Discurso durante a 155ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Análise do programa de fome zero do governo Lula.

Autor
Lúcia Vânia (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/GO)
Nome completo: Lúcia Vânia Abrão
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Análise do programa de fome zero do governo Lula.
Publicação
Publicação no DSF de 05/11/2003 - Página 35265
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • QUESTIONAMENTO, GOVERNO FEDERAL, EXCESSO, IMPORTANCIA, PRIORIDADE, FOME, PROGRAMA ASSISTENCIAL, AUSENCIA, POLITICA SOCIAL, COMBATE, ORIGEM, PROBLEMA, MOTIVO, INTERESSE, EXECUTIVO, PROPAGANDA, DIVULGAÇÃO, MEIOS DE COMUNICAÇÃO, OPINIÃO PUBLICA, OBTENÇÃO, VANTAGENS, NATUREZA POLITICA.
  • ANUNCIO, INSTALAÇÃO, SENADO, SUBCOMISSÃO, FISCALIZAÇÃO, PROGRAMA, GOVERNO FEDERAL, COMBATE, FOME, ENCAMINHAMENTO, REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO EXTRAORDINARIO DE SEGURANÇA ALIMENTAR E COMBATE A FOME, QUESTIONAMENTO, APLICAÇÃO, RECURSOS FINANCEIROS, GESTÃO, FUNCIONAMENTO, DIVERSIDADE, PROGRAMA ASSISTENCIAL, ADMINISTRAÇÃO FEDERAL, POSTERIORIDADE, UNIFICAÇÃO.
  • COMENTARIO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, CORREIO BRAZILIENSE, DISTRITO FEDERAL (DF), AUSENCIA, INVESTIMENTO, GOVERNO FEDERAL, INFRAESTRUTURA.

A SRª LÚCIA VÂNIA (PSDB - GO. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a necessidade de políticas públicas voltadas para o combate à miséria e à pobreza vem se mostrando cada vez mais imprescindível e inadiável para os países em desenvolvimento. Entre essas, as políticas de complementação de renda surgem como significativo instrumento de ação de efeitos imediatos, muito embora apresentem o risco de não atingir as causas mais profundas da pobreza, como as relacionadas à educação básica, à qualificação profissional e à criação de empregos.

Em nosso Brasil, verifica-se um processo de amadurecimento da esfera pública, intensificado há alguns anos, no que se refere a tais políticas. A instituição do programa Bolsa-Escola e as ações do Projeto Alvorada, de iniciativa do Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso, destacam-se como medidas de amplo alcance e interesse, tendo-se tornado referências importantes para quem se dedique a pensar sobre o assunto.

Srªs e Srs. Senadores, a implementação do Programa Fome Zero, solenemente anunciada pelo Presidente Luís Inácio Lula da Silva logo após sua vitória no pleito de um ano atrás, inaugura, incontestavelmente, uma nova fase das políticas de combate à pobreza.

Ressaltemos, antes de tudo, a importância que o novo Governo buscava e busca conceder a uma tal iniciativa, transformando-a em carro-chefe das suas políticas de ação social. Outro ponto a ser valorizado é a procura de uma ampla comunicação com a sociedade, que a leve a se engajar efetivamente no programa.

Desde o início, entretanto, diversas propostas do programa suscitaram dúvidas quanto à sua validade; e a própria concepção geral do Fome Zero foi motivo de questionamentos. 

Façamos, aqui, uma rápida exposição dessas dúvidas e questionamentos - ao menos dos que nos parecem mais importantes. Em primeiro lugar, teria sido correto situar na fome o foco de um tão amplo programa de ação social? É evidente que queremos todos extirpar esse problema terrível de nosso País, mas a melhor maneira de fazê-lo não seria, efetivamente, combater as causas estruturais da pobreza e da miséria? Essa definição de foco, aparentemente tão bem intencionada, levou a tentativas de inflacionar o número de famintos no Brasil, quando é notório que esse número, em termos de percentuais da população, vem caindo bastante nas últimas décadas. É mais amplo, sem dúvida, o problema da desnutrição, bem como de outros males causados diretamente pela pobreza, tal como o baixo nível de escolarização de nossa população.

A eleição da fome como o foco do principal programa de ação social do novo governo trazia embutida a tendência a um enfoque assistencialista. O cartão-alimentação, por sua vez, foi tratado como a principal ação do programa social mais importante. Durante muito tempo, recordam-se com certeza os ilustres Senadores e Senadoras, cogitou-se até da absurda exigência de comprovação de que o dinheiro distribuído tivesse sido gasto, de fato, com alimentos.

Por mais que um programa de complementação de renda aos mais pobres seja relevante e bem-vindo, uma política de ação social de governo não poderia tê-lo como centro, sob risco de que nossos concidadãos, com inegável disposição de trabalhar e de receber uma remuneração digna, tivessem que se conformar com a condição de eternos clientes do assistencialismo. O Governo Lula foi tomando, pouco a pouco, consciência desses problemas. Abriu mão da idéia de cobrar comprovantes fornecidos por supermercados, mercados e bodegas autorizadas. A importância do cartão-alimentação minguou entre as ações reais ou virtuais propostas pelo Programa Fome Zero, como veremos mais adiante.

Mas outra crítica muito importante, Sr. Presidente, por vezes manifestada até em setores do Governo, é que a continuidade e a ampliação dos programas já existentes poderia ser muito mais simples e eficaz no combate aos problemas da nossa população pobre, embora de efeitos menos espetaculares junto aos meios de comunicação. E esta questão dá ensejo, afinal, a mais uma séria crítica: não esteve a motivação da propaganda política presente em cada minuto da concepção do Programa Fome Zero?

Pois bem, como desconsiderar a concepção e a prática do Projeto Alvorada, que tinha como objetivo "combater a pobreza e as desigualdades sociais no país", e buscava priorizar ações geradoras de emprego e renda? Por que não dar continuidade a esse programa e ao Bolsa-Escola, que já se espraiava por tantos Municípios de norte a sul do País? Por que não ampliá-los e aperfeiçoá-los, aumentando, por exemplo, o valor da bolsa-escola?

Essas questões permanecem sem resposta satisfatória. Mas como devemos defrontar-nos, de qualquer modo, com a realidade presente, e não com outra qualquer, é justo e necessário que questionemos a concepção do Fome Zero, avaliemos a pertinência dos seus meios em relação ao fins propostos e fiscalizemos a sua prática. E que busquemos, também, propor medidas para o seu aprimoramento.

Com tais intenções, Sr. Presidente, foi instalada, nesta Casa Legislativa, a Subcomissão Fome Zero. No âmbito dessa subcomissão, julguei por bem apresentar requerimentos de informações ao Ministro Extraordinário de Segurança Alimentar e Combate à Fome (Mesa), conforme previsto no § 2º do art. 50 da Constituição Federal. Qual o teor desses requerimentos e o que os justifica?

Requeiro, em um deles, informações sobre o orçamento disponível para o Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza no corrente ano, bem como sobre o percentual do orçamento já executado; pergunto, ainda, em quais ações estão sendo aplicados esse recursos, que resultados foram assim obtidos e quais os mecanismos de avaliação utilizados para identificar esses resultados.

Cabe lembrar que o Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza é constituído por recursos federais e doações feitas por pessoas físicas ou jurídicas na conta do Programa Fome Zero. O Tribunal de Contas da União constatou que o ritmo de execução do orçamento do programa ameaça comprometer a consecução de seus objetivos neste primeiro ano. Ademais, a aplicação dos recursos nas diversas ações previstas, de modo a trazer resultados efetivos, constitui ponto delicado, que deve ser permanentemente avaliado - embora o próprio TCU afirme não ter identificado os indicadores que permitam avaliar a efetividade das ações que recebem recursos do Fundo. 

Uma questão que merece exame atento e julgamento imparcial é a transferência, há pouco ocorrida, de diversas ações desenvolvidas por 15 diferentes ministérios para a esfera do Programa Fome Zero. Referi-me, há algum tempo, a um início de autocrítica por parte do Governo Federal, reavaliando algumas de suas idéias iniciais em relação ao Fome Zero.

Uma sábia mudança de rumo foi, sem dúvida, a de promover a unificação dos programas sociais do governo, para a qual uma ferramenta imprescindível é o cadastro único de todos os seus beneficiários. Essa medida representa o reconhecimento da importância de outros programas que já vinham sendo desenvolvidos, com destaque para o Bolsa-Escola. O Cartão-Alimentação passa a ser reconhecido como mais um programa de complementação de renda, não como a panacéia universal. O único reparo que gostaria de formular, Sr. Presidente, é que esse trabalho de cadastramento já vinha sendo feito no Governo anterior, tendo alcançado 70% do universo total, e foi injustificadamente retardado na atual gestão do Poder Executivo.

Já a outra referida decisão, de abrigar sob a "grife Fome Zero" ações sociais desenvolvidas por outros ministérios, é das mais questionáveis. Entre essas, encontram-se ações que guardam pouquíssima relação direta com o combate à fome, como o Brasil Alfabetizado, do Ministério da Educação, ou o Saúde da Família, do Ministério da Saúde, para nos restringirmos a dois exemplos. Haverá, de fato, algum ganho na classificação desses programas no âmbito do Fome Zero, ou será apenas mais uma espécie de malabarismo administrativo e contábil de efeitos políticos?

Por tais razões, requeri as seguintes informações ao Ministro Extraordinário José Graziano da Silva: Houve, em 2003, aporte superior de recursos para as ações e programas desenvolvidos por outros ministérios, mas englobados no orçamento do Programa Fome Zero? Foi editado algum ato normativo conjunto, ou celebrado algum convênio ou similar instrumento, entre o Mesa e o órgão executor de cada um dos programas?

Solicitei, ainda, informações sobre que Municípios e grupos populacionais foram por eles beneficiados e quais os critérios de seleção.

Por último, Sr. Presidente, requeiro a relação dos Estados e Municípios com Conselhos de Segurança Alimentar instalados, considerados como instrumentos fundamentais para a consecução das ações do Fome Zero. Essa relação mostra-se, portanto, relevante para os trabalhos de fiscalização a serem desenvolvidos pela Subcomissão Fome Zero do Senado Federal.

Não há como negar, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a importância de que o Governo brasileiro olhe de frente para a realidade de seu povo - para sua situação de penúria e para as imensas dificuldades com que se depara, no seu dia-a-dia, para obter uma existência digna.

Julgo, em princípio, digna de louvor toda ação que se volta para o combate à fome, para a erradicação da miséria e para a promoção social dos pobres. Mas temos a obrigação de buscar as formas mais apropriadas de fazê-lo, que tragam mais e melhores resultados efetivos, que utilizem do modo mais proveitoso os recursos públicos e os recursos doados pela sociedade civil.

Não podemos aceitar, por outro lado, o uso inescrupuloso dessas ações para obtenção de ganhos políticos, tanto mais quando iludem a opinião pública e prejudicam a continuidade e a eficácia das mesmas ações.

Desejo, ainda, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, tratar de um segundo assunto na tarde de hoje.

Venho à tribuna para comentar matéria intitulada “Mais um ano sem investimentos”, publicada no jornal Correio Braziliense, edição de 28 de outubro do corrente.

A matéria é de extrema atualidade, pelo que entendo que a inserção nos Anais do Senado é oportuna, e mostra como o Governo Lula deverá conviver, em 2004, pelo segundo ano consecutivo, com a falta de recursos para as áreas de infra-estrutura. O problema é que, mesmo cortando todo o investimento de infra-estrutura - o que é impossível -, o Congresso não terá eliminado o rombo do Orçamento.

Mais uma vez, pode-se ver que o atual governo não saiu do lugar, continua “patinando”.

O texto que passo a ler para que fique integrando este pronunciamento, é o seguinte:

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE A SRª SENADORA LÚCIA VÂNIA EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210 do Regimento Interno.)

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/11/2003 - Página 35265