Discurso durante a 169ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Posicionamento contrário à proposta do governo de estabelecer novas alíquotas de Imposto de Renda para o próximo ano, o que elevará a carga tributária para a classe média brasileira.

Autor
José Jorge (PFL - Partido da Frente Liberal/PE)
Nome completo: José Jorge de Vasconcelos Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA FISCAL.:
  • Posicionamento contrário à proposta do governo de estabelecer novas alíquotas de Imposto de Renda para o próximo ano, o que elevará a carga tributária para a classe média brasileira.
Aparteantes
Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 25/11/2003 - Página 38538
Assunto
Outros > POLITICA FISCAL.
Indexação
  • PROTESTO, POSSIBILIDADE, AUMENTO, ALIQUOTA, IMPOSTO DE RENDA, INCOERENCIA, PROPOSTA, GOVERNO FEDERAL, PERIODO, CAMPANHA ELEITORAL, PREJUIZO, CLASSE MEDIA, DIFICULDADE, CRESCIMENTO ECONOMICO, BRASIL.
  • COMENTARIO, APREENSÃO, AUMENTO, IMPOSTOS, ESPECIFICAÇÃO, PROGRAMA DE INTEGRAÇÃO SOCIAL (PIS), CONTRIBUIÇÃO SOCIAL, LUCRO LIQUIDO, DIFICULDADE, CRIAÇÃO, EMPREGO, SONEGAÇÃO FISCAL, PREVISÃO, CRESCIMENTO, ALIQUOTA, CONTRIBUIÇÃO PARA FINANCIAMENTO DA SEGURIDADE SOCIAL (COFINS), CONTRIBUIÇÃO PROVISORIA SOBRE A MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA (CPMF).

O SR. JOSÉ JORGE (PFL - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, gostaria de dar continuidade a um tema que levantei na sexta-feira passada nesta tribuna. Trata-se do aumento da carga tributária para a classe média brasileira. Na realidade, na semana que passou, eu falaria sobre a emenda paralela da Previdência. Então, o tema foi abordado de maneira incompleta.

Mas, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, verificamos, durante todo o fim de semana, que a mídia deu grande destaque às mudanças que a Receita Federal pretende fazer para o Imposto de Renda em 2004. Todas essas mudanças são exatamente no sentido do que vem ocorrendo desde o início deste Governo, aliás desde a transição, ou seja, aumentar a carga tributária. Na realidade, existe sempre o discurso, estilo Robin Hood, que alardeia tirar daqueles que ganham mais para dar àqueles que ganham menos. Na verdade, se analisarmos melhor o que está ocorrendo, verificaremos que se tira dez dos que ganham mais e se dá um aos que ganham menos. A diferença fica na mão da Receita Federal para aumentar ainda mais a carga tributária.

O que ocorre quando se aumenta a carga tributária? O País não cresce. Parece-me que, neste ano, o Brasil crescerá apenas 0,5%, ou seja, menos do que a taxa de natalidade. Com isso, a renda do trabalhador também diminuirá. Esse fato já ocorre há muitos anos, porque a economia está amarrada, com uma alta taxa de juro. Mesmo com a recente diminuição da taxa de juro real do Brasil, ela ainda é uma das mais altas do mundo. Como exemplo, cito o caso dos Estados Unidos, que têm uma taxa de juro bastante baixa, cresceram 7,6% no último trimestre. Imaginem, V. Exªs a economia de um país do tamanho dos Estados Unidos crescer, em um trimestre, 7,6%! No Brasil, há exatamente esse grande aumento de carga tributária a amarrar a economia do País.

Qual é a proposta do novo Imposto de Renda para 2004? Primeiramente, o aumento da alíquota. Atualmente, há três alíquotas: isenção para alguns; 15% para outros; e, a partir do próximo ano, a alíquota de 27,5% talvez passe para 25%. Quando da apreciação do projeto na Câmara dos Deputados, houve um acordo no qual se previa três alíquotas para 2004: 0%, 15% e 25%. Na realidade, o Governo já está propondo 27,5%. Portanto, todas essas pessoas que ganham acima de R$2 mil - e que não são milionárias - pagarão uma alíquota de 27,5%.

Quanto à proposta de correção das faixas do Imposto de Renda, devo lembrar que era uma bandeira histórica do PT corrigi-las anualmente, porque, quando os salários aumentam, se não são corrigidas, algumas pessoas mudam de faixa e passam a pagar mais imposto.

O Secretário da Receita Federal, Sr. Jorge Rachid, declarou sexta-feira que haverá uma correção de 10% apenas na primeira faixa, a faixa dos isentos, que são aqueles que ganham menos de R$1.058,00. E disse algo que considero absurdo: que, realmente, essas pessoas serão beneficiadas. Mas o “andar de cima”, que não será corrigido, pagará o que deixará de ser arrecadado pelo “andar de baixo”.

Sr. Presidente, o Secretário definiu como integrantes do “andar de cima” aqueles que ganham mais de R$1.058,00. Estes pagarão pelos que ganham menos. Penso que R$1.000,00 é um salário quase insuficiente para uma família se manter. Conseguirá se manter com muita dificuldade. São essas pessoas que ele considera estar no “andar de cima”. Essa correção não será feita.

Em segundo lugar, reduz-se a possibilidade de desconto para quem ganha acima de R$2.000,00 - que também não um milionário - de 27,5% para cerca de 20%.

Sr. Presidente, na realidade, se a intenção era uniformizar, porque existia uma faixa que pagava 15%, deveriam fazê-lo adotando uma alíquota de, por exemplo, 25%, valor que ficaria mais próximo daqueles que, na realidade, têm necessidade desse desconto.

Então, se verificarmos, nas contas que foram elaboradas e publicadas no Jornal O Globo, esses valores, com a correção da faixa inferior e que deixará de ser recolhido por esse contribuinte, serão da ordem de R$500 milhões. E aqueles valores que não serão debitados nessas faixas mais altas serão de R$3,5 bilhões.

Então, Sr. Presidente, qual é a diferença? É que o Governo deixará de arrecadar R$500 milhões daqueles contribuintes que, na realidade, ganham menos do que R$1.058 e arrecadará R$3,5 bilhões daqueles contribuintes que estão na faixa superior. Assim, ele terá um lucro de R$3 bilhões. É isso, Senador Mão Santa, que eles chamam de proteger os mais pobres, quando, na realidade, isso é um Robin Hood às avessas porque, na verdade, ele está retirando daqueles que ganham mais de R$2 mil, não para dar para quem ganha menos de R$1 mil, mas para encher, mais uma vez, os cofres do Governo e para exatamente cumprir as metas do superávit primário acertadas com o FMI.

Mas, eu gostaria de registrar que essas medidas propostas para o Imposto de Renda ainda não foram tomadas. É necessário que todos nós, aqui, no Congresso Nacional, já nos unamos para irmos combatendo essas medidas que serão tomadas por meio de medida provisória, para que, quando chegar aqui, tenhamos os elementos necessários para fazermos as devidas mudanças.

Além disso, eu gostaria de citar alguns outros pontos que foram aumentados, ou no final do Governo passado, já de comum acordo com a equipe econômica atual, ou que foram aumentados agora, por meio de medidas provisórias ou de projetos aprovados aqui, neste Congresso. Em primeiro lugar, foi o aumento do PIS de 0,65% para 1,65%, sob a alegação de que era um imposto em cascata e que iria deixar de sê-lo. Realmente isso aconteceu. Disseram que ia ser neutro. Disseram que o PIS mudaria, mas que seria neutro; beneficiaria algumas categorias e prejudicaria outra, mas a idéia era de que a arrecadação fosse a mesma. E não é o que está acontecendo. A arrecadação em termos reais do PIS está aumentando mais de 20% este ano, exatamente por conta dessas modificações.

E o que aconteceu com isso? Alguns setores, como, por exemplo, o setor de serviço, que não tem como se creditar, porque é basicamente em cima de mão-de-obra, teve o seu PIS aumentado em três vezes, de 0,65% para 1,65%, inviabilizando, portanto, muitas vezes, a geração de emprego, porque são essas empresas de serviço que efetivamente geram grande número de empregos.

Em segundo lugar também, logo no início, aumentou-se a CSLL, Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, de 8% para 9%. É outro aumento de carga tributária.

Depois, houve o aumento da Cide, que não se efetivou ainda. Mas, no final do Governo passado, já de comum acordo com a equipe atual, a Cide, que é R$0,52, por litro de gasolina, mais o ICMS, dá R$1,00, portanto, é mais do que o preço da gasolina que o consumidor paga. Quando o consumidor paga R$2,00 por um litro de gasolina, ele entrega R$1,00 ao Governo, metade ao Governo Federal e metade ao Governo Estadual; e o outro R$1,00 é para pagar à Petrobras, ao posto de gasolina, à distribuidora, enfim, os custos gerais que acontecem no processo.

Há uma lei que autoriza aumentar de R$0,52 (cinqüenta e dois centavos) para R$0,80 (oitenta centavos), que até agora não foi feita, mas que poderá ser realizada a qualquer momento, porque já existe autorização legislativa.

A CSLL, Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, também para aqueles que pagam por estimativa, a base de cálculo, que era de 12%, passou para 32%. Então, na realidade, todos os profissionais liberais, tipo dentistas, advogados, médicos, que pagavam determinada contribuição vão pagar quase duas vezes e meia a mais daquilo que pagavam antes. Com isso, aumenta-se a sonegação, diminuindo o número de empregos e todas aquelas mazelas que já conhecemos.

Em sexto, a Medida Provisória nº 135, que está tramitando na Câmara, Sr. Senador Paulo Paim, mas que, na realidade, como medida provisória, já está em vigor. A Medida Provisória nº 135 aumenta a Cofins de 3% para 7,6%. A mesma coisa que foi feita com o PIS, de 0,65% para 1,65%, aumentando, assim, a receita mais do que a pseudoneutralidade. Acontece que para a Cofins é mais grave, porque, como a base é maior, imagine pagar 7,5% sobre o faturamento total de uma empresa! O lucro que se espera de uma empresa normal de prestação de serviço é em torno de 5% em cima do faturamento. Aqui, você tem 7,6% só de Cofins. Você soma com 1,65% do PIS e já tem quase 10% aí exatamente em cima do faturamento bruto, sem retirar nada. Uma empresa de serviço normal, de consultoria etc, a única coisa que pode creditar é da conta de luz e da conta de telefone, da Cofins que foi pago nessas duas contas.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Permite V. Exª um aparte?

O SR. JOSÉ JORGE (PFL - PE) -Concedo um aparte ao Senador Mão Santa.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador José Jorge, do Estado de Pernambuco, em primeiro lugar, minhas palavras são de congratulações por V. Exª ter assumido a presidência do PFL. Meu nome mesmo é Francisco e aprendi que, onde houver discórdia, que eu traga a união. Mas Deus escreve certo por linhas tortas. V. Exª assumiu o comando de um grandioso partido da Oposição, e digo que o País tem convicção disso. V. Exª assumiu o Ministério de Minas e Energia no momento mais difícil, diante de um iminente apagão, mas não apagou nada, porque V. Exª trouxe a luz. Portanto, V. Exª, com a mesma inteligência e liderança, fará crescer o seu Partido. Mas quero dizer que o tema é muito importante. E digo que um quadro vale por dez mil palavras. Tenho um amigo, um dos empresários mais corretos que conheço, do Piauí, Joaquim Costa, que possui uma indústria de cerâmica e que ocupou vários cargos, entre eles o de Secretário de Indústria e Comércio e diretor da Federação das Indústrias. Outro dia, encontrou-me e disse: “Mão Santa, a vida lá fora está difícil”. Não entendi, e ele me explicou que “lá fora” é fora do Governo. É o que o setor econômico tem que observar. Agora que estão no Governo, está fácil. Estão aumentando o caixa, é muito dinheiro. Todo mês um ministério é criado, já vão para o rumo de cinqüenta, se continuar essa escalada. E digo que, com relação à taxa Selic, dizem que a taxa de juros é de 20%. Mas não é. Todos que possuem cheque ouro sabem que o banco, fora a taxa de juros do cheque especial, cobra a taxa de administração, as taxas de risco e outras, que, na realidade, dão quase 200%. Vou citar outro fato: há um empresário espanhol no Piauí que me disse outro dia: “Mão Santa, está difícil, porque, com esses bancos aqui do Brasil, compra-se uma máquina e, com a mesma quantia, compra-se na Europa cinco máquinas dessas, porque lá o juro é de 1%.” Então, essa é a dificuldade. Por isso, está crescendo o desemprego. Emprego, sem dúvida alguma, resolveria todos os problemas. Entendo que a grande missão deste Governo é propiciar emprego. Com ele, a fome acabaria, viria a saúde, a educação e a felicidade que o povo do Brasil merece.

O SR. JOSÉ JORGE (PFL - PE) - Muito obrigado, Senador Mão Santa. V. Exª tem absoluta razão em todas as suas observações.

Continuando, ainda temos dois tipos de aumento de impostos: o aumento da Cofins dos bancos, de 3% para 4%. Todos pensam que esse aumento vai tirar o lucro do banco, mas ele será incluído pelos bancos na conta do usuário, daquele que vai lá pedir um empréstimo.

Por último, haverá aumento da CPMF, pois, estava prevista para o próximo ano a alíquota de 0,08%, nas continuará sendo cobrada a alíquota atual, de 0,38%. Isso ainda está na reforma tributária que será votada aqui no Senado, mas é um ponto que já se pode considerar.

Então, o que geram todos esses pontos que aumentam a carga tributária? Como disse o Senador Mão Santa, geram desemprego, porque o setor econômico fica sem poder investir. Por exemplo, uma pessoa que ganha acima de R$2 mil paga 27,5% de Imposto de Renda, 11% de Previdência, mais seguro saúde, mais educação e uma série de despesas desse tipo. Quando chega no final, a capacidade de consumo dessa pessoa é muito pequena. Conseqüentemente, ela não compra, e o setor empresarial não vende.

            Então, precisamos mobilizar a classe média para que essa carga tributária possa ser controlada, ficando em nível aceitável e que permita a continuação do crescimento do País.

Vou ler aqui um parágrafo sobre o Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário.

Segundo dados do IBPT (Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário), a classe média pagará pelo menos 23% a mais de Imposto de Renda, em média, caso o Governo leve adiante seu plano de corrigir entre 10% e 12% o teto de isenção, que hoje é de R$1.058,00, e limitar deduções com saúde, educação e dependentes a 20% do imposto devido. Isso significa uma arrecadação extra de R$3 bilhões.

O Presidente do IBPT, Gilberto Luiz do Amaral, afirmou em reportagem de O Globo do último sábado: “Isso é alarmante, porque a grande beneficiária dessa medida será a classe alta, que se utiliza muito pouco das deduções com despesas de saúde e educação”.

Um exemplo: um professor com dois dependentes e renda anual de R$32.752,00, pelas regras atuais, consegue deduzir R$11.589,00 e paga R$1.269,00 de Imposto de Renda. Se a regra de deduções mudar, ele só terá direito de descontar R$4.071,00 e passará a pagar R$2.975,00 de Imposto de Renda, 134% a mais do que desembolsa hoje, Srs. Senadores! Trata-se de um professor com dois dependentes, que ganha cerca de R$2,5 mil por mês. Não é da elite, nem milionário, tampouco rico, mas um simples professor.

Em relação à medida provisória, para 90% das empresas, a matéria-prima custa, em média, de 30% a 35% de suas despesas. Na situação atual, uma empresa com faturamento de R$100 mil pagaria R$3 mil de Cofins. No novo modelo, ficará devendo R$7,6 mil e poderá abater a Cofins que incidiu sobre os insumos adquiridos de outras empresas - 7,6%, de 35%, ou R$2.660,00. Ou seja, a Cofins deverá saltar para R$4.940,00, uma elevação de 65% para a maioria absoluta das empresas. Já uma empresa de serviços, por exemplo, nem isso tem como descontar. Assim, em vez de pagar R$3 mil, a empresa pagará R$7,6 mil.

Portanto, Sr. Presidente, a nossa preocupação e a do nosso Partido é encontrar uma fórmula que permita ao Governo manter a sua arrecadação nos valores mínimos necessários para conduzir a máquina pública, mas também garantir uma carga tributária que permita o crescimento da economia e que seja justa com a classe média. Mesmo porque as pessoas da classe média, as que realmente financiarão esses aumentos, usam muito pouco os serviços do Governo: seus filhos não estudam em escola pública, não usam plano de saúde, aposentam-se com a aposentadoria complementar privada. No sistema de transporte do País, as estradas estão arrasadas. Na realidade, são pessoas que pagam um grande número de impostos com grande percentual de suas receitas e praticamente não recebem nada em troca.

Portanto, é necessário que o Governo, que se elegeu com forte apoio dessas pessoas, que até foram às ruas, verifique exatamente a situação da classe média brasileira com a carga tributária no nível em que está.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

Agradeço a atenção de todos.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/11/2003 - Página 38538