Discurso durante a 180ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Apresentação de projeto de lei que considera crime a prática de abrir cadastro com informações bancárias e creditícias sem autorização do consumidor.

Autor
João Ribeiro (PFL - Partido da Frente Liberal/TO)
Nome completo: João Batista de Jesus Ribeiro
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CODIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.:
  • Apresentação de projeto de lei que considera crime a prática de abrir cadastro com informações bancárias e creditícias sem autorização do consumidor.
Aparteantes
Eduardo Siqueira Campos, Mozarildo Cavalcanti.
Publicação
Publicação no DSF de 09/12/2003 - Página 40343
Assunto
Outros > CODIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.
Indexação
  • COMENTARIO, DESENVOLVIMENTO TECNOLOGICO, AGILIZAÇÃO, CIRCULAÇÃO, INFORMAÇÕES, FALTA, CONTROLE, PROTEÇÃO, DADOS PESSOAIS, CIDADÃO, FAVORECIMENTO, CRIME, ESCLARECIMENTOS, GRAVIDADE, AUSENCIA, ADAPTAÇÃO, CARACTERIZAÇÃO, DELITO, CODIGO PENAL, BRASIL, EFEITO, MANUTENÇÃO, IMPUNIDADE, ATO, FRAUDE.
  • REFERENCIA, EXPERIENCIA, JUSTIÇA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DETERMINAÇÃO, OBRIGATORIEDADE, AVISO, CIDADÃO, ANTERIORIDADE, INCLUSÃO, NOME, CADASTRO, INADIMPLENCIA, ESCLARECIMENTOS, OCORRENCIA, VIOLAÇÃO, CODIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, ESPECIFICAÇÃO, EMPRESA DE TELECOMUNICAÇÕES, FALTA, RESPEITO, CONTROLE, DADOS PESSOAIS, USUARIO.
  • APRESENTAÇÃO, JUSTIFICAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, OBJETIVO, TRANSFORMAÇÃO, CRIME, IMPROPRIEDADE, MA-FE, MANIPULAÇÃO, DADOS PESSOAIS, CIDADÃO, COMBATE, IMPUNIDADE, DEFESA, DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS.

O SR. JOÃO RIBEIRO (PFL - TO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, meu colega de Bancada do Tocantins, Senador Eduardo Siqueira Campos, Sras e Srs. Senadores, o avanço tecnológico dos últimos anos tem provocado profundas mudanças no cotidiano da sociedade brasileira, tal como a circulação de informações e dados pessoais que passou a ser feita de maneira e velocidade nunca antes vistas. Se por um lado tal avanço agiliza os diferentes processos da vida moderna, por outro tem gerado uma série de problemas, principalmente no campo dos direitos do consumidor.

Destaco, desse quadro, a forma quase indiscriminada com que são tratados os dados pessoais do cidadão brasileiro. O descaso e desrespeito à legislação vigente que garante os direitos do cidadão, aliados à impunidade - por inexistir a devida caracterização do delito em nosso código penal -, estimulam as atitudes de má-fé e provocam dois sérios problemas para a população em geral.

Um deles está relacionado à utilização delituosa em si de dados cadastrais dos cidadãos, que são obtidos de forma fraudulenta, como tem sido mostrado largamente pela grande imprensa, e, o outro, na inobservância da lei que protege o cidadão da divulgação indevida de seus dados pessoais. Isso tem provocado injustiças irreparáveis quanto à questão moral que acaba por ser gerada quando ocorre uma cobrança financeira indevida, por exemplo, e, em outros casos, repercussões financeiras impagáveis.

A questão é por demais preocupante e, por se tratar de uma forma de delito, precisa ser, como qualquer outra, inibida e eliminada.

A Justiça presa à letra da lei, como não poderia deixar de ser, não encontra na legislação vigente a caracterização adequada a esses novos crimes praticados contra os direitos do cidadão e, por isso mesmo, não pode apenar, como deveria, esses ilícitos.

Uma prova clara do que afirmo acaba de ocorrer no Estado de São Paulo. Lá a Justiça determinou, em novembro passado, que o Serasa informe ao consumidor, por meio de carta registrada, 15 dias antes da inclusão do nome do devedor no seu cadastro. Veja bem, Sr. Presidente, o Serasa inclui o nome de qualquer cidadão em seu cadastro sem avisá-lo e esse só toma conhecimento do fato quando efetua alguma compra, passando por uma vergonha muito grande. A decisão tomada pela 20ª Vara da Justiça Federal daquele Estado deixa qualquer um pasmo. Primeiro, porque, infelizmente, não encontra amparo claro na própria Lei nº 8.078, que, aliás, precisa ser reformulada também nesse ponto, e, segundo, porque condenou a entidade a acatar uma série de dispositivos do Código de Defesa do Consumidor, o que não deveria ser preciso fazer, Sr. Presidente, pois a lei é para todos. Qual então a reação do Serasa? “Recorrer da decisão”, foi o que declararam seus representantes à imprensa local.

Eu tenho chamado a atenção, e continuarei a fazê-lo, enquanto for necessário, para os graves problemas de desrespeito a direitos legítimos dos cidadãos que se tornaram rotineiros. Um dos exemplos que posso citar, porque fui vítima dele, por incrível que pareça, é a forma sinistra como as empresas de telecomunicações tratam atualmente os usuários dos péssimos serviços que têm oferecido. Alguém pode se apropriar do CPF de outrem e usá-lo, como fizeram contra mim. Em junho deste ano, apareceu uma conta minha do Estado do Maranhão. Eu estava esperando um cartão de crédito e não podia pegá-lo se não pagasse essa conta que eu não devia, mas tive de pagar porque não havia outro meio de discutir com o pessoal da empresa.

Eu vou repetir que é de forma sinistra que as empresas de telecomunicações tratam atualmente os usuários dos péssimos serviços que têm oferecido, como mostrei em pronunciamento feito desta tribuna. Impõem a eles cobranças indevidas e levam, de maneira indistinta, seus nomes a registro negativo em bancos de dados específicos, como o sistema citado há pouco que, por sua vez, não cumpre propositadamente o Código do Consumidor.

Fica fácil ver que, se cumprida à risca a legislação, se permitiria a contraprova do pagamento de dívidas para aqueles que nada devessem e que estivessem, portanto, quites com suas obrigações comerciais. Muitas vezes, a pessoa não tem oportunidade nem de mostrar que não deve; eles mandam pagar primeiro para depois o cidadão recorrer aos seus direitos. Mas acontece exatamente ao contrário: a lei está sendo descumprida de forma descarada com o inimaginável aval de órgãos da própria Justiça.

Vejamos, então, o que a Lei nº 8.078, de 1990, estabelece em seu § 2º do art. 43:

A abertura de cadastro, ficha, registro e dados pessoais e de consumo deverá ser comunicada por escrito ao consumidor, quando não solicitada por ele.

            Isso nunca ocorre. O que fazem, então, os sistemas de proteção ao crédito diante do claro dispositivo legal? Simplesmente aplicam frágeis portarias dos órgãos de Corregedoria da Justiça, as quais permitem que se dê publicidade imediata aos nomes registrados nas listas dos cartórios de distribuição, desconhecendo o texto da lei. Essa prática vergonhosa precisa ser coibida de imediato.

            Mas os problemas do cidadão comum não param aí, na transgressão cometida e já explicitada. O mais perverso da situação registra-se pela insegurança que provoca diante da inexistência de um ordenamento jurídico que seja igualmente capaz de barrar as novas formas de delito, agora realizado com o auxílio da tecnologia computacional que apenas quer facilitar a vida de todos.

            A ação criminal nas relações que envolvem técnicas e instrumentos de informática tem despertado atenção, em face dos computadores passarem a fazer parte da vida cotidiana das pessoas que têm aprendido a realizar muitas das transações comerciais, utilizando-se deles, notadamente com cartões de crédito na rede mundial de computadores, a Internet.

Concedo um aparte a V. Exª, Senador Eduardo Siqueira Campos.

O Sr. Eduardo Siqueira Campos (PSDB - TO) - Senador João Ribeiro, em primeiro lugar, novamente parabenizo a presença de V. Exª na tribuna desta Casa, desta vez trazendo um assunto que talvez seja o mais conhecido pelos cidadãos brasileiros, dos mais humildes à classe média, hoje tão achatada; pelos mais de 100 milhões de brasileiros. Não digo esse número aleatoriamente, Senador João Ribeiro. Há aproximadamente dois anos, quando eu era membro da Comissão de Assuntos Econômicos, assisti a uma reportagem levada ao ar pela TV Bandeirantes e, depois, recebi dois advogados paranaenses que, naquela oportunidade, utilizando-se de um código de acesso que aqueles que contratam os serviços do Serasa adquirem, conseguiram inserir o nome de, pelo menos, dez Parlamentares, de dois Ministros de Estado e do Presidente da República no cadastro do Serasa. Isso me levou a pedir uma audiência pública e a convocar o Presidente do Serasa, seu Conselho Diretor, seu corpo jurídico e os dois advogados que, uma hora antes da realização da audiência pública, inseriram os nomes de outros Parlamentares, dentre eles o do então Deputado Aloizio Mercadante, como se S. Exª fosse emitente de cheque sem fundo. Isso demonstrou que o sistema era vulnerável e que bastava uma empresa comercial ser filiada àqueles que compram o serviço. O Serasa nada mais é que um prestador de serviço, que recolhe, nos cartórios de distribuição, junto às empresas, por meio da informática, as informações de estabelecimentos comerciais, formando, então, o tal malfadado cadastro, que V. Exª tão bem aborda hoje como um infortúnio na vida daqueles que já não têm crédito. Senador João Ribeiro, apenas para que V. Exª tenha idéia, dessa audiência resultou um processo, que o Serasa move contra os dois advogados, acusando-os de fazerem inserção criminosa. Fui arrolado como testemunha e disse que, no meu entendimento, o que fizeram os advogados foi comprovar que existe uma fragilidade por parte do consumidor, que o consumidor é a peça frágil. As relações do comércio, como bem diz V. Exª, se aprimoraram. Vivemos em um mundo altamente informatizado e, para haver mais de 100 milhões de brasileiros inscritos numa rede como essa, entendemos que, no mínimo, muitas pessoas estão passando constrangimentos muitas vezes indevidos. Cito outro exemplo. Se eu emitir contra V. Exª uma cobrança qualquer e esta for a cartório, sem haver decisão de mérito, trânsito em julgado ou sequer uma audiência de conciliação, basta o cartório de distribuição emitir ou registrar uma cobrança, ainda que indevida, e esse cidadão já vai para o banco do Serasa. Então, Senador João Ribeiro, não há nada mais oportuno do que o pronunciamento de V. Exª. Recebi o Presidente do Serasa, que me trouxe um vasto currículo dessa empresa que presta serviço há muitos anos, dizendo tratar-se de um serviço honesto, que apenas detecta quem está com problema para proteção dos lojistas, dos comerciantes. Mas isso, na verdade, vem em desfavor do contribuinte. Cito o Código de Defesa do Consumidor, Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, que já está com 13 anos. Há um projeto de resolução tramitando nesta Casa, criando a Comissão de Defesa do Consumidor no âmbito do Senado, para aproximar ainda mais esta Casa do consumidor brasileiro, do Idec - Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor -, a quem presto a minha homenagem juntamente àquelas prestadas por V. Exª. Por último, sendo hoje o Dia da Justiça, registro que está tramitando no Supremo Tribunal Federal uma ação, se não me engano de autoria da Confederação do Sistema Financeiro Nacional, para que os bancos não estejam sujeitos às ações de proteção do Código de Defesa do Consumidor, ou seja, que as relações dos bancos com seus clientes não estejam no âmbito das relações que o Código de Defesa do Consumidor estabelece em defesa do consumidor. Esse fato seria mais uma violência contra o consumidor brasileiro. Portanto, cumprimento V. Exª pelo seu pronunciamento. Ressalto que, na Câmara dos Deputados, está em andamento a CPI do Serasa. Espero que dessa CPI e do pronunciamento e do projeto de lei que V. Exª apresenta com tanto brilhantismo surjam relações que favoreçam mais a parte desfavorecida, ou seja, o consumidor brasileiro. Parabéns!

O SR. JOÃO RIBEIRO (PFL - TO) - Senador Eduardo Siqueira Campos, incorporo o aparte de V. Exª ao meu discurso, pois certamente enriquece o meu pronunciamento.

Concedo um aparte ao Senador Mozarildo Cavalcanti.

O Sr. Mozarildo Cavalcanti (PPS - RR) - Senador João Ribeiro, como bem falou o Senador Eduardo Siqueira Campos, o pronunciamento e o projeto de V. Exª são muito oportunos. É comum vermos, a toda hora, cidadãos, os mais humildes possíveis, sendo constrangidos por essa situação do Serasa. O pouco cuidado, o pouco respeito para com o contribuinte é tamanho que se chega ao ponto, como disse o Senador Eduardo Siqueira Campos, de o sistema bancário querer ficar fora dessa relação, não considerando o cliente consumidor dos seus serviços. Na verdade, esse projeto é oportuno. Penso até que deveria haver urgência em sua tramitação para proteger todos os usuários do sistema financeiro.

O SR. JOÃO RIBEIRO (PFL - TO) - Senador Mozarildo Cavalcanti, incorporo o aparte de V. Exª ao meu discurso.

Sr. Presidente, apesar do difícil combate aos crimes que se pode denominar de informação, é preciso sempre avaliar, perante o direito penal, os fatos sociais já conhecidos que ferem os direitos do cidadão garantidos pela Constituição brasileira.

Carece, pois, a legislação de instrumentos que permitam aos magistrados tipificar tais atos delituosos e aplicar aos seus autores sansões adequadas que reparem o dano causado e possam desestimular a prática do crime, assim como as rotinas birrentas dos sistemas de proteção ao crédito que, ao seu modo, insistem, repito, em não observar o que preceitua o Código do Consumidor.

São esses fatos que me trazem à presença de meus pares, com o propósito de submeter-lhes à apreciação um projeto de lei que trata de criminalizar a prática, sob todas as formas, do uso indevido de dados do cidadão.

O projeto de lei que apresento acrescenta dispositivo ao Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940, nosso Código Penal, para considerar crime a prática de abrir cadastro, ficha e registro indevido de dados pessoais e de consumo; ou a violação, espionagem, cópia, aquisição, fornecimento a outrem; ou impressão em faixa magnética, sem autorização do consumidor, de seus dados e informações bancárias, creditícias ou de transação comercial, para obter qualquer tipo de vantagem pessoal ou para terceiros. Pretende tratar os crimes em referência como mais uma espécie de estelionato, que se configura com o lançamento indevido de dados pessoais em sistemas de registros e cadastros e a obtenção e utilização de qualquer informação pessoal de forma fraudulenta, permitindo assim uma ação mais pronta no combate a esses delitos.

Conto com o apoio das Srªs e dos Srs. Senadores, para a aprovação, o mais rápido possível, do projeto de lei que apresento nesta sessão, e que já foi inclusive lido pela Mesa.

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/12/2003 - Página 40343