Discurso durante a 177ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Audiência Pública realizada pelas Comissões de Educação e de Assuntos Sociais a respeito da biossegurança e dos transgênicos.

Autor
Juvêncio da Fonseca (PDT - Partido Democrático Trabalhista/MS)
Nome completo: Juvêncio Cesar da Fonseca
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.:
  • Audiência Pública realizada pelas Comissões de Educação e de Assuntos Sociais a respeito da biossegurança e dos transgênicos.
Aparteantes
Augusto Botelho, Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 06/12/2003 - Página 40131
Assunto
Outros > POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.
Indexação
  • IMPORTANCIA, REALIZAÇÃO, AUDIENCIA PUBLICA, CONSULTA, CIENTISTA, PESQUISADOR, ASSUNTO, BIOTECNOLOGIA, PRODUTO TRANSGENICO, CONCLUSÃO, NECESSIDADE, APROVEITAMENTO, OPORTUNIDADE, DESENVOLVIMENTO, AGRICULTURA, PECUARIA, INCENTIVO, PESQUISA CIENTIFICA E TECNOLOGICA, DEFESA, REGULAMENTAÇÃO, FLEXIBILIDADE, ATUAÇÃO, Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBIO).
  • ESCLARECIMENTOS, SEGURANÇA, UTILIZAÇÃO, PRODUTO TRANSGENICO, VANTAGENS, PRODUTIVIDADE, SAFRA, ALIMENTOS, PROTEÇÃO, MEIO AMBIENTE, CARATER PROVISORIO, MONOPOLIO, EMPRESA, SEMENTE, POSSIBILIDADE, PRODUÇÃO, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), PROMESSA, MINISTERIO DO MEIO AMBIENTE (MMA), DESBUROCRATIZAÇÃO, Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBIO).

O SR. JUVÊNCIO DA FONSECA (PDT - MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, anteontem e ontem, as Comissões de Educação e de Assuntos Sociais, em conjunto, promoveram uma audiência pública de grande importância para o Senado Federal, para o Congresso Nacional e para o País. Essas audiências públicas versaram sobre consulta, especialmente aos cientistas, quanto à visão desses cientistas e pesquisadores sobre a biotecnologia, sobre os transgênicos.

A iniciativa do requerimento foi nossa, subscrita pelo ilustre Senador Augusto Botelho e pelo Senador Sibá Machado.

Ouvimos, nesta audiência, nove pessoas. Destacamos entre elas ex-presidentes da CTNBio, biologistas, cientistas, pesquisadores de renome internacional, todos brasileiros, como Ernesto Paterniani, Elíbio Rech, Francisco Aragão, Robinson Pitelli, Luiz Fernando Lima Reis, Fernando Reinach e Dr. Rubens Nodore, do Ministério do Meio Ambiente.

Hoje há uma preocupação muito grande do povo brasileiro em entender qual o rumo que se toma - favorável ou contrário - quanto aos transgênicos.

Os ambientalistas ocupam um espaço bastante grande, dizendo que os transgênicos são nocivos à saúde e ao meio ambiente, mas os cientistas entendem o contrário. Enquanto os primeiros ocupam um espaço da comunicação bastante grande, fazem movimentos de grande importância no mundo inteiro contra os transgênicos, os cientistas geralmente se recolhem, falam menos, são acanhados.

Foi esta a razão de ser do nosso requerimento: ouvirmos os cientistas a respeito da transgenia. Esses cientistas nos trouxeram uma visão importantíssima. A primeira conclusão a que cheguei, após essas duas audiências públicas, foi a de que o Brasil, se continuar comportando-se como está, amarrando as mãos da Ciência e dos pesquisadores na área da biotecnologia, perderá sua oportunidade de desenvolvimento na área do agronegócio, oriundo do produto da agricultura e da pecuária, assim como já perdeu uma importante oportunidade na política da reserva da Informática para o País.

Pois bem, esses cientistas são enfáticos em dizer que este é o momento certo, preciso para que Brasil se desamarre e avance na área da biotecnologia. Já temos grandes conquistas alcançadas nessa área, há cientistas brasileiros qualificados, de renome internacional, mas eles dizem claramente que o órgão nacional que desenvolve a pesquisa, que autoriza a utilização ou não dos produtos transgênicos, a CTNBio - Comissão Técnica Nacional de Biossegurança , está por demais amarrada, porque a regulamentação é confusa. Na verdade, a regulamentação da sua ação é no sentido de evitar que se faça a pesquisa neste País.

Sr. Presidente, a primeira proposta dos cientistas é justamente uma regulamentação que flexibilize a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança, no sentido de que a pesquisa flua, que os cientistas possam trabalhar, que realmente o Brasil avance na era da biotecnologia, liderando mundialmente esta pesquisa científica, como já quase lidera, mesmo estando com as mãos amarradas. A visão científica é por demais clara.

Certos argumentos contra a transgenia foram derrubados nessa reunião. O que preocupa é o perigo de os produtos transgênicos afetarem a saúde humana ou o meio ambiente, mas não há, segundo os cientistas, nenhuma prova de que um produto transgênico seja mais perigoso ou menos perigoso, mais danoso ou menos danoso à saúde, ao meio ambiente do que qualquer outro produto orgânico. Não há diferença. Um grão de soja transgênico que se tenha em mão será idêntico, será igual a um grão de soja orgânico, que não seja transgênico. Não faz mal à saúde e não faz mal ao meio ambiente, tanto quanto o orgânico. Não há diferença. E, para todo e qualquer desvio que possa advir na transgenia, de qualidade divergente da inicialmente proposta, a biotecnologia tem instrumentos, tem condições, de imediato, de redirecionar o trabalho e corrigir o defeito.

Um fato importante mencionado por um dos palestrantes foi sobre a grande preocupação do mundo hoje, que é com a fome e com o meio ambiente. Produzir alimentos é papel da agricultura e da pecuária. A agricultura e a pecuária mexem com a terra. O meio ambiente está justamente nesse cenário. A população mundial cresce, como também cresce a necessidade de alimentos, mas os recursos naturais para produção desses alimentos são limitados, a área agricultável é uma só no mundo inteiro. E os dados históricos dos últimos cinco anos demonstram que dobrou a produção agrícola, apesar de que só avançamos 17% a 20% na área plantada.

O que é que garantiu essa diferença de 100%, ocorrida no Brasil nos últimos dois anos? O que garantiu que avançássemos tão pouco na área agricultável, mas tanto na produtividade? Foi justamente a tecnologia, não só do Brasil, que não tem transgênico, mas a tecnologia do mundo, desde a revolução verde, com os agrotóxicos e com a produção da semente de melhor qualidade para uma melhor produtividade. E a biotecnologia chega nesta hora em que a projeção para o mundo é de que, até 2050, tenhamos que triplicar a produção de alimentos. Se a área agricultável do planeta está quase exaurida, como conseguiremos triplicar a produção de alimentos sem triplicar a área cultivada? Somente por meio da tecnologia, principalmente a biotecnologia dos alimentos transgênicos. E, quando se diz que o transgênico afeta o meio ambiente, é preciso também dizer que este evita a utilização de agrotóxicos no volume utilizado na produção natural, orgânica, como ocorre. Enquanto uma soja não transgênica necessita de quatro ou cinco pulverizações de agrotóxicos, a transgênica necessita de uma ou duas. A simples diminuição do uso de agrotóxicos na produção dos alimentos transgênicos já significa preservação do meio ambiente. E o simples fato, Sr. Presidente, do aumento da produção ou da produtividade dos alimentos sem aumento da área agricultável significa ganho ambiental, pois, todas as vezes em que se aumenta a área de produção agrícola, isso significa agressão ao meio ambiente. Contudo, se há instrumentos para conter a expansão de área agricultável, colaboramos com o meio ambiente. Portanto, os alimentos transgênicos são essencialmente uma segurança da preservação ambiental do planeta.

Com referência à saúde, reafirmamos: não há nenhuma diferença para a saúde entre transgênicos e orgânicos. Mas, mesmo assim, foi colocado por um dos palestrantes, que não era cientista, que nos Estados Unidos a batata transgênica foi rejeitada pelo McDonald’s. Isso não significa nada. Isso é uma questão de mercado, não é de saúde. No caso, foi uma questão de gosto.

Portanto, se não temos problemas com a saúde, se não temos problemas ambientais, de acordo com os cientistas, por que é que aqui no Brasil se fala tanto contra os transgênicos? Fala-se tanto contra os transgênicos, Senador Mão Santa, porque eles também representam um instrumento de morte para muitas iniciativas privadas que existem por aí.

Vamos dar alguns exemplos sobre a produção de transgênicos.

Nos Estados Unidos, líder mundial inconteste na produção de transgênicos, foram plantados 60 milhões de hectares de soja transgênica. Segundo a Academia de Ciências dos Estados Unidos, o transgênico não faz mal à saúde nem causa dano algum ao meio ambiente.

A soja transgênica e a orgânica, Sr. Presidente, são iguais. A diferença é que uma tem um gene inoculado no outro, de maneira diferenciada e que dá o produto transgênico que nós conhecemos.

Se nos Estados Unidos a Academia de Ciências e os outros órgãos dizem sim aos transgênicos; se o Canadá, da mesma maneira, diz sim aos transgênicos; se a Austrália diz sim aos transgênicos; se a Argentina, pertinho de nós, nosso grande concorrente, segundo produtor mundial de alimentos transgênicos, diz sim aos transgênicos; se a Coréia do Sul está priorizando a tecnologia voltada para a conquista do espaço, lançando satélites, e a biotecnologia; se a China igualmente está avançando na biotecnologia, produzindo e importando produtos transgênicos - se as academias de ciência desses países afirmam que o transgênico não causa nenhum dano à saúde nem ao meio ambiente -; por que nós aqui, Senador Mão Santa e Senador Augusto Botelho, dizemos, na nossa visão tupiniquim, que temos que ter cautela com a pesquisa transgênica, que temos que ter cautela para nos aventurar com os transgênicos? Quando a ciência deixou de ter cautela ao pesquisar um determinado produto? Quando? Nunca. Mas essa colocação da cautela, com excesso de regulamentação no projeto que vem para esta Casa, exigindo até audiência pública para liberação de produtos na CTNBio, é a amostra mais evidente de que querem continuar amarrando os braços e as pernas das nossas instituições de pesquisa. Infelizmente, o que está acontecendo é isso.

Este instante que estamos vivendo é muito forte. É uma tomada de consciência do que seja este amplo espectro que é o transgênico. Precisamos saber como nos comportar diante dele para podermos votar o projeto de lei do Governo Federal que está chegando ao Senado, que traz os princípios da política nacional de biossegurança, que faz a nova composição da CTNBio e mostra os caminhos da nossa biossegurança.

Esta hora, Senador Mão Santa, é importantíssima.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Juvêncio da Fonseca, eu gostaria de participar do seu pronunciamento.

O SR. JUVÊNCIO DA FONSECA (PDT - MS) - Logo concederei o aparte a V. Exª. Estou ansioso para ouvi-lo, como também ao Senador Augusto Botelho. A inteligência de V. Exª é muito importante nessa área.

O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim) - Desculpe interrompê-lo, Senador Juvêncio da Fonseca. A Mesa faz um apelo para que os apartes sejam feitos dentro do tempo do orador, e lhe faltam três minutos.

É claro que a Mesa será tolerante com o orador, mas os apartes só poderão ser concedidos dentro do tempo. Isso não quer dizer, Senador, que não serei tolerante com V. Exª, como fui com a oradora que o antecedeu.

O SR. JUVÊNCIO DA FONSECA (PDT - MS) - Concedo o aparte ao Senador Mão Santa.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Estou atentamente ouvindo V. Exª e lamento a grande perda do meu Partido. O PT pode oferecer até seis ministérios. Lamentamos a perda do nome de V. Exª, que, sem dúvida nenhuma, se destaca nesta Casa como um dos nomes de maior competência. Todos sabemos da sua competência jurídica, do seu comportamento presidindo a Comissão de Ética e, agora, da sua prudência. Fui professor de Biologia, Genética e Fisiologia. Tive um professor que dizia: “A ignorância é audaciosa”. V. Exª dá o exemplo: veio usar da palavra depois que ouviu os cientistas e os técnicos, a quem também tive o prazer de ouvir. O momento mais alto do Senado foi quando se teve a inspiração de convidar os cientistas para explicar esse assunto complicado, cuja discussão começou em 1635, com Mendell, e continua evoluindo. E eu, como cirurgião, quero dizer que as perspectivas não só da agricultura como da cirurgia de transplante são essas. Os países poderosos estão fazendo pesquisas genéticas para fazer órgãos transgênicos para continuar a evolução. Nobre Senador, o Brasil aplaudia V. Exª como jurista e agora aplaude como grande estadista. Em minha opinião, o cargo de prefeito, a que V. Exª almeja, é uma moldura muito pequena. V. Exª podia ser o próximo Presidente da República do Brasil.

O SR. JUVÊNCIO DA FONSECA (PDT - MS) - Agradeço as sábias e amigas palavras do Senador Mão Santa.

Concedo um aparte ao Senador Augusto Botelho.

O Sr. Augusto Botelho (PDT - RR) - Nobre Senador, é com prazer que tenho participado como co-autor das audiências que V. Exª convocou. Fico feliz de V. Exª estar fazendo um resumo da posição da ciência em relação aos transgênicos em seu discurso, mas essa audiência também trouxe algumas coisas que ignorávamos, os Senadores e a população do Brasil em geral, como, por exemplo, alguns organismos que estão sendo desenvolvidos para ter resistência a insetos. Quando se pesquisa um organismo novo, que tem resistência a algumas lagartas, a alguns insetos, ele é tratado como agrotóxico. Ao ser tratado como agrotóxico, o caminho até chegar à pesquisa prática é complicado, é um labirinto. Eu ignorava esse fato e quero torná-lo público para reafirmar que a genética tem que ser tratada diferenciadamente. Nessas reuniões que estamos realizando, tomamos conhecimento de que o Brasil estava na ponta em engenharia genética. Temos pesquisadores que são considerados o ápice da pirâmide do conhecimento da engenharia genética, mas as nossas pesquisas estão atrasadas três anos por causa dessa espécie de inquisição com o setor. Eu não sabia que tínhamos chegado a queimar experimentos no Brasil por causa desse movimento retrógrado que está acontecendo aqui. Sei que V. Exª, com essa conferência que fez, está dando um passo no sentido de alargar o conhecimento de todas as pessoas. Como V. Exª já era detentor do conhecimento, tomou a iniciativa. Vamos fazer as coisas com justiça e dentro do aspecto técnico-científico. Espero que a Lei de Biossegurança seja analisada por esse aspecto. Muito obrigado.

O SR. JUVÊNCIO DA FONSECA (PDT - MS) - Obrigado pelo aparte, Senador Augusto Botelho.

Dois minutos para terminar, Sr. Presidente.

Uma das questões apresentadas é a de que determinada empresa tem nas mãos o monopólio das sementes transgênicas. V. Exª se encontrava presente, nobre Senador Augusto Botelho: os cientistas foram claros ao dizer que o monopólio, se existe, é momentâneo. Basta que a Embrapa continue fazendo suas pesquisas para chegarmos lá. E não se trata apenas da soja, mas também do arroz, do feijão.

Aliás, Sr. Presidente, a Embrapa tem uma pesquisa com o feijão, que, para ser desenvolvida, foi preciso fazer um convênio com os Estados Unidos; não pode fazê-la no Brasil em razão da burocracia. O mesmo ocorre com outra pesquisa em relação à banana, que está sendo desenvolvida pela Embrapa em convênio com Honduras, porque não há condições de realizá-la no País, em razão da regulamentação excessiva.

Nessa área da CTNBio, da biossegurança e da biotecnologia, tenho grande esperança no Governo de Luiz Inácio Lula da Silva, que, nessa reunião, fez-se representar pelo Dr. Rubens Nodari, do Ministério do Meio Ambiente. O Dr. Rubens Nodari foi categórico e enfático ao afirmar para nós, Senadores, na audiência pública, que o Governo Federal está empenhado em simplificar, desburocratizar e desregulamentar a CTNBio e a pesquisa no Brasil e dar celeridade aos processos que foram iniciados. Isso é muito bom. Temos de louvar essa iniciativa, se o Governo Lula pretende fazer com que a ciência respalde o nosso desenvolvimento. Preocupa-me muito, nesta hora em que concorremos com o mundo inteiro, que estejamos atrasados tecnologicamente. Enquanto outros países avançam, nós permanecemos estagnados. O mundo precisa tanto de alimento, e o Brasil, que tem a maior capacidade de expansão agrícola, fica acanhado, com suas instituições de pesquisa e ciência amarradas. Preocupa-me que não avancemos na conquista de uma produtividade que seja a salvação da produção de alimentos, sem agressão ao meio ambiente. Preocupa-me muito que, com essa corrida econômica que ocorre no mundo e com a globalização, fechemos o ano, tendo de pagar, como juros e serviço da dívida por empréstimos internacionais contraídos, mais de R$150 bilhões, enquanto foi propalado que, para investimento no desenvolvimento, serão destinados apenas R$2 bilhões. Preocupa-me que o Brasil não faça parte dessa corrida para o desenvolvimento na área da agroindústria, principalmente porque tem uma capacidade de expansão agrícola que não se iguala à de nenhum outro país - só nós podemos crescer. Esperamos que o brasileiro - em especial, o político brasileiro - compreenda essa grande luta de titãs da globalização e favoreça o Brasil. Sejamos mais protetores da nossa nacionalidade, sejamos nacionalistas em busca da conquista de um lugar ao sol na área da biotecnologia, para o desenvolvimento do nosso País e para o fim da fome no mundo.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/12/2003 - Página 40131