Discurso durante a 161ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Defesa de um novo marco legal e institucional para o setor de transportes brasileiro. Apoio à expansão das ferrovias no País.

Autor
João Ribeiro (PFL - Partido da Frente Liberal/TO)
Nome completo: João Batista de Jesus Ribeiro
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DE TRANSPORTES.:
  • Defesa de um novo marco legal e institucional para o setor de transportes brasileiro. Apoio à expansão das ferrovias no País.
Publicação
Publicação no DSF de 13/11/2003 - Página 36807
Assunto
Outros > POLITICA DE TRANSPORTES.
Indexação
  • ANALISE, CRISE, TRANSPORTE DE CARGA, BRASIL, AUSENCIA, PRIORIDADE, INVESTIMENTO, AMPLIAÇÃO, SISTEMA, TRANSPORTE FERROVIARIO, INCAPACIDADE, PRECARIEDADE, SISTEMA RODOVIARIO NACIONAL, ABSORÇÃO, DEMANDA, TRANSPORTE TERRESTRE, PAIS.
  • COMENTARIO, DADOS, MELHORIA, TRANSPORTE FERROVIARIO, POSTERIORIDADE, PRIVATIZAÇÃO, FERROVIA.
  • NECESSIDADE, GOVERNO FEDERAL, DESTINAÇÃO, RECURSOS FINANCEIROS, URGENCIA, IMPLEMENTAÇÃO, PROGRAMA, REVIGORAÇÃO, FERROVIA, VIABILIDADE, INTEGRAÇÃO, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, REDUÇÃO, CUSTO, TRANSPORTE, PRODUÇÃO, PAIS.

O SR. JOÃO RIBEIRO (PFL - TO. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, se existe uma afirmação que já se incorporou à lista de lugares-comuns da política e da administração pública no Brasil é a de que precisamos dar prioridade ao transporte ferroviário.

Uma afirmação, sabemos todos, sempre acompanhada da série de argumentos que justificariam tal atitude: os benefícios econômicos; os benefícios em termos de consumo de energia; os benefícios ao meio ambiente.

Não obstante, entra ano, sai ano, e a matriz do transporte em nosso País, em especial o de carga, continua a privilegiar o modo rodoviário em detrimento dos demais.

A tal ponto que, enquanto nos países desenvolvidos as ferrovias transportam 40% das cargas, e as rodovias ficam com 30%, aqui o modo ferroviário é responsável por menos de 20% da carga transportada, contra mais de 60% das rodovias. E, se considerarmos os produtos e insumos de maior valor agregado, a repartição modal é ainda mais ingrata: 7% nas ferrovias, 91% nas rodovias.

As conseqüências são conhecidas. Sobrecarregadas, as rodovias se deterioram a olhos vistos, causam desperdícios, interferem de forma cruel no valor dos fretes e aumentam sensivelmente os preços de nossos produtos que, por isso, perdem inclusive competitividade no mercado mundial.

Enquanto isso, o setor ferroviário luta bravamente para dar conta de uma demanda que, de forma natural, já lhe deveria pertencer.

Nas últimas semanas, revistas especializadas têm apontado um gargalo que, se não for corajosamente enfrentado, trará sérios problemas a nossa economia. A exportação de minério e de produtos agropecuários, em especial a soja, está prestes a dar um salto significativo, e depende dramaticamente das ferrovias. De modo que, em poucos meses, por exemplo, somente a Companhia Vale do Rio Doce se viu obrigada a, quase de afogadilho, encomendar a fabricação de 1.200 vagões.

Essa encomenda, vejam bem, é mais do que toda a produção nacional dos últimos cinco anos.

Mas será que precisávamos chegar a esse ponto, de incrementar a produção ferroviária quase às pressas, sob a pressão de uma demanda inesperada?

Na verdade, o que nos tem faltado, ao longo de décadas, é a combinação de planejamento com vontade política.

Temos uma malha implantada, em sua maior parte, ainda no final do século XIX e início do século XX. Trabalho feito com a maioria de capitais privados, mas que paulatinamente foi passando ao controle público, num processo que culminou com a criação da Rede Ferroviária Federal, em 1957; e que foi novamente revertido na década de 90, com a concessão das malhas regionais à iniciativa privada.

O problema, porém, é que, nesse vasto período em que administrou o sistema ferroviário, o poder público não foi capaz de dar-lhe a atenção devida, seja em investimentos, seja, até, de mera capacidade gerencial.

Quanto aos investimentos, basta notar que as características gerais da malha ferroviária brasileira continuam, hoje, praticamente as mesmas de um século atrás. Alguns dados, nesse sentido, são significativos:

·     o traçado das linhas é, em média, 30% mais longo que o das rodovias;

·     a velocidade média dos trens mal passa dos 20 quilômetros por hora, quando nos Estados Unidos, por exemplo, é de 80 quilômetros por hora; e

·     os terminais continuam, em sua maior parte, sem condições de receber, armazenar e distribuir produtos com celeridade e segurança.

            Quanto à capacidade gerencial, o processo de concessão das malhas é ilustrativo. O que tivemos, por exemplo, nas áreas de energia elétrica e de telecomunicações? Uma ação planejada, em que agências reguladoras previamente criadas conceberam a melhor forma de se conceder ou permitir os serviços.

No transporte ferroviário ocorreu exatamente o contrário. A Agência Nacional de Transportes Terrestres só foi criada, em junho de 2001, depois que as malhas já tinham sido concedidas à iniciativa privada, ainda na década de 90, ou seja, a questão institucional e organizacional foi tratada depois de feitas as privatizações. Isso, evidentemente, exigiu das concessionárias um esforço adicional de ajuste às novas condições de operação, resultantes da entrada em cena do ente regulador.

De qualquer forma, improvisado ou não, o fato é que o processo de devolução do setor ferroviário à iniciativa privada tem se mostrado, no fim das contas, bem-sucedido.

Afinal, se compararmos o desempenho das concessionárias com aquele do período de operação estatal, veremos que, nesses pouco mais de cinco anos, todos os indicadores melhoraram:

·     a produção de transporte, medida em toneladas vezes quilômetros úteis, aumentou 70%; o número de locomotivas em tráfego aumentou 50%;

·     o consumo de combustível por tonelada vezes quilômetro útil foi reduzido em 10%;

·     o número total de acidentes diminuiu 40%; e

·     a tarifa média cobrada dos usuários foi reduzida em 30%.

Tudo isso significa que as concessionárias têm cumprido seu papel e o que importa, agora, é mobilizar o setor público para que também faça sua parte.

Quando cito o setor público não estou falando apenas do Poder Executivo. Vejamos, pois , a tramitação na Câmara dos Deputados do Projeto de Lei nº 1.494, de 1999, que pretendia consolidar a legislação que dispõe sobre os princípios e as diretrizes para o Sistema Nacional de Viação.

Recebido em 11 de agosto de 1999, o projeto circulou pelo Grupo de Trabalho de Consolidação das Leis, pela Comissão de Constituição e Justiça e de Redação e pela Coordenação de Comissões Permanentes, onde acabou arquivado em maio deste ano. Ou seja, perdemos quatro preciosos anos, em cujo decorrer poderíamos ter chegado a um novo marco legal e institucional para o setor de transportes brasileiro.

Esse fato, em si, mostra que é imperioso tratar com muita urgência o assunto, retomando-o, imediatamente, no âmbito do legislativo. Do mesmo modo é preciso tratar agora com a devida ênfase, ainda que com atraso secular, de uma iniciativa que cabe, antes de tudo, ao Poder Executivo. Refiro-me à destinação de maciços recursos ao setor ferroviário.

Já temos, nesse sentido, um Programa de Revitalização das Ferrovias, lançado pela Agência Nacional de Transportes Terrestres em maio deste ano. Um programa que, acertadamente, propõe um modelo de transporte baseado em corredores ferroviários de exportação, ligados aos principais portos; e que, também acertadamente, procura introduzir nos contratos de concessão as modificações que se mostram necessárias após esses anos de operação privada do sistema.

A questão, porém, é que planos desse tipo já tivemos muitos. O que precisamos agora é de ação. É preciso que o Governo Federal demonstre, na prática, a vontade política de dar prioridade às ferrovias; a vontade de acionar, com firmeza e determinação, um mutirão de expansão e modernização de nosso sistema ferroviário. Seja com a alocação de recursos próprios, e para isso temos os recursos da Contribuição de Intervenção de Domínio Econômico, a CIDE, seja pelo oferecimento, aos investidores privados, de condições especiais de financiamento e, neste capítulo como não poderia deixar de ser fica com a palavra o BNDES que, além da sua finalidade institucional ligada ao desenvolvimento, tem recursos de monta para essa iniciativa.

Para essa retomada, temos um projeto emblemático: a Ferrovia Norte-Sul. Que símbolo maior poderíamos adotar, como a conclusão de obra tão essencial, para sinalizar que as ferrovias voltam a ser prioritárias no Brasil?

Uma grandiosa obra ferroviária que, conectando as regiões Norte e Nordeste às regiões Sul e Sudeste, por meio das Estradas de Ferro Carajás, Centro-Atlântica, Ferroban e Sul-Atlântica:

·     promove a integração nacional e regional;

·     estimula o desenvolvimento sustentável do Brasil Central;

·     reduz custos logísticos e impactos ambientais; e que

·     quando concluída, transportará anualmente doze milhões e meio de toneladas de carga, levando minérios, produtos agrícolas e florestais no sentido norte-sul e combustíveis, fertilizantes e carga em geral no sentido sul-norte.

            Obra que ouso dizer, tem para nosso País, em termos sociais, econômicos e geopolíticos, importância semelhante à da transferência da Capital da República para o Planalto Central.

Finalmente, quero deixar patente meu apoio à priorização da expansão das ferrovias no Brasil, sabendo que tal acontecimento tem que ser traduzido por uma série de medidas que vão da oferta de linhas de crédito específicas para os investidores tratarem, por exemplo os mais de 10.000 cruzamentos das linhas férreas com rodovias, ruas e avenidas às ações regulamentares que facilitem o transporte multimodal.

Isso tudo, com certeza, implica a aprovação de uma lei que consolide os princípios e diretrizes para o Sistema Nacional de Viação e o conseqüente e necessário investimento público.

Essa parte, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores é de nossa inteira responsabilidade.

Era o que tinha a dizer.

Obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/11/2003 - Página 36807