Discurso durante a 177ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações acerca das viagens do Presidente Lula ao exterior. Cobrança do cumprimento de metas anunciadas pelo Governo. Necessidade de se baixar os juros a nível internacional.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA.:
  • Considerações acerca das viagens do Presidente Lula ao exterior. Cobrança do cumprimento de metas anunciadas pelo Governo. Necessidade de se baixar os juros a nível internacional.
Publicação
Publicação no DSF de 06/12/2003 - Página 40161
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • COMENTARIO, VIAGEM, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ORIENTE MEDIO, ELOGIO, POLITICA EXTERNA, BUSCA, INTEGRAÇÃO, TERCEIRO MUNDO, AFRICA, ASIA, AMERICA LATINA, IMPORTANCIA, CAPTAÇÃO, INVESTIMENTO, PAISES ARABES, BRASIL.
  • APOIO, POLITICA EXTERNA, REFORÇO, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), SOLIDARIEDADE, DESENVOLVIMENTO, TERCEIRO MUNDO, ANALISE, PROPOSTA, INCLUSÃO, BRASIL, CONSELHO DE SEGURANÇA, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU).
  • ANALISE, PRESTAÇÃO DE CONTAS, GOVERNO FEDERAL, EXPECTATIVA, LUTA, EXERCICIO FINANCEIRO SEGUINTE, REDUÇÃO, JUROS, PAGAMENTO, DIVIDA PUBLICA, AMBITO INTERNACIONAL.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, lá está o nosso Presidente em mais uma viagem internacional, desta vez no Oriente Médio. É claro que essas viagens podem ser analisadas sob vários ângulos: o número de dias fora do País; a comparação das suas viagens com as do Sr. Fernando Henrique, muito criticadas, na época, pelo próprio PT.

No entanto, vejo com muito respeito as viagens que o Presidente da República vem fazendo, algumas delas. Acredito que marcou posição e marcou época sua viagem à África. Creio que o Brasil, no tempo da ditadura militar, abriu as embaixadas e abriu conversações que nunca tivera com a África. O Presidente Fernando Henrique - claro, mais aristocrata - praticamente desconheceu a importância do diálogo com a África. O Presidente Lula não só fez a viagem como preestabeleceu um diálogo África/América Latina.

Aliás, é interessante salientar - e é muito importante esta parte - que o Presidente Lula, nas suas viagens, está tendo o maior empenho em falar no Brasil e na América do Sul. Nessa viagem que está fazendo ao Oriente Médio, por exemplo, está acompanhado do ex-Presidente da República Argentina, Presidente do Mercosul. E faz questão de sua presença, para que não aconteça a ciumeira entre o Brasil e a Argentina, mostrando que, quando fala na integração do Brasil e da América com o Oriente Médio, está pensando em toda a América do Sul.

Assim como fez na África, o Presidente Lula está, agora, fazendo com o Oriente Médio.

Parece mentira, mas a única viagem do governo brasileiro ao Oriente Médio foi feita por D. Pedro II. Foi uma viagem pessoal. Quando estava doente na Europa, o monarca fez questão de conhecer o Oriente Médio. Esteve no Líbano, onde Lula está hoje, e convidou os orientais para virem para o Brasil - naquela época -, dizendo que o Brasil era uma terra que tinha tudo por construir e que eles, vindo para cá, teriam condições de ajudar a construção do Brasil e poderiam retornar ricos à sua pátria, por assim dizer.

Interessante é que os orientais atenderam ao pedido de Dom Pedro II e, hoje, o Brasil tem oito milhões de descendentes de libaneses, só de libaneses. É a maior concentração do mundo, maior do que em Beirute.

Por isso, acho importante essa viagem feita ao Oriente Médio, de um modo especial a viagem que faz hoje ao Líbano. Esse diálogo Brasil/América/Oriente Médio tem todas as condições para progredir e desenvolver-se.

Interessante a característica, porque, fruto das posições americanas no Oriente Médio, US$400 bilhões em investimentos do mundo árabe estão deixando de ser aplicados nos Estados Unidos. Essa fantástica quantia está buscando outros objetivos, e o Brasil está-se credenciando. Entendo que foi o momento mais oportuno, mais significativo.

O Brasil vai construir na Síria, com tecnologia própria, uma refinaria de açúcar. O Brasil fornecerá a matéria-prima e praticamente não terá concorrente com relação ao açúcar em todo o Oriente Médio.

É importante a posição do Presidente Lula no âmbito internacional. Quando foi à África, pediu desculpas pelo que o Brasil fez com milhões de africanos escravos em nossa terra. De certa forma, continua fazendo hoje, pelos números apresentados com relação à educação. Os dados mostram a exclusão dos negros em sua imensa maioria nos níveis de educação, nos níveis sociais deste País.

Creio que neste mundo conturbado deste início de milênio é muito importante o que o Presidente Lula está fazendo. É muito importante ter começado, como ele começou, pela Argentina, primeiro país visitado; importante ele ter ido aos Estados Unidos conversar com o presidente americano e mostrar que quer ter o melhor relacionamento, o melhor diálogo com aquele governo; importante a visita que fez aos demais países da América Latina, mostrando que está jogando todo o seu prestígio no Mercosul, que considera importante o projeto Mercosul, que nasceu com Sarney, continuou com Itamar, com Fernando Henrique e continua com o Lula. Talvez até esteja dando mais força - e acho que está - ao Mercosul do que deu ao final o Sr. Fernando Henrique, que, fruto dos entendimentos e vaidade entre ele e o Presidente da Argentina e da simpatia que tinha pelo americano, não foi muito forte o prestígio dado pelo nosso governo ao Mercosul no seu final..

O Governo Lula entrou, dando uma colaboração altamente positiva, meritória, quando a Argentina estava numa crise brutal. O Brasil foi firme, resoluto, deu solidariedade absoluta, cobrando do mundo financeiro um tratamento à Argentina com mais dignidade e seriedade. Foi tão positivo o apoio que o Brasil deu à Argentina na crise que, eleito o novo presidente, o primeiro país a ser visitado foi o Brasil, para agradecer o estímulo e a força que o Governo brasileiro tinha dado na hora da crise.

Depois, foi à África, e agora ao Oriente Médio. Logo adiante, ele vai visitar a Índia - e faz muito bem - e a China. O mundo de hoje diz que Índia, Brasil, China são as três grandes nações que se discutirão neste século, nações que não têm os problemas e os dramas de outros países. O Brasil tem uma das maiores reservas de terras agricultáveis do mundo inteiro e uma das maiores reservas de água doce. Já se diz - eu falava no final do século, mas ontem nos argumentavam que já no ano 30 deste século - que o principal problema do mundo não será petróleo e sim água.

O Brasil tem a sua importância e o seu significado e por isso devemos agarrar e defender a Amazônia, com autonomia para o Brasil, com unhas e dentes. Por isso, a importância dessas visitas, como a visita ao Oriente Médio, à Índia, à China e creio - por que não? - a visita à Rússia.

Acho que está se formando, e o Presidente Lula está tendo essa capacidade, um debate que foge do monopólio da presença americana, só o Presidente Bush. O Primeiro-Ministro da Inglaterra, numa posição de humilhação - cá entre nós, causa pena ver hoje a situação da velha Inglaterra, ver que a majestade da Grã-Bretanha hoje reside no Sr. Blair, uma figura secundária -, praticamente parece até que é o representante do Presidente Bush no continente europeu.

Estamos na posição de avançar, não com a questão da hegemonia ridícula, que não passa por nós; não na vaidade de uma posição superior ridícula, que não passa por nós. O Brasil não tem nenhum interesse hegemônico. Ao contrário do americano e de outras nações, não quer um metro de terra de quem quer que seja. O Brasil não tem interesse em impor o seu imperialismo aos nossos irmãos da América; o Brasil quer que os nossos irmãos da América, como nós, cresçam e se desenvolvam; o Brasil entende que, para crescer, avançar e para que esses números que o ilustre e querido Senador Demóstenes mostrou agora se alterem - e para mudarem realmente têm que se alterar na América Latina -, temos que ter uma América Latina forte, desenvolvida, com progresso. Temos terra, temos na América condições de agricultura, minério, petróleo, temos tudo. A América Latina não precisa importar nada de ninguém, se o seu povo tivesse competência, capacidade de avançar e desenvolver-se. Não podemos aceitar o argumento de que o latino-americano é um povo inferior, que a mestiçagem do negro e do índio fez desse povo um povo que não tem condições de avançar e que, por isso, tem que ser um país subalterno. Pelo contrário, temos a convicção de que o que falta - e está acontecendo agora - é nos integrarmos, nos unirmos, nos darmos as mãos, um ajudar o outro para que, juntos, possamos vencer e fazer o grande desenvolvimento da América Latina.

O Brasil, ao lado disso, olha e vê a África; olha e vê o Oriente Médio; olha e vê o Extremo Oriente. Diz bem o Chanceler brasileiro quando argumenta que o Brasil não tem nenhuma política contra o americano, nem quer fazer absolutamente nada em relação ao antiamericano. Prestigiamos a amizade americana, respeitamo-la, queremos que continue, queremos conviver o melhor possível com os nossos irmãos do norte. Mas isso não impede o Brasil de ter personalidade, autoridade, vida; isso não impede pensarmos diferente sobre a América Latina, que o americano vê como quintal e nós olhamos como irmãos; isso não impede querermos, além de negociar com o americano, negociar com a Comunidade Econômica Européia, irmãos nossos. Ao longo do tempo, a nossa identidade cultural foi com a França, com a Europa, não foi com os Estados Unidos. Os imigrantes que para cá vieram e construíram o Brasil, os nossos livros, o nosso desenvolvimento, as nossas intimidades ao longo da História - quando não tínhamos a televisão fechada, que é praticamente uma lavagem cerebral que o americano está fazendo em todo o mundo -, a nossa cultura era francesa, era européia. Então, olhamos com respeito a Comunidade Econômica Européia e achamos que devemos dialogar, debater, analisar, pela amizade - repito -, mas também porque ali são dez, doze, quinze, vinte nações. É mais fácil estabelecer um diálogo entre as vinte nações do Mercosul e as vinte nações da Comunidade Econômica Européia do que entre a superpotência americana e as vinte nações do Mercosul. Por isso, acho que a posição do Lula vai bem. Acho interessante essa proposta feita e a resposta.

O Sr. Fernando Henrique lançou a bandeira, a que não fui nunca tão simpático nem achei tão importante, de que o Brasil devia fazer parte do Conselho Permanente da ONU. Está aqui um ilustre, além de advogado, além de Senador, homem do nosso Itamaraty, e me atrevo a falar na sua presença. Nunca fui simpático ao Conselho de Segurança da ONU. Durante jovem e como professor, eu debatia muito, achando que aquele Conselho era uma excrescência, ou melhor, os votos dos membros permanentes do Conselho de Segurança. O Conselho de Segurança é claro que é uma obrigação. Se não existe Conselho de Segurança, não funciona, mas os votos dos membros permanentes, eu achava uma excrescência. Depois fui ver que, de certa forma, se não existisse aquilo, talvez não existisse nada. Hoje, quanto ao Brasil pertencer ao Conselho de Segurança da ONU como membro permanente, não sei; quanto à nova idéia, a nova proposta de o Brasil pertencer ao Conselho da ONU como membro permanente, mas sem direito a veto, também não sei. Sinceramente, não sei. Não vejo importância ter ou não direito a veto. Acho que para nós o ideal é entrarmos para o Conselho da ONU e ficarmos lá permanentemente. Seria ideal até que não tivéssemos direito a veto e, depois, fôssemos lutar internamente para que os outros também não tivessem direito a veto.

Sr. Presidente, considero da maior importância e do maior significado, ao término deste primeiro ano do Presidente Lula, os números concretos e reais apresentados pelo nobre Líder da Minoria, pelo nobre Líder da Oposição. A taxa de desemprego é menor que a do ano passado. A promessa é de 2,5 milhões de empregos. O Governo apresenta outros números, que também são concretos.

Analisando a prestação de contas deste ano, a execução orçamentária deste ano e o orçamento que está sendo preparado para o ano que vem, em meio a toda a caminhada do Lula, a grande bandeira que Sua Excelência deve defender no ano que vem refere-se à redução em nível internacional dos juros.

O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Fazendo soar a campainha.) - Senador Pedro Simon, interrompo V. Exª para prorrogar a sessão por vinte minutos. Cinco minutos serão concedidos a V. Exª para concluir e o restante, aos oradores já inscritos.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Agradeço a V. Exª pela gentileza, mas usarei menos que cinco minutos. Muito obrigado.

O Presidente Lula tem autoridade e pode dizer ao Fundo Monetário e ao Banco Mundial que, durante os oito anos do Governo Fernando Henrique Cardoso e o ano do seu Governo, nenhum país pagou juros tão altos e em quantidade tão extrema como o Brasil. Pode-se dizer que o Lula pagou ainda mais, que pagou além do que o Fundo Monetário pediu. O superávit primário foi superior, a cinta foi mais apertada do que o próprio Fundo Monetário Internacional pediu. Nessas condições, ele tem a autoridade de dizer que assim como está não pode continuar.

As organizações internacionais têm de baixar os juros internacionais, porque não é possível que o americano pague 1%, que o Japão pague 2% e que nós paguemos a estupidez que estamos pagando. Essa é a próxima grande bandeira do Presidente Lula, e penso que ele terá o Brasil inteiro a seu lado, e penso que terá autoridade. Se ele tivesse pedido moratória, se ele tivesse mudado a economia, se ele tivesse feito uma série de coisas que se imaginara que fizesse, talvez não a tivesse.

Hoje, como ele desagrada seu Partido, como aperta todos os pontos, como endurece e dificulta a vida dos brasileiros, como faz uma política drástica, como vai muito além do que se imaginava, em termos de endurecimento da economia, ele pode dizer, no dia 2, que, em contrapartida, não pode pagar 140 milhões de juros e que não tem dinheiro para o Fome Zero. Pode perguntar: se não há 10 milhões para o Fome Zero, como poderia pagar 140 milhões de juros? Ele vai ter de dizer que isso não pode ser, que isso não vai ocorrer, que o Brasil vai derrubá-lo, que há risco de uma insurreição social. Ele tem condições e autoridade de fazê-lo. Tenho a certeza de que o Governo, a Oposição e a sociedade inteira no Brasil lhe darão solidariedade.

Meus cumprimentos ao Presidente. Meus cumprimentos pelas declarações firmes que está fazendo no Oriente Médio, difíceis, porque ele está caminhando num fio de arame, mas não avança mais do que deve. Quando ele diz que se devem cumprir os tratados da ONU, ele está dizendo o óbvio, aquilo que realmente sempre deveria ter sido feito: cumprir os tratados da ONU, as decisões da ONU.

Ele fala com serenidade e tranqüilidade que no Brasil árabes e judeus se dão muito bem e que ele espera que isso ocorra no Oriente.

Meu abraço ao Presidente por essa viagem. Que ele realize com êxito o seu final e que possamos, efetivamente, chegar no início do próximo ano com uma nova caminhada.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/12/2003 - Página 40161