Discurso durante a 155ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre a reforma tributária.

Autor
Augusto Botelho (PDT - Partido Democrático Trabalhista/RR)
Nome completo: Augusto Affonso Botelho Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA TRIBUTARIA.:
  • Considerações sobre a reforma tributária.
Publicação
Publicação no DSF de 05/11/2003 - Página 35269
Assunto
Outros > REFORMA TRIBUTARIA.
Indexação
  • ANALISE, EVOLUÇÃO, SISTEMA TRIBUTARIO NACIONAL, MODERNIZAÇÃO ADMINISTRATIVA, PERIODO, REGIME MILITAR, CRIAÇÃO, RECEITA FEDERAL, SERVIÇO FEDERAL DE PROCESSAMENTO DE DADOS (SERPRO), APERFEIÇOAMENTO, LEGISLAÇÃO TRIBUTARIA, COMPARAÇÃO, SITUAÇÃO, ATUALIDADE, INEFICACIA, SISTEMA TRIBUTARIO.
  • ANALISE, SITUAÇÃO, CONTRADIÇÃO, EXCESSO, AUMENTO, CARGA, TRIBUTOS, SIMULTANEIDADE, AUSENCIA, CRESCIMENTO ECONOMICO.
  • NECESSIDADE, REFORMA TRIBUTARIA, ATUALIZAÇÃO, LEGISLAÇÃO, RETOMADA, FUNÇÃO, NATUREZA ECONOMICA, NATUREZA SOCIAL, TRIBUTAÇÃO, CORREÇÃO, INJUSTIÇA, COBRANÇA, IMPOSTOS, RACIONALIZAÇÃO, DISTRIBUIÇÃO, ARRECADAÇÃO, IMPORTANCIA, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA.

 

O SR. AUGUSTO BOTELHO (PDT - RR. Sem apanhamento taquigráfico.) -

TRIBUTAÇÃO ARRECADATÓRIA

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ocupo a tribuna do Senado Federal para tratar de um dos mais importantes temas, no campo econômico e nas áreas social e política: a Reforma Tributária.

No início dos anos 60, do século passado, o Brasil convivia com um sistema tributário caótico, com uma quantidade enorme de impostos e taxas, com uma máquina arrecadadora ineficiente, desaparelhada e sem os recursos humanos mínimos exigíveis para uma operação adequada das atividades de arrecadação, tributação, fiscalização e estudos econômico-fiscais.

O País era considerado um paraíso dos contrabandistas e da sonegação fiscal, em que apenas alguns poucos pagavam suas obrigações tributárias e em que os controles das autoridades eram muito frágeis, pouco confiáveis, sem fidedignidade.

No final dos anos 60, após exaustivos estudos e pesquisas realizados por um conjunto de entidades e especialistas, o Brasil fez um grande esforço de modernização de toda a sua estrutura tributária.

Esse programa contou com a participação da Fundação Getúlio Vargas, da Agência Norte-Americana para o Desenvolvimento Internacional (Usaid), de grandes economistas, como Mário Henrique Simonsen, Roberto Campos e Gerson Augusto da Silva, e de técnicos e especialistas do Ministério da Fazenda.

Podemos afirmar que esse foi, sem dúvida, o maior esforço de modernização da máquina governamental brasileira dos últimos tempos: tivemos a criação da Secretaria da Receita Federal, a consolidação e a modernização das principais normas tributárias do País, a criação do Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro), a criação da Escola de Administração Fazendária e o aperfeiçoamento de diversos outros instrumentos tributários, de modo a dotar o Brasil de um sistema tributário moderno, eficaz e eficiente.

Decorridos quase 40 anos desse esforço de modernização tributária, vemos ressurgir muitos dos antigos problemas que assolavam a economia e o sistema tributário nacional: temos um sistema tributário ineficiente, que reduz nossa capacidade de competir internacionalmente, impedindo nossa inserção favorável no mercado globalizado, com o aumento do chamado custo Brasil, pois atualmente somos obrigados a exportar tributos, o que não passa pelo crivo de um mínimo de racionalidade econômica e tributária.

Sr. Presidente, as diversas crises por que passaram as finanças públicas nacionais, a diminuição do ritmo de crescimento da economia nas últimas décadas, a chamada década perdida, a pressão inflacionária, a falta de planejamento do setor público e o estrangulamento do setor privado, e o enorme crescimento da demanda por serviços públicos contribuíram para a atual situação caótica em que nos encontramos do ponto de vista tributário.

O setor público apresenta pouca capacidade de resposta no atendimento de demandas crescentes por serviços públicos, e tivemos a introdução de muitas distorções na economia e, particularmente, no sistema tributário, como a reintrodução dos chamados impostos em cascata.

Tivemos uma elevação desmedida da carga tributária, que hoje se aproxima dos 40% do Produto Interno Bruto, com uma repartição muito desigual da receita tributária entre regiões, Estados e Municípios, acentuado as desigualdades sociais, regionais e pessoais e agravando o nível de regressividade de um sistema tributário complexo, ineficiente e criador de distorções que impedem o desenvolvimento de muitas atividades econômicas.

Vemos o aumento da sonegação, da informalidade, da pirataria, da inadimplência, da evasão, da elisão, das fraudes e de um grande número de manobras e atividades que objetivam escapar da ação do Fisco.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, assistimos hoje, estarrecidos, à exacerbação do furor tributário: a Secretaria Receita Federal, a cada mês, durante anos, vem atingindo recordes e mais recordes, ultrapassando, sucessivamente, metas mais elevadas de arrecadação, numa espécie de luta de muitos rounds, com a arrecadação crescente e a economia estagnada.

Nessa luta, o contribuinte honesto acabará nocauteado, pois o nível da carga tributária cresce mais e mais, principalmente para os poucos que são obrigados a pagar, porque não dispõem de mecanismos de fuga.

Estamos atingindo o nível em que o contribuinte poderá recorrer aos Tribunais, alegando que está sendo vítima de verdadeiro confisco, pois nosso sistema tributário se transformou num mecanismo que objetiva arrecadar mais e mais.

Esse furor arrecadatório acaba retirando legitimidade desse sistema, pois a História nos ensina que todos os sistemas tributários que ultrapassaram os limites da lógica, da coerência e da razoabilidade, os sistemas que provocam as chamadas derramas, esses sistemas têm como final revoltas, desobediência civil, queda dos níveis de eficiência, produtividade e competitividade da economia e, finalmente, o caos social.

Sr. Presidente, o Brasil de hoje vive esse momento de rota para o caos, em que as empresas são obrigadas a pagar Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira, Contribuição Social sobre Lucro Líquido, Programa de Integração Social, Contribuição para Financiamento da Seguridade Social, Imposto sobre Produtos Industrializados, Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços, para falarmos apenas em alguns dos atuais tributos que não cumprem as funções essenciais de justiça fiscal, de distribuição de renda e de regulação e de estabilização das atividades econômicas.

O Brasil, hoje, atingiu um nível de carga tributária equivalente ao dos países mais desenvolvidos socialmente, com a diferença no que se refere aos serviços públicos.

Lá os serviços públicos são de primeira qualidade; aqui os serviços públicos são do tipo do nosso sistema público de saúde: simplesmente horríveis e incompatíveis com o respeito à dignidade humana.

A carga tributária é apenas uma das faces da moeda que engloba a despesa pública, o orçamento público.

A arrecadação tributária só se justifica com um orçamento público adequado, que atenda a todos os requisitos de transparência, legitimidade, legalidade, impessoalidade, moralidade, eficiência e razoabilidade, com metas definidas, em que prevaleça o interesse público, os objetivos nacionais, o interesse da Nação, o bem-estar dos cidadãos.

Neste momento em que o Senado Federal delibera sobre um assunto da mais alta relevância para o futuro do Brasil, a Reforma Tributária, é preciso que a tributação se torne uma função econômica e social de relevância, corrigindo-se todos os desvios e distorções que ocorreram nas últimas décadas, que transformaram nosso sistema tributário num avassalador mecanismo de arrecadação.

Não podemos mais aceitar uma tributação confiscatória, que não atende a objetivos sociais, contribui para acentuar as desigualdades sociais e regionais, prejudica o produtor, o assalariado e facilita a sonegação e a evasão fiscal.

Tenho plena convicção de que o Senado Federal, a Casa da Federação, formada por homens e mulheres com vasta experiência e competência, saberá encontrar o caminho adequado para dotar o Brasil de um instrumento tributário moderno, adequado ao nível de desenvolvimento de nossa economia e sem o viés do furor arrecadatório.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/11/2003 - Página 35269