Discurso durante a 173ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Justificação a Projeto de Decreto Legislativo 317, de 2003, de autoria de S.Exa., que convoca plebiscito para a incorporação de cidades do entorno ao Distrito Federal.

Autor
Eurípedes Camargo (PT - Partido dos Trabalhadores/DF)
Nome completo: Eurípedes Pedro Camargo
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA PARTIDARIA. POLITICA DE DESENVOLVIMENTO URBANO.:
  • Justificação a Projeto de Decreto Legislativo 317, de 2003, de autoria de S.Exa., que convoca plebiscito para a incorporação de cidades do entorno ao Distrito Federal.
Publicação
Publicação no DSF de 02/12/2003 - Página 39537
Assunto
Outros > POLITICA PARTIDARIA. POLITICA DE DESENVOLVIMENTO URBANO.
Indexação
  • DEFESA, ATUAÇÃO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), MOTIVO, ARTIGO DE IMPRENSA, IMPRENSA, ESPECIFICAÇÃO, PERIODICO, VEJA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP).
  • JUSTIFICAÇÃO, PROJETO DE DECRETO LEGISLATIVO, AUTORIA, ORADOR, CONVOCAÇÃO, PLEBISCITO, INCORPORAÇÃO, MUNICIPIOS, ENTORNO, DISTRITO FEDERAL (DF).

O SR. EURÍPEDES CAMARGO (Bloco/PT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, acompanhei atentamente o início da sessão e as manifestações dos dois primeiros oradores, ou seja, os seus entendimentos políticos. Logo que cheguei ao plenário, tentei acompanhar quantas vezes eles falaram no Partido dos Trabalhadores em seus discursos. Na verdade, trata-se de uma apologia ao Partido. Portanto, quero agradecer a preocupação dos companheiros pela forma como citaram, explicitaram ou colocaram suas posições. Isso demonstra a importância do Partido. Eu parabenizo S. Exªs e considero muito importante essa manifestação de apreço.

Hoje, a imprensa, como por exemplo, a revista Veja, traz algumas questões ligadas a escândalos. É importante que essas denúncias aconteçam neste Brasil revisado e, como se diz no jargão utilizado pela imprensa, “no Brasil passado a limpo”. Elas têm muito a ver com a construção que estamos fazendo - e eu não diria só o meu Partido, mas toda a sociedade organizada deste País - e têm contribuído para que passemos desse patamar das coisas escondidas para as transparentes. E todos nós que nos envolvemos nesse processo da transparência do que acontece na vida pública somos co-responsáveis por este momento que estamos vivendo. Infelizmente, há notícias que desabonam, mas o fato de que elas não estejam escondidas, para mim, é um ponto positivo, porque estamos trabalhando nesse sentido.

Um dos temas aqui abordado foi o caso Banestado. Esse assunto vem sendo denunciado pela imprensa de modo grave e vasto já há alguns anos e o seu desfecho foi a CPI, dita aqui como a CPI que não avançou. E ficou parecendo que o Partido dos Trabalhadores citado nas fitas - se pegarem as notas taquigráficas conferirão - teve algo a ver com o fato. Na verdade, quem preside a Comissão desta CPI não é o Partido dos Trabalhadores. Então, como foi citado o Partido, eu estou aqui querendo dizer que as pessoas, ao citarem a fonte, precisam citar também a ligação, já que tentam colocar o Partido dos Trabalhadores como o responsável pelo processo. No entanto, nós sabemos que esse é um fato concreto. Eu estou somente registrando os fatos relacionados às questões.

A outra questão abordada hoje foi sobre o Ministro Ciro Gomes. Segundo o que li na revista sobre a entrevista do Ministro Ciro Gomes, a posição de S. Exª sobre a campanha não foi aquela publicada pela reportagem; pelo contrário, ele considera que o Partido dos Trabalhadores teve uma postura limpa e transparente em relação à sua candidatura. A prova disso é que hoje ele é Ministro do Governo sem nenhum problema de consciência. Portanto, a tentativa de colocar a questão de forma direcionada, dizendo que “A” ou “B” foi perseguido, culpando a quem tenham interesse em fazê-lo, como foi o caso da própria pessoa que se colocou neste plenário, como se fosse a pessoa atingida, não corresponde à verdade, pois S. Exª não se sentiu assim durante o processo eleitoral. Logo, acredito que essa seja uma tentativa de aleivosia. Registro isso, porque não poderia assistir a essas manifestações no plenário sem me pronunciar sobre as mesmas.

Sobre a questão do Distrito Federal, há uma decisão, um encaminhamento do TRE ao TSE. Portanto, esperamos o julgamento. O Distrito Federal, durante um bom período, esteve, e ainda continua, como manchete negativa nas páginas da imprensa. Mas não foi o Partido dos Trabalhadores que o colocou nessa situação; as circunstâncias o levaram a isso. Assim, gostaria de deixar muito clara essa questão que está ocorrendo com o Distrito Federal, no caso, com o Governador Joaquim Roriz e a sua vice, que também não é do mesmo partido. Eu não gostaria de fazer aqui esse embate de partido para partido, até porque respeito as organizações partidárias. Acredito que, no seu bojo, é que os quadros são discutidos, trabalhados, vistos e encaminhados. Portanto, não quero citar esse ou aquele partido, pois entendo que em todos os partidos há pessoas competentes - e o Senado é prova cabal disso. Logo, não quero me referir ao partido dessas pessoas envolvidas, por respeitar e entender que é dentro dos seus partidos que se coloca em discussão os seus quadros. Esse era o registro que queria fazer antes de passar para o assunto que me trouxe a esta tribuna.

Trago para conhecimento e apreciação das Srªs e dos Srs. Senadores o PDS 317, de 2003, de minha autoria, que tramita nesta Casa, na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Trata-se da convocação de plebiscito dos Municípios de Águas Lindas, Santo Antônio do Descoberto, Cidade Ocidental, Valparaízo de Goiás, Novo Gama e Planaltina de Goiás, a fim de submeter à consulta popular a incorporação desses Municípios ao Distrito Federal. Vou explicar o porquê dessa proposta.

Como é do conhecimento de todos, a Constituição Federal prevê a possibilidade de “os Estados se incorporarem entre si, subdividir-se para se anexarem a outros, ou formarem novos Estados ou Territórios Federais, mediante aprovação da população diretamente interessada, através de plebiscito, e do Congresso Nacional, por lei complementar”.

Para que os senhores possam entender as motivações que me levam a tal proposição, resgato aqui um pouco da história política do DF. Brasília foi fruto do processo de interiorização do País, reivindicado desde 1780 pelos Inconfidentes.

Com a Proclamação da República, em 1889, o ideal de interiorização transforma-se em preceito constitucional. Em seu art. 3º, a Constituição estabelecia: “Fica pertencente à União, no Planalto Central da República, uma zona de 14.400 km2, que será oportunamente demarcada, para nela estabelecer-se a futura Capital Federal”.

Assim, em 1892, foi constituída a conhecida Missão Cruls, para demarcar a área do futuro Distrito Federal. Os estudos desenvolvidos resultaram na definição da zona constitucionalmente definida, com a indicação do Quadrilátero Cruls, área retangular que incorporava os limites de antigas fazendas do Estado de Goiás, pertencentes às cidades de Planaltina e Luziânia.

No centenário de nossa Independência foi lançada, em Planaltina, a Pedra Fundamental do Distrito Federal.

A cidade de Brasília, projetada por Lúcio Costa e construída por Oscar Niemeyer para ser a nova Capital do País, foi inaugurada em 1960, respaldando a política desenvolvimentalista implementada pelo Governo de Juscelino Kubitschek.

Desde sua criação, Brasília tem sido marcada pela intensa atividade política de sua população, desde a luta por direitos trabalhistas dos que a construíram, gerando episódios como o Massacre da Pacheco Fernandes, conflito entre polícia e trabalhadores pioneiros da construção da cidade, até manifestações de repúdio à ditadura militar por estudantes e professores da Universidade de Brasília.

Em 1984, a Capital se destacou no cenário nacional pelo movimento organizado em torno das Diretas Já, que visava consagrar à restituição dos direitos democráticos usurpados durante a ditadura militar.

Além das grandes reivindicações de caráter nacional, nossa população também se mobilizou, desde o primeiro momento, em torno de direitos e melhorias para a cidade, protagonizando lutas em torno de direitos como o da moradia, de que participei como militante da Associação dos Incansáveis, Moradores da Ceilândia, assentamento populacional que visava à erradicação das favelas no Distrito Federal.

Desde o início, esteve presente entre os militantes do movimento popular e sindical a certeza de que a autonomia política era uma conquista fundamental para o exercício democrático da cidadania em nossa cidade.

Após 26 anos de tutela, a representação política foi negada ao povo do Distrito Federal. Conseguimos conquistar com muita luta o direito de eleger nossos Deputados Federais e Senadores por meio do voto.

Na Constituinte, conquistamos o direito de eleger, pela primeira vez, governadores e membros de uma câmara legislativa que se consagrou na Constituição de 1988.

Somente nas eleições de 1990, o Distrito Federal teve seu primeiro Governador eleito e também seus primeiros deputados distritais. Nossa autonomia política tornou-se realidade em 1991, com a instalação da Câmara Legislativa, da qual fiz parte como Deputado Distrital, tendo tido o privilégio de participar da criação da Lei Orgânica do Distrito Federal, que teve o objetivo de organizar o exercício do poder, fortalecer instituições democráticas e os direitos da pessoa humana.

Para nós, que vimos nascer essa cidade e lutamos para que seus cidadãos tenham condições dignas de vida, a autonomia política do Distrito Federal é um princípio inegociável.

Reconheço que hoje o crescimento populacional do Distrito Federal e da chamada região do Entorno criam dificuldades para o atendimento da população com serviços públicos de qualidade e é por isso que proponho a ampliação legal do Distrito Federal, a fim de consagrar por direito algo que já existe de fato.

A ampliação do Distrito Federal com a inclusão dos Municípios do Entorno já citados irá não apenas oficializar uma situação já existente, mas também possibilitar maior aporte de recursos para o Distrito Federal, de forma a permitir atendimento adequado à população que recorre aos serviços de educação e saúde do Distrito Federal, entre outros.

Segundo o Anuário Estatístico do Distrito Federal, ano 2001, recentemente divulgado pelo Palácio do Buriti, cerca de 60% da população desempregada da Capital federal é proveniente da chamada região do Entorno.

No campo da educação, conforme levantamento também recente da Secretaria de Educação do Distrito Federal, mais de seis mil crianças e jovens provenientes do Entorno, diariamente, deslocam-se de suas cidades para estudar em escolas da rede pública de ensino do Distrito Federal, usando inclusive o endereço de parentes na Capital federal para poderem matricular-se.

Na área de saúde, o problema assume proporções alarmantes, gerando enorme queda na qualidade dos serviços oferecidos e privando enorme contingente populacional do atendimento hospitalar.

Estudo realizado pela Secretaria de Planejamento, que trata da situação socioeconômica e cultural do Entorno, revela que os moradores dos Municípios situados na divisa com a BR-040, como Águas Lindas, Novo Gama, Valparaíso e Santo Antônio do Descoberto, são os que mais utilizam os serviços do Distrito Federal: cerca de 50% dos moradores dessas cidades trabalham no Distrito Federal e mais de 60% utilizam a rede hospitalar local.

O projeto que apresento leva em conta a atual realidade dessa região e busca contribuir para a solução desses problemas. Os Municípios de Águas Lindas, Santo Antônio do Descoberto, Cidade Ocidental, Valparaízo de Goiás, Novo Gama, Planaltina de Goiás são hoje verdadeiras cidades satélites de Brasília e grande parte de sua população vive fundamentalmente em função dos empregos e serviços públicos ofertados pela Capital federal.

Uma das conseqüências da aprovação dessa proposição, que virá minorar as dificuldades enfrentadas atualmente pelo Distrito Federal, é o maior aporte de recursos que deverá resultar do acréscimo populacional dela conseqüente, que incrementará o coeficiente de participação do Distrito Federal na repartição dos fundos constitucionais, proporcionando condições adequadas para melhor oferta de serviços públicos à população das áreas a serem incorporadas.

Enfim, gostaria de concluir dizendo que grande parte do drama urbano que nos aflige, gerando violência e degradação das condições de vida, deriva do processo de exclusão de grande parte da população de nosso País, a qual está à margem dos direitos elementares. Isso nos impõe a responsabilidade de erguer nossas vozes contra medidas que venham a agravar esse verdadeiro fosso social.

Devemos usar nossos recursos para encontrar soluções para os enormes problemas de desigualdade de oportunidades que geram as distorções que não são resolvidas senão com justiça social.

Com a proposição ora apresentada, pretendo dotar o Distrito Federal de melhores instrumentos para promoção do bem-estar, resgatando o sonho da “Capital da Esperança”.

Esse é o intuito do projeto. Espero contar com o apoio dos meus Pares nesta Casa.

Muito obrigado, companheiros.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/12/2003 - Página 39537