Discurso durante a 156ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Necessidade de soluções para a pesca nacional.

Autor
João Ribeiro (PFL - Partido da Frente Liberal/TO)
Nome completo: João Batista de Jesus Ribeiro
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PESCA.:
  • Necessidade de soluções para a pesca nacional.
Publicação
Publicação no DSF de 06/11/2003 - Página 35580
Assunto
Outros > PESCA.
Indexação
  • CRITICA, GESTÃO, MINISTRO DE ESTADO, SECRETARIA ESPECIAL, AGRICULTURA, PESCA, INFERIORIDADE, DESTINAÇÃO, RECURSOS, Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), PESCA ARTESANAL, PRIORIDADE, INVESTIMENTO, CONSTRUÇÃO, EMBARCAÇÃO PESQUEIRA.
  • ANALISE, SETOR, PESCA, BRASIL, INFERIORIDADE, PRODUÇÃO, PESCA ARTESANAL, ESPECIFICAÇÃO, RIO ARAGUAIA, RIO TOCANTINS, REFORÇO, COOPERATIVA, FINANCIAMENTO, PEQUENA EMPRESA, BUSCA, INDUSTRIALIZAÇÃO, INTEGRAÇÃO, ESTADOS, APOIO, PESQUISA, AGRICULTURA, ATENÇÃO, FISCALIZAÇÃO, MEIO AMBIENTE, REPUDIO, LOBBY, PAIS ESTRANGEIRO, DEFESA, APROVAÇÃO, LEGISLAÇÃO.

O SR. JOÃO RIBEIRO (PFL - TO. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, há algum tempo o Ministro-chefe da Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca, José Fritsch, afirmou que os problemas da pesca no Brasil só podem ser resolvidos em médio e longo prazo, fato que nos induz considerar que S. Exª, o ministro, percebe apenas parte da realidade do setor que está sob a égide do órgão de governo que dirige, o qual tem por obrigação, antes de qualquer outra, de traçar políticas públicas que atendam a todos os segmentos ligados à área, principalmente ao dos pequenos produtores.

Mais tarde o governo ao anunciar um pacote de medidas que beneficiam o setor mostrou que a miopia é geral, pois não contempla satisfatoriamente a grande maioria daqueles brasileiros que trabalham diariamente para sustentar suas famílias com a pesca. Quer destinar menos de 5% do bilhão e meio anunciado para o financiamento do PRONAF/PESCA, o programa que atende aos trabalhadores artesanais.

A par dos benefícios que a pesca industrial terá, uma vez que o grosso dos recursos serão aplicados na construção de embarcações de grande porte adequadas à pesca oceânica em águas profundas, muito provavelmente os pequenos produtores de pescado continuaram às voltas com os problemas cotidianos, principalmente aqueles que fazem a pesca artesanal em águas doce.

Para compreender tal realidade é preciso observar os diferentes elementos que compõem o cenário do setor da pesca no Brasil.

Muito embora tenhamos uma costa que se estende por mais de oito mil quilômetros de extensão e um sem número de rios piscosos, consta que nossa produção anual de peixe é bastante modesta, quando a comparamos com a de outros países produtores.

Nesse setor, os dados econômicos mostram que se produz pouco mais do que 65% de pescado consumidos anualmente, ou seja, cerca de mil e cem toneladas. Esse número parece ainda menor se lembrarmos que somos mais de 167 milhões de habitantes, o que produz um parco quociente de consumo que não atinge a 7 quilos por ano de pescado, enquanto países como o Japão e os Estados Unidos consomem mais de 20 quilos por habitante, durante o mesmo período.

A FAO, Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentos, recomenda que a média de consumo de pescado por ano, por pessoa, seja de 12 a 13 quilogramas. Isso quer dizer que consumimos apenas a metade do que é recomendado.

Mas o fato que nos interessa de perto, neste momento, é que passamos a ter uma política setorial para a pesca que se mostra, com os anúncios do atual governo, vista apenas sob um lado, o da indústria de grande porte. A produção pesqueira caracteriza-se como uma atividade multifacetada, de certo modo complexa, com variados subsetores que precisam ser incentivados.

A pesca artesanal, talvez, mais que a industrial, é uma atividade que necessita, imediatamente, de apoio e estímulo, pelo impacto positivo que ela pode proporcionar, inclusive, na geração de emprego e a renda para uma parcela de trabalhadores que hoje deixa sua profissão de pescador por falta de apoio para a atividade.

O exemplo mais claro que ora me ocorre vem das margens do Araguaia e do Tocantins, onde colônias de pescadores, profissionais no que fazem, clamam por apoio de toda sorte -- tais qual o financiamento de equipamentos, a capacitação técnica para os novos recursos de exploração e manejo, o treinamento para atividades como a monitoria e fiscalização da pesca esportiva e, também, profissional -- aproveitando-se o grande potencial desses trabalhadores que conhecem sobremaneira a região, tudo com o propósito de melhorarem os resultados que obtém no seu trabalho e a condição de vida de suas famílias.

Todos sabemos que a pesca industrial ou a própria industrialização do pescado ou prática da aqüicultura, isto é, a criação de peixes em tanques e piscinas apropriadas, em qualquer ponto do Território Nacional, tem, igualmente, largo potencial para gerar emprego e com isso contribuir para o fortalecimento da nossa economia. Entretanto o incentivo apenas para um segmento do setor não resolve o problema maior, como já afirmamos há pouco.

Insisto, afirmando com convicção, que nos falta uma política de pesca ampla e consistente. E não é de hoje que isso tem faltado. Não tivemos, nos últimos governos, um órgão federal forte, dedicado exclusivamente a esse setor produtivo. Isso tem impedido até que tenhamos boas estatísticas, dados confiáveis e precisos, sobre captura, cultivo, espécies e perfil do consumo de peixes e dos próprios trabalhadores desse importante setor econômico.

O Brasil já teve algumas iniciativas que mostravam estar no rumo certo. Há quarenta anos atrás, esboçou-se um plano nacional da pesca, idéia que infelizmente não avançou. Depois, nos anos 70, criou-se um órgão federal, a Sudepe, Superintendência do Desenvolvimento da Pesca, a qual de órgão bem estruturado passou por desvios e desmandos até enfrentar escândalos financeiros que lhe levaram à extinção. De lá até aqui, foram quinze anos sem uma política pública efetiva, e agora, mesmo tendo uma sinalização governamental para suprir tal lacuna, ela se mostra pouco adequada à realidade.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, tudo isso deixa claro que estamos diante de mais uma grave contradição brasileira. Um país de dimensões continentais e com extenso litoral como o nosso, que produz 12% da água doce do mundo, detentor de colossal hidrografia e de imensos reservatórios hidrelétricos, que são verdadeiros mares interiores, não tem política pública efetiva que lhe garanta o melhor aproveitamento de seu potencial pesqueiro.

A bem da verdade não estamos na estaca zero, reconhece-se que temos um setor parcialmente organizado, frotas pesqueiras, colônias de pescadores, cooperativas etc. Mas, infelizmente, sem qualquer incentivo público.

O Governo, que aí está, por ter fortalecido a Secretaria de Aqüicultura e Pesca dando-lhe status de ministério, gerou expectativa positiva, sim. Entretanto, o que é criticável é o fato de que tal Secretaria tenha iniciado suas atividades sem ter idéias mais bem definidas, sem o necessário conhecimento da realidade, como prova o estabelecimento de prazos excessivamente longos para que as ações práticas sejam desencadeadas e mesmo pelo investimento quase que único em um segmento desse imenso setor.

O quadro atual da área requer ações urgentes. Cooperativas de pesca devem começar a ser fortalecidas e outras organizadas já, sem demora, sem hesitação. Todo o setor pesqueiro, de enorme potencial de crescimento, clama por financiamento e por definições quanto à sua regulamentação.

É preciso dar condições para que o pequeno empresário da pesca que queira investir possa fazê-lo com estímulos federais. É necessário que todo o setor produtivo da pesca se articule com a fase de processamento industrial do pescado e tenha influência sobre ela. Como tem sido com a produção de frangos, suínos e frutas. O próprio Ministro-chefe prega esse conceito. Quanto maior é a participação do produtor na industrialização, mais cresce sua renda, pois se reduz o número de intermediários no processo. Por via das cooperativas, o produtor pode ser mais favorecido pelas atividades de industrialização, de comercialização, beneficiamento e armazenamento.

Quanto à aqüicultura, a própria FAO recomenda que seja fortalecida, pois a pesca nos mares ficará cada vez mais sujeita a restrições que decorrem da preocupação com a superexploração dos cardumes. Há um esgotamento dos recursos pesqueiros marítimos em vários pontos do mundo, o que exige muita disciplina e respeito às regras e normas de exploração. O Brasil já experimentou uma forte redução dos cardumes de sardinha, no litoral Sul do país. No Nordeste, começa a se repetir esse quadro, com a queda no rendimento produtivo na pesca da lagosta. Isso deve preocupar a todos nós, mas principalmente deve ocupar aqueles que hoje estão na definição e condução das políticas públicas direcionadas à pesca.

O setor pesqueiro exige integração da ação federal com o que já se faz nos Estados. É preciso incentivar a pesquisa, assim como ampliar as linhas de financiamento para todas as modalidades adequando-as ao perfil setorial.

Nesse terreno há pendências a serem resolvidas. Uma delas é a tramitação da lei de pesca e aqüicultura que se encontra paralisado na Câmara dos Deputados. Temos que assegurar, nessa lei, um tratamento justo para o produtor nacional frente à atividade de barcos estrangeiros.

É necessário lançar programas específicos para as diferentes regiões e diferentes situações, levando em consideração a realidade conforme já indiquei neste discurso quando trouxe o exemplo das colônias de pescadores do meu Estado do Tocantins. Assim como para o semi-árido no Nordeste ou para a região amazônica que guardam características próprias. E nesse ponto acerta o governo, é preciso que se reconheça, quando operacionaliza a concessão da subvenção econômica ao preço do óleo diesel -- instituída pela Lei 9.445, de 14 de março de 1997 -- atendendo, assim ao pescador artesanal que tem no óleo matéria prima essencial para seu trabalho.

No plano institucional é preciso delinear as atribuições de fiscalização sobre a atividade pesqueira e definir o que fica com a Secretaria e o que fica com o Ibama, por exemplo.

No plano das relações internacionais, é necessário repelir as pressões dos países ricos que levam a perpetuar o desnível entre nós e eles. Nesse particular defendo que os países da América Latina se organizem numa entidade regional.

Sr. Presidente, o setor da pesca brasileiro tem grande potencial de expansão e investir nele pode criar repercussão muito positivamente sobre a economia, sobre o emprego, sobre a geração de renda para muitos milhares de trabalhadores, como já dissemos. Trata-se, afinal, de produzir alimento. Imaginemos o que essa expansão poderia significar, por exemplo, para um programa como o combalido Fome Zero do Governo Federal.

Mas, insisto, as medidas têm que ser adotadas em ritmo expedito, pois o País não pode esperar. A pesca no Brasil exige sim uma visão de longo prazo, entretanto clama por uma ação de curto prazo. Espero que o Governo entenda isso, e que aja de acordo com este entendimento.

Muito obrigado.

Era o que tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/11/2003 - Página 35580