Discurso durante a 149ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

As ações do governo federal de combate à fome.

Autor
Edison Lobão (PFL - Partido da Frente Liberal/MA)
Nome completo: Edison Lobão
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • As ações do governo federal de combate à fome.
Publicação
Publicação no DSF de 25/10/2003 - Página 33836
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • REFERENCIA, CRITICA, PROGRAMA, COMBATE, FOME, GOVERNO FEDERAL, MOTIVO, EXCESSO, BENEFICIO, ATIVIDADE ASSISTENCIAL, ESCLARECIMENTOS, URGENCIA, CARATER PROVISORIO, PROJETO, AUXILIO, POPULAÇÃO CARENTE, AUTONOMIA, OBTENÇÃO, PRODUTO ALIMENTAR BASICO.
  • DEFESA, ATENÇÃO, GOVERNO FEDERAL, TRABALHO, AUTORIA, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), CAMARA DOS DEPUTADOS, ESTUDO, SITUAÇÃO, FOME, BRASIL, APRESENTAÇÃO, INFORMAÇÕES, EFICIENCIA, ATIVIDADE ASSISTENCIAL, NECESSIDADE, ADAPTAÇÃO, ALIMENTAÇÃO, ESPECIFICAÇÃO, REGIÃO, SUBSIDIOS, PEQUENO AGRICULTOR, PRODUÇÃO, GENEROS DE PRIMEIRA NECESSIDADE, ECONOMIA POPULAR.
  • ELOGIO, INICIATIVA, GOVERNO FEDERAL, UNIFICAÇÃO, PROGRAMA, NATUREZA SOCIAL, MELHORIA, EFICIENCIA, GARANTIA, BENEFICIO, POPULAÇÃO.

O EDISON LOBÃO (PFL - MA. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, tenho acompanhado com grande interesse o devotamento compulsivo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva para criar ações de governo capazes de extirparem a fome instalada em milhões de lares brasileiros. Sob tal motivação, deu-se início ao programa “Fome Zero”, que tem sido objeto de alguns desacertos e recebe críticas, até mesmo de membros do Partido Trabalhista, que se contrapõem às iniciativas de cunho paternalista.

Há de se entender, sob esse aspecto, que o viés paternalista do programa é um instrumento que se pode definir como emergencial, provisório, que atende a uma necessidade imediata, inadiável, pois é o próprio governo que assim o declara publicamente. Faz-se a doação para alimentos na expectativa de que os beneficiários, com a desejada criação de novos postos de trabalho, possam, em futuro próximo, prover o próprio sustento familiar, tornando mais adiante desnecessárias as doações paternalistas.

O que me causa perplexidade nessa meritória campanha de combate à fome - que se desenvolve em meio a debates críticos - é o total desconhecimento de um relevante trabalho, desenvolvido por duas Comissões Parlamentares de Inquérito da Câmara dos Deputados, em 1981 e em 1991, exatamente sobre a fome. A primeira, iniciativa do saudoso deputado Adhemar Santillo, não chegou ao relatório final, mas a segunda - cujas Conclusões e Recomendações estão publicadas em Suplemento do Diário do Congresso Nacional, edição nº 64/92 - conseguiu produzir um trabalho assaz importante, alcançando conclusões que, suponho, não são do conhecimento dos que atualmente tocam o “Fome Zero”.

Nessas CPIs - a segunda, presidida por Armando Costa e relatada por Márcia Cibilis Viana -, foram ouvidos importantes depoimentos de técnicos e cientistas, por mim comentados, desta tribuna do Senado, a 8 de junho de 1995.

Nesse meu discurso, eu disse que a carência alimentar do brasileiro não se devia à falta de programas. Ao contrário, eram abundantes nos três níveis governamentais: programas de distribuição de leite, de merenda escolar, de tíquetes de alimentação, das sopas gratuitas, das cestas básicas - quer estatais, quer as de iniciativa de sociedades benemerentes. No entanto, nenhum desses programas - por mais meritórios que tenham sido e ainda o são, os que já vinham de longas datas ou os mais recentes - logrou resolver o grave problema alimentar das famílias brasileiras menos afortunadas.

Na documentação reunida pelas citadas CPIs da Câmara dos Deputados, apurou-se inclusive que o organismo humano adapta-se à fome, ao que se chama de “fome oculta”. Após 18 horas de jejum, o corpo começa a eliminar os lipídios e nutrientes, e a fome leva o indivíduo a um hábito que reduz consideravelmente a sua expectativa de vida. Quanto à “cesta básica” - que então se disse não existir em nenhum outro país do mundo -, concordou-se que a nossa não priorizava alimentos nutritivos para os quais estava vocacionada a agricultura brasileira. Com a merenda escolar, criávamos em nossas crianças hábitos estranhos à sua realidade, oferecendo-lhes, por exemplo, pão de trigo - produto de importação - ao invés de pão de milho, que é a nossa realidade.

No depoimento que prestou à CPI, citou-se um estudo do Professor Warulick Kerr, então do Departamento de Biologia da Universidade do Maranhão, no qual ele dizia que a fome seria consideravelmente reduzida no Brasil se utilizássemos os alimentos regionais. E demonstrou o Professor que o cidadão da Região Amazônica importava a cenoura para se suprir da vitamina A, quando o buriti é um elemento regional com muito mais propriedade nessa vitamina do que a cenoura.

Na análise desse trabalho do inquérito parlamentar infelizmente subestimado, eu citei o depoimento do Dr. José Eduardo Dutra de Oliveira - Professor Titular e Chefe do Departamento de Nutrição da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, então Presidente da União Internacional de Ciência e Nutrição, Membro da Academia Nacional de Medicina e da Academia de Medicina de São Paulo. S. Sª enfatizava que o arroz e o feijão (este só é produzido no Brasil, México, Chile e América Central), que compõem o hábito alimentar nacional, têm sido os responsáveis pela subsistência do brasileiro nos últimos 100 ou 200 anos. No entanto, esses alimentos não recebiam a atenção prioritária que merecem. Segundo o professor, o pequeno produtor devia merecer o estímulo que lhe garantisse o preço equivalente àquele que ganharia se plantasse algodão, soja, cana ou qualquer outro produto de mercado. Devia-se subsidiá-lo sem preconceitos, pois não há país que deixe de subsidiar seus produtos essenciais. “Ao subsidiar o trigo, estamos subsidiando o indivíduo rico mais que o pobre. Subsidiar o feijão é subsidiar o indivíduo pobre e não o consumidor rico”, dizia o Professor Dutra de Oliveira. E acrescentou que os dados das organizações internacionais mostravam que nenhum país resolvera o problema alimentar sem um tipo de subsídio específico para certos tipos de alimentos.

Várias e procedentes foram as recomendações do referido inquérito parlamentar, feitas há mais de dez anos, nenhuma das quais mereceu maior atenção das autoridades governamentais. Cito algumas: implantação de duzentas agrovilas ao longo dos principais eixos rodoviários e ferroviários, com adequada infra-estrutura; investimentos públicos direcionados preferencialmente para a produção de alimentos, bem como à irrigação da região semi-árida nordestina e do Vale do Jequitinhonha; implantação de novas escolas agrotécnicas federais em áreas com potencialidade agrícola; isenção total de tributação para os produtos integrantes da cesta básica; unificação dos programas de distribuição de alimentos; que os alimentos adquiridos pelo Poder Público para distribuição em programas nutricionais sejam constituídos de modo a estimular-se a produção agropecuária, respeitando-se os hábitos alimentares regionais da população.

Vejam V. Exªs como é difícil, no Brasil, levar adiante um projeto de alto alcance social e econômico, como o de combate à fome ou o da melhoria nutricional do brasileiro. Uma tarefa relevante como a do inquérito levado a efeito na Câmara - no qual se investiram recursos públicos e longas horas de trabalho parlamentar, cujas conclusões foram naturalmente encaminhadas às autoridades competentes - resultou inútil, talvez pelo vezo da habitual descontinuidade administrativa muito própria dos sistemas presidencialistas, em que uma gestão governamental não dá continuidade ao que veio da anterior.

A iniciativa do atual governo de unificar os projetos sociais, interrompendo a duplicidade ou a diversificação de ações similares, é uma decisão importante, pois buscará organicidade para o desempenho de programas que se pretendem eficientes. Trata-se provavelmente de um passo adiante no sentido do melhor aproveitamento das ações de política pública.

Esperamos que assim seja.

Era o que tinha a dizer.

Obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/10/2003 - Página 33836