Discurso durante a 152ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Necessidade de uma política governamental que gere mecanismos eficazes em favor de setor de produção e beneficiamento do borracha natural no Brasil.

Autor
Luiz Otavio (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PA)
Nome completo: Luiz Otavio Oliveira Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA AGRICOLA.:
  • Necessidade de uma política governamental que gere mecanismos eficazes em favor de setor de produção e beneficiamento do borracha natural no Brasil.
Publicação
Publicação no DSF de 31/10/2003 - Página 34504
Assunto
Outros > POLITICA AGRICOLA.
Indexação
  • ANALISE, HISTORIA, PRODUÇÃO, BORRACHA, BRASIL, ERRO, FALTA, PRIORIDADE, EXISTENCIA, MONOPOLIO ESTATAL, POLITICA, SUBVENÇÃO, AUSENCIA, PLANEJAMENTO, DEFESA, INCENTIVO, RETOMADA, BORRACHA NATURAL, REGIÃO AMAZONICA, OBJETIVO, DESENVOLVIMENTO REGIONAL, REDUÇÃO, IMPORTAÇÃO, PRODUTO.
  • DENUNCIA, CARTEL, EMPRESA MULTINACIONAL, PNEUMATICO, AQUISIÇÃO, PRODUTO NACIONAL, BORRACHA, EXIGENCIA, PADRÃO DE QUALIDADE, BENEFICIAMENTO, DIFICULDADE, PRODUTOR RURAL, FALTA, CONTROLE, PRODUTOR, CONTINENTE, ASIA, CONTRABANDO, BIODIVERSIDADE, BRASIL.
  • APRESENTAÇÃO, SUGESTÃO, POLITICA, INCENTIVO, BORRACHA.

O SR. LUIZ OTÁVIO (PMDB _ PA. Sem apanhamento taquigráfico.) -

PRODUÇÃO DE BORRACHA NATURAL

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ao longo de nossa história, o Brasil tem sido pródigo em erros de escolha que muito custaram ao seu povo, em decorrência do atraso provocado em nosso desenvolvimento. Um exemplo desses erros é o que ocorreu com a produção de borracha natural em nosso País.

No final do século XIX e início do século XX, a Amazônia brasileira era a única produtora mundial de borracha natural. Como o café ainda vivia seu apogeu de maior produto brasileiro de exportação, e o baronato do café tinha influência política decisiva no País, a borracha foi relegada a segundo plano e deixada ao seu próprio destino. O resultado foi que a Inglaterra, percebendo a importância da borracha como matéria-prima para a revolução a ser levada a efeito pelos meios de transporte que se estavam criando, transportou nossa borracha para o Sudeste asiático e lá criou o grande centro produtor que hoje domina o mercado desse setor. E o Brasil viu definhar a economia amazônica e empobrecer toda uma vasta área do norte brasileiro que vinha vivendo um ciclo acelerado de desenvolvimento, fruto de suas potencialidades naturais.

Após 1940, quando o Brasil percebeu o enorme erro cometido, tentou recuperar o terreno perdido, mas sempre com políticas e objetivos equivocados. No período da 2ª Grande Guerra, a produção de borracha foi subsidiada para ajudar no esforço militar, mas sem nenhuma perspectiva de continuidade do processo de alavancagem da produção no pós-guerra. Segue-se, então, o segundo grande equívoco, com o monopólio estatal da produção e comercialização do produto, que durou de 1945 a 1966. O resultado foi o esgotamento do modelo estatal e quase nenhum ganho em escala econômica ou socialmente justificável para tão longo período de monopólio estatal. A partir de 1966, seguiram-se políticas de subvenção ao setor, mas nenhum planejamento estratégico que pudesse maximizar a produtividade e otimizar a área plantada, seja em seringais nativos, seja em seringais de cultivo.

Mas é sempre assim, Sr. Presidente. Quando os governantes e as elites têm visão estreita e mesquinha do que possam ser as estratégias de desenvolvimento, quem sofre é o povo. E assim se passou com a borracha. Hoje o Brasil tenta recuperar uma posição que já foi sua, lutando em condições extremamente desfavoráveis interna e externamente.

Isso, contudo, Sr. Presidente, não pode servir de pretexto para deixarmos para depois o encaminhamento das medidas necessárias para resgatar o sistema produtivo de borracha natural da Amazônia, pois ele é e será, no futuro próximo e mais remoto, um dos fatores decisivos para levar o crescimento econômico a toda a região.

Os Estados federados amazônicos têm enorme potencial para produzir borracha natural em escala que contribua de modo efetivo e intensivo para a elevação do PIB da região, o que pode ser facilmente constatado a partir dos indicadores atuais do setor.

O primeiro e escandaloso dado é que o Brasil importa, hoje, cerca de 75% de suas necessidades de borracha natural, gerando emprego e renda em outros países e gastando o equivalente a 300 milhões de dólares anuais, enquanto a produção amazônica está estagnada em 60 mil toneladas anuais. Tal situação mantém o setor em permanente crise, pela cadeia perversa de políticas públicas equivocadas; pela extinção dos conselhos e órgãos estatais reguladores do setor, como o Conselho Nacional da Borracha e a Superintendência da Borracha, que não encontraram substitutos em nenhum outro órgão do Estado; pela incapacidade do IBAMA de se posicionar como efetivo gestor do setor de borracha e responsabilizar-se por uma política setorial; pela eterna burocracia estatal, que inviabiliza qualquer ação expedita dos produtores, retardando empréstimos, repasse de subvenções, concentrando subsídios em empresas e grupos economicamente fortes, em detrimento dos pequenos e médios produtores.

Enfim, Srªs e Srs. Senadores, o setor da borracha natural no Brasil é quase uma comédia de erros, não fossem trágicos para as economias regional e nacional os efeitos dessa louca cadeia de equívocos. Que fica ainda mais sombria, se aliarmos aos fatos que narrei, mais os seguintes.

As multinacionais da indústria de pneumáticos, responsáveis pela compra de 80% da borracha nacional, em virtude da desorganização do mercado e da falta de uma política brasileira para o setor, impõem suas regras e ditam os preços 15 a 20% abaixo do preço da borracha nos mercados de Singapura, Londres ou Malásia. Fica, assim, configurada a prática de cartel em detrimento da produção nacional.

Essas mesmas indústrias de grande porte exigem dos beneficiadores nacionais de borracha padrão de qualidade altamente custoso para as pequenas usinas existentes na região, o que dificulta a venda de borracha beneficiada ou provoca o seu envio para beneficiamento fora da região, enfraquecendo ainda mais a cadeia produtiva local. Mesmo que a borracha saia das usinas com certificado de qualidade em conformidade com as especificações do cartel, ela é, freqüentemente, recusada pelo adquirente, após novo exame no destino, sem que seja permitido ao produtor qualquer contestação ou contraprova.

Por outro lado, a importação de borracha pela indústria para seu consumo não sofre qualquer restrição, mesmo que haja disponibilidade da matéria no mercado interno. Ora, ficam assim prejudicados os produtores nacionais, preteridos, sem qualquer necessidade, em favor de fornecedores estrangeiros.

Os produtores do Sudeste asiático, Sr. Presidente, vêm ao Brasil e, livremente, sem qualquer espécie de restrição de nossa parte, levam material genético brasileiro para criarem novos clones em seus países e renovarem seus plantios em decadência, ou abrirem novas áreas de plantação. Estamos, na prática, doando nossas matrizes biológicas, sem qualquer contrapartida imediata vantajosa para o País, nem qualquer outra que beneficie nossa produção local, como, por exemplo, transferência de tecnologia. Não demora muito, ver-nos-emos proibidos por uma patente estrangeira de explorar nossa própria riqueza nativa.

Sr. Presidente, creio já haver demonstrado, de modo cabal, que nosso setor de borracha natural carece de urgente ação por parte do Estado, para dar-lhe organicidade, responsabilidade, eficiência e eficácia econômica e social. A Amazônia necessita fortemente retomar o ciclo da borracha, agora em novas bases e com perspectiva de sustentabilidade.

Creio ser um legítimo anseio de todo amazonense ver o Teatro Municipal de Manaus retornar aos seus momentos de glória, quando recebia artistas do calibre de uma Sarah Bernhardt ou de um Caruso, no auge da febre desenvolvimentista do final do século XIX e início do século XX. Para tanto, será necessário impulsionar o desenvolvimento da Amazônia, fazendo da borracha uma das alavancas mestras do novo crescimento da região amazônica brasileira.

Melhorar a produtividade, garantir mercado para a produção, apoiar com crédito o setor, apoiar a implantação e modernização das usinas de beneficiamento, incentivar os seringais de cultivo e renovar os naturais, instalar e fortalecer órgão de governo responsável por políticas de curto, médio e longo prazos para o setor. Eis algumas medidas indispensáveis para que possamos retomar o ciclo virtuoso de desenvolvimento do segmento da borracha na Amazônia.

O Pará, com 18 mil hectares de área plantada, produz sete mil toneladas-ano de borracha. Rondônia, com 75 mil hectares plantados, produz sete mil e quinhentas toneladas. Ou seja, Rondônia tem uma produtividade que é a quarta parte da obtida no Pará, mas que pode ser sensivelmente melhorada. Se tivermos uma política efetiva de incentivo à produção, poderemos alcançar rapidamente 90 mil toneladas-ano entre seringais nativos e cultivados. E isso, sem comprometer qualquer política de ocupação do solo ou de preservação da mata amazônica.

Para que um novo modelo de produção de borracha no Brasil possa ser instalado, é preciso que o governo se debruce sobre as necessidades do setor e dê-lhe tratamento condigno com a importância que tem para a economia amazônica. Políticas creditícias para investimento, para custeio e para comercialização; subsídios para os pequenos produtores; apoio à pesquisa são todos aspectos do que podem vir a ser um real programa de recuperação da produção da borracha no Brasil.

Enquanto estivermos com nossa cadeia produtiva desarticulada, os agentes produtivos potenciais descapitalizados e com deficiências crônicas de tecnologia e processo produtivo, dificilmente poderemos revigorar o setor e atrair novos investidores.

Os laboratórios do CNPq poderiam tornar-se um centro independente de certificação de qualidade da borracha regional, desde que adequadamente equipados para tal. Com isso, ficaria satisfeita, por um laboratório independente, uma das exigências da indústria de pneumáticos, que é a certificação conforme as normas internacionais ISO 9.000.

Haverá, Sr. Presidente, com toda a certeza, mecanismos eficazes para o Governo acionar em favor do setor de produção e beneficiamento de borracha natural no Brasil. Trata-se de uma tarefa de ordem econômica, mas também social, já que boa parte da população amazônica que hoje não encontra trabalho, porque a borracha não lhes dá renda, não seria tentada a vir para as cidades da região, as quais, essas também, não têm empregos a ofertar.

Há, pois, Srªs e Srs. Senadores, um vasto campo de ação do governo para incentivar um segmento econômica e socialmente importantíssimo para o desenvolvimento amazônico e, conseqüentemente, para o crescimento do Brasil, tão esperado e anunciado pelo atual governo.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 31/10/2003 - Página 34504