Discurso durante a 144ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Homenagem à Medicina pela passagem do Dia do Médico.

Autor
Papaléo Paes (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AP)
Nome completo: João Bosco Papaléo Paes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. SAUDE.:
  • Homenagem à Medicina pela passagem do Dia do Médico.
Publicação
Republicação no DSF de 30/10/2003 - Página 34225
Assunto
Outros > HOMENAGEM. SAUDE.
Indexação
  • HOMENAGEM, DIA, MEDICO.
  • CRITICA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ACUSAÇÃO, SENADOR, LOBBY, AREA, SAUDE PUBLICA, MOTIVO, OPOSIÇÃO, RETIRADA, RECURSOS ORÇAMENTARIOS, MINISTERIO DA SAUDE (MS), DESTINAÇÃO, PROGRAMA, COMBATE, POBREZA.
  • DENUNCIA, PRECARIEDADE, SERVIÇO PUBLICO, ATENDIMENTO, SAUDE, PERDA, SERVIDOR, RETIRADA, DIREITO ADQUIRIDO, REFORMULAÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL.
  • ELOGIO, TRABALHO, MEDICO, DENUNCIA, PRECARIEDADE, CONDIÇÕES DE TRABALHO, SALARIO, ATENDIMENTO, POPULAÇÃO CARENTE, ESPECIFICAÇÃO, ZONA RURAL, GRAVIDADE, DADOS, SAUDE PUBLICA, BRASIL, EFEITO, HISTORIA, CORRUPÇÃO, DESVIO, VERBA.
  • DEFESA, UNIFICAÇÃO, CURRICULO, CURSO SUPERIOR, MEDICINA, EXPECTATIVA, MINISTERIO DA EDUCAÇÃO (MEC), CRIAÇÃO, FACULDADE, ESTADO DO AMAPA (AP).
  • NECESSIDADE, PRIORIDADE, PROGRAMA, INCENTIVO, MEDICO, TRABALHO, INTERIOR, PAIS.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 29-10-2003


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DISCURSO PRONUNCIADO PELO SR. SENADOR PAPALÉO PAES, NA SESSÃO NÃO DELIBERATIVA ORDINÁRIA DE 17010-2003, QUE SE REPUBLICA PARA SANAR INCORREÇÕES.

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O SR. PAPALÉO PAES (PMDB - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o evento de hoje é conseqüência de um requerimento do Senador Mozarildo Cavalcanti, subscrito pelos Senadores Mão Santa, Antonio Carlos Magalhães, Augusto Botelho, Tião Viana, Papaléo Paes e pela Senadora Heloísa Helena. Este evento nos deu oportunidade de ter aqui nesta Casa figuras significativas da Medicina, que peço permissão para citar: Dr. Pablo Magalhães Chacel, Representante do Conselho Federal de Medicina; Dr. Washington Corrêa, Presidente da Associação Brasileira dos Centros de Diálise e Transplante - ABCDT; Drª Maria Silva Sucupira, Endocrinologista e Secretária-Executiva da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabolismo e ex-Diretora do Serviço Médico do Senado. E cito os colegas médicos: Dr. Luís Roberto Magalhães, Cardiologista; Dr. Antônio Carlos Amorím, Cardiologista; Drª Leda Braúna Braga, Cardiologista, que são representantes aqui do Serviço Médico do Senado Federal.

Quero citar o nobre Deputado Federal, Dr. Rodolfo Pereira, que está prestigiando este evento no Senado, honrando-nos com sua presença, assim como o Dr. Evaldo Carneiro Nogueira, do Estado de Roraima; Dr. Cláudio Vieira, Secretário-Geral do CRM, e fazer um registro da presença da minha esposa, Drª Josélia, que é representante do Amapá, além de mim, é claro.

Realmente, já ouvimos o Dr. Mozarildo, Senador da Republica, fazer um pronunciamento muito brilhante. E ouvimos o belíssimo pronunciamento do Senador Mão Santa, fazendo abordagens sobre a nossa profissão, envolvendo as questões políticas que, logicamente, estão ligadas à nossa profissão.

Claro que cada um de nós tem a sua experiência na vida médica e na vida política. Há médicos que enveredaram pela vida político-partidária em conseqüência de suas ações como profissionais da área da saúde; e há colegas que, por disporem de uma situação financeiramente mais privilegiada não exerceram por tanto tempo a sua profissão. Mas cada um de nós tem a sua experiência. A minha experiência é a de convivência hospitalar, dentro de uma Santa Casa do Estado do Pará, onde fiz o meu curso de Medicina. Aos dezoito anos de idade eu já estava dentro da Santa Casa do Estado do Pará.

Hoje, aos cinqüenta e um anos de idade, estou, logicamente, exercendo a minha profissão. Estou há algum tempo um pouco afastado, desde que tomei posse nesta Casa, porém ainda pratico medicina um dia na semana. Ficamos em uma situação de poder dar um pouquinho da nossa experiência. Eu fiz uma opção de vida: escolhi ser médico funcionário público. Nunca participei de qualquer atividade na área privada da Medicina por opção. Ambos médicos, eu e minha esposa recebíamos salário de Território Federal, um salário que era muito bom. Achávamos até que era demais para uma família de quatro pessoas, eu, minha esposa e duas filhas.

Tivemos oportunidade de passar pelos níveis de excelência que a medicina nos oferece e por aquele elementar, que é o maior da nossa convivência; somos cardiologistas, mas jamais nos deixamos influenciar pela especialidade que temos para deixar de atender em um centro de saúde ou em uma comunidade carente.

A nossa experiência médica envolve a questão humanitária. Nós, médicos, temos uma formação humanística profunda, que ninguém tira e que engrandece a política partidária.

Por isso não admito, Sr. Presidente Mozarildo Cavalcanti, que sejamos jogados em uma vala comum - estou falando especificamente de nós, médicos políticos -, que sejamos acusados de fazer lobbies na saúde para beneficiar quem quer que seja. Podemos até estar fazendo lobby, mas lobby para o bem, para dar condições à nossa saúde pública de voltar a ser o que já foi - tivemos épocas muito melhores do que a atual. Esse lobby faremos sempre, para que o Governo faça cumprir as leis, para que tenhamos recursos para patrocinar uma saúde pública de qualidade e com responsabilidade. Não podemos jamais deixar que os nossos postos ou centros de saúde deixem de oferecer dignidade ao cidadão pobre, que é quem procura esses locais.

O Senador Mão Santa fez referência à Emenda Constitucional nº 29. Na quarta-feira, em audiência pública com o Deputado Rafael Guerra, Presidente da Frente Parlamentar da Saúde, discutimos essa questão. O Senador Antonio Carlos Valadares, que não é médico, mas tem uma formação socialista muito forte, em determinado momento da reunião, comunicou que teria que sair devido a um encontro que teria na residência do Presidente da República, onde estariam várias outras lideranças da base de apoio ao Governo. S. Exª se comprometeu a levar a nossa mensagem de preocupação quanto à subtração feita do orçamento destinado à saúde de mais de R$3 bilhões. O Senador cumpriu o que nos prometeu, mas, para nossa surpresa, no dia seguinte, ontem, lemos no Correio Braziliense:

Um incidente marcou ontem o almoço do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva com os líderes e vice-líderes do governo no Senado. Sentido-se ofendido quando Lula disse haver lobistas na bancada da saúde no Congresso Nacional, o líder do PSB, Antonio Carlos Valadares (SE), reagiu, causando constrangimento. Na proposta de Orçamento Geral da União para 2004, o governo tirou R$3,6 bilhões do total de R$28,9 bilhões previstos para a saúde e os realocou no Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza [que é outra emenda, a Emenda nº 31], o que provocou protestos da bancada de congressistas da saúde.

Antes do almoço, Valadares e o líder do PT, Tião Viana (AC), combinaram de levar o assunto ao presidente. O senador do PSB queria, com Tião Viana, falar em particular com Lula. Mas o petista sugeriu que ele falasse na presença de todos. Foi o que fez Valadares.

Então estamos sendo chamados de lobistas - lobistas do mal - pelo Presidente da República porque queremos o bem da população. O dinheiro do Orçamento não vem para o bolso de nenhum de nós; vai para a saúde pública.

Sou Presidente da Subcomissão de Saúde e, em uma audiência pública sobre hemodiálise, fiquei muito constrangido quando disse a uma figura importante, um político do governo, que eu lamentava o fato de muitas clínicas de hemodiálise estarem com seus pagamentos atrasados, valores ínfimos, segundo dados de planilhas de custos, e essa pessoa me perguntou se eu estava fazendo lobby para essas clínicas e questionou: “Como o governo pode gastar R$2 bilhões por ano para cuidar apenas de 60 mil pessoas?

Lamentamos que esteja havendo um trabalho matemático, desumano, por parte do Governo. Como médicos e Senadores eleitos pelo povo, temos que denunciar essas situações. Da mesma forma, queremos denunciar a qualidade do serviço público que está cada vez pior, a falta de recursos para incrementar os serviços ou até para mantê-los; queremos denunciar a reforma da previdência, que está esvaziando as nossas universidades e retirando do serviço público profissionais preparados, gabaritados, experientes.

Sou funcionário público e sei falar muito bem sobre isso, porque convivo naquele meio. Quando se quer tirar a pensão da viuvinha, como diz o Senador Mão Santa, faz-se isso sobre quem projetou toda a sua vida na aposentadoria e até na sua morte, para deixar alguma segurança para sua família. Ouvi também um exemplo infeliz, quando questionei a redução de pensão: quando há um casal e morre um, ficam 50%. O que ficou vivo está lucrando porque fica com mais 20%, ou seja, 70% da pensão, com se isso fosse a nossa realidade. A pensão ou aposentadoria não é só para sustentar o casal, mas para sustentar neto, bisneto, filho de 40 ou 50 anos que perdeu o emprego e vai para a casa do pai, para pagar a escola das crianças, reformar a casa, pagar plano de saúde, porque ele não tem bom atendimento no serviço médico público.

Quando assinamos um contrato de servidor público, assim o fazemos porque concordamos com as cláusulas daquele contrato. De repente, aproximando-se a aposentadoria, vem uma lei que reduz tudo aquilo que você imaginou ter direito e passa a não ter mais. Esse direito é jogado no ralo. Esse direito perdido vai resolver o problema da Nação - é essa a propaganda. Em 1988, o Governo propagava que a Constituição ia resolver todos os problemas da Nação. Mas estamos vivendo uma situação muito pior.

Tudo que se faz hoje, lamentavelmente, é em cima da matemática. Perdeu-se a noção do ser humano. Seria preciso uma análise, um ensaio das conseqüências sociais dessa reforma; as conseqüências financeiras, podemos saber imediatamente, fazer contas, apresentar a quem quiser; a matemática não falha. Mas s conseqüências sociais deveríamos ter, porque, daqui a cinco, dez, quinze anos, essa reforma que hoje é cantada e decantada como uma maravilha deverá ser um verdadeiro desastre para a sociedade brasileira.

Com essas palavras, pretendo que compreendam o sentimento de alguém que convive na área de medicina com muito amor, com muita responsabilidade e com muita dedicação, como os demais colegas que estão aqui.

Srªs e Srs. Senadores, senhores convidados, amanhã, dia 18 de outubro, é o dia escolhido para homenagear os médicos do Brasil. O discurso que trago a este plenário homenageia os milhares de profissionais brasileiros que exercem com abnegação, com sacrifício, com elevado sentimento de solidariedade e com baixos salários uma das profissões mais exigidas devido à grande procura profissional.

Lamentavelmente, o sistema de saúde pública existente em nosso País é dos mais desordenados. Os profissionais de medicina que nele trabalham lidam cotidianamente com enormes dificuldades materiais e profissionais para exercer honestamente a sua estafante profissão. Assim, o retrato que apresentamos ao mundo é de tristeza, de vergonha, de frustração, de corrupção, de abandono e de desorganização, quando tudo poderia ser bem diferente.

Na verdade, o direito à saúde o Brasil é privilégio de uma minoria que evita os hospitais públicos e busca atendimento médico em clínicas sofisticadas ou hospitais de primeiríssima linha, normalmente privados ou administrados por fundações em que as condições materiais são excelentes, a higiene é impecável, o atendimento é de alta qualidade, não existem filas, os equipamentos são de última geração, os profissionais são altamente treinados e os custos do atendimento são elevadíssimos. Nas grandes capitais brasileiras, encontramos esses centros de excelência médica que chegam inclusive a superar unidades semelhantes existentes em países como Estados Unidos, Japão, Alemanha, Inglaterra, Noruega, Suécia e outros do chamado universo da prosperidade e do bem-estar social.

Em contrapartida, aos pobres é oferecida uma péssima estrutura em que o médico precisa fazer vários milagres diários para poder suplantar todos os tipos de desafios e amenizar suas precárias condições de trabalho.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, todos os anos, os organismos internacionais ligados à saúde incluem o nosso País entre as nações mais desestruturadas do planeta no que se refere à qualidade do serviço de saúde pública oferecido à maioria da população. Na verdade, os indicadores são vergonhosos e não são dignos de um País que está hoje colocado entre as quinze maiores economias do planeta.

Perante a comunidade internacional, sempre estamos entre os primeiros em mortalidade infantil, infecção hospitalar, deficiências sanitárias de todos os tipos, mortalidade por doenças banais como coqueluche, diarréia, tuberculose, dengue, doença de Chagas, esquistossomose e uma infinidade de outras ocorrências parasitárias que poderiam ser facilmente tratáveis, se tivéssemos investido melhor ao longo dos anos na organização, no treinamento dos profissionais, na manutenção e na modernização dos nossos equipamentos de saúde.

Como bem sabemos, é muito freqüente o dinheiro público trocar de caminho para atender demandas políticas das mais absurdas e imorais. Aliás, durante o escândalo do Orçamento, que revelou o envolvimento de Parlamentares denominados “anões”, a Nação inteira ficou estarrecida diante das revelações feitas pela comissão parlamentar de inquérito que mostrou detalhadamente como as verbas do Orçamento nunca chegavam ao seu verdadeiro destino.

Pois bem, durante décadas seguidas, esse constante desvio do dinheiro público foi um dos motivos que mais agravaram a degradação dos hospitais, dos prontos-socorros, dos postos de saúde e de outras unidades médica em todo o território nacional que não conseguiam, de forma alguma, manter uma infra-estrutura decente de atendimento em saúde às populações mais necessitadas.

Convém destacar que um dos maiores prejudicados por esses graves crimes cometidos contra a maioria da sociedade brasileira foi o profissional médico. Todos os dias, anos a fio, seu ritmo de trabalho é intenso e estressante nos corredores abarrotados de doentes e nos plantões, numa louca disputa contra as péssimas condições existentes em seus locais de atendimento. É justamente nesse ambiente que milhares de médicos trabalham em todo o País, tentando, por todos os meios, salvar vidas sem ao menos dispor, em muitas situações, do material mais elementar como anestésicos, gaze, esparadrapo, seringas, gesso, oxigênio e mesmo uma simples aspirina.

Recentemente, um canal de televisão mostrou uma reportagem revoltante em um hospital público do Rio de Janeiro. Um senhor de 75 anos de idade que não passava bem, portador de diabetes e doença cardíaca, em uma cadeira de rodas, esperava, ao lado da filha apreensiva, atendimento na emergência e necessitava tomar medicamentos. O médico de plantão, constrangido, foi obrigado a comprar com o seu próprio dinheiro, na farmácia ao lado, o medicamento necessário que estava faltando no estoque do referido hospital; medicamento esse de pequeno valor.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quando saímos desta realidade cruel, que faz parte do dia-a-dia do médico brasileiro nos grandes e médios centros urbanos, deparamos com outra que complementa o quadro miserável de nossas deficiências de infra-estrutura na saúde. Trata-se do exercício da medicina nos pequenos Municípios, nas áreas rurais, nas regiões distantes do nosso imenso País e nos grotões mais atrasados. Nessas áreas, as condições de trabalho são verdadeiramente penosas porque o médico conta apenas com a sua capacidade profissional nos momentos mais difíceis, ou seja, quando depara com casos graves que exigem remoção do paciente para um centro mais adiantado.

De maneira geral, nessas regiões, os remédios são praticamente inexistentes, as condições de atendimento extremamente precárias, as distâncias significativas, o transporte difícil, as estradas esburacadas e os recursos médicos mais adiantados encontram-se a centenas de quilômetros do paciente. Lamentavelmente, em muitos desses casos, os doentes não resistem, apesar do esforço sobre-humano do médico para salvar aquela vida.

É importante ressaltar ainda que, nessas áreas longínquas, o exercício da medicina é um verdadeiro sacerdócio e um ato de heroísmo. A presença do médico, quando existe em alguma localidade distante, é idolatrada por todos. Além do poder que exerce por ser detentor do conhecimento científico da cura, o médico, no seio dessas comunidades distantes, passa a ser um grande conselheiro, uma pessoa de grande respeito e de grande confiança no seio das famílias.

Muitas vezes, e não são raros os casos, os médicos abnegados dessas localidades não cobram pelas consultas. Chegam até a pagar com o próprio dinheiro o preço de sua missão, que é a de atender a um paciente necessitado, sejam quais forem as suas condições. Para isso, não importa se ele se encontra a centenas de quilômetros de distância de sua residência, se foi chamado nos horários mais impróprios ou se o doente está nos lugares mais inóspitos e mais isolados.

Antes de concluir, Sr. Presidente, gostaria de levantar alguns pontos que considero importantes para o futuro do exercício da Medicina em nosso País.

O primeiro é a unificação do currículo dos cursos de Medicina em todas as instituições de ensino de graduação. Dessa maneira, o estudante que se formar na melhor faculdade de Medicina do Estado de São Paulo - e aí eu mando um recado para o meu Estado - terá a mesma visão médica daquele que estudou no Amapá, no meu Estado, que, lamentavelmente, ainda não possui uma faculdade para a formação de médicos - desde já, peço o apoio do Exmº Sr. Ministro da Educação para esse fim.

Outro ponto que considero prioritário é a interiorização da Medicina. Aliás, o Governo deveria investir mais nesse caminho, criar programas especiais, destinar verbas suficientes para viabilizar essas ações, oferecer bons salários e condições corretas de trabalho e de fixação e incentivar os jovens médicos a trabalharem no interior. Outro dia, na mesma reunião a que há pouco me referi, da Frente Parlamentar da Saúde, ouvi o comentário de que o Governo estaria disposto a acabar com o Programa Médico de Família, porque estava gastando muito dinheiro na formação de profissionais e porque, do seu ponto de vista, os salários são muito altos. É lamentável!

Como vimos ao longo deste pronunciamento, nos grandes e médios centros urbanos, em virtude da agitação, da concorrência, da competitividade cada vez mais presente, da violência, do individualismo, da solidão e de outros fatores que definem a complexidade da vida social nos dias atuais, a relação médico/paciente infelizmente acompanha essa dinâmica, e dificilmente seria diferente.

Todavia, como dissemos anteriormente, nas comunidades interioranas ou rurais, apesar de tudo, as relações sociais ainda são fraternas, e a relação médico/paciente é mais próxima, mais amiga, mais dedicada, mais confiante e muito mais pura. Portanto, o Governo poderia muito bem aprofundar a questão da necessidade de interiorização do atendimento médico, que exigiria, inclusive, pouco dispêndio, se os programas fossem criativos e bem administrados.

Aliás, para iniciar tal projeto, já dispomos de um grande capital que é o número de médicos formados em nossas faculdades e prontos para serem recrutados. Vale lembrar que o Brasil é auto-suficiente em profissionais médicos. Entretanto, a maioria deles está concentrada nos grandes e médios centros urbanos, enquanto as áreas do interior sentem a sua ausência. Diante dessa realidade, não precisamos de médicos de outros países. Certa ocasião, queriam levar 30 médicos cubanos para atender à população do Amapá, porém, nós não admitimos que o fizessem de maneira inescrupulosa. Tanto é que, dos 30, apenas dois foram aprovados na nossa universidade. Não devemos deixar os nossos interiores servirem de laboratório para ninguém, para país nenhum, principalmente para o país a que me referi, que tem uma formação médica duvidosa para a realidade brasileira. Diante disso, volto a dizer, não precisamos de médicos de outros países e, sim, criar condições para que os médicos brasileiros saiam das grandes cidades e vão para o interior. Para isso, se quisermos, se tivermos vontade política e iniciativa, conseguiremos, em médio prazo, estruturar um programa exemplar de interiorização do atendimento médico.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a conclusão a que chegamos é que o sistema de saúde brasileiro precisa ser mudado urgentemente. A esta altura do nosso estágio de desenvolvimento, não é mais possível conviver com corredores lotados de pessoas esperando atendimento em hospitais públicos caindo aos pedaços, pacientes morrendo por falta de assistência, por falta de médicos, de remédios, de atendimento profissional, de equipamentos e de organização. Enfim, é preciso rever todo o sistema público de saúde, que está à beira do caos. Do contrário, a imagem do Brasil continuará sendo, lá fora, a de um país que não tem a menor preocupação com a cidadania, com a dignidade e com os direitos humanos.

Saúdo, neste momento, todos os colegas médicos do Brasil e, particularmente, do querido Estado do Amapá.

Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 30/10/2003 - Página 34225