Discurso durante a 159ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Relatório de sua visita oficial aos EUA.

Autor
Jonas Pinheiro (PFL - Partido da Frente Liberal/MT)
Nome completo: Jonas Pinheiro da Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ATUAÇÃO PARLAMENTAR. POLITICA EXTERNA.:
  • Relatório de sua visita oficial aos EUA.
Aparteantes
Juvêncio da Fonseca.
Publicação
Publicação no DSF de 11/11/2003 - Página 36034
Assunto
Outros > ATUAÇÃO PARLAMENTAR. POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • RELATORIO, PARTICIPAÇÃO, ORADOR, MISSÃO OFICIAL, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), VISITA, LEGISLATIVO, BOLSA DE VALORES, UNIVERSIDADE ESTRANGEIRA, ENCONTRO, PARLAMENTAR ESTRANGEIRO, RECONHECIMENTO, IMPORTANCIA, CONTRIBUIÇÃO, AÇÕES, BRASIL, CAPTAÇÃO, POUPANÇA, EXTERIOR, IDENTIFICAÇÃO, OBSTACULO, TITULO, PAIS, MERCADO INTERNACIONAL, DEFESA, POSIÇÃO, GOVERNO BRASILEIRO, REFERENCIA, AREA DE LIVRE COMERCIO DAS AMERICAS (ALCA), PROTESTO, SUBSIDIOS, AGRICULTURA, PAIS INDUSTRIALIZADO.
  • DEFESA, NECESSIDADE, PLANEJAMENTO, ATIVIDADE, SETOR, FINANÇAS, BRASIL.

O SR. JONAS PINHEIRO (PFL - MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, de volta de uma recente viagem aos Estados Unidos como membro de uma missão oficial, juntamente com outros Parlamentares e autoridades, para visitar o Congresso norte-americano e as principais bolsas de valores daquele país e para fazer outras visitas técnicas a mesas de operações financeiras e a órgãos reguladores ou auto-reguladores dos mercados derivativos, quero prestar contas a V. Exªs e, ao mesmo tempo, tecer alguns comentários sobre o que vimos naquele país estrangeiro.

Muito se fala sobre a utilidade ou não das viagens ao exterior. Quero, então, retratar fielmente para V. Exªs a extraordinária utilidade da visita que fizemos aos Estados Unidos, cumprindo uma agenda exaustiva em três cidades diferentes - Nova York, Washington e Chicago -, onde, no curto espaço de cinco dias úteis, visitamos dezenas de instituições, ouvimos palestras e participamos de debates técnicos.

Iniciamos a viagem por São Paulo, onde passamos a manhã e a tarde do dia 22 de outubro nos inteirando do mercado de derivativos negociados na Bolsas de Mercadorias & Futuros. O sistema de compensação desse mercado registra diariamente mais de 450 mil contratos que envolvem taxas futuras de juros, de dólar, de índices futuros da Bovespa, de ouro, de commodities agropecuárias, como café, boi, bezerro, milho, soja, açúcar, e de energia, como o álcool anidro. Os volumes diários em giro neste ano estão em torno de US$15 bilhões.

A BM&F, situa-se entre as sete maiores bolsas no rol das instituições que trabalham com contratos futuros. Creio, Srªs e Srs. Senadores, que ainda não nos demos conta do que isso significa para o nosso País e de qual deve ser a nossa postura diante da escalada do mercado derivativo no Brasil. Vou dizer a razão, a partir das constatações a que chegamos com a recente visita técnica aos mercados financeiros norte-americanos.

Para começar, quero reportar o que constatamos ao visitar a NYSE, a mais importante bolsa de valores do mundo. Naquele mercado, negociam-se os chamados ADRs, os recibos americanos de depósito que representam frações do capital de empresas estrangeiras.

A NYSE dispensa grande atenção ao Brasil. O motivo é claro: os ADRs de ações de empresas brasileiras ocupam o primeiro lugar em negociação entre os concorrentes latino-americanos negociados ali, com uma fatia de 10%.

Reconhecemos que a presença das ações brasileiras na NYSE é um fator positivo por contribuir para captar poupança estrangeira para investimento em capital fixo. Mas existe o outro lado da moeda, que é a drenagem de liquidez dos papéis do mercado secundário de ações do Brasil para o exterior.

Em boa parte, isso ocorre devido à CPMF e a outras distorções tributárias que diminuíram a capacidade competitiva do mercado brasileiro de ações negociadas em bolsa em comparação com os centros de liquidez estrangeiros. Não podemos ignorar essa questão no exato momento em que queremos fomentar a poupança doméstica e pavimentar o caminho para o ingresso de ações de empresas de segunda linha no mercado.

Pudemos detalhar melhor esses aspectos com a visita à mesa de operações do Citibank, quando nos deparamos com salões de operação onde mais de setecentos técnicos movimentam recursos, aplicando-os em índices de ações, realizando operações de investimento de renda fixa ou de arbitragem. Se não prestarmos muita atenção nos centros de liquidez que existem no Brasil, corremos o risco de criar incerteza jurídica, dificultando a tarefa da auto-regulação, fundamental para os mercados derivativos e para as câmaras de compensação geral.

Depois das exposições e dos debates na NYSE e no Citibank, que ocorreram na segunda-feira, 27 de outubro, fomos à Universidade de Colúmbia, onde tivemos a oportunidade de manifestar a nossa opinião sobre a Alca e de protestar, uma vez mais, contra os subsídios que os países ricos concedem a sua agricultura.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, sem dúvida, teremos de desenvolver um intenso trabalho de formação de opinião se quisermos preparar o caminho para a entrada na Alca sem prejuízo para o agronegócio brasileiro. Não podemos ignorar o que ocorre no meio parlamentar, financeiro e acadêmico dos Estados Unidos ou por que a delegação norte-americana chegou a Cancún com posições que travaram o diálogo com os países em desenvolvimento. Se ficarmos reféns de Brasília e dos corredores e gabinetes desta Casa, muito provavelmente decidiremos no escuro. Precisamos ter uma atitude pró-ativa e, nesse caso, levar nossa mensagem aos fóruns acadêmicos, parlamentares e técnicos dos países com os quais temos fores interesses comerciais, a começar pelos Estados Unidos da América. Nesse sentido, o contato que tivemos em Colúmbia e no Congresso norte-americano foi de extrema utilidade, de acordo com a agenda de viagem promovida pela BM&F.

Antes de entrar nesse ponto, quero relatar o resto da agenda que cumprimos em Nova York, onde visitamos a Nymex, a bolsa onde são negociados contratos de energia, e a Nybot, onde são negociados contratos de café, açúcar, cacau e algodão. O Brasil é o maior produtor mundial de café, mas só recentemente a BM&F conseguiu criar um contrato de café que balizasse os preços do produto brasileiro. Lidera o mercado mundial de álcool de cana, mas os maiores pregões de açúcar ficam na NYBOT e em Londres. A NYBOT baliza os preços internacionais do café com base no café colombiano. E a NYMEX quer entrar em contratos de álcool, competindo com o contrato lançado na BM&F, que foi pioneira nessa área, assim como o Brasil foi pioneiro na adoção de biomassas para gerar energia através do álcool anidro. Verificamos, durante essa viagem, qual era o grau de competitividade dos serviços financeiros no mundo. Além dos aspectos de marketing, os mercados derivativos geram um mercado de trabalho altamente especializado, que não surge da noite para o dia, mas que pode ser perdido de repente, devido a falhas na legislação e à má regulação de mercado.

Nossa passagem por Nova Iorque terminou com a nossa participação no jantar promovido pela Câmara Americana para homenagear o Homem do Ano. Este ano, o homenageado pela Câmara Americana foi o eminente brasileiro Sr. Maurílio Biaggi, que, em seu discurso, tocou em muitos dos pontos que acabo de mencionar. Prestigiando aquele acontecimento em Nova Iorque estiveram presentes o Presidente desta Casa, Senador José Sarney, os Senadores Romeu Tuma, Sérgio Cabral, Leomar Quintanilha e Hélio Costa, além de vários Deputados federais e muitos outros brasileiros. Na oportunidade, sentimos orgulho de ser brasileiro ao assistir à condecoração de Maurílio Biaggi, produtor de açúcar e de álcool, representante da Coca-Cola em boa parte do território brasileiro, além de ter outras atividades em que lidera. Ficamos muito orgulhosos de ver como o Brasil brilha nessa área.

No dia seguinte, Sr. Presidente, quarta-feira, seguimos para Washington, onde participamos de importante reunião de trabalho na CFTC, que é o órgão regulador do mercado de Commodities e seus derivativos. O equivalente brasileiro da CFTC é a nossa CVM. Quero registrar, Sr. Presidente, que a CFTC norte-americana é regida por uma lei votada e periodicamente atualizada pelo Senado norte-americano e balizada pelo interesse da Casa Branca e do Congresso norte-americano em fomentar o desenvolvimento dos mercados de commodities nos Estados Unidos quase em status de segurança nacional. Essa lei considera de alta importância a fixação de preços nas bolsas norte-americanas. A CFTC tem, além do seu papel regulador, um papel de fomentador do mercado. Precisamos alertar a nossa CVM sobre a importância do fomento do mercado.

Na mesma quarta-feira, participamos de uma reunião com a FIA e de um jantar na Embaixada brasileira, promovido pelo Embaixador Rubens Barbosa, ao qual estiveram presentes também o ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso e o ex-Ministro José Serra.

Quero destacar os encontros que mantivemos na quinta-feira no comitê de agricultura do Congresso norte-americano, onde fomos recebidos na Divisão de Gerenciamento de Risco e Atividades Rurais. Uma vez mais, pudemos conferir como estão bem municiados os parlamentares norte-americanos com respeito à política agrícola daquele país e quão diferente da nossa é a visão que eles têm de proteger os seus fazendeiros. Se quisermos melhorar a nossa situação e chegar à Alca de forma conclusiva e mutuamente favorável, precisamos abrir um caminho de bom entendimento entre o Legislativo e o Executivo, com a participação de órgãos interessados no setor. Ao visitar o Banco Mundial, conferimos a tendência das instituições multilaterais de crédito para um enfoque global dos problemas das economias emergentes. Esse enfoque global pode ser mais bem balizado se tivermos uma atitude ativa, e não passiva, apenas reclamando das delegações que, partindo de Washington, vêm nos visitar.

Devo declarar que fomos recebidos, no Banco Mundial, pelo eminente brasileiro Amauri Bier, que recentemente deixou o Ministério da Fazenda aqui, no Brasil.

Chegamos a Chicago na sexta-feira, 31 de outubro, onde visitamos diversas entidades mercantis que operam no mercado de bolsas. Quero destacar, a propósito, a importância da auto-regulação nos mercados de commodities. Os mercados de derivativos giram valores trilionários no mundo. Para tanto, requerem proteção jurídica espelhada nas leis a eles especificamente destinadas. Dentro dessa moldura de certeza jurídica, a Bolsa de Mercadorias & Futuros do Brasil poderá exercer a auto-regulação indispensável ao setor, pois dispõe de meio de controle rápido, sem que o mercado fique engessado.

Para finalizar, Sr. Presidente, quero reiterar a importância de fixarmos uma agenda para o setor financeiro, a qual não se detenha apenas em detalhar as ações, mas em cumpri-las. Os detalhes são, com certeza, importantes, tais como o nível das taxas de juros ou os spreads entre transações, mas tudo isso pode ser muito mais bem focalizado se tivermos uma visão global do mercado financeiro e não apenas dos detalhes.

Com muito prazer, concedo o aparte ao eminente Senador Juvêncio da Fonseca, de Mato Grosso do Sul.

O Sr. Juvêncio da Fonseca (PDT - MS) - Senador Jonas Pinheiro, V. Exª é um dos Parlamentares brasileiros que mais conhecem a questão da agricultura e da pecuária do nosso País. O agronegócio tem em V. Exª uma grande bandeira. Essa viagem que V. Exª fez aos Estados Unidos com outros Parlamentares do Senado e da Câmara dos Deputados bem demonstra que o Parlamento brasileiro está presente nesse processo de crescimento da agricultura e da pecuária brasileira. Somos hoje uma força imensurável no agronegócio. Ele oferece ao Brasil quase a metade dos empregos à disposição do nosso povo e quase a metade do nosso PIB. Enfim, a atividade rural do País sustenta a Nação brasileira. Por isso é tão importante que os Parlamentares brasileiros tomem consciência, como V. Exª já o fez há muito tempo, de que precisamos defender intransigentemente nossos brasileiros nessa área. O Brasil, na liderança do agronegócio, tem pela frente longo caminho a ser percorrido, caminho de redenção, caminho de liberdade, caminho de autonomia econômica, que pode perfeitamente fazer com que o Brasil exerça mais plenamente sua soberania política. Portanto, a viagem dos Parlamentares, muitas vezes criticadas, mostra que o Congresso Nacional, por meio dos bons Parlamentares, como V. Exª, presta grande serviço a toda a Nação. Veja V. Exª - se ainda me permite um tempo -, acabamos de receber uma comitiva da China, que esteve aqui há poucos minutos. Ela vem ao Brasil em virtude dos interesses chineses de busca de negócios principalmente na área da agricultura brasileira. Portanto, para estarmos com toda essa frente de trabalho aberta, basta que todos, juntos, tenhamos consciência da necessidade de um trabalho de proteção aos nossos produtores e também a noção de que precisamos defender - Senador Jonas Pinheiro, estou alongando meu aparte um pouco mais por V. Exª estar ao final de seu discurso - a nossa soja, principalmente neste momento de terrível campanha contra a soja transgênica. Parece que querem que todos os países do Primeiro Mundo avancem cada vez mais na conquista do mercado internacional e que o Brasil não tenha condições para esse avanço, tecnológica e cientificamente falando. O americano pode, por meio de sua Academia de Ciências, que diz sim, consumir e vender a soja. São 40 milhões de hectares, 39 milhões de toneladas de soja transgênica, produzida e vendida para todo o mundo. Não faz mal e não mata ninguém. O meio ambiente é plenamente preservado. No entanto, no Brasil, temos enorme dificuldade, nessa área da ciência e tecnologia, de nos afirmarmos diante de um produto já testado internacionalmente. É uma proposta, às vezes, de exclusão do Brasil do mundo científico. Querem excluir o País da área da tecnologia. V. Exª contribui muito com sua postura, sua iniciativa e com essa comitiva que foi aos Estados Unidos e, certamente, disse, em alto e bom som, que o Brasil está preparado para enfrentar essa terrível luta do agronegócio no mundo inteiro. Temos condições, sim, mais do que qualquer outra nação, de avançarmos, progredindo e produzindo mais alimentos para todo o mundo. É isso que o povo e a Nação esperam de nós, Parlamentares conscientes dos problemas e da grande missão que temos que cumprir no Parlamento brasileiro. Parabéns pelo trabalho, Senador Jonas Pinheiro.

O SR. JONAS PINHEIRO (PFL - MT) - Muito obrigado, eminente Senador Juvêncio da Fonseca.

Sr. Presidente, concluirei relatando apenas um episódio que tivemos no Congresso americano. Os Parlamentares americanos que foram discutir conosco quiseram saber qual a razão pela qual o Brasil tinha aumentado tanto sua produção de soja, porque os americanos, que produziam 82 milhões de toneladas, caíram para 67 milhões, e o Brasil, que produzia 30 milhões de toneladas, passou para 58 milhões de toneladas de grãos. Perguntaram qual a razão do aumento da produção de soja. Falamos, então, da interiorização da agricultura, do agronegócio brasileiro. O Brasil deixou de olhar apenas para o litoral e passou a interiorizar sua produção. É o seu Piauí, Sr. Presidente, que está ajudando nessa parcela, assim como Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Rondônia, Goiás, todos esses Estados que hoje recebem a alta tecnologia de um país e de produtores sofridos como os brasileiros.

Os americanos, de tanto receber subsídios, estão com a sua biotecnologia lá embaixo, sem poder concorrer com o Brasil e ainda sem transgênicos. Na hora em que tivermos os transgênicos legalizados, com possibilidade de avançarmos na nossa produção, na nossa produtividade, com certeza, o Brasil será muito mais respeitado.

Outro fato sobre o qual quero falar e para o qual peço mais um minuto. Os Parlamentares americanos não sabiam que eu e o Deputado Antonio Carlos Mendes Thame tínhamos participado do debate em Cancún e quiseram saber por que o Brasil trancara a Rodada de Cancún. Nós dissemos que não foi o Brasil que a trancou. A Rodada de Cancún era, como já havíamos dito, continuidade da Rodada de Doha, no Katar, que ocorrera há dois anos.

Portanto, o Brasil liderou um grupo de países que se preparou para a discussão em Cancún como continuidade da discussão de Doha. Quando lá chegamos, os americanos e os europeus não quiseram discutir nem Doha nem Cancún. Eles queriam, isto sim, discutir Cingapura, que não tinha nada a ver com a discussão para a qual o Brasil havia se preparado.

            Com isso, Sr. Presidente, concluo o meu discurso dizendo que a visita aos Estados Unidos nos mostrou claramente essa necessidade de propormos, e é o que fazemos, a esta nobre Casa continuar a discutir os assuntos de real interesse da nossa Pátria.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/11/2003 - Página 36034