Pronunciamento de Patrícia Saboya em 04/11/2003
Discurso durante a 155ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Homenagem de pesar pelo falecimento da professora, jornalista, romancista, cronista, teatróloga e acadêmica Rachel de Queiroz.
- Autor
- Patrícia Saboya (PPS - CIDADANIA/CE)
- Nome completo: Patrícia Lúcia Saboya Ferreira Gomes
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
HOMENAGEM.:
- Homenagem de pesar pelo falecimento da professora, jornalista, romancista, cronista, teatróloga e acadêmica Rachel de Queiroz.
- Publicação
- Publicação no DSF de 05/11/2003 - Página 34868
- Assunto
- Outros > HOMENAGEM.
- Indexação
-
- HOMENAGEM POSTUMA, RACHEL DE QUEIROZ, ESCRITOR, MUNICIPIO, QUIXADA (CE), ESTADO DO CEARA (CE), PERSONAGEM ILUSTRE, LITERATURA BRASILEIRA, REPRESENTAÇÃO, MULHER, ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS (ABL), IMPORTANCIA, OBRA LITERARIA, DESCRIÇÃO, SITUAÇÃO, VIDA HUMANA, REGIÃO NORDESTE.
A SRª PATRÍCIA SABOYA GOMES (PPS - CE. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é com profundo pesar que venho a esta tribuna lamentar o falecimento, na manhã de hoje, de uma das filhas mais diletas do Ceará e do Brasil: a escritora, a professora, a jornalista, a amiga, a inesquecível Rachel de Queiroz.
Rachel faria 93 anos no próximo dia 17. Apesar da idade, ela impressionava pela lucidez das observações, pela clareza com que discorria sobre os assuntos mais atuais, pela jovialidade no trato com os muitos amigos e inúmeros admiradores.
Na verdade, Rachel nunca perdeu o jeito de menina, aquela mesma menina que publicou, na flor dos 20 anos, um dos clássicos de nossa literatura: o romance O Quinze, cuja primeira tiragem foi patrocinada pela própria Rachel, com dois contos de réis que seus pais lhe emprestaram. Poucos artistas conseguiram representar com tanta sensibilidade o flagelo da miséria e da seca nordestinas.
Vencedora de vários prêmios literários, traduzida para outras línguas, a obra de Rachel de Queiroz fala do Brasil, sim, mas sem nunca perder de vista o universal, o atemporal, o eterno no ser humano. É por essa razão que suas obras resistem tão bem ao avanço do tempo. Além de O Quinze, obras como João Miguel, Caminho de Pedras, As Três Marias, Dora Doralina e Memorial de Maria Moura estão indelevelmente marcadas no imaginário nacional.
Rachel viveu a literatura em todas as suas dimensões. Os romances são apenas um dos aspectos de sua vastíssima obra. Crônicas, por exemplo, escreveu mais de duas mil. Aventurou-se pelo teatro e pela literatura infantil, escreveu para a televisão e traduziu, ao longo da vida, mais de quarenta obras para a língua portuguesa.
A suprema consagração ocorreu com sua eleição para a Cadeira nº 5 da Academia Brasileira de Letras, no dia 4 de agosto de 1977. Foi a primeira mulher a entrar para a ABL, abrindo o caminho para as demais Imortais que hoje compõem a instituição.
Aliás, a precocidade e o pioneirismo são características que sempre acompanharam Rachel de Queiroz. Em Fortaleza, fez o curso normal e diplomou-se em 1925, com apenas quinze anos de idade. Aos vinte, como sabemos, escreveu um dos clássicos da literatura brasileira, e o fez com tanta intensidade e com tanta densidade que muitos não acreditaram que aquela fosse obra de uma moça recém-saída da adolescência.
Rachel de Queiroz adiantou-se ao seu tempo e aos seus costumes não só na literatura, mas também na vida pessoal. Quando se iniciou no jornalismo, há mais de sessenta anos, a atividade era território eminentemente masculino. Também desbravou território selvagem ao militar em um partido clandestino quando poucos tinham a coragem de fazê-lo. Por fim, encarou de frente uma muralha de preconceitos ao separar-se do marido ainda na década de 1930.
Rachel de Queiroz era isso: uma mulher corajosa e ousada, uma pioneira em mais de um campo, sem nunca, contudo, perder a alegria de viver e o otimismo que tão bem a caracterizavam. Quando trazemos à mente imagens de Rachel, sempre nos aparece uma mulher risonha, de bem com a vida, com as decisões que tomou e com as trilhas que percorreu.
O Brasil perde, assim, uma de suas maiores artistas. O Ceará perde uma de suas filhas mais ilustres. E eu dou adeus a uma grande amiga, que iluminou e enriqueceu a minha existência e a de todas as pessoas que tiveram a sorte de conviver com essa grande mulher.
Adeus, Rachel. Você jamais será esquecida.