Discurso durante a 172ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas à política econômica do Governo Federal.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PREVIDENCIA SOCIAL.:
  • Críticas à política econômica do Governo Federal.
Aparteantes
Eurípedes Camargo.
Publicação
Publicação no DSF de 29/11/2003 - Página 39331
Assunto
Outros > PREVIDENCIA SOCIAL.
Indexação
  • REPUDIO, REFORMULAÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL, CONFISCO, TRABALHADOR, APOSENTADO, IDOSO, SERVIDOR, CRITICA, DECLARAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA.
  • ANALISE, CONJUNTURA ECONOMICA, PAIS, NECESSIDADE, URGENCIA, POLITICA, INVESTIMENTO, APOIO, INICIATIVA, GOVERNO FEDERAL, ENCAMINHAMENTO, CAMARA DOS DEPUTADOS, PROJETO, DEFINIÇÃO, PARCERIA, SETOR PUBLICO, INICIATIVA PRIVADA, BENEFICIO, INFRAESTRUTURA, DESENVOLVIMENTO, REGISTRO, EXPERIENCIA, PAIS ESTRANGEIRO, EXPECTATIVA, COMPETENCIA, GESTÃO, GOVERNO.
  • DETALHAMENTO, VANTAGENS, ESTADOS, MUNICIPIOS, PARCERIA, INICIATIVA PRIVADA, INVESTIMENTO, INFRAESTRUTURA, ESPECIFICAÇÃO, SANEAMENTO BASICO, CONSTRUÇÃO CIVIL.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, V. Exª está estreando de forma muito competente, cumprindo o Regimento da Casa.

Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o tema do meu discurso de hoje é de apoio a uma iniciativa do Governo, porque o nosso objetivo nesta Casa é fazer uma oposição dura, mas responsável e propositiva, a favor do Brasil.

No entanto, antes de iniciar o tema de hoje, eu não poderia deixar de analisar aquilo que está na ordem do dia.

Senador Paulo Paim, respeito a posição, a luta e a coerência, sim, de V. Exª, mas não entendo e me surpreendeu, deixando-me, de certa forma, indignado, ver o Presidente Lula, até com certa emoção, dizer que estava com a alma lavada por ter aprovado a reforma da Previdência. Não entendo como alguém que tem a origem do Presidente Lula pode sentir-se de alma lavada ao colocar o braço longo do Governo, com a mão grande, no bolso de trabalhadores, aposentados e idosos deste País.

Não importa se o Presidente se sentiu compelido a realizar a reforma do modo como a colocou para o País. O que importa é que é uma reforma que confisca. É uma reforma devastadora de direitos adquiridos de milhares de trabalhadores brasileiros, servidores públicos ou não.

Não sei como aquele que, em sua casa, depois de um dia de trabalho, ou aquele aposentado, ou aquela viúva, já nos últimos momentos de sua existência, pode ter compreendido essa manifestação do Presidente Lula ontem à noite na televisão, sentindo o impacto incrível dessa proposta sobre os seus benefícios. Trata-se de uma proposta que confisca benefícios, que não foram concessões governamentais, mas significaram conquista resultante do trabalho de muitos anos.

Como pode estar o Presidente de alma lavada quando anuncia que o espetáculo do crescimento se deu às avessas? A economia encolheu. O PIB sofreu retração de 1,5% no último trimestre, o pior desempenho do PIB nos últimos 5 anos. Como pode o Presidente estar de alma lavada se o desemprego, em 8 meses, cresceu 21,7%, na contramão da promessa de 10 milhões de novos empregos - 21,7% são mais do que 500 mil trabalhadores desempregados; são mais 500 mil desempregados somando-se aos milhões que já estavam nessa situação.

O talentoso jornalista Elio Gaspari coloca uma cifra ainda superior, falando em cerca de um milhão de novos desempregados no primeiro ano da gestão Lula.

Portanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não poderia deixar de protestar em nome daqueles que se sentem excluídos dessa proposta de reforma da Previdência. Mais do que excluídos, sentem-se usurpados, porque não há nenhuma dúvida. Isso é incontestável. Há situações que são inexplicáveis. Não há explicação convincente. É incontestável que essa reforma da Previdência é usurpadora de direitos adquiridos por trabalhadores neste País.

No entanto, quero também, neste momento, Senador Pedro Simon, aplaudir uma iniciativa do Governo. Vou inclusive ler, Senador Eurípedes Camargo, porque a alma oposicionista fala mais forte no improviso, e é preciso, neste momento em que se deseja, com boa-fé, estimular uma iniciativa governamental, fazê-lo com a responsabilidade de quem lê:

Nas décadas passadas de exitoso desenvolvimento da economia brasileira, o seu nível de investimento era da ordem de 25% do Produto Interno Bruto. Hoje, esse nível de investimento está na ordem de 17% do PIB. Insuficiente para a consistente retomada do desenvolvimento, mesmo a taxas modestas da ordem de 2% ou 3% ao ano.

Hoje, a poupança brasileira, pública e privada, é insuficiente para a manutenção de investimentos da magnitude do passado, em que a ação estratégica do Estado era balizamento fundamental, sobretudo da construção e implantação de uma infra-estrutura nacional que consolidasse as altas taxas de crescimento econômico.

Esgotou-se o modelo histórico de investimentos públicos na infra-estrutura efetivados unicamente com recursos estatais. Mas as necessidades de investimentos da infra-estrutura do país é uma necessidade permanente que não pode ser paralisada. A própria continentalidade do Território Nacional exige que investir no setor básico da infra-estrutura seja um desafio permanente e intransferível. A isso acrescente-se a necessidade de manutenção permanente da infra-estrutura já existente, em que o sucateamento, falta de manutenção, não fica restrito apenas às estradas. Isso em um País onde dois terços da movimentação de cargas e produtos efetivam-se através do transporte rodoviário. Outras áreas básicas, como o saneamento, vivem uma realidade semelhante.

É preciso definir com urgência uma política de investimentos e reativação na área da infra-estrutura.

É objetivo e pragmático, diante desta realidade, o envio pelo Governo de Luiz Inácio Lula da Silva do projeto de lei à Câmara dos Deputados que estrutura as PPPs. As Parcerias Público-Privadas são uma resposta que pode significar um expressivo nível de recursos canalizados para investimento na infra-estrutura nacional.

Presentemente, na Europa, as PPPs são responsáveis por um acelerado processo de investimentos na infra-estrutura de diversos países. A construção e manutenção de estradas, ferrovias, pontes, saneamento, hospitais e até projetos militares vêm se desenvolvendo dentro de projetos formatados no bojo das Parcerias Público-Privadas.

Em termos de políticas desenvolvimentistas, há excelentes perspectivas. Mas se torna importante ressaltar alguns pontos que não podem ser ignorados. Surgido na Inglaterra, o programa de parceria público-privada teve seu projeto de lei aprovado pelo Parlamento em 1993. Mas seu deslanche e desenvolvimento pleno deram-se somente a partir de 1996, sendo criados órgãos centrais para articulação dos programas dentro da estratégia geral do governo. Fora da Europa, as PPPs acabam de ser implantadas no México e também na África do Sul. O Brasil vem, portanto, na esteira de providências já adotadas no México e na África do Sul.

O fato é que, se implantado com seriedade e eficiência, o programa estará destinado a ampliar os investimentos em serviços públicos. Trata-se de uma opção inteligente e criativa de planejamento, envolvendo recursos públicos e privados, em uma saudável parceria destinada a fazer a economia crescer, gerando os empregos de que os brasileiros precisam.

Receio que a incompetência governamental destrua a essência de um programa que pode resultar efetivamente em grandes benefícios econômicos e sociais para o nosso País.

O Ministério do Planejamento já teria identificado projetos da ordem de R$180 bilhões que poderão integrar, em uma primeira fase, o programa. O setor público seria, de acordo com o Ministro Guido Mantega, um alavancador de 30% do valor dos projetos, ficando 70% para alocação de recursos privados. Concomitantemente, seria criado um fundo garantidor dos investimentos, constituído por recursos orçamentários, bens móveis e imóveis, além de ativos não-financeiros.

Esperamos que a equipe do Presidente Lula, depois do primeiro ano de experiência, possa, a partir do próximo ano, ser mais capaz, mais eficiente, mais produtiva na liberação dos recursos provisionados para investimentos no País. De nada adiantará essa boa idéia, que surgiu na Inglaterra, aplicada aqui no Brasil se não houver competência de gerenciamento. Sabemos que sem recursos privados o poder público, com sua capacidade de investir absolutamente comprometida pelos encargos da dívida pública, não atenderá as expectativas nacionais em matéria de conservação de rodovias, em matéria de novos projetos de infra-estrutura que permitam o crescimento econômico desejado pela sociedade brasileira.

A isso some-se a possibilidade de captação de recursos do Banco Interamericano de Desenvolvimento e do Banco Mundial. A isso, internamente, acrescente-se o BNDES, que seria um ato fundamental na estruturação dos fundos que o programa exige, com alta capacitação gerencial, já que, em princípio, de acordo com o projeto de lei já tramitando na Câmara dos Deputados, a parceria envolveria contratos de até 30 anos, garantindo plena rentabilidade dos investimentos que venham a compor o núcleo societário.

Estamos, de antemão, anunciado nosso apoio a esse projeto do Governo, porque temos uma visão estratégica de futuro. Não estamos aqui para nos opor ao Brasil, estamos aqui para nos opor aos erros do Governo, que, lamentavelmente, não têm sido poucos nos últimos meses.

Para Estados e Municípios, que, não tendo recursos para investimentos ou, tendo atingido o teto de endividamento, ficam estrangulados, seria uma excelente e extraordinária alternativa, já que com a parceria público-privada quem vai contrair empréstimo, seja junto ao BNDES ou instituições internacionais não é o ente público, mas a empresa nascida dessa parceria. É ela que vai construir a infra-estrutura, seja de estrada ou saneamento, por exemplo.

É um drible na situação vigente, uma estratégia criativa e inteligente, para possibilitar investimentos produtivos no setor de infra-estrutura do País.

Sabemos que Municípios e Estados estão impossibilitados de contrair novos empréstimos para investimentos, e essa é uma forma criativa, uma alternativa inteligente que possibilitará a retomada desses investimentos como forma capaz de contribuir para o crescimento econômico e sobretudo para a geração de empregos, porque há obras fundamentais do setor público, e agora, em parceria com o setor privado, para a geração de emprego. Entre as obras fundamentais para a geração de emprego, incluímos, prioritariamente, as de saneamento básico, que, além de atender uma prioridade que deve ser prioridade de todos os governos - porque saneamento básico diz respeito à saúde da população - é um setor da atividade pública gerador de empregos. As obras exigidas no saneamento básico exigem mão-de-obra braçal, portanto, oferecendo oportunidade de trabalho a muitos dos desempregados do País.

O crescimento do desemprego no País se dá, de um lado, em função da ausência de investimentos públicos, alavancadores da economia e geradores de emprego, e de outro lado, a retração do setor privado, inibido no processo de crescimento em função das políticas públicas adotadas pelo atual Governo, que dizem respeito a imposições oriundas do Fundo Monetário Internacional. É por essa razão, por exemplo, que houve uma retração de 10,9% no setor da construção civil no último trimestre, que contribuiu para que o PIB nacional recuasse em 1,5%, já que a construção civil é também um dos setores geradores de emprego dos mais generosos.

Lembro que a experiência do investimento na construção civil é extremamente positiva. Quando tive a honra de governar o Paraná, 25% dos empregos urbanos significavam a contribuição decisiva do setor da construção civil. De um lado o Estado, construindo casas populares, através de mutirões habitacionais, ou dos programas convencionais existentes, através do sistema financeiro habitacional, e, de outro lado, o Governo sendo ponte para a atração de recursos financeiros, a fim de que o setor privado pudesse desenvolver atividade fundamental para a geração do emprego.

O Sr. Eurípedes Camargo (Bloco/PT - DF) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Concedo com prazer, Senador Eurípedes Camargo, o aparte a V. Exª.

O Sr. Eurípedes Camargo (Bloco/PT - DF) - Senador Alvaro Dias, V. Exª traz para o debate um tema fundamental - as políticas públicas do Governo - e coloca a sua posição, sempre vigilante das ações do Governo e embasada pela bagagem adquirida ao longo da sua trajetória nos cargos ocupados no Executivo e no Legislativo, o que nos enriquece a todos nós. Parabenizo V. Exª. por isso. Quanto à reação do Presidente da República, V. Exª traz as suas preocupações e a sua crítica fundamentada. No entanto, são muitas as reformas a serem feitas, e essa foi apenas a primeira - embora ainda não esteja concluída, já está bem encaminhada -, para que o Executivo possa sair deste patamar e criar as condições para aumentar as riquezas nacionais e dar rumo ao desenvolvimento. As reformas são dolorosas, admito, mas necessárias, e talvez o Presidente, ciente da responsabilidade de ter que caminhar, não só quanto à reforma da previdência, mas também em relação às demais. A aprovação no dia de ontem foi um passo na direção da estruturação do Estado e do desenvolvimento. Talvez tenha sido isso que o Presidente tenha querido expressar, ou seja, o alívio por ter dado o primeiro passo rumo a essa estruturação.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Muito obrigado, Senador Eurípedes. Com a sua modéstia, humildade e a sua vivência na atividade sindical, V. Exª está sempre atento a todas as questões e aos problemas dos mais humildes deste País, procurando, da melhor forma possível, trazer a sua contribuição no período em que se encontra nesta Casa do Congresso Nacional.

Quanto às palavras do Presidente Lula, é bom dizer que a solidão é péssima conselheira, especialmente quando tratamos de questões pessoais, emocionais, sentimentais. Mas o silêncio, em determinadas circunstâncias, é a postura que se recomenda a quem governa. Aliás, aprendi isso como Governador e não imaginava que, muito antes, um estadista do mundo, o General De Gaulle, já havia ensinado isso. Ele dizia: “Quem governa faz; não fala”. Em determinados momentos, o silêncio é, sem dúvida, a melhor parceria para quem está exercendo o poder. O Presidente Lula, ontem, perdeu a oportunidade de ficar calado em relação à aprovação da reforma da previdência nesta Casa. Certamente, se lavou a sua alma, não lavou a alma do povo brasileiro, porque não é a reforma desejada, sobretudo pelos mais necessitados do País. Não é uma reforma, por exemplo, que inclui os excluídos, que são 40 milhões de brasileiros. Não podemos compactuar com a afirmativa constante de que esta reforma da previdência inclui os 40 milhões de excluídos no nosso País.

Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em respeito aos inscritos que me sucederão nesta tribuna, vou concluir o meu pronunciamento.

Após a aprovação, pela Câmara dos Deputados, do projeto que cria o programa público-privado de parcerias para investimentos no nosso País, teremos oportunidade, aqui no Senado Federal, de analisar e de avaliar com maior profundidade e, quem sabe, se possível, até contribuir para que ele seja aprimorado. Mas desde já queremos saudar o auspicioso caminho que o projeto pode trazer para a economia brasileira. Na esteira do exemplo da Inglaterra, agora seguido pela África do Sul e pelo México, o projeto chega ao Brasil. E esperamos que, nessa caminhada, os resultados positivos possam significar contribuição para o crescimento econômico com geração de emprego.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/11/2003 - Página 39331