Discurso durante a 158ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Crise financeira dos municípios brasileiros.

Autor
Garibaldi Alves Filho (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RN)
Nome completo: Garibaldi Alves Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL. DIVISÃO TERRITORIAL. REFORMA TRIBUTARIA. PREVIDENCIA SOCIAL.:
  • Crise financeira dos municípios brasileiros.
Aparteantes
José Agripino, Mão Santa, Rodolpho Tourinho.
Publicação
Publicação no DSF de 08/11/2003 - Página 35970
Assunto
Outros > ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL. DIVISÃO TERRITORIAL. REFORMA TRIBUTARIA. PREVIDENCIA SOCIAL.
Indexação
  • GRAVIDADE, SITUAÇÃO, ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL, FALTA, RECURSOS, PAGAMENTO, DECIMO TERCEIRO SALARIO, REDUÇÃO, FUNDO DE PARTICIPAÇÃO DOS MUNICIPIOS (FPM), NECESSIDADE, DEBATE, PACTO, FEDERAÇÃO, COMBATE, DESEQUILIBRIO, RECEITA, MUNICIPIOS, ANALISE, HISTORIA, CRISE.
  • APOIO, RETIRADA, PROJETO DE LEI, AUTORIA, SERGIO ZAMBIASI, SENADOR, TRANSFERENCIA, ESTADOS, RESPONSABILIDADE, CRIAÇÃO, MUNICIPIOS, DEFESA, NECESSIDADE, ATENÇÃO, UNIÃO FEDERAL, CONSULTA, POPULAÇÃO, EXISTENCIA, CRITERIOS.
  • IMPORTANCIA, DEBATE, REFORMA TRIBUTARIA, MELHORIA, ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL.
  • EXPECTATIVA, DECISÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, REVISÃO, ATUAÇÃO, MINISTERIO DA PREVIDENCIA SOCIAL (MPS), DESRESPEITO, IDOSO, SEGURADO, PREVIDENCIA SOCIAL.

O SR. GARIBALDI ALVES FILHO (PMDB - RN. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, na discussão dessa emenda, que se encerrou em 18 de setembro passado - não se trata da emenda da previdência e nem da emenda da reforma tributária, mas de uma emenda do Senador Sérgio Zambiasi, do Rio Grande do Sul, que resolve, por um projeto de lei, transferir aos Estados toda a responsabilidade pela criação de novos municípios -, fiz uma análise na qual dizia que o Senador deveria ter em conta o momento que estávamos vivendo, de crise sem precedentes, nos últimos anos, na história administrativa dos Municípios brasileiros.

Ora, o que mais ouvimos aqui, nos últimos dias, a respeito da situação dos Municípios, foi que os Municípios, debilitados financeiramente, não poderão pagar o décimo terceiro salário. Alguns estão com vencimentos atrasados. Falo pelo Rio Grande do Norte, mas sei que essa situação não se restringe apenas ao meu Estado.

Isso é atribuído, como causa imediata - e é verdade -, à queda no fundo de participação. Mas era preciso, Sr. Presidente - e há um temor muito grande com relação a isso -, refletir acerca do nosso pacto federativo. É preciso ver que não se pode continuar a ter um desequilíbrio tal que leva os Municípios a continuarem de pires na mão, aqui, em Brasília, buscando mais recursos financeiros.

O meu discurso hoje pretende ser uma análise histórica dessa crise - e vai levar as minhas congratulações ao Senador Sérgio Zambiasi, porque ele soube, estrategicamente, retirar a sua proposta para tentar um acordo em torno dela. A discussão dessa proposta iria gerar uma controvérsia muito grande aqui no Plenário e S. Exª estava correndo até mesmo o risco, a despeito das suas boas intenções, de não vê-la aprovada.

A tradição constitucional brasileira mais recente é no sentido de um mínimo de regulamentação federal quanto à criação de Municípios. Isso mais se justifica no regime da Constituição de 1988, quando os Municípios foram elevados à qualidade de entes autônomos integrantes da Federação, em pé de igualdade com os Estados e o Distrito Federal.

Ainda no regime constitucional anterior, já a Lei Complementar nº 1, de 1967, fixava regras e parâmetros para que fosse possível aos Estados, através de lei, criar novos Municípios. E isso quando os Municípios não eram tidos pela Constituição revogada como entes da Federação.

Justificava-se, então, a atenção da União com o trato da questão, porque historicamente os Municípios, na sua esmagadora maioria, sempre mantiveram dependência financeira em relação à União, cabendo a esta, por conseguinte, cuidar para que os recursos disponíveis pudessem ser distribuídos entre todos os Municípios do País de forma a mais racional possível. Por envolver não um Estado, mas os Municípios de todo o Brasil, nacionalmente considerados, bem se vê que a questão era e é da atribuição federal.

Com a Constituição de 1988, e passando os Municípios a integrar a Federação, conforme seu art. 18, o Poder Legislativo Federal tem redobradas responsabilidades quanto ao trato da matéria. Concluir diferentemente seria o mesmo que pleitear que o Congresso Nacional fosse alijado do processo de criação de novos Estados, posto que estes, repito, estão no mesmo nível político e jurídico dos Municípios em sua qualificação constitucional.

Portanto, Srªs e Srs. Senadores, não estou falando aqui sobre uma questão vencida. Não estou falando porque a matéria não chegou a ser apreciada. Estou falando sobre uma questão atualíssima, porque não podemos permitir, de maneira nenhuma - e a matéria voltará à baila, à discussão -, que se criem novos Municípios sem que a União venha a exigir, por meio de lei federal, regras gerais para os estudos de viabilidade municipal a par da consulta às populações, não só da área desmembrada, mas também daquela que terá seu território e rendas reduzidos pela criação dos novos Municípios.

Creio, mais do que nunca, que a questão federativa ficará viva, ficará presente. As reformas trouxeram um novo alento a essa discussão, inclusive a reforma tributária, que tem mais a ver com isso. Venho fazer essa advertência e não apenas exaltá-la.

Há pouco tempo, o Relator da reforma tributária, Senador Romero Jucá, passou aqui, apressado como sempre - S. Exª já é apressado e, como Relator, está ainda mais possuído por uma dinâmica grande -, e sabemos que já se conseguiu um avanço de natureza financeira. Haverá um aumento no fundo de participação, a partir de janeiro, que possibilitará aos Municípios um ganho de 8% a 10%; que significará em torno de 100% ao ano, que significará em torno de um mês a mais no fundo de participação. Mas isso será um paliativo e não a solução para esse problema, que passa por todas essas questões, como a que estou trazendo, que parece extemporânea, mas, na verdade, não é.

Não estamos mais discutindo a emenda agora porque ela foi sobrestada, mas estamos discutindo o problema dos Municípios.

O Sr. Rodolpho Tourinho (PFL - BA) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. GARIBALDI ALVES FILHO (PMDB - RN) - Concedo o aparte, com muito prazer, ao Senador Rodolpho Tourinho.

O Sr. Rodolpho Tourinho (PFL - BA) - Senador Garibaldi Alves Filho, inicialmente, quero dizer que a análise de V. Exª da questão dos Municípios é perfeita. Se hoje há uma queda no FPM e é ela que acaba levando ao problema de caixa que as prefeituras têm hoje, que até impede, como V. Exª colocou, o pagamento do décimo terceiro salário, só gostaria de acrescentar que essa queda é histórica e é devida, basicamente - para atacar as causas -, à alteração que houve nos tributos compartilhados, no IPI, no Imposto de Renda, que fazem parte dos fundos constitucionais, do FPE, dos Estados, e do FPM, dos Municípios - que, em 1988, eram de 76% e, no ano passado, de 45%. Essa é a grande causa. Por isso é que, na reforma tributária, temos que atacar a causa estrutural. E ela só pode ser atacada se passarmos a partilhar todos os tributos e não só o Imposto de Renda e o IPI, para evitar o que aconteceu com as receitas ou com as contribuições. Mas também se faz necessário, de imediato, o aumento no FPM, o que, no nosso cálculo, significaria passar de 22,5% para 25%. Esse também seria um bom caminho para resolver os problemas que V. Exª aponta com tanta competência, conhecimento e propriedade. Era isso o que gostaria de dizer a V. Exª. Mas ainda quero acrescentar um ponto: a mudança de 76% para 45% representou, para os Estados, em 2002, uma perda de 13,5% de sua arrecadação. E penso que no Município essa perda deve ser maior, porque a participação dos Municípios nos fundos e nos impostos é maior. Daí a gravidade da situação que V. Exª tão bem aponta.

O SR. GARIBALDI ALVES FILHO (PMDB - RN) - Senador Rodolpho Tourinho, quero agradecer o aparte de V. Exª, que foi preciso e objetivo. V. Exª está correto quando diz que a grande solução é fazer com que os Municípios possam compartilhar de todos os impostos e contribuições.

Dentro da tradição constitucional brasileira, defendo que, a partir de 1988, o Município passou a ser um ente da Federação. E assim ele se nivelou aos Estados e tem que ser tratado como são tratados os Estados e o Distrito Federal. Mas não vemos assim. Ignoramos essa tradição constitucional e nos fixamos na Constituição de 1967, que fixava regras e parâmetros para que fosse possível aos Estados, por intermédio de lei, criar novos Municípios, conseqüentemente dando a eles aquele status. Mas, como V. Exª diz, isso não foi obedecido, o que terminou gerando essas perdas, que não serão recuperadas da noite para o dia. Não adianta estender a mão com o pires na direção do Ministro Antônio Palocci; não adianta querer que o Relator, que o Líder do Governo dêem tratos à imaginação. Eles não vão conseguir recuperar essas perdas da noite para o dia.

E V. Exª também está correto quando lembra que seria importante fixar regras estáveis, no futuro, a fim de possibilitar essa participação. Agradeço o seu aparte, Senador Rodolpho Tourinho.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. GARIBALDI ALVES FILHO (PMDB - RN) - Concedo o aparte ao Senador Mão Santa.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Quanto à criação de Municípios, penso que esta Casa deve fazer uma reflexão. E coloco aqui a minha experiência, adquirida no Piauí, Estado que governei por duas vezes. Está presente o Senador Heráclito Fortes, municipalista por excelência. Em 1990, o ex-Senador Freitas Neto começou a governar o Estado do Piauí e desencadeou esse processo de criação de novos Municípios. Havia 115 Municípios; S. Exª criou mais 30. E era Presidente da Assembléia Legislativa um eleitor muito lúcido de Heráclito Fortes, o Deputado Gesualdo Cavalcanti. Recebi o Estado do Piauí com 145 cidades e vi que tinha que continuar o processo - não fui eu que criei, mas eles. Deslanchei e Deus me permitiu transformar 76 povoados em cidades. As coisas estavam dando certo e as acelerei mais. Está aí o testemunho do Senador Heráclito Fortes. E além das novas cidades, também fiz boas praças para namorar, ruas. Há pouco tempo fui em Ribeira do São João do Parnaíba, na Praça Mão Santa, porque tinha prometido namorar a Adalgisa naquela praça. A escola para estudar, o mercado, o hospital, enfim, o essencial é invisível aos olhos. Quem vê bem, vê corações. Foi uma oportunidade de chamamento para as novas lideranças: vereadores, vice-prefeitos e prefeitos, alguns dos quais excepcionais. Convido V. Exª para visitar uma cidade em que o prefeito vota em mim e no Senador Heráclito Fortes: Cajueiro da Praia, no litoral do Piauí. Que beleza! Bem melhor do que Jericoacoara, que faz parte do Ceará, porque eu criei estruturas para isso. E o próprio prefeito já tinha sido prefeito de uma cidade-mãe, é advogado. Assim, houve uma melhoria extraordinária. Em uma delas, Senador Antonio Carlos Magalhães, houve um concurso literário de poesias. Foram povoados que se transformaram em cidades. Penso, então, que isso deve passar para o Poder Legislativo Estadual e, socialmente, aos Estados. Aí estão os Estados Unidos, com 46 Estados. O Brasil só tem 27 Estados. Como melhoraram Tocantins, Mato Grosso do Sul e os Territórios que se transformaram em Estados! Penso que o Piauí deve se dividir em dois. Senador Antonio Carlos Magalhães, olhe o mapa dos Estados Unidos. Lá há quadriláteros. O Piauí é muito comprido. E nasci no litoral. E há outros Estados que querem se dividir. Recentemente, fui ao México, país que tem menos da metade da nossa área e tem 35 Estados. Devemos fazer uma reflexão a respeito do assunto. A experiência do Piauí mostra que avançamos.

O SR. GARIBALDI ALVES FILHO (PMDB - RN) - Respeito muito o Senador Mão Santa - e quem não respeita, não é? Mas nesse assunto dos Municípios nós dois divergimos um pouco, porque, como disse aqui, creio que o ente federal deve ter alguma ingerência na criação dos Municípios, pelo menos no estabelecimento de algumas regras.

Senador Mão Santa, depois da Constituição de 1988, foram criados, no Brasil, 1.118 novos Municípios. Em 1990, o País tinha 4.990 Municípios; na eleição de 1998, já tínhamos 5.608 Municípios.

A experiência do Piauí de criação de Municípios foi vitoriosa - não conheço a realidade, mas respeito o depoimento de V. Exª. Mas em muitos outros Estados isso não aconteceu e está contribuindo - além de o Governo Federal ter desequilibrado o pacto federativo - para a situação em que estão os Municípios hoje. Mas nem todos os Estados puderam ter governando-os Mãos Santas, não é?

Quero encerrar o meu pronunciamento...

O Sr. José Agripino (PFL - RN) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. GARIBALDI ALVES FILHO (PMDB - RN) - Pois não, Senador José Agripino, com muito prazer.

O Sr. José Agripino (PFL - RN) - Senador Garibaldi Alves Filho, inicialmente, quero cumprimentar V. Exª pela oportunidade do seu pronunciamento, ao qual me associo. E gostaria de aduzir, modestamente, alguns argumentos aos que V. Exª já apresentou. V. Exª sabe que os Municípios são hoje, na Federação brasileira, o ente mais sacrificado e mais solicitado. Ninguém faz cerimônia ao solicitar o que os Municípios não podem dar. V. Exª sabe que quando se vai instalar o programa do idoso, o programa da criança, o programa de proteção ao trabalho da criança, o PETI, o Governo Federal exige a formação de um conselho no âmbito do Município, e V. Exª sabe também que quem paga os conselheiros é o prefeito. A verba é federal, operada diretamente da União para o Município, mas quem paga os custos do programa é o Município, que tem, além do mais, as suas obrigações constitucionais. É nossa obrigação - e V. Exª aborda com muita oportunidade o problema - defender os entes federados que estão literalmente quebrados. V. Exª, como eu, como todos os Senadores que têm assento nesta Casa, recebem visitas diárias dos Prefeitos, que vêm com o pires na mão pedir o apoio dos Parlamentares com relação à apresentação de emendas. A única alternativa de investimento dos Municípios pequenos e médios - excluo as capitais, que têm uma estrutura de arrecadação um pouco melhor - para o atendimento da expectativa de seus munícipes é o acolhimento da emenda parlamentar ou o apoio do Governo do Estado. Isso tem de acabar, está nas nossas mãos, e, na reforma tributária, vamos ter a nossa vez. Espero que V. Exª seja favorável à emenda, tenho certeza de que o será. Trata-se de mais do que uma emenda do PFL, é uma emenda do Senado Federal que aumenta de 22,5% para 25% a participação dos Municípios na cota parte do Fundo de Participação no que diz respeito ao IPI e ao Imposto de Renda. Louvo V. Exª por seu pronunciamento, que é oportuno, porque defende uma crescente tese contra a criação de novos Municípios. Essa é também a tese que defendo. Não dá mais, a menos que a renda nacional cresça ou até que isso ocorra, não dá mais. Mas defendo, principalmente, na repartição do bolo dos tributos federais, uma melhor participação dos Municípios do Brasil. Parabéns a V. Exª.

O SR. GARIBALDI ALVES FILHO (PMDB - RN) - Agradeço, Senador José Agripino.

Creio que devemos defender os sobreviventes, ou seja, aqueles municípios que estão sobrevivendo a duras penas, e não podemos permitir o nascimento de novos, que vão encontrar esse quadro atual. Ora, se os Municípios que pensávamos que se consolidariam não se consolidaram, quanto mais os novos! Fazemos essa advertência, sabendo que encontramos a compreensão do Senador Sérgio Zambiasi, que retirou a sua proposta para novamente apresentá-la em plenário, depois de um acordo.

Agradeço ao Presidente pela compreensão e associo-me ao Senador Antonio Carlos Magalhães, solicitando uma revisão dessa medida do Ministério da Previdência com relação aos segurados mais idosos que realmente trouxe uma situação de angústia para essas pessoas e suas famílias. Estamos vendo realmente a sociedade brasileira indignada com essa questão.

Acredito que o Presidente da República, como disse o Senador Antonio Carlos Magalhães, tomará providências.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/11/2003 - Página 35970