Discurso durante a 153ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas às declarações do Presidente Lula a respeito de ex-Presidentes da República. Percepção quanto ao primeiro ano de mandato do Governo Federal.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO. ELEIÇÕES.:
  • Críticas às declarações do Presidente Lula a respeito de ex-Presidentes da República. Percepção quanto ao primeiro ano de mandato do Governo Federal.
Aparteantes
Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 01/11/2003 - Página 34690
Assunto
Outros > PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO. ELEIÇÕES.
Indexação
  • CRITICA, DECLARAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ACUSAÇÃO, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, DENUNCIA, DESRESPEITO, AUTORITARISMO, FALTA, RESPONSABILIDADE, COBRANÇA, ESCLARECIMENTOS.
  • ANALISE, FRUSTRAÇÃO, OPINIÃO PUBLICA, DESCUMPRIMENTO, PROMESSA, DESENVOLVIMENTO NACIONAL, CRISE, DESEMPREGO, REDUÇÃO, PODER AQUISITIVO, CONFLITO, CAMPO, FALTA, ETICA, ADMINISTRAÇÃO PUBLICA, FAVORECIMENTO, INTERESSE, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), AUTORITARISMO, IMPOSIÇÃO, REFORMA TRIBUTARIA, REFORMULAÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL, INCOMPETENCIA, EXECUÇÃO ORÇAMENTARIA.
  • NECESSIDADE, INVESTIGAÇÃO, DENUNCIA, ESPIONAGEM, CAMPANHA ELEITORAL, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT).

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, decepção é a palavra de ordem. Não pretendo buscar o dicionário para enumerar definições em torno da palavra decepção. Mas busquei o dicionário para enumerar alguns sinônimos ou acepções da palavra covarde, já que foi, sem dúvida, a última grande tirada do Presidente da República.

Covarde: sem coragem, tímido, medroso, poltrão, fraco de ânimo, pusilâmine, desleal, traiçoeiro.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, no mínimo, o que se deve exigir do Presidente da República neste momento é que nomine os ex-Presidentes que, de forma desrespeitosa, define como covardes e nocivos aos interesses de progresso do País. Segundo Sua Excelência, a covardia dos ex-Presidentes é responsável pela situação econômica e social debilitada do nosso País.

Vejo na fala do Presidente da República e no improviso, combinado com a irreverência e, quem sabe, até a irresponsabilidade, um viés autoritário inegável. Aliás, em muitos momentos do atual Governo, o viés autoritário desponta de forma surpreendente; diria até mesmo que se revelou já no período da campanha eleitoral. Agora, o País sabe da existência de uma rede de espionagem, do esquadrão petista, que, na campanha eleitoral, procurava investigar os adversários de Lula. Eu os denominaria “arapongas da estrela vermelha”, revelando resquícios de um reacionarismo imperdoável. Foi o começo, quem sabe, desse espetáculo de afronta a que o País está se acostumando a assistir.

O viés autoritário revelou-se quando o Presidente da República, no exterior, destacou: “O ano de 2003 passará para a História do Brasil como o ano em que mudamos o País”. E nós, daqui, ficamos a imaginar quais as mudanças alcançadas pelo Governo no ano de 2003.

O que realmente mudou foi a postura do PT como partido político; o que realmente mudou foi o PT, mas não mudou para melhor, mudou para a decepção, para a frustração, para o arrependimento de muitos que nele acreditaram, votaram e elegeram.

Na verdade, o que se verificou no ano de 2003 foi a perda de competitividade do nosso País na área econômica; o que se verificou foi o aprofundamento da crise social, com a produção de mais de um milhão de desempregados em 2003, na contramão da promessa de campanha de que o Governo seria responsável pela geração de 10 milhões de empregos durante os quatro anos de mandato.

Essa meta já se afigura como inatingível, comprometendo, desde já, um compromisso assumido na campanha eleitoral, porque o que se sinalizou no primeiro ano de mandato foi exatamente o oposto: o aumento avassalador do desemprego que, na grande São Paulo, chega hoje a 20%. São índices recordes, lamentavelmente, índices imbatíveis na nossa história de desemprego no País.

A perda do poder aquisitivo com a redução do poder de compra do assalariado, que o leva a consumir menos, com uma redução de compra dos produtos da cesta básica identificada nas pesquisas dos supermercados do País.

No campo, a desordem se institucionalizou. A violência, de forma avassaladora, cresceu, fazendo vítimas, manchando de sangue as primeiras páginas da história do Governo que se dizia mudancista, modernizador.

Não é essa mudança que o País esperava e espera; não é essa modernidade que todos nós almejamos, para que, num País de riquezas naturais extraordinárias, o povo possa sonhar com dias melhores.

O viés autoritário do atual Governo destaco em outro pronunciamento infeliz do Presidente da República, quando, do alto do pedestal de mandatário maior da Nação afirmou: “Vamos ensinar o Brasil a se organizar, a se comportar, a se posicionar”. Não falava mais o Presidente da República. Falava o mestre, falava alguém que se coloca no pedestal de mestre, mesmo que o destino lhe tenha negado a oportunidade de freqüentar os bancos universitários. E, aliás, essa é a faceta de sua personalidade que nos impunha maior respeito: o fato de não ter tido oportunidade de buscar o aprendizado nas escolas, nas universidades, não ser impeditivo para que galgasse os degraus da popularidade e alcançasse a Presidência da República, sonho maior de qualquer liderança política do País.

Isso, mais do que nunca, lhe tira o direito de se posicionar como quem pode impor lições ao sofrido povo brasileiro. Não se ensina um país governando como se governa hoje, com esse apego à mordomia, com esse incomensurável desejo pelo turismo fácil, puxando para baixo a qualidade da composição dos quadros do Governo, em favor do protecionismo dos apaniguados que militaram, ao longo do tempo, nas hostes do PT. Não cabe aqui repeti-las, tantas foram as denúncias em relação à composição dos atuais quadros do Governo, em prejuízo da eficiência técnica e da qualidade administrativa, para o favorecimento de interesses de natureza partidária ou político-eleitoral.

Cabe, sim, destacar o viés autoritário, na postura governamental, de impor o rolo compressor para fazer valer a sua vontade e aprovar reformas que não reformam o País, pelo menos não para o avanço, a modernização e o bem. Trata-se de reformas, lamentavelmente, deterioradoras das expectativas populares em relação a um futuro melhor, como a reforma da Previdência, que, sem dúvida, agride de forma frontal direitos adquiridos e é devastadora em relação aos sonhos e às esperanças de milhares de idosos no nosso País. A reforma tributária, que fica longe de ser um instrumento capaz de promover desenvolvimento, distribuindo renda, gerando emprego e promovendo justiça social, tem por objetivo aumentar recursos dos cofres do Governo, para que este, depois, não tenha a competência de aplicá-los, como já demonstrou. Neste ano, o Governo não investiu sequer 1,5% dos recursos provisionados no Orçamento. Assim, o País não cresce devido à ineficiência governamental, já que investimentos públicos são fundamentais para estimular o crescimento econômico.

O esquadrão petista, os arapongas da estrela vermelha precisam, sim, ser investigados pelo Congresso Nacional. Por isso, hoje fez bem o Senador Antero Paes de Barros ao apresentar requerimento pretendendo explicações a respeito do comportamento daqueles que venceram as eleições mas não podem afirmar que o fizeram ao lado da ética, pela ética e para a ética.

A Nação merece explicações sobre a existência dessa rede de espionagem, que compromete, definitivamente, a história do PT como Partido político. Ou o Governo e o PT esclarecem, de forma cabal e respondível, essa questão, ou estará definitivamente comprometido. Terá perdido, de forma absoluta, a credibilidade, porque não há como se acreditar num Partido que se lança de expedientes reacionários, os mais condenáveis na época da ditadura, para alcançar os seus objetivos de vitória.

Antes de prosseguir, concedo, com satisfação, um aparte ao Senador Mão Santa.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Alvaro Dias, V. Exª relembrou todos os sinônimos da palavra covarde e acho que consultou o dicionário de Buarque de Holanda. Com relação a esse infeliz momento presente, em que o Presidente Lula chamou os ex-Presidentes de covardes, a História nos traz um ensinamento. Júlio César, o romano, depois do alea jacta est, atravessou o Rubicão e provocou uma euforia natural em Roma. Antes dele, no Triunvirato, Roma era administrada por Pompeu. Naquele momento, o povo destruiu as estátuas e obras de Pompeu, mas Júlio César mandou reconstruir todas elas. Com esse gesto, demonstrou respeito por aqueles que o antecederam e entrou para a História. O Presidente Lula, que ajudamos a eleger, deve ter a sua missão histórica, pois somente Cristo era homem e Deus. Todos os dirigentes do País tiveram uma missão: Pedro I foi o Imperador da Independência; Pedro II, o da unidade; Deodoro e o Marechal Floriano, fizeram a República, “o governo do povo pelo povo”; Vargas, as leis trabalhistas e a previdência, enfrentando três guerras, uma para entrar, outra contra os paulistas e a Guerra Mundial; Juscelino Kubitschek teve o otimismo, promoveu o desenvolvimento, construiu Brasília e defendeu os “cinqüenta anos em cinco”; Jânio Quadros deu o grande ensinamento de que ninguém pode governar tomando “umas”; João Goulart foi o pacifista e evitou duas guerras civis, uma na entrada e outra na saída; o regime militar disse que combateu os comunistas; o Presidente Sarney fez a consolidação democrática; Collor, a globalização, e Fernando Henrique e Itamar Franco controlaram a inflação. Então, Lula tem que ver essa sua limitação. A sua missão é combater a maior doença, que é o desemprego. Somos o País que está para ganhar a medalha de ouro mundial em desemprego. Com emprego, trabalho, combate-se a fome e têm-se habitação, saúde, educação e felicidade.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Muito obrigado, Senador Mão Santa, que sempre se vale dos ensinamentos que a História nos oferece e me faz lembrar uma outra passagem bíblica e histórica, que cabe neste momento em que o Presidente Lula revela um apego incrível ao passado.

Ao invés de olhar para a frente e de ver o futuro deste País descortinando-se, como algo a se buscar para melhor, o Presidente prefere olhar para trás. Constantemente faz referência a ex-Presidentes. Procura, quem sabe até, o pretexto para o insucesso de seu primeiro ano de gestão, já que não há resultados concretos, nesta fase de seu Governo, que possam ser apresentados como frutos do trabalho de uma equipe eficiente e competente.

Não olha para a frente, olha para trás. Fala em herança maldita constantemente, como se não soubéssemos da nossa História. É claro que há uma herança desde a Colonização. Nós, evidentemente, não podemos responsabilizar, isoladamente, esse ou aquele Presidente. Devemos, sim, responsabilizar a nossa História, mas não cabe a quem governa fazer oposição ao passado. Cabe a quem governa construir o futuro.

É bom lembrar, como gosta de fazer o Senador Mão Santa, o episódio bíblico que relata a destruição de Sodoma e Gomorra: um anjo, em nome de Deus, pediu para que os justos deixassem as cidades sem olhar para trás, porque corriam o risco de se transformar em estátua de sal. A mulher de Lot teimou e olhou para trás, transformando-se em estátua de sal.

O Presidente Lula não pode se transformar em mulher de Lot, não pode continuar olhando para trás, já que corre o risco de se transformar numa estátua de decepção e frustração nacional. Sua Excelência deve olhar para a frente e construir o futuro deste País, o que deve ser feito com compreensão, determinação e humildade. Constrói-se o futuro do País com muito trabalho e galvanização das forças sociais em torno de um projeto comum.

É necessário que o Presidente apresente os projetos do seu Governo com maior clareza. É preciso que diga o que pretende realmente o Governo, porque o que se vê até aqui é um Governo sem planos e sem objetivos definidos.

Nós não podemos navegar na nau da insensatez, no mar revolto das incompreensões, na esperança de que dessa forma se possa chegar à terra firme na construção de um futuro melhor para o nosso País.

Presidente Lula, olhe para a frente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/11/2003 - Página 34690