Discurso durante a 173ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentário a artigo publicado na revista Veja, sob título "Paz, amor e Guerra", sobre espionagem e perseguição para garantir a eleição do presidente Lula. Visita de fiscais do Ministério do Trabalho à chácara do Ministro Maurício Corrêa. (como Líder)

Autor
Arthur Virgílio (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
Nome completo: Arthur Virgílio do Carmo Ribeiro Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
IMPRENSA. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Comentário a artigo publicado na revista Veja, sob título "Paz, amor e Guerra", sobre espionagem e perseguição para garantir a eleição do presidente Lula. Visita de fiscais do Ministério do Trabalho à chácara do Ministro Maurício Corrêa. (como Líder)
Publicação
Publicação no DSF de 02/12/2003 - Página 39510
Assunto
Outros > IMPRENSA. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, PERIODICO, VEJA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DENUNCIA, ATUAÇÃO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), EXECUÇÃO, ESPIONAGEM, PERSEGUIÇÃO, ADVERSARIO, GARANTIA, ELEIÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, DIVULGAÇÃO, CORRUPÇÃO, GOVERNO ESTADUAL, ESTADO DE RORAIMA (RR), PARTICIPAÇÃO, EX GOVERNADOR, GOVERNADOR, DESCOBERTA, MANDANTE, HOMICIDIO, PREFEITO, MUNICIPIO, CAMPINAS (SP), OCORRENCIA, VISITA, FISCAL, DELEGACIA REGIONAL DO TRABALHO (DRT), CHACARA, PROPRIEDADE, MAURICIO CORREA, PRESIDENTE, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), COMPROVAÇÃO, IRREGULARIDADE, CONTRATAÇÃO, TRABALHADOR.
  • QUESTIONAMENTO, CONDUTA, GOVERNO, POSSIBILIDADE, OCORRENCIA, REPRESALIA, TENTATIVA, OFENSA, HONRA, REPUTAÇÃO, PRESIDENTE, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), PREJUIZO, JUDICIARIO.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, ainda há pouco, como Líder do PSDB, cobrava do Partido dos Trabalhadores uma posição muito clara a respeito da crise de Roraima, esse escândalo dos “gafanhotos” que estão corroendo o dinheiro público. Agora, como Líder da Minoria, venho falar de espionagem, perseguição a adversários e espírito totalitário.

Recentemente, a revista Veja, independente sob todos os títulos, publica matéria com o título “Paz, amor e Guerra”, dizendo:

Há um ano, Lula venceu a eleição com um estilo “paz e amor”, mas, nos bastidores, uma equipe do PT trabalhou noite e dia, desencavando denúncias e dossiês e promovendo blefes e negociações sigilosas para enfraquecer seus adversários.

A matéria, primorosa, é do jornalista Policarpo Júnior, que aponta os generais da guerra de guerrilha, nem sempre ética, que o PT teria executado na sua campanha: Carlos Alberto Grana, o logístico; Oswaldo Bargas, o elo; João Piza, o coordenador; Wagner Cinchetto, o operador; Ricardo Berzoini, o político. E aqui se mostra que muitas das acusações imputadas inclusive ao Senador José Serra seriam mesmo da lavra do PT. O PT tentou afastar o candidato Ciro Gomes por vias ilegais; tentou, de qualquer maneira, garantir a vitória de Lula, usando instrumentos, argumentos e atitudes nem sempre corretos, nem sempre ortodoxos.

Nesta semana, a revista Veja, que tem mesmo que cumprir com o seu dever de publicar aquilo que vê, seja para aplaudir, seja para condenar, traz novamente o escândalo de Roraima. Menciona a reportagem:

Uma casta inteira na cadeia. Como só ocorre nas revoluções, metade da elite de Roraima foi para o xilindró.

Assina a jornalista Malu Gaspar.

E há, de novo, referências ao ex-Governador Neudo Campos, ao atual Governador, Flamarion Portela, uma matéria que aqui está e que constará nos Anais, cujo título é aquele que assinalei.

A Veja, independente como é, aperta o garrote em torno do caso de Santo André:

O Ministério Público informa que vai denunciar o amigo do prefeito Celso Daniel como responsável por sua morte.

Trata-se daquele tal de Sérgio Gomes da Silva, o Sombra, hoje muito fortemente apontado como o brutal mandante do assassinato do ex-Prefeito. E aqui se fala das fitas, daquela coisa toda. Não adianta: no Brasil, não se esconde mais nada; as coisas aparecem.

Citei essas três matérias, mas quero deter-me na primeira delas. A chácara do Presidente do Supremo Tribunal Federal foi visitada por fiscais da Delegacia Regional do Trabalho. Pergunto, Sr. Presidente: há um projeto da Delegacia Regional do Trabalho de visitar todas as chácaras? Ao lado dessa, foram vistas e revistas mais chácaras, ou visitada foi apenas a do Dr. Maurício Corrêa, Presidente do Supremo Tribunal Federal? A matéria menciona que foram encontradas irregularidades, o que deploro. Espero que o Ministro Maurício Corrêa, figura que estimo, seja capaz de dar respostas claras a todas as perguntas que a revista Veja faz. Entretanto, aqui em mim, no meu fundo, no meu íntimo, Sr. Presidente, fica a desconfiança sobre se esse não é mais um golpe do mesmo governo que antes de o ser trabalhava uma verdadeira operação de guerra para intimidar adversários, para forjar dossiês e para chegar à vitória a qualquer preço na época das eleições; agora, quem sabe, para afastar adversários a qualquer preço, já que ganhou as eleições.

Longe de mim defender trabalho escravo. Se há trabalho escravo lá, merece ser execrado sim, e o Ministro Maurício Corrêa, se for o responsável. Todavia, se não há trabalho escravo, vai ficar claro também, porque tenho o Ministro Maurício Corrêa como homem de bem, homem honrado.

Agora, a revista Veja, que apenas relata o que vê, e faz muito bem em relatar o que viu, meu querido Líder Renan Calheiros, foi atrás de uma denúncia, com certeza vazada pela Delegacia do Trabalho. A pergunta que faço, repito, Sr. Presidente, é se foi uma ação de rotina. É muito difícil acreditar que na República, pelo que conheço dela, tenha sido apenas uma ação de rotina. E o Delegado do Trabalho, nomeado não sei por que Deputado do PT aqui do Distrito Federal, adversário político desde o passado do Sr. Maurício, e o Presidente da República vivendo uma hora atritada com o Ministro Maurício Corrêa. Esse delegado, sabendo que chácara era do Ministro, iria lá, e se sim, e mesmo a chácara, pertencendo ao Ministro do Supremo Tribunal Federal, S. Sª é um homem exemplar que deve ser trazido aqui para ser homenageado por nós. Espero que não se trate de um mero fofoqueiro político a serviço de um grupo a qualquer preço.

Agora, o grave é se esse homem, fiel a quem o nomeou e fiel a instintos políticos baixos, e mais ainda, mais do que servindo a interesses mesquinhos da luta PMDB contra PT aqui no Distrito Federal, mais ainda a coisa complica se ele estiver servindo a interesses do Governo, a interesses do Planalto, interesses que podem se traduzir em: vamos montar uma desmoralização para cima do Presidente do Supremo Tribunal Federal, vamos desmoralizar o Ministro Maurício Corrêa, vamos colocar de joelhos o outro Poder. Se é isso, quero alertar esta Casa para o fato de que é hora deste Congresso Nacional começar a mostrar independência, porque Governo que age assim, que tenta colocar de joelhos um Poder é Governo que não respeita a democracia e, se não respeita a democracia, começa encontrando o Partido da Social Democracia Brasileira - que aqui lidero e tenho muita honra em fazê-lo pela qualidade dos membros que são os meus liderados - alerta, de pé, jamais de joelhos, seguros de que não temos nós - e não temos mesmo - “rabo preso” ou o que mais seja, para que alguém possa tentar vir para cima de nós com a arma da intimidação. Ou seja, se é essa a forma de o Governo ver o processo democrático, se ele acha que a oposição de alguém deve significar a desmoralização desse alguém a qualquer preço, que se acautele o Congresso Nacional porque é assim que nasce toda aventura autoritária.

Estou convocando o tal fiscal, o tal Delegado do Trabalho, junto com o Ministro do Trabalho, para que venha aqui explicar como foi isso. Ou é alguém exemplar, correto, alguém que merece elogios e medalhas porque vendo o irregular vai contra até o Presidente do poderoso Supremo Tribunal Federal, ou é alguém a serviço de instrumentos medíocres de política, alguém que quer servir ao PT do Distrito Federal e alguém que, quem sabe, pode estar servindo a algo maior. E o meu medo é esse. Se ficar na mediocridade do terra-a-terra aqui debaixo, não me importo tanto. Importo-me é se houver uma determinação do tipo: estamos sendo incomodados pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal, logo nós, do Governo, nós, todo-poderosos, nós, que detemos todo o poder, nós, que vencemos as eleições, nós isso, nós, que somos próximos de Deus, nós, que somos talvez acima de Deus - eles às vezes se imaginam assim -, nós, então, começaremos uma campanha de desmoralização do Supremo Tribunal Federal.

E aí paro de falar pelo Governo. Tenho o maior medo de que as pessoas confundam, como se essa loucura toda fosse minha. Não é minha. Volto a parar de falar pelo Governo e, portanto, piso no chão, na terra, e falo por mim, pelos meus companheiros, pela Oposição, pela democracia que ajudei a construir, que Lula ajudou a construir. Não podemos tolerar esse tipo de coisa.

Para mim a matéria é perfeita. Parabenizo Veja pela matéria de Santo André, pela matéria de Roraima e pela matéria sobre o Ministro do Supremo Tribunal Federal. Omissão terrível seria se ela não tivesse cumprido com o seu papel jornalístico.

Como ela chegou a tomar conhecimento dessa notícia? Alguém vazou. Se alguém vazou, o fez por conta própria. Se o fez por conta própria, não obedecendo a instintos menores, quando convocarmos esse cidadão aqui, vamos saber direitinho - e ele é um benemérito que merece ser apoiado por todos nós. Se ele não o fez por conta própria, obedeceu a quem? Obedeceu a algum candidatozinho do PT local que quer ter mais votos? Enfim, essas coisas que lamentamos - a política também é feita de gente medíocre e mesquinha também.

Contudo, terrível, Sr. Presidente. Lamentável, deplorável, condenável, a ponto de termos de reunir nós todos, aqueles que têm brios neste Congresso, para impedir que se monte neste País uma caminhada autoritária, que sabemos como começa, mas não como termina. Pior é se isso significa um plano para desmoralizar o Presidente do Supremo Tribunal Federal, desmoralizando por essa via o próprio poder maior do Judiciário deste País.

Isso é inaceitável. Isso seria aberrante, e repito, condenável, deplorável. Isso, Sr. Presidente, significaria estarmos aqui fazendo concessões em relação a um valor que é absoluto para nós, o democrático.

Eu, portanto, que não posso me solidarizar com o Ministro Maurício Corrêa se porventura se confirmar o que está aqui - é lamentável; ele que se explique! - solidarizo-me com os democratas brasileiros e com o Poder Judiciário, porque aqui o meu sexto sentido me diz que há uma agressão a um poder.

Amanhã, o Presidente Sarney toma um gesto independente. Ninguém se iluda: se tiver que tomar, vai tomar. Eles partem contra o Senador José Sarney. Tomo todos os dias atitudes independentes contra esse Governo e o desafio de manhã, de tarde e de noite. Eu cumpro o meu papel de Líder de um Partido de Oposição de manhã, de tarde e de noite.

Imagino, colocando minha vida à disposição deles, que se um dia pegassem algo pessoal meu, bem pessoal e íntimo, teriam eles a ilusão de que me teriam na mão? Eu, numa hora dessas, sacrificaria tudo! Eu sacrificaria casamento, relação com filho, qualquer coisa; mas eu não calaria. Isso é bom que se coloque com todas as letras, para todos os navegantes não terem nenhuma ilusão a respeito de com quem estão lidando. Quero que as pessoas que lidam comigo saibam com quem estão lidando.

E tenho muito desejo de dizer que respondo pela honra e pela independência dos meus companheiros. Mas eu pergunto: este é o País da democracia, do choque de idéias, dos Poderes independentes entre si? Ou este é o País da chantagem, dos comandos que visam aniquilar com a honradez e com a reputação dos outros, para fazer valer um projeto de poder? Se é isso, Sr. Presidente, anuncio que daqui em diante aumentarei ainda mais o meu vigor, a minha garra, a minha disposição de luta, porque se tem algo com o que eu não posso nunca concordar é com a chantagem. Cresci com meu pai me dizendo “Meu filho, nunca tema o chantagista; enfrente sempre o chantagista. Prefira, se for o caso, um fim horroroso. Jamais tolere viver um horror sem fim.” E todos que se vergam a um chantagista ficam dependendo do original, da foto ou de somente ter aquelas cópias se o original chegou às suas mãos. Esse vive um horror sem fim; esse é um escravo da sua própria covardia; esse é o escravo da sua própria falta de coragem; esse é o escravo da sua própria falta de dependência; esse é o escravo da sua própria falta de confiança no seu destino de homem livre a compor uma nação de homens livres.

Portanto, volto a dizer, parabéns a Veja pela capacidade de auscultar sempre as verdades da maneira instigante como faz. As três matérias são muito boas: a de Santo André, a de Roraima e a da chácara do Ministro. Se eu fosse jornalista, não perderia isso por nada! Eu faria isso com toda a consciência tranqüila e, mais ainda, com toda a sensação de que estaria cumprindo o dever.

Parabéns, portanto, à revista. Que o Ministro se explique. Aguardo - até por estimá-lo e por respeitá-lo - declarações e firmes do Ministro Maurício Corrêa. Mas, investigaremos isso a fundo, para saber, Sr. Presidente, se é um fiscalzinho que agiu por conta própria, ou se há um baixo instinto na luta PT contra os seus adversários aqui. Isso é triste, mas não mata ninguém; isso sai pelo joelho.

A minha preocupação maior, Senador Alvaro Dias, quando encerro - e é a terceira vez que repito isso -, é se existe algo montado, a partir do centro do poder, como “estamos sendo incomodados por fulano; destrua-se fulano”; “estamos sendo incomodados por beltrano; aniquile-se beltrano”. Estamos sendo perturbados por sicrano, acabe-se com a vida política, com a vida pública, se necessário com a vida familiar de sicrano. No caso, estamos sendo incomodados pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal, então, liquide-se o Presidente do Supremo Tribunal Federal, ainda que isso custe desgaste para o Poder que deve estar acima de todos nós na hora de nos julgar.

Quando vou ao Supremo Tribunal Federal e este julga contra mim, eu me conformo e passo a entender que eu não tinha razão. Quando julga a favor de mim, fico feliz, porque passo a ter certeza de que eu tinha razão. Em outras palavras, o desrespeito ao Supremo não é tolerável e não é tolerável que possamos estar suspeitando, a essa altura, de uma marcha na direção do autoritarismo por um Governo que se elegeu, numa beleza de espetáculo democrático, com 52 milhões de votos. Quem se elege com tantos votos, quem se elege com qualquer voto, quem perde eleição, quem ganha eleição, quem participa do processo democrático e nele acredita não pode tramar contra a liberdade, não pode fazer da chantagem uma arma, não pode, em algum momento, imaginar que se coloque uma nação de joelhos para que alguns distintos políticos sobrevivam.

Eu não fico de joelhos, porque não fiquei na época da ditadura! Não ficarei agora! Sei que o Supremo também não ficará e confio que este Congresso também haverá de manter o seu orgulho, o seu amor-próprio e a sua confiança no destino livre do povo brasileiro.

Muito obrigado, Sr. Presidente.

 

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DOCUMENTOS A QUE SE REFERE O SR. SENADOR ARTHUR VIRGÍLIO EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inseridos nos termos do art. 210 do Regimento Interno.)

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/12/2003 - Página 39510