Discurso durante a 166ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações acerca da criação de novos estados e municípios.

Autor
Sibá Machado (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Sebastião Machado Oliveira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. DIVISÃO TERRITORIAL.:
  • Considerações acerca da criação de novos estados e municípios.
Aparteantes
Ana Júlia Carepa, José Maranhão.
Publicação
Publicação no DSF de 20/11/2003 - Página 38051
Assunto
Outros > HOMENAGEM. DIVISÃO TERRITORIAL.
Indexação
  • HOMENAGEM, CENTENARIO, ASSINATURA, TRATADO, REGIÃO, ESTADO DO ACRE (AC), ELOGIO, PROGRAMAÇÃO, GOVERNO ESTADUAL.
  • REFERENCIA, DEBATE, SENADO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, ALTERAÇÃO, ARTIGO, DETERMINAÇÃO, CRITERIOS, CRIAÇÃO, ESTADOS, MUNICIPIOS, DEFESA, DESCENTRALIZAÇÃO, ATENÇÃO, GOVERNO FEDERAL, COMBATE, DESIGUALDADE REGIONAL, DESENVOLVIMENTO, OCUPAÇÃO, INTERIOR.
  • COMENTARIO, FALTA, APOIO, CRIAÇÃO, EFEITO, MULTIPLICAÇÃO, MUNICIPIOS, ESPECIFICAÇÃO, ANTERIORIDADE, ALTERAÇÃO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, RETIRADA, BENEFICIO, EXCLUSIVIDADE, RECURSOS, FUNDO DE PARTICIPAÇÃO DOS MUNICIPIOS (FPM), MANUTENÇÃO, RECEITA, ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL.
  • ESCLARECIMENTOS, APRESENTAÇÃO, PROJETO DE LEI COMPLEMENTAR (PLP), AUTORIA, ORADOR, AUMENTO, CRITERIOS, CRIAÇÃO, MUNICIPIOS, CONTENÇÃO, INJUSTIÇA, DISTRIBUIÇÃO, BENEFICIO, ESPECIFICAÇÃO, LIMITAÇÃO, NUMERO, HABITANTE, EXISTENCIA, NUCLEO URBANO, ANALISE, VIABILIDADE, SITUAÇÃO, RECEITA, EQUILIBRIO ECOLOGICO.
  • REGISTRO, EXPERIENCIA, ESTADO DO ACRE (AC), DEFESA, REALIZAÇÃO, ACORDO, GOVERNO ESTADUAL, GOVERNO FEDERAL, ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL, DEFINIÇÃO, PRIORIDADE, DESTINAÇÃO, INVESTIMENTO, CRIAÇÃO, EMPRESA, RENDA, AUTONOMIA, MUNICIPIOS.

O SR. SIBÁ MACHADO (Bloco/PT - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, quero relatar um pouco das atividades deste final de semana no Estado do Acre, quando das comemorações dos cem anos do Tratado de Petrópolis.

Estão de parabéns o Governador Jorge Viana e toda a sua equipe pela brilhante programação, que nos emocionou do primeiro ao último minuto. Houve uma missa de ação de graças no domingo à noite e, na segunda-feira, dia 17, houve o lançamento do livro do Professor Valdir Calixto, que trata da história da revolução acreana, lançado especialmente para a data. Em seguida, houve a solenidade de entrega do símbolo da revolução, que é a espada do líder Plácido de Castro. Cem pessoas foram homenageadas.

O SR. PRESIDENTE (Romeu Tuma) - Senador Sibá Machado, peço licença para interromper o pronunciamento de V. Exª, a fim de saudar os universitários da Faculdade Anhembi Morumbi, de São Paulo, e do Centro Universitário Feevale, do Rio Grande do Sul. É um prazer recebê-los em nosso plenário, em nossas homenagens.

Peço-lhe desculpas, Senador Sibá Machado.

V. Exª continua com a palavra.

O SR. SIBÁ MACHADO (Bloco/PT - AC) - Para nós é uma honra e uma satisfação contar com a presença dos universitários no plenário do Senado Federal neste momento.

Sr. Presidente, o assunto que me traz à tribuna hoje é o debate que se trava nesta Casa a respeito da possível modificação do § 4º do art. 18 da Constituição Federal, que trata das normas para criação de novos Estados e Municípios. Pedimos a colaboração de alguns colegas para abordar com maior profundidade o assunto. Estou cada vez mais convencido de que devemos ter muito cuidado, a fim de evitar a proliferação de municípios, o que a realidade brasileira não permite. Observei, desde a minha chegada a esta Casa, que tramitam aqui três PECs que tratam da mudança do § 4º do art. 18 da Constituição. Analisei atentamente as idéias apresentadas. Penso que os Senadores que apresentam essas sugestões estão convencidos da necessidade de o Brasil descentralizar suas atenções. Esse é o espírito que mobiliza essas proposições no afã de garantir mais igualdade regional, nos Estados e nos Municípios, garantir a interiorização do desenvolvimento e defender o Estado brasileiro por meio da ocupação. Uma das regras dos portugueses nos idos das grandes navegações foi estabelecida no chamado tratado uti possidetis, ou seja, é dono aquele que ocupa. A medida visa também democratizar as oportunidades políticas, fazendo com que mais pessoas da sociedade tenham oportunidade de expor suas idéias e suas convicções.

            Acredito que são esses os grandes eixos que mobilizam o espírito que rege esta Casa, no sentido de modificar o § 4º do art. 18 da Constituição Federal. Porém, nos estudos que fizemos, observamos que há alguns sérios problemas a serem analisados no conjunto dessas idéias. Primeiro, Sr. Presidente, diz o texto que “a proliferação de pequenos municípios é, dessa forma, muito acentuada no País e em várias regiões. Na verdade, como pode ser estimado a partir de dados publicados pelo IBGE, de 1940 a 1997, a proporção de municípios até 20 mil habitantes sobre o total de municípios existentes no Brasil saltou de 54,5% para 74,8%. O crescimento foi ainda mais espetacular na classe dos micromunicípios. Considerados isoladamente, seu número passou de 2% para 25,6% do total de municípios brasileiros”.

Fica, portanto, evidente que criar municípios tem significado no Brasil, antes de tudo, multiplicar o número de pequenos municípios e, ainda mais, dos micromunicípios.

Depois, há o problema das receitas. Muitos pequenos municípios foram criados recentemente, desde a regionalização de 1992. Isso provocou a mudança da Constituição, que praticamente retirou qualquer possibilidade de criação de municípios desse tipo, que passam a viver exclusivamente dos repasses do Governo Federal por meio do Fundo de Participação dos Municípios. Eles têm contribuição praticamente zero do Imposto de Renda e de outros impostos que compõem o FPM.

A Srª Ana Júlia Carepa (Bloco/PT - PA) - Senador Sibá Machado, V. Exª me concede um aparte?

O SR. SIBÁ MACHADO (Bloco/PT - AC) - Concedo, com muito prazer, um aparte à nobre Senadora Ana Júlia Carepa.

A Srª Ana Júlia Carepa (Bloco/PT - PA) - Quero parabenizar V. Exª pela preocupação e lembrá-lo de que tramitava na Casa um projeto que tratava dessa matéria, mas a sensibilidade do Senador Sérgio Zambiasi o fez retirá-lo. É necessário estabelecer que, antes de criar um município, é preciso certificar-se de que ele tem condições mínimas de sustentabilidade. Muitas vezes se vende a ilusão de que, criando um município, a população daquela localidade terá melhores condições de vida. Ora, se hoje os municípios, principalmente os pequenos, pouco arrecadam - essa é a verdade -, como alimentar em uma comunidade a ilusão de que haverá melhorias? Na verdade, vai se pegar o bolo e dividi-lo entre mais municípios, com uma agravante: haverá mais despesas, porque será criada uma prefeitura e uma câmara municipal com, no mínimo, nove vereadores. É óbvio que existem lugares onde isso é positivo, porque dinamiza a economia e gera mais emprego. Mas, na maioria das vezes, segundo a história de criação de municípios, isso não ocorre. É preciso haver mecanismos que só permitam a criação de municípios se ficar provado que aquela localidade, no mínimo, tem condições de custeio. Caso contrário, aumentará o número de municípios dependentes, cujos habitantes, carentes, não terão as condições mínimas de vida. Tudo isso sem falar na sangria provocada pelos desvios. Há pouco conversava com o Superintendente da Funasa no Pará, meu Estado. S. Sª se dizia preocupadíssimo com a perspectiva de o Estado do Pará perder recursos provenientes do Projeto Alvorada pela falta de prestação de contas, tanto por parte do Governo do Estado quanto por parte dos municípios. Falo de municípios que receberam recursos. O Município de Santa Bárbara, segundo o Dr. Giovanni Queiroz, Superintendente da Funasa, recebeu mais de um milhão de reais. De novembro do ano passado até novembro de 2003 a obra sequer começou. Além de tudo, nos municípios pequenos há dificuldades para a organização da sociedade, tendo em vista o controle e a fiscalização. Por vezes, eles acabam enfrentando dificuldades. Devemos dispor de mecanismos que assegurem a criação de municípios economicamente saudáveis que favoreçam o desenvolvimento, a geração de empregos e a distribuição de renda. Assim, serão importantes. Não sendo dessa forma, a criação de novos municípios irá aprofundar os problemas porque será dividido ainda mais um bolo que já é muito pequeno para tantos.

O SR. SIBÁ MACHADO (Bloco/PT - AC) - Senadora Ana Júlia, faço minhas as palavras de V. Exª, pois creio que complementam muito bem o meu pensamento. V. Exª traz uma riqueza em informações. Realmente, entendo que houve injustiça para com muitos Municípios a partir da criação de novos Municípios na sua base. Não se implementou nenhuma novidade no novo Município criado e, sim, uma ilusão para a população.

Por outro lado, aproveitando-me da observação de V. Exª, quero dizer que ocorreram algumas injustiças. Observo, em Ponta do Abunã, divisa do Acre com Rondônia, que as Vilas Extrema e Califórnia têm todas as condições - julgadas inclusive pelo Banco da Amazônia - de se transformarem em Municípios. Têm know-how, capacidade, infra-estrutura, população, produção, circulação financeira, mas são dependentes da cidade de Porto Velho. A mesma coisa ocorre, no Estado do Acre, com a Vila Campinas, que hoje tem uma movimentação, senão maior, pelo menos igual ao seu Município sede, que é Plácido de Castro.

Sr. Presidente, gostaríamos de propor a correção dessas injustiças.

Antes de mais nada, lembro ao Senado Federal que encaminhei uma proposta de lei, pois entendo que o art. 18, § 4º, da Constituição está correto em sua redação e em seu entendimento. É preciso que façamos o que diz a lei: que apresentemos uma lei complementar. É nesse sentido que proponho ao Senado essa lei. É uma sugestão nossa. O grande eixo de nossa proposição é o estudo de viabilidade. Neste estudo queremos apresentar cinco pontos que, com certeza, poderão ser acrescidos pelos demais colegas Senadores. O primeiro ponto trata da população mínima de 3 mil pessoas para se criar um novo Município, aqui sugerido. O segundo, de existir na localidade um centro urbano já constituído. O terceiro, uma estimativa de receita compatível com a execução das funções típicas da administração municipal. O quarto, a delimitação do perímetro urbano e da zona rural. E, por último, a questão do meio ambiente ecologicamente equilibrado. Por que dizemos isso? Nos reunimos com os Prefeitos do Acre para lhes dizer que, com os parcos recursos que entram nesses Municípios, não dá para cada Prefeitura fazer o que ela considera mais importante. É preciso haver um acordo entre Governo do Estado, Prefeituras, Bancadas Partidárias e todos os outros “atores” para verem onde serão aplicados. Isso não vale apenas para as Prefeituras, mas também para o Governo do Estado. A partir desse acordo inédito no Estado do Acre, houve o entendimento da bancada - já concederei um aparte ao nobre Senador José Maranhão - no que diz respeito à questão do saneamento ambiental que vai estar na pauta. Para nossa desagradável surpresa, a maioria dos Municípios transforma, imediatamente, aquele pequeno córrego que passa pelas cidades em seu esgoto principal, criando o seu “tietezinho” particular.

São as preocupações que tenho.

O SR. PRESIDENTE (Romeu Tuma) - Senador Siba, V. Exª pediu-me que o avisasse nos quinze minutos.

O SR. SIBÁ MACHADO (Bloco/PT - AC) - Agradeço a V. Exª, Sr. Presidente.

Ouço o Senador José Maranhão.

O Sr. José Maranhão (PMDB - PB) - Procurarei ser breve, considerando que V. Exª já foi advertido pela nossa Presidência, por sinal rigorosíssima no cumprimento do Regimento, é verdade.

O SR. PRESIDENTE (Romeu Tuma) - Pediu-me o nobre Senador Sibá Machado que o avisasse quando S. Exª passasse dos quinze minutos.

O Sr. José Maranhão (PMDB - PB) - Exatamente. E o Regimento estabelece prazos - evidente - em proveito de todos. O assunto que V. Exª está abordando é da maior oportunidade. Sou de um Estado onde proliferou a criação de novos Municípios. A Paraíba é um Estado que tem um território pequeno e tem 223 Municípios. Há Municípios que vivem - e é a grande maioria dos novos - exclusivamente da cota do Fundo de Participação dos Municípios. Hoje os Prefeitos estão vivendo uma verdadeira tragédia, porque, afora essa receita, não há nenhuma outra. Por outro lado, há casos de Municípios que têm todas as condições para aspirarem a sua emancipação e que vêem isso ser sempre retardado, postergado. Daí por que digo que é oportuna a iniciativa de V. Exª em estabelecer na lei princípios rígidos para a criação dos Municípios. Felicito V. Exª por essa nobre iniciativa.

O SR. SIBÁ MACHADO (Bloco/PT - AC) - Agradeço-lhe, Senador José Maranhão. Aliás, gostaria que o aparte de V. Exª constasse do meu discurso.

Realmente, Senador, penso que essa é uma idéia para aperfeiçoamento. Com certeza, o Senado Federal está devendo essa resposta a todos os Municípios brasileiros, e muito mais àquelas comunidades que hoje estão - digamos assim - prejudicadas pelo que ocorreu em 1992.

Sr. Presidente, hoje estamos com 5.507 Municípios. Tentei fazer as contas do número de Vereadores - mas isso não foi possível -, Prefeitos, Vice-Prefeitos, Secretários Municipais e tantas outras coisas.

O que houve foi uma brutal inversão nas prioridades dos investimentos. A atividade-fim nunca é considerada. Vemos a maioria desses micromunicípios, Sr. Presidente, com extrema dificuldade, aliás, diria impossibilidade de gerar receitas próprias, de obter a receita do IPTU, de gerar renda e, principalmente, não conseguem trabalhar a infra-estrutura de produção ou mesmo mobilizar o seu setor produtivo.

Portanto, o PIB e a receita local são expressões que não constam dos dicionários desses Municípios.

Diante da iminência do encerramento do tempo de que disponho, gostaria de fazer a minha proposição, o mais rápido possível, e espero contar com a colaboração de V. Exªs para que possamos avançar nessa discussão e dar uma resposta salutar ao Estado brasileiro.

Como bem disse a Senadora Ana Júlia Carepa, estamos, cada vez mais, com dificuldades orçamentárias, tanto no âmbito internacional quanto no nacional. Todos os Estados estão em dificuldades. Inclusive brinquei com alguns Senadores de Minas Gerais, dizendo-lhes que se cada um de S. Exªs tivesse de fazer campanha eleitoral em cada Município do Estado, que tem mais de 800, precisariam de mais de 800 dias. Portanto, levariam cerca de quase três anos para complementar a empreitada. Realmente isso não nos traz contribuição alguma, porque não foi feito dentro dos propósitos inicialmente abordados por mim. Acredito que, de fato, está na hora de o Brasil viver um momento novo.

Era o que eu tinha a dizer. E espero ter contribuído com o meu grande companheiro e Senador Paulo Paim.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/11/2003 - Página 38051