Discurso durante a 167ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Viagem do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva à África.

Autor
Ney Suassuna (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Ney Robinson Suassuna
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA.:
  • Viagem do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva à África.
Publicação
Publicação no DSF de 21/11/2003 - Página 38300
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • ELOGIO, ATUAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, VIAGEM, CONTINENTE, AFRICA, IMPORTANCIA, POLITICA EXTERNA, APROXIMAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, TERCEIRO MUNDO, BENEFICIO, INTERCAMBIO, ECONOMIA, FAVORECIMENTO, BRASIL, POLITICA INTERNACIONAL.
  • CRITICA, GOVERNO, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, DESATIVAÇÃO, EMBAIXADA DO BRASIL, PAIS ESTRANGEIRO, AFRICA.
  • DENUNCIA, FALTA, ATENÇÃO, SISTEMA, EDUCAÇÃO, CULTURA AFRO-BRASILEIRA.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PI. Sem apanhamento taquigráfico.) Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, muitas vezes, o anedótico acaba sendo mais valorizado que o essencial.

Isso, em minha opinião, foi o que ocorreu na recente viagem do Presidente Lula a cinco países da África: São Tomé e Príncipe, Angola, Moçambique, Namíbia e África do Sul.

Deu-se amplo destaque, principalmente na mídia, a uma declaração isolada, quando havia algo muito mais importante a ser ressaltado: o caráter histórico e emblemático da viagem.

Não é fácil, Sr. Presidente, registrar alguma ação relevante dos governos brasileiros, no que diz respeito ao continente africano, nos últimos vinte anos.

Na verdade, ao longo de nossa História, houve somente dois momentos em que buscamos uma aproximação construtiva com a África: durante os governos Jânio Quadros e João Goulart, no início dos anos 60, com a política externa independente; e durante os governos Geisel e Figueiredo, na segunda metade da década de 70 e na primeira metade da década de 80, com o pragmatismo responsável.

No mais, Srªs e Srs. Senadores, nossa postura em relação à África variou entre a truculência escravagista, somente interrompida, formalmente, quase no final do século XIX, e a indiferença mal disfarçada das últimas décadas.

E os sintomas desse descaso são evidentes.

Há poucos anos, por exemplo, o Ministério das Relações Exteriores desativou as embaixadas brasileiras em Camarões, no Congo, no Togo, na Tanzânia e em Zâmbia. Alegaram-se, vejam bem, restrições orçamentárias. Ora, Sr. Presidente. Um país que, somente no ano passado, torrou 74 bilhões de reais com o pagamento dos juros nominais de sua dívida pública não poderia alegar que não tem recursos para manter uma embaixada, modesta que seja, em países como o Congo ou Camarões.

O descaso também está presente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, no próprio sistema educacional de nosso País, que nunca valorizou de forma efetiva nossas raízes africanas, apesar do sangue negro que seguramente vamos encontrar na maior parte de nossa população.

E talvez haja grande correlação entre esse desprezo do Brasil por suas origens negras e a posição secundária a que são relegados os afrodescendentes em nossa sociedade.

Por tudo isso, há que se dar o devido reconhecimento à viagem do Presidente Lula.

Antes de mais nada, ela teve um aspecto simbólico. Os brasileiros, que há séculos deram as costas para o continente africano - exceto para, com a maior das crueldades, ali buscar a força de trabalho escrava -, buscam estreitar os laços sentimentais com seus antepassados; buscam resgatar todo um painel de valores sociais e culturais a que estão umbilicalmente ligados.

Mas é claro, Sr. Presidente, que a viagem teve também um aspecto pragmático, em que se destacaram objetivos geopolíticos e econômicos.

Quanto aos primeiros, nunca é demais ressaltar a importância de uma relação estratégica do Brasil com as nações periféricas à América do Norte e à Comunidade Européia, principalmente neste momento em que a África e a América Latina pleiteiam, para seus países, vagas de membros permanentes no Conselho de Segurança da ONU.

No que concerne aos objetivos econômicos, basta lembrar que o Presidente se fez acompanhar por mais de uma centena de empresários, e por um grande número de ministros. E essa é uma área, sabemos todos, em que há muito a ser feito. Afinal, em 2002, o intercâmbio comercial entre o Brasil e os países africanos não chegou a 5 bilhões de dólares; ou seja, representou menos de 5% de nosso comércio externo. Pois, já nessa viagem, nessa primeira viagem, foram assinados diversos acordos de cooperação econômica, em especial nas áreas de educação, de saúde e de agricultura. 

Ademais, a aproximação econômica com o continente africano é especialmente importante neste momento em que se consolida a NEPAD - a Nova Parceria para o Desenvolvimento Econômico da África - e em que se fala na criação de uma área de livre comércio entre o Mercosul e a União Aduaneira da África Austral.

Em síntese, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, penso que não há como negar a essencialidade desse encontro do Brasil com suas origens. Conforme ressaltou o Presidente Lula, o estreitamento de nossos vínculos com a África “é uma obrigação política, moral e histórica”. E isso porque “a sociedade brasileira foi construída com o trabalho, o suor e o sangue dos africanos”.

Resgatar essa dívida do passado e, ao mesmo tempo, tratar dos interesses geopolíticos e econômicos de nosso País é o melhor que temos a fazer.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/11/2003 - Página 38300