Discurso durante a 153ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Posição do Centro-Oeste frente à reforma tributária.

Autor
Delcídio do Amaral (PT - Partido dos Trabalhadores/MS)
Nome completo: Delcídio do Amaral Gomez
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA TRIBUTARIA.:
  • Posição do Centro-Oeste frente à reforma tributária.
Aparteantes
Gerson Camata, Ney Suassuna, Ramez Tebet, Rodolpho Tourinho, Serys Slhessarenko.
Publicação
Publicação no DSF de 01/11/2003 - Página 34647
Assunto
Outros > REFORMA TRIBUTARIA.
Indexação
  • ANALISE, DESIGUALDADE REGIONAL, BRASIL, CONTINUAÇÃO, CONCENTRAÇÃO, INVESTIMENTO, RECURSOS, BANCO NACIONAL DO DESENVOLVIMENTO ECONOMICO E SOCIAL (BNDES), RECURSOS ORÇAMENTARIOS, RENUNCIA, NATUREZA FISCAL, REGIÃO SUDESTE, REGIÃO SUL, APRESENTAÇÃO, DADOS.
  • COMPARAÇÃO, TRANSFERENCIA, RENDA, UNIÃO FEDERAL, PREJUIZO, REGIÃO CENTRO OESTE, CRITICA, PROPOSTA, REFORMA TRIBUTARIA, AUSENCIA, REVERSÃO, SITUAÇÃO, QUESTIONAMENTO, FALTA, SUBSTITUIÇÃO, PROGRAMA, INCENTIVO FISCAL, PREVISÃO, INEFICACIA, FUNDO DE DESENVOLVIMENTO.
  • PREVISÃO, OBSTACULO, ATUAÇÃO, INVESTIMENTO, INICIATIVA PRIVADA, REGIÃO NORTE, REGIÃO NORDESTE, REGIÃO CENTRO OESTE, FALTA, SEGURANÇA, EMPRESARIO, RENOVAÇÃO, CONTRATO, DENUNCIA, AUSENCIA, POLITICA NACIONAL, DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
  • ANALISE, REFORMA TRIBUTARIA, RELAÇÃO, IMPOSTO SOBRE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS (IPI), IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS (ICMS), PERDA, REGIÃO CENTRO OESTE, ARRECADAÇÃO, CESTA DE ALIMENTOS BASICOS.

O SR. DELCÍDIO AMARAL (Bloco/PT - MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Bom dia, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores. Em pronunciamento realizado em agosto último, abordei a questão da reforma tributária em seus aspectos gerais. Hoje, venho a esta tribuna tratar mais especificamente de pontos que interessam à Região Centro-Oeste e, conseqüentemente, ao meu Estado de Mato Grosso do Sul.

Para melhor situar a questão, permitam-me, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, traçar um breve panorama da posição da Região Centro-Oeste no que diz respeito aos investimentos governamentais, transferências da União, financiamentos públicos e benefícios fiscais.

Guimarães Rosa, conhecedor da realidade nacional, disse que “o Brasil são vários”. O grande escritor mineiro não se referia apenas às diferenças culturais, mas, principalmente, à desigualdade das condições sociais e de desenvolvimento econômico entre as regiões brasileiras.

Graças a séculos de canalização dos recursos federais, as Regiões Sul e Sudeste do Brasil alcançaram um bom nível de desenvolvimento econômico e social. Desde o período imperial, o Sul/Sudeste vem concentrando a maior parte dos investimentos públicos. Os volumosos investimentos dotaram a Região de infra-estrutura, que, somados aos incentivos fiscais do passado, criaram as condições necessárias para a atração do capital privado e para o crescimento da produção.

Apesar dos esforços para a minimização das desigualdades regionais, as ações governamentais desenvolvidas mostram-se insuficientes para promover o crescimento das Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, que permanecem bastante distanciadas da realidade econômica do Sul/Sudeste e continuam exportando importante força de trabalho para essas Regiões.

Muitas das políticas públicas da União herdadas pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva contribuem para o agravamento das desigualdades regionais e se mostram ainda mais desfavoráveis para a Região Centro-Oeste.

Com relação aos financiamentos do BNDES, dos R$37,4 bilhões aplicados em 2002, 78% foram direcionados para a Região Sul e Sudeste. E dos R$8,2 bilhões aplicados no restante do País somente R$2,5 bilhões foram destinados à Região Centro-Oeste, o que representa menos de 7% dos investimentos do BNDES no ano passado.

Assim como acontece com os recursos do BNDES, os benefícios tributários federais também são direcionados para o Sul e o Sudeste do Brasil. Dos R$24 bilhões de renúncia tributária prevista para 2003, R$14,7 bilhões, 61,4% ficarão para o Sul/Sudeste.

O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. DELCÍDIO AMARAL (Bloco/PT - MS) - Pois não, Senador Ney Suassuna.

O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - O tema que V. Exª traz a esta Casa é recorrente, mas quanto mais falarmos, melhor será. Por isso a minha saudação a V. Exª, porque essa é uma injustiça que se perpetua. A Constituição reza uma coisa e a realidade é exatamente o inverso. Todos os últimos presidentes disseram que iriam melhorar essa desigualdade, mas a verdade é que a situação se agrava. Em relação ao meu Nordeste, que é tão injustiçado quanto o seu Centro-Oeste, o que arrecadamos não só não recebemos a mais, como ainda contribuímos com o restante do País com R$3 bilhões, quando devíamos estar recebendo um pouco mais para diminuir a desigualdade. Ontem, o Presidente Lula conversou com os moradores de uma cidade chamada Cabaceiras e ficou muito chocado. Em uma cidade com oito, dez mil habitantes há três mil desempregados. E não fosse o Fome Zero, que está minorando um pouco a miséria, estaríamos inteiramente em desespero. Realmente, esse é um tema de longo prazo. Não vamos conseguir mudar do dia para a noite. V. Exª cita o BNDES; não temos o know-how que tem o pessoal do Sul/Sudeste de ir lá fazer o projeto, conhecer o caminho das pedras. Quando entramos, tudo é difícil, temos que vir ao Rio de Janeiro - e só aí já é uma passagem -, e, mesmo com a descentralização, ela não funciona como devia. Enfim, louvo o discurso de V. Exª porque há uma gritante injustiça que assola nossas regiões e que merece a voz de V. Exª e de todos nós. Parabéns.

O SR. DELCÍDIO AMARAL (Bloco/PT - MS) - Obrigado Senador Ney Suassuna.

Ouço o nobre Senador Gerson Camata.

O Sr. Gerson Camata (Sem Partido - ES) - Ilustre Senador Delcídio Amaral, acompanho o pronunciamento de V. Exª. Vejo que vai abordar as perspectivas que, na reforma tributária, poderão provocar as correções que V. Exª cita. Seguindo o caminho e a orientação do Senador Ney Suassuna, peço que sempre que citar os discriminados do Brasil acrescente o Espírito Santo. Estamos na transição entre o Sudeste e o Nordeste, ou seja, não estamos nem no Nordeste e nem no Sudeste. O BNDES desconhece o Espírito Santo. Certa vez, no Governo passado, fui ao Presidente do BNDES e levei um mapa para mostrar que o Espírito Santo era no Brasil, porque, naquela Instituição, a obtenção de qualquer pedido de empréstimo para o Estado era difícil, tanto para a iniciativa privada quanto para as prefeituras. Ainda no Governo anterior - e protestei várias vezes - criou-se no Brasil os Estados centralistas e os Estados periféricos. O Espírito Santo foi escolhido para ser periférico, e sabe o Senador Botelho aqui presente - capixaba de nascimento e o quarto Senador da nossa Bancada, que nosso Estado é o maior produtor de pedras decorativas do Brasil e exporta 70% do mármore e do granito, mas a delegacia do DNPM é no Rio de Janeiro, que não produz uma pedra. A delegacia do Ministério da Educação está em Minas. O número 102 de informação do Espírito Santo fica em Belo Horizonte. Tem-se que explicar ao telefonista do 102 onde fica a cidade, cujo número se está procurando porque ele é de Belo Horizonte e não conhece o Espírito Santo. Vejo agora - e V. Exª, com maestria, vai apontando isto - que não há só Estados centralistas e periféricos, mas regiões centralistas e periféricas. E só temos uma oportunidade para corrigir isso, e V. Exª chegará lá por meio da reforma tributária. Saúdo o pronunciamento de V. Exª. Temos que, de vez em quando ou quase todo dia, gritar por isso aqui. O Presidente Lula, que é nordestino, estava ontem sofrendo com os moradores de uma região assim. Está na hora de se começar a fazer com que todos sejamos centralistas e não alguns periféricos. Dou outro exemplo a V. Exª: o Espírito Santo enfrenta a maior seca da história do Estado. No norte do Estado, de 30 Municípios, 18 estão sendo abastecidos por carros-pipas. Nunca tínhamos visto isso. Não tínhamos nem carro-pipa para minimizar a seca, e o Governo do Estado teve que adaptar carros-pipas. E não houve o socorro de um centavo nem do BNDES nem do Governo Federal. Ninguém olhou para o Espírito Santo apesar dos lancinantes pedidos. Hoje de manhã, recebi a notícia de que, em alguns Municípios, começou a chover. Deus está fazendo o que as autoridades não puderam fazer pelo norte do Estado. Cumprimentos a V. Exª. Acompanho seu pronunciamento.

O SR. DELCÍDIO AMARAL (Bloco/PT - MS) - Muito obrigado, Senador Gerson Camata.

Concedo o aparte ao meu caro Senador Ramez Tebet.

O Sr. Ramez Tebet (PMDB - MS) - Senador Delcídio Amaral, sou testemunha disso porque participo com V. Exª de estudos sobre a reforma tributária e suas conseqüências para a nossa região, o Centro-Oeste. V. Exª tem sido incansável, tem trabalhado bastante. Apresentamos 32 emendas, tentando recompor algo para a Região Centro-Oeste. Mas, Senador Delcídio Amaral, eis que, diante desse trabalho, além de não nos darem, tiram. Dou um exemplo a V. Exª: no Orçamento de 2003, a Bancada alocou recursos para a BR-359, no trecho de Coxim a Alcinópolis, alocou recursos para a BR-158, no trecho de Três Lagoas até Selvíria e também para o contorno ferroviário. Chegou um projeto de lei do Governo agora, na Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização. Apelo ao Senador Gilberto Mestrinho para que recomponha isso. Sabe o que fizeram? Tiraram R$31 milhões dessas três obras e deixaram R$3 milhões para outra obra no nosso Estado, obra que já havia sido contemplada. Aí a situação começa a ficar nebulosa. Vinte e oito milhões foram jogados para outros Estados da Federação. Quer dizer, além de não darem, tiram. Tiram por quê? Porque o Centro-Oeste só tem oito Deputados Federais? Mas, no Senado, não! Aqui, os Estados são representados de forma igualitária. O Governo precisa tomar consciência disso. O Ministro dos Transportes precisa saber que tem que honrar os compromissos que assumiu. Até porque não cobrei compromisso de S. Exª. Em Corumbá, S. Exª afirmou, na presença do Presidente Lula, que daria início à BR-158. Como S. Exª dará início se retira dinheiro? V. Exª está numa posição de defensor do Centro-Oeste, coroando de êxito, naturalmente, o trabalho que V. Exª já vem desenvolvendo e, com certeza, continuará a desenvolver, Senador Delcídio Amaral, porque V. Exª é uma grata revelação nesta Casa.

O SR. DELCÍDIO AMARAL (Bloco/PT - MS) - Obrigado, Senador Ramez Tebet. Não há dúvida nenhuma de que as BR-158 e 359 são projetos prioritários e, evidentemente, merecerão, como V. Exª bem disse, uma atenção especial e absoluta da Bancada Federal do Mato Grosso do Sul, pelo que essas rodovias representam para o desenvolvimento do nosso Estado.

Concedo um aparte à Senadora Serys Slhessarenko.

A Srª Serys Slhessarenko (Bloco/PT - MT) - Senador Delcídio, o Centro-Oeste realmente está sendo castigado. Na reforma tributária, sob sua Liderança, há mais de 30 emendas protocoladas, objetivando salvar aquela região, que, a olhos vistos, tem um potencial gigantesco, mas precisa do mínimo de condições ou, pelo menos, que a nova legislação não nos prejudique. Com relação à BR-158 - como o Senador Ramez Tebet acaba de dizer -, foram retiradas as condições. Havíamos conseguido inseri-la no PPA como estratégica para a região, graças à luta junto ao Ministério dos Transportes. Mas, infelizmente, ao chegar ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, ela foi retirada do PPA, desconsiderada como obra estratégica. Mas ela está voltando, Senador, por meio de uma emenda de nossa autoria. Com certeza, com o apoio de todos os Srs. Senadores, a BR-158 está voltando para o PPA. Aí, já estou pedindo, realmente, o apoio e a força de todos os Srs. Senadores da região Centro-Oeste, pelo menos, aos nossos Estados, os mais diretamente atingidos, para que ela volte para o PPA como obra estratégica do Governo Lula. Esse é mais um informe aos Senadores na busca de uma política de todos os Senadores da região, por excelência, não só dos nossos dois Estados. Muito obrigada.

O SR. DELCÍDIO AMARAL (Bloco/PT - MS) - Obrigado, Senadora Serys Slhessarenko.

Continuo o meu discurso.

Especificamente, no que se refere aos benefícios tributários, se as Regiões Sul, Sudeste ficaram com 61,46%, o restante do País recebeu apenas R$9 bilhões, em contrapartida aos R$14 bilhões das Regiões Sul e Sudeste. Isso porque a Zona Franca de Manaus recebe R$3,5 bilhões; excluída a Zona Franca, o Norte, Nordeste, Centro-Oeste recebem pouco mais de 1/3 dos benefícios tributários concedidos ao Sul, Sudeste.

Se verificarmos apenas a renúncia do IPI e do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica, que realmente importam ao setor produtivo, o Centro-Oeste receberá menos de R$125 milhões, apenas, 1,4% da renúncia total desses dois tributos, estimadas em 2003. O que corresponde, vejam, os Senhores, a somente 8% do benefício do IPI concedido, por exemplo, para a indústria nacional da informática.

Com relação aos investimentos das estatais federais, dos 11,5 bilhões investidos, 2/3 (dois terços) dos recursos são direcionados para o Sul/Sudeste. Dos 4 bilhões que restam para as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, somente 300 milhões, ou seja, 2,5% (dois e meio por cento) são aplicados na região Centro-Oeste.

Nas transferências da União para os Estados e Municípios, mais uma vez o Centro-Oeste é a região mais prejudicada do País. No FPE, por exemplo, todos os Estados do Centro-Oeste juntos recebem 7,18% do total, o que é menos que o repasse de vários Estados da Federação. Na soma das transferências constitucionais, voluntárias e da Lei Kandir, o Centro-Oeste, que há cinco anos recebia mais de 13% do total dessas transferências, hoje recebe menos de 10%.

Nas relações federativas, o Centro-Oeste, apesar de subdesenvolvido e de ter renda per capita menor que a média nacional, transfere mais renda do que recebe; ou seja, o que a União recebe em tributos na região Centro-Oeste somado ao que seus Estados pagam pelo serviço da dívida, representa valor bem maior que o volume de recursos transferidos pela União para a região.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, diante de todas as desigualdades regionais, com forte concentração da renda e da produção no Sul/Sudeste do País, a reforma tributária deveria ser concebida de forma a estimular a interiorização do desenvolvimento. Mas, infelizmente, o texto aprovado na Câmara não reverte o processo de concentração, além de agravar as dificuldades regionais e, de forma ainda mais gravosa, prejudica sensivelmente a região Centro-Oeste.

Tratemos, inicialmente, da questão dos benefícios fiscais. Na ausência de políticas nacionais eficazes para a redução das desigualdades regionais, os Estados do Centro-Oeste utilizaram incentivos e benefícios fiscais como seu principal instrumento indutor do desenvolvimento econômico.

Graças aos benefícios fiscais, a região Centro-Oeste tem conseguido agregar valor à sua matéria- prima e diversificar sua economia, atraindo indústrias não apenas da área de alimentação, mas de beneficiamento do couro, do setor têxtil, de bens duráveis e de tantos outros segmentos da economia.

O Centro-Oeste não é a favor de benefícios fiscais concedidos de forma indiscriminada e autofágica, mas a simples vedação aos programas de incentivos, sem a adoção de instrumentos que substituam a sua finalidade, irá condenar o Centro-Oeste à estagnação econômica.

Na tentativa de equacionar o problema, em 12 de fevereiro, os governadores do Centro-Oeste propuseram, na Carta de Cuiabá, a criação de fundo de um desenvolvimento regional que tivesse recursos suficientes para substituir os incentivos fiscais, como instrumento de desenvolvimento das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste.

A proposta foi parcialmente acolhida pela União, mas o fundo de desenvolvimento previsto na PEC 74, de 2003, além de ter recursos insuficientes e de ter sido descaracterizado pela inclusão de outros Estados, provavelmente, a exemplo do Fundo de Participação dos Estados, destinará pouquíssimos recursos para o Centro-Oeste, principalmente, como disse o Senador Ramez Tebet, pela baixa representatividade numérica da região no Congresso Nacional.

O Sr. Rodolpho Tourinho (PFL - BA) - Senador Delcídio, V. Exª poderia me conceder um aparte?

O SR. DELCÍDIO AMARAL (Bloco/PT - MS) - Pois não, Senador Tourinho.

O Sr. Rodolpho Tourinho (PFL - BA) - Quando V. Exª toca nessa questão de benefícios fiscais, estamos nós, do Nordeste, falando a mesma linguagem do Centro-Oeste. A competição e a concessão de benefícios fiscais já tinham atingido um nível - e vou usar uma palavra que V. Exª empregou - autofágico. Isso ficou muito claro quando todos os Estados assentiram em fazer a simplificação do sistema e a unificação das alíquotas, impedindo novos benefícios fiscais. No entanto, desde o primeiro momento, o que foi acertado com o Presidente da República, não só pelos Governadores do Centro-Oeste, tenho certeza, mas por todos os Governadores interessados no problema, das regiões menos desenvolvidas, é que haveria uma forma de compensar a não possibilidade de concessão de incentivo fiscal, que seria o Fundo de Desenvolvimento Regional, que só pode atender aos anseios da sua região, ou da minha, ou do Norte, se for transferido como capital e não como fundo de financiamento. O FNE, hoje, tem 1,5 bilhão à disposição da iniciativa privada, valor que não é tomado porque esse não é o caminho de se eliminar desigualdade regional. Tenho certeza, Senador Delcídio, de que estamos falando a mesma linguagem. O Centro-Oeste tem uma outra preocupação, e temos conversado a respeito, que consiste na desoneração ou redução de alíquota dos produtos alimentícios e de medicamentos, além de, como proponho em uma emenda, a diminuição dos efeitos que incidem sobre a região, com alíquota reduzida para insumos e matérias-primas. Isso, de certa forma, minora o problema do Centro-Oeste. Mesmo no caso do FDR, é preciso rever a sua forma de alocação, que, tenho absoluta convicção, virá sob a forma de investimento. Aliás, nesse sentido, temos já manifestações como as dos Líderes do PTB, Senador Fernando Bezerra, e do PMDB, Senador Renan Calheiros, mas creio que também aí deve haver um ajuste em relação ao Centro-Oeste. Não pode ser usada simplesmente a fórmula do FPE. Ela deve sofrer um ajuste exatamente para se evitarem ou contrabalançarem esses números que V. Exª cita. Eu chamaria ainda a atenção para mais dois aspectos quanto ao FPM: também é importante que o percentual passe de 22,5% para 25%, porque essa é uma forma de se atenderem os Municípios do Centro-Oeste, e que haja desvinculação da DRU em relação à Cide, porque, senão, ela cairá de 25% para 20%. Enfim, parece-me que estamos todos juntos e assim devemos lutar para que essas coisas sejam obtidas. Caso contrário, será difícil haver uma reforma tributária ou essa proposição tributária que está sendo analisada.

O SR. DELCÍDIO AMARAL (Bloco/PT - MS) - Muito obrigado, Senador Rodolpho Tourinho, sempre parceiro e, como homem da área, sempre nos ajudando muito nesta grande batalha pela reforma tributária, especialmente pelas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste.

Sr. Presidente, gostaria de ressaltar que, sem a possibilidade de se utilizarem políticas fiscais e sem recursos suficientes para o desenvolvimento, não apenas o Centro-Oeste, mas, como disse também o Senador Tourinho, as regiões Norte e Nordeste perdem vantagens comparativas e não poderão mas atrair novos investimentos para os seus territórios.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, esta situação pode ser ainda mais agravada com a emenda apresentada pelo Relator da reforma tributária na CCJ do Senado. De acordo com o seu parecer, são mantidos os incentivos e os benefícios fiscais concedidos entre 1º de maio e 30 de setembro, sujeitando sua reativação à deliberação do Senado. Isto certamente traz insegurança ao investidor, que seguramente recuará em seus projetos e não realizará os investimentos previstos enquanto a situação não estiver definida.

O Sr. Ramez Tebet (PMDB - MS) - Muito bem.

O SR. DELCÍDIO AMARAL (Bloco/PT - MS) - Nem mesmo os benefícios fiscais concedidos antes de 30 de abril estão seguros, Senador Ramez Tebet. Segundo o parecer do Relator, esses benefícios poderão ser denunciados ao Confaz e suspensos por decisão da maioria simples daquele órgão, ficando submetidos à apreciação do Senado.

O Sr. Rodolpho Tourinho (PFL - BA) - Nobre Senador, permite V. Exª mais um aparte?

O SR. DELCÍDIO AMARAL (Bloco/PT - MS) - Pois não, Senador.

O Sr. Rodolpho Tourinho (PFL - BA) - Gostaria de fazer um esclarecimento, muito importante, em relação a este ponto, que já foi retirado ou será. No dia em que percebi isso, denunciei, da tribuna, que em hipótese alguma o Estado pode duvidar de um incentivo fiscal que tivesse sido dado a outro Estado dez anos antes. Isso é uma loucura, já foi retirado. Quero apenas esclarecer que, pelo menos neste ponto, já não existe o problema.

O SR. DELCÍDIO AMARAL (Bloco/PT - MS) - Assim espero, Senador Tourinho. Nós, da Bancada do Centro-Oeste, estaremos reunidos com o Relator, Senador Romero Jucá, terça-feira, para discutir este e outros assuntos.

Sr. Presidente, o Senador Ramez Tebet gostaria de fazer uma aparte.

O SR. PRESIDENTE (Eduardo Siqueira Campos) - Senador Ramez Tebet, o tempo do orador já está esgotado em mais de quatro minutos. Os outros oradores sinalizam, e V. Exª é um dos próximos oradores inscritos.

O SR. RAMEZ TEBET (PMDB - MS) - Eu gostaria de falar porque o discurso do Senador Delcídio está brilhante, em defesa de uma região, Sr. Presidente. Serei rápido.

O SR. PRESIDENTE (Eduardo Siqueira Campos) - V. Exª tem razão.

O Sr. Ramez Tebet (PMDB - MS) - Senador Delcídio Amaral, o que V. Exª diz é importantíssimo. Discordo do Senador Tourinho. Não foi retirado, está prometido retirar. Se não agirmos, ficará lá. Não podemos engolir isso.

O SR. DELCÍDIO AMARAL (Bloco/PT - MS) - Com certeza, Senador Ramez Tebet e Senador Rodolpho Tourinho.

Sr. Presidente, V. Exª me concede mais um tempo para terminar? Eu gostaria apenas de externar alguns conceitos importantes para a minha região.

O SR. PRESIDENTE (Eduardo Siqueira Campos) - A Presidência concede um minuto para que V. Exª conclua, Senador Delcídio Amaral.

O SR. DELCÍDIO AMARAL (Bloco/PT - MS) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores. A quem interessa o fim dos incentivos e benefícios fiscais? Certamente, só interessa aos Estados que já concederam muitos incentivos, industrializaram-se e não se preocupam com o crescimento econômico dos Estados menos desenvolvidos.

O simples fim das políticas estaduais de desenvolvimento sustentadas nos incentivos fiscais, sem que sejam substituídas por uma política nacional eficiente para promover o desenvolvimento regional, certamente agravará as profundas desigualdades já existentes.

Com relação a máquinas e implementos agrícolas, a proposta aprovada na Câmara prevê redução de impacto do IPI nas aquisições de bens de capital “pelo contribuinte do IPI”. Essa proposta tende a beneficiar a atividade industrial. O produtor rural é preterido, pois, nas aquisições de máquinas, equipamentos agrícolas e mesmo no caminhão para transportar a sua produção, não poderá gozar da redução do IPI que será concedida ao industrial que adquirir uma máquina, um equipamento industrial ou um caminhão.

É mais uma proposta que prejudica a região Centro-Oeste e desestimula a produção. O que o Brasil precisa é desonerar todos os bens de capital tanto do IPI quanto do ICMS. Formas de crédito do imposto não resolvem. O crédito pode nunca ser recuperado e virar custo. É preciso desonerar o investimento e tributar o consumo. Isso, sim, pode ajudar o desenvolvimento da Nação.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, outro ponto de extrema preocupação para o Centro-Oeste é a garantia do equilíbrio fiscal. A região recebe poucos recursos federais e depende essencialmente da arrecadação do ICMS.

O principal prejuízo para o Centro-Oeste está relacionado à redução da carga tributária sobre gêneros alimentícios de primeira necessidade. A medida, apesar de justa, impõe aos Estados produtores o ônus da redução de receita.

Atualmente, todos os Estados adotam redução interna de ICMS para produtos da cesta básica, mas, nas operações interestaduais, a tributação é normal. Assim, cada Estado arca com o ônus da redução do imposto para seu consumo interno. Com a proposta de reforma tributária, o tributo da cesta básica será reduzido já na saída interestadual, o que faz com que o Estado produtor arque com a redução do imposto para os consumidores do Estado destinatário.

Para o Centro-Oeste, que é o grande produtor de alimentos, essa redução de imposto é extremamente significativa. O setor agrícola tem na região Centro-Oeste a representatividade que a indústria tem para São Paulo, por exemplo. Para os Estados do Centro-Oeste, não há como cortar essa receita sem a devida compensação financeira, sob pena de inviabilizar as administrações estaduais.

A situação do Centro-Oeste pode ainda se tornar mais grave caso seja aprovada a proposta de reforma tributária, ora em tramitação na CCJ, que incluiu, na menor alíquota, as matérias-primas necessárias à produção dos alimentos da cesta-básica. Assim, o Centro-Oeste, que já perderia receita nas saídas de óleo de soja, carnes, fubá, farinha de trigo, açúcar e outros alimentícios, passará a perder receita nas saídas de soja em grão, gado, milho, trigo e tantos outros produtos que possam, ainda que em parte, ser utilizados como matéria-prima para alimentos da cesta-básica.

No caso da carne, por exemplo, não obstante somente a carne de segunda ser incluída na cesta-básica, sua matéria-prima é o boi e a redução do tributo incidirá sobre o couro, sobre a carne de primeira e sobre todos os subprodutos não comestíveis. O mesmo acontece com a soja, que é matéria-prima para o óleo de soja, mas também é matéria-prima para cosméticos, lecitina, biodiesel e tantos outros produtos que não estarão na cesta-básica. Na saída do produtor não será possível separar o que será cesta básica e o que não será. Assim, toda a soja será tributada pela menor alíquota.

A receita desse segmento para os Estados do Centro-Oeste representa cerca de 30% de sua arrecadação. Uma expressiva redução dessa receita pode inviabilizar totalmente as administrações estaduais.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Centro-Oeste, que já foi extremamente injustiçado na edição da Lei Complementar nº 62, de 1989, que definiu os índices de distribuição do FPE, pode mais uma vez ser castigado na partilha das novas transferências de recursos da União para os Estados.

Com a intenção de beneficiar os Estados mais industrializados, a inclusão dos créditos nas aquisições de bens de capital nos critérios que definirão o rateio do fundo de exportação prejudica não apenas os Estados do Centro-Oeste, mas todos os Estados exportadores de produtos primários e semi-elaborados.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. DELCÍDIO AMARAL (Bloco/PT - MS) - Sr. Presidente, vou concluir.

O fundo de exportação deve ressarcir apenas as perdas de receita decorrentes das exportações de produtos primários e semi-elaborados, pois os industrializados já têm o repasse do IPI-Exportação. Mas, se considerados os créditos das aquisições de bens de capital, o ressarcimento deve alcançar apenas os créditos decorrentes das aquisições interestaduais, já que nas operações internas o imposto foi pago ao Estado e não se pode falar em ressarcimento.

Com relação à CIDE, os Estados que inicialmente receberiam 25% a receita estão ficando com apenas 15%, já que a DRU fica com uma parte dos recursos, e a outra parte será destinada aos municípios. Estes, em razão da insignificância do repasse, nem terão como aplicar os recursos em infra-estrutura de transporte.

Quanto aos critérios de rateio, ainda que não constem da PEC 74/03, o acordo firmado entre alguns Estados prejudica o Centro-Oeste, toda a região Norte e boa parte do Nordeste.

Estão sendo propostos critérios de rateio que não guardam relação com a finalidade do repasse da CIDE, como população, consumo de gás de cozinha (GLP), consumo de querosene de aviação (QAV) e até mesmo consumo de gasolina. Seriam incluídas rodovias mantidas pela cobrança de pedágio e excluídas as rodovias não pavimentadas. Esses critérios só interessam aos Estados mais ricos e prejudicam os que mais precisam de recursos para investimento em infra-estrutura de transporte.

O SR. PRESIDENTE (Eduardo Siqueira Campos) - Senador Delcídio, a Mesa pode dar o discurso de V. Exª como lido, se assim o desejar.

O SR. DELCÍDIO AMARAL (Bloco/PT - MS) - Sr. Presidente, restam apenas mais duas frases para concluir, agora definitivamente.

Tudo isso, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é razão suficiente para que nós, nesta Casa, façamos profundas reflexões sobre a reforma tributária, considerando sobretudo seus impactos sobre as combalidas economias das regiões menos favorecidas deste Brasil.

E o Senado, como Casa que representa igualitariamente os Estados da Federação, não se omitirá em restabelecer a isonomia econômica e social das várias regiões do País, promovendo o desenvolvimento e o crescimento de um Brasil mais justo,solidário e fraterno.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/11/2003 - Página 34647