Discurso durante a 174ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com os indicadores econômicos do governo Lula.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Preocupação com os indicadores econômicos do governo Lula.
Aparteantes
Antonio Carlos Valadares.
Publicação
Publicação no DSF de 03/12/2003 - Página 39640
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • APREENSÃO, SITUAÇÃO, ECONOMIA NACIONAL, PERIODO, GESTÃO, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, REGISTRO, DADOS, REDUÇÃO, CRESCIMENTO ECONOMICO, AGRAVAÇÃO, PROBLEMA, DESEMPREGO, AUMENTO, NUMERO, FALENCIA, TAXAS, JUROS, FALTA, DEFINIÇÃO, POLITICA HABITACIONAL, POLITICA INDUSTRIAL.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, pretendo hoje abordar a situação das cooperativas de crédito no Governo Lula. Mas, antes, creio ser necessário fazer referência a indicadores econômicos que acabam por desmentir o otimismo governamental sobre a retomada do crescimento econômico.

            O mercado financeiro reduziu fortemente a projeção média para o crescimento do PIB brasileiro em 2003. De acordo com o Relatório Focus, publicado semanalmente pelo Banco Central, a média das expectativas para o crescimento da economia do País neste ano caiu de 0,68% para 0,30% na última semana.

O Presidente Lula continua otimista. No seu programa de rádio, ele afirmou ter certeza de que 2004 será um ano muito melhor. É claro que desejamos que o Presidente, como pitonisa, acerte; mas, lamentavelmente, como pitonisa, ele não tem sido competente. Há cinco meses, ele previu que o espetáculo do crescimento começaria em julho. O Presidente anunciou o início do espetáculo do crescimento para o mês de julho. Estamos em dezembro, aguardando o chamado espetáculo do crescimento. Na verdade, estamos verificando a ocorrência do espetáculo do crescimento às avessas, para infortúnio de todos nós brasileiros.

Agora o Presidente o adia para 2004. O Presidente acertará? Essa é a expectativa nacional.

Creio que o Presidente Lula deve aprender a lição de Charles de Gaulle: “quem tem o poder deve agir mais e falar menos”. Creio ser essa a recomendação fundamental para que o Presidente Lula evite determinadas situações de constrangimento.

Aliás, o bloco dos otimistas, sediado no Ministério da Fazenda, aposta na retomada do crescimento. Como escreveu Clóvis Rossi, em seu artigo de hoje, na Folha de S.Paulo, os ingressos para o show do crescimento já podem ser vendidos, porque ele é inevitável. Essa é a opinião daqueles que compõem o bloco dos otimistas. O carnaval ainda não chegou, mas existe o bloco dos otimistas no Ministério da Fazenda.

É preciso precaução. É preciso invocar a razão, o equilíbrio, o comedimento, a prudência, porque, com o atual patamar dos juros, não há espetáculo de crescimento. No máximo, teremos uma ópera-bufa.

Será vital também implementar a política industrial, já anunciada com pompa e circunstâncias, que carece ainda de definições urgentes. Até aqui, circunscreveu-se a um tratado de bons princípios. O Senado Federal precisa debater a política industrial do País, porque é fundamental que se adote uma política industrial competente, para que o País possa retomar o crescimento econômico.

Não podemos ancorar a retomada do crescimento apenas no consumo efêmero. São necessários investimentos públicos e privados. E manter a meta de 4,25% de superávit fiscal primário, sem dúvida, é impedir a retomada do crescimento econômico.

Creio ser difícil compatibilizar essa meta de superávit primário com o objetivo de crescimento econômico anunciado pelo Governo e pelo Presidente da República. De um lado, o Governo anuncia que vai manter o aperto fiscal e que vai manter a política - uma imposição do Fundo Monetário Internacional - de se alcançar superávit primário de 4,25%. Não entendemos como pode a economia retomar o crescimento acelerado com o Governo colocando com força o pé no freio, para atender às imposições do Fundo Monetário Internacional.

Dado importante revela o aprofundamento da crise social no Brasil e retrata o crescimento acelerado do desemprego, exatamente na contra-mão do principal compromisso deste Governo - ou do candidato Lula em campanha -, de gerar dez milhões de empregos no País, durante dez anos. O Governo Federal pagou, até o final de outubro, 93,1% dos recursos previstos no Orçamento para o seguro-desemprego. É provável que os R$8,5 bilhões reservados ao benefício acabem antes do final do ano. Isso é muito sério, grave e revelador. É evidente que é o retrato da recessão.

O desemprego cresceu 21,7%, em oito meses, neste ano. Houve o pior desempenho do PIB, que encolheu 1,5% no último trimestre. Esse é o cenário da economia nacional neste momento. Quando os recursos aprovisionados para pagamento do seguro-desemprego acabam antes do final do ano, tem-se o retrato da situação desesperadora em que se encontram os trabalhadores do País.

E já há uma repercussão externa. O Presidente Lula está dedicando-se, à exaustão, à política externa de nosso País. As suas viagens se tornaram rotina. Ainda hoje, o Presidente Eduardo Siqueira Campos leu anúncio do Presidente comunicando sua ausência do País até o dia 11 de dezembro, em mais uma viagem internacional. Não estamos aqui questionando as viagens do Presidente. Estamos, aqui, anunciando que a imagem de nosso País no exterior começa a ficar comprometida, porque há uma contradição entre aquilo que o Governo e o Presidente anunciam e aquilo que vem ocorrendo, especialmente no que diz respeito à economia nacional.

Diz o Financial Times, o respeitado jornal inglês: “Euforia no Brasil pode ter vindo cedo demais”. Faltou o jornal dizer “Euforia do Presidente do Brasil” ou “Euforia do Governo do Brasil” ou “Euforia de parte do Governo do Brasil” - aquela constituída pelo núcleo dos otimistas do Ministério da Fazenda -, porque, na verdade, não há esse otimismo propalado pelo Governo no seio da população brasileira, e o jornal destaca que a euforia pode ter vindo cedo demais. E diz: “Lula se tornou o xodó dos mercados financeiros”. E é bom para o País o Presidente ser xodó dos mercados financeiros? É evidente que não. Creio que esse título de “xodó dos mercados financeiros” não faz bem ao currículo do Presidente Lula e não é compatível com sua história, com sua pregação política de tantos anos.

O jornal destaca que a política fiscal severa do Governo Lula convive com uma recuperação da recessão, lenta e dolorosa. As pessoas empregadas estão ganhando, em média, 15,2% menos, em termos reais, do que no ano passado. Isso é da maior gravidade. Não é apenas o desemprego, não se trata de anunciar a angústia e a inconformidade do desempregado no País. Há também a inconformidade dos empregados, dos trabalhadores que mantêm o emprego e que estão ganhando, em média, 15,2% menos, em termos reais, do que no ano passado. É evidente que não foi isso que o Presidente Lula prometeu como candidato à Presidência da República.

O número de falências vem crescendo. Mesmo com um superávit primário de 4,25%, os pagamentos de juros significam que o Brasil terá de se defrontar com o déficit nominal de 4% do PIB.

A análise do jornal destaca que o peso dos juros e do principal da dívida continua sendo esmagador. É evidente que todos sabemos disto: a dívida pública brasileira esmaga as esperanças de crescimento econômico. Enquanto o Governo atender às imposições do Fundo Monetário Internacional, não teremos esperanças de crescimento com justiça social.

Não há, repito, exemplo no mundo de país que retomou o crescimento econômico nos níveis desejados aceitando as imposições do Fundo Monetário Internacional. Evidentemente, o Fundo é importante em determinadas circunstâncias, não podendo ser dispensado em determinados momentos, mas a perenidade ou a permanência do Fundo impondo a sua prática durante muito tempo asfixia a economia de uma nação, e é o que vem ocorrendo no Brasil.

A construção civil, por exemplo, que é um setor de dinamismo ímpar em nosso País, responsável pela geração de bom percentual dos empregos, sofreu o maior revés deste ano. Mais de 50 mil empregos foram ceifados, e o PIB do setor recuou 10,9% no terceiro trimestre, voltando ao patamar do segundo trimestre de 1991. Recuamos de 2003 para 1991. Convenhamos que se trata de um recuo significativo. A construção civil deve encolher 8% neste ano.

O economista Luciano Coutinho, que creio ser um economista respeitado pelo Presidente da República, atua na extraordinária Unicamp e, em estudo recente, mostrou que o País tem hoje um déficit de 6,6 milhões de moradias e que, para reduzi-lo, é necessário construir 600 mil moradias por ano. A maior parte desse déficit, 83,2%, está concentrada nas famílias com renda entre um e três salários mínimos. Portanto, os excluídos do País são aqueles que aspiram à casa própria. O sonho da casa própria tem sido esse pesadelo interminável, e não há no Governo Lula nenhuma proposta competente que nos permita uma alteração dessa realidade. Não há essa proposta; não a conhecemos. Até este momento, o Governo Lula não apresentou uma proposta de política habitacional que possa nos convencer de que essas cifras dramáticas serão alteradas.

O Sr. Antonio Carlos Valadares (Bloco/PSB - SE) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Com prazer, Senador Antonio Carlos Valadares.

O Sr. Antonio Carlos Valadares (Bloco/PSB - SE) - Senador Alvaro Dias, como sempre, os discursos de V. Exª são recheados de dados e de preocupações quanto ao desenvolvimento de nosso País. De fato, o Brasil tem uma realidade econômica e social complexa e de difícil solução, pelo menos no momento. Há anos, o País vem sofrendo com um desenvolvimento estancado, principalmente pelas altas taxas de juros. Nos oito anos do Governo passado, houve momentos em que a taxa Selic de juros atingiu um patamar superior a 40%. Hoje, apesar das dificuldades, essa taxa de juros baixou substancialmente, situando-se abaixo dos 20%. Mas, apesar disso, os bancos continuam impondo taxas absurdas aos seus usuários, fazendo com que o desenvolvimento do País fique a depender da sua boa vontade. É preciso que o Governo direcione sua atenção para a lucratividade excessiva dos bancos. Tanto eu quanto V. Exª já falamos sobre esse assunto, sobre os lucros exorbitantes do sistema financeiro nacional. De outro lado, na gestão passada, o Brasil quebrou três vezes. E é bom que nos lembremos de que as intervenções do FMI, apesar das restrições que fazemos a elas, foram benéficas para evitar que o Brasil quebrasse até à cepa. Três vezes, o FMI socorreu o Governo de Fernando Henrique Cardoso. Se não tivesse havido negociação, teríamos mergulhado, quem sabe, em uma crise semelhante à da Argentina. Senador Alvaro Dias, se, porventura, a política nacional tivesse sido direcionada para o social nos últimos anos, se, por exemplo, as privatizações não tivessem sido feitas sem nenhum critério, se nosso patrimônio não tivesse sido vendido por dinheiro de banana, certamente não estaríamos tão pobres quanto hoje. Vendemos as estatais sob o prisma de que pagaríamos a dívida, de que faríamos em muitos Estados o fundo de previdência, e nada disso aconteceu. Perdemos o patrimônio, o Brasil ficou mais pobre, e a dívida não foi paga. Pelo contrário, hoje, somente os encargos da dívida estão perto de R$120 bilhões anuais. Houve a venda dos bancos estaduais, o Proer veio em socorro dos bancos quebrados, o Brasil teve que recorrer a um volume de aproximadamente R$30 bilhões, tudo isso compôs um quadro totalmente desfavorável ao atual Governo. Se há demora para chegarmos ao pleno desenvolvimento, ao crescimento econômico, com geração de emprego e renda, se temos essas dificuldades produzidas por situações complexas anteriores, temos também a esperança de que o Brasil mergulhará definitivamente em um sistema de desenvolvimento econômico, promovendo a igualdade e acabando com a desigualdade interpessoal e regional. Não vou mais tomar o tempo de V. Exª. Apesar dos números apresentados por V. Exª, sou otimista. Quero crer que vamos sair desse cipoal de dificuldades e mergulhar numa situação completamente diferente. O Brasil, hoje, é um país acreditado, e não se vislumbra uma crise nacional que venha a colocá-lo em uma situação como a de 1988, quando quebrou e precisou recorrer ao FMI, pela terceira vez, durante o último Governo. Louvo V. Exª por essas preocupações, mas continuo otimista: se não temos projetos consistentes em face da absoluta falta de recursos, vamos construir uma situação em que teremos os recursos orçamentários para promover o desenvolvimento dos Estados, dos Municípios e da própria União. Vamos resolver, por exemplo, o problema das estradas, das obras de infra-estrutura. As reformas tributária e previdenciária estão paulatinamente sendo aprovadas, e quero crer que também o será a reforma política, para que haja um quadro de representação em nosso País menos comprometido com o capital, mas mais compromissado com o dever social de cada um de nós, cidadãos brasileiros. Obrigado a V. Exª.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Obrigado, Senador Antonio Carlos Valadares. V. Exª valoriza o Senado com sua atuação sempre brilhante.

Também sou um otimista em relação ao Brasil. Como ensina o filósofo italiano Antonio Gramsci, devemos ser pessimistas no diagnóstico e otimistas em relação às soluções.

O diagnóstico é pessimista. Não temos o direito de iludir a opinião pública brasileira, apresentando um diagnóstico distanciado da realidade. Os indicadores econômicos são esses que ora estou apresentando. No entanto, é evidente que eles não são suficientes para matar o nosso otimismo em relação ao futuro deste País.

Tenho o dever, desta tribuna, de apontar os erros do Governo - e o atual Governo tem errado demais. Tinha o dever, no passado, de apontar os erros do Governo passado e, particularmente, apontei-os modesta e humildemente, quando fui capaz de fazê-lo.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - E vivi momentos de choque com o Governo, embora integrasse o seu próprio Partido.

Hoje, na Oposição, mais do que antes, tenho o dever de apontar os erros do Governo. E veja, Sr. Presidente, que esse tema é tão fascinante, que aquele que havia escolhido para o discurso de hoje ficará para outra ocasião. Não falarei sobre as cooperativas de crédito no atual momento brasileiro; eu o deixarei para outra oportunidade.

Agradeço a V. Exª a benevolência em relevar os dois minutos e dez segundos que ultrapassei no meu tempo.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/12/2003 - Página 39640