Discurso durante a 181ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Criticas a lei que modifica a Lei de Execução Penal e o Código de Processo Penal.

Autor
Demóstenes Torres (PFL - Partido da Frente Liberal/GO)
Nome completo: Demóstenes Lazaro Xavier Torres
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO PENAL. SEGURANÇA PUBLICA.:
  • Criticas a lei que modifica a Lei de Execução Penal e o Código de Processo Penal.
Aparteantes
Magno Malta, Romeu Tuma.
Publicação
Publicação no DSF de 10/12/2003 - Página 40430
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO PENAL. SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • ANALISE, CRITICA, LEGISLAÇÃO, ALTERAÇÃO, LEI DE EXECUÇÃO PENAL, CODIGO DE PROCESSO PENAL, APROVAÇÃO, REGULAMENTO DISCIPLINAR, CUMPRIMENTO, PENA, FAVORECIMENTO, PRESO, PERICULOSIDADE, ALEGAÇÕES, RESPEITO, DIREITOS HUMANOS, CRIMINOSO.
  • QUESTIONAMENTO, CONDUTA, GOVERNO FEDERAL, CONCESSÃO, INDULTO, CRIMINOSO, PERICULOSIDADE, AGRAVAÇÃO, SITUAÇÃO, FALTA, SEGURANÇA, POPULAÇÃO, PAIS.

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, gostaria de saudar todos os pastores aqui mencionados pelo nosso Presidente e também o movimento em defesa da Advocacia Pública e da Defensoria Pública, que contam com toda a minha simpatia.

Que País é esse?

(Renato Russo)

Provavelmente, o da fina ironia de Carlos Drummond de Andrade, que propôs, “pelo desenvolvimento da linha, e pela melhoria do homem”, que o Natal durasse o ano inteiro. Na crônica de uma sociedade em permanente ação de graças, haveria espécie de regime único de “fraternidade”, onde “governo, oposição e neutros, super e subdesenvolvidos, marcianos, bichos e plantas” seriam impregnados do espírito natalino. Para Drummond, “o supra-realismo, justificado espiritualmente”, transportaria o “reino crueldade” para o “reino do amor”.

Nesse País que entregaria ao mundo a chave da felicidade, os “bens seriam repartidos por si mesmos entre os irmãos” e não haveria “mais carta de cobrança, nem a descompostura do suicídio”. Pelo correio só chegariam “correspondências gentis”. A crítica de arte poderia “tomar a forma de sininho cristalino”, a música permaneceria como “Palestrina e Mozart a deixaram” e os livros, indicaria um anjo, seriam “a terra impressa com as tintas do sol e das galáxias”.

No País do poeta, “suavemente” perderiam a razão de viver “as classes armadas e semi-armadas, as repartições arrecadadoras, polícias e fiscais de toda a espécie”. “Nem juntas de conciliação nem tribunais”, pois os conflitos seriam dirimidos na “ordem do amor”. “Uma palavra seria descoberta no dicionário: paz”. “As pessoas iriam rir do dinheiro” e o trabalho seria “o sentido natural da vida”. Já a morte “não seria procurada nem esquivada” em um lugar “administrado exclusivamente pelas crianças que fariam o que bem entendessem com as instituições caducas”.

Srªs e Srs. Senadores, o mundo que Drummond sugeriu na literatura é o País que o queridismo penal propugna. Para o movimento, haverá segurança pública quando existir a igualdade entre os homens, que, por sua vez, aboliriam, junto com a pobreza, causa primordial da violência, sentimentos ímpios como a cobiça, o ódio, o desejo de matar e corromper. A corrente do pensamento jurídico brasileiro, que se pretende unânime, não reconhece que o País vive sob sistemático fogo taliban, por conta das ações criminosas, e imagina que a administração da boa vontade tem poder de purgar os pecados dos homens e transformá-los em pessoas de bem.

A doutrina, que se formou na resistência ao regime militar, quando defendia meritoriamente os presos políticos, fez carreira na advocacia do crime organizado e, há pelo menos duas décadas, pretende exercer espécie de protetorado na Justiça criminal brasileira. Na teoria, a Nação é pacífica e se entende na miscigenação racial, no sincretismo religioso, nas comidas quentes, na concupiscência e no vigor lúdico da música e dos rituais. Para o queridismo penal, o que não presta são as instituições. Excomungá-las é a grande missão e, neste caso, eles desempenharam tão bem o dever de casa que criaram tradição no Ministério da Justiça.

Apesar de haver mais de uma centena de teorias que explicam a motivação da violência, o pensamento advoga a tese de que a criminalidade é culpa da miséria e só vai ser controlada quando houver a redenção geral. Para eles, os mecanismos do Estado, como as polícias e as cadeias, são uma escória sem salvação. Já o ordenamento penal não é dos melhores porque lhe falta um quê de humanismo. São os tais direitos humanos dos bandidos que precisam ser salientados em nome do Estado democrático.

No entendimento do queridismo, as penas não podem ter caráter retributivo ao mal que o crime causou porque o agente do delito é fruto de uma deformação do próprio Estado hipossuficiente, sempre a serviço do poder lacaio das elites capitalistas. Para eles, tampouco deve haver endurecimento contra o crime organizado, mesmo porque tais organizações não passam de uma ficção fascista inventada pelo terror institucional. Para os próceres da teoria queridista, o aumento das penas, as medidas restritivas de execução penal, o emprego das Forças Armadas no combate ao crime organizado, a unificação das polícias e a diminuição da idade penal, por exemplo, são uma espécie de delírio legislativo.

Da teoria para a prática, o movimento acaba de entregar ao Brasil uma lei que, a pretexto de promover reforma no sistema de execução penal, vai trazer de volta às ruas aproximadamente 40 mil condenados em regime fechado. A intenção real do Governo Lula é aliviar a pressão no sistema penitenciário e drenar as más notícias no setor. Como no Brasil só cumpre pena em regime fechado quem foi condenado a mais de oito anos, assaltantes a mão armada, traficantes e homicidas serão convidados a vir às ruas participar do eixo do bem. O Governo deve argumentar para os brasileiros que o presente de final de ano tem a vantagem de retirar do ambiente corrompido das penitenciárias quem cometeu crimes leves e abrir o caminho da ressocialização.

A nova ordem será anunciada como um golpe duríssimo contra o crime organizado, com a instituição do Regime Disciplinar Diferenciado (RDD) de cumprimento da pena. Por inebriar, poderá haver sensação momentânea de segurança, mas a aplicação da lei demonstrará que a proposta do Ministério da Justiça é contra a sociedade. Como muito bem sustentou o Secretário de Segurança Pública de São Paulo, Sr. Saulo Abreu, “o crime organizado é o maior vencedor com a aprovação da matéria” e, por força das circunstâncias liberalizantes das regras sancionadas, ouso cunhar o referido diploma legal com o epíteto de Lei Fernandinho Beira-Mar. O projeto que alterou a Lei de Execução Penal e os Códigos Penal e de Processo Penal foi aprovado neste ano, na Câmara dos Deputados, como foi à sanção presidencial: um conjunto aparente de medidas de endurecimento penal sem qualquer prognóstico de efetividade.

Concedo a palavra ao ilustríssimo Senador Romeu Tuma.

O Sr. Romeu Tuma (PFL - SP) - Senador Demóstenes Torres, eu não gostaria de interrompê-lo. Senadores Antonio Carlos Magalhães e Magno Malta, acho que até nossa alma treme quando o Senador Demóstenes Torres faz uma exposição tão consistente e corajosa, nesta hora difícil em que a sociedade atravessa momentos de temor permanente. Infelizmente, a população é prisioneira do medo. É claro que temos o sentido da defesa dos direitos humanos, que é inerente a qualquer um de nós, mas estão matando sem dó, sem nenhuma consideração pelo cidadão. Jovens cometem assassinatos e dizem que, se necessário, fariam o mesmo mais dez vezes. Se as autoridades não tomarem providências, permanecendo essa tolerância exagerada que V. Exª descreve, sem dúvida nenhuma, vamos, a cada dia, abrir um buraco maior, e haverá até terrorista sem causa política, apenas objetivando o mal do cidadão. Há alguns anos - V. Exª foi Secretário e sabe disso -, bandidos procuravam os benefícios do roubo. Eram os descuidistas, os ventanistas e todos os que não agiam contra a pessoa humana. Hoje, não. Hoje, eles matam com toda a tranqüilidade, tornando alvo de felicidade o ataque a uma unidade policial. Dessa forma, o endurecimento é uma coisa natural. Senador Demóstenes, hoje repassei para V. Exª um elogio que me deixou com ciúme. Minha mulher disse que V. Exª é um dos grandes Senadores que defendem a segurança do cidadão, e o Senador Antonio Carlos Magalhães tem repetido isso para mim também. Este período do ano, para mim, é angustiante, porque recebo telefonemas dos procuradores, seus colegas, que trabalham no setor de execuções penais, e vejo seu desespero com as leis de indulto: a cada ano que passa, condenados por pena mais alta recebem esse benefício - 4 anos de reclusão, depois 5. Beneficiam-se até os indivíduos que praticaram crimes com uso de arma de fogo. Isso é praticamente uma impunidade.

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO) - Total.

O Sr. Romeu Tuma (PFL - SP) - Fico apavorado quando recebo o relatório, principalmente de São Paulo, dos procuradores da Lei de Execuções Penais, pedindo pelo amor de Deus para alertarmos alguém, porque estão colocando na rua bandidos de alta periculosidade. V. Exª está fazendo um discurso importantíssimo, e temos que apóia-lo de qualquer forma, somando para que, realmente, uma vitória venha em defesa do cidadão, da sociedade e daqueles que não podem se defender por si, pois, infelizmente, a atuação dos bandidos vem crescendo, acuando a própria polícia e a própria segurança. O confronto pune o policial, e isso é uma coisa maluca. Em São Paulo está acontecendo isso. Se V. Exª me permitir, aproveitaria para cumprimentar os Procuradores do Estado, os Advogados da AGU e outros aqui presentes, solicitando que o Sr. Ministro Guido Mantega atenda às reivindicações que deles, para que melhore o atendimento, no interesse do próprio Estado. Muito obrigado.

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO) - Muito obrigado, Senador Romeu Tuma. V. Exª sempre abrilhanta o pronunciamento quando faz um aparte.

Concedo o aparte ao ilustre Senador Magno Malta.

O Sr. Magno Malta (Bloco/PL - ES) - Senador Demóstenes Torres, não preciso rasgar seda para V. Exª, até porque o conheço há pouco mais de 4 anos. Na época da CPI do Narcotráfico, estive no seu Estado, e V. Exª era Secretário de Segurança. A CPI teve êxito no seu Estado, numa investigação duríssima dentro das entranhas do próprio Estado e dos poderes constituídos, até porque o crime organizado trabalha nas vísceras do Estado. Entendo que V. Exª foi o marco que deu à CPI o norte, corajosamente, como acontece com homens do seu calibre. O discurso de V. Exª é corajoso. Estamos vivendo um estado de exceção na segurança pública brasileira. Quando se aproxima o Natal, vem a notícia de que apenados perigosos receberão indulto. O pavor já tomou conta do coração da sociedade brasileira, que perdeu o direito às ruas e às praças públicas, sem saber que dia isso terá fim. Certamente, esse é um presente ruim. Temos depósitos de seres humanos. Na verdade, ninguém quer uma disciplina tão dura, mas isso é necessário. Quando o sujeito afronta a honra, a dignidade e a vida da sociedade, ele precisa responder por isso. Mas, nem por isso, precisa responder num depósito de seres humanos. O Presidente Lula, em quem tenho confiança profunda, no seu terceiro mês de governo, falou em 5 penitenciárias de segurança máxima. Imagino ser necessário criatividade administrativa. Nosso País tem Vale do Rio Doce, Aracruz Celulose, Bahia Sul, Fiesp, Itaú, Bradesco. Por que não convidá-los para construir as penitenciárias, em um ano, com recursos próprios, e entregá-las para a União? Não podemos esperar pelos investimentos que muitos acham que é gasto. Tudo o que se coloca em segurança pública é investimento na sociedade brasileira. Essas empresas da iniciativa privadas certamente fariam isso com muita alegria para entregar à sociedade brasileira, porque o modelo já está pronto. Nas melhores penitenciárias da Europa, o indivíduo pode pagar a sua pena com dignidade, estudando e trabalhando para indenizar a família da vítima e ressarcir o Estado pelo que gasta com ele. É isso que discutimos, Senador Demóstenes Torres, e que a sociedade discute. Algumas pesquisas registram que 88% - outras, 95% - do povo brasileiro quer a redução da maioridade penal. Ninguém quer punir criança.

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO) - Com toda a razão está o povo.

O Sr. Magno Malta (Bloco/PL - ES) - Com razão está o povo. Ninguém quer punir menino ou adolescente. Estamos propondo que quem tiver menos de 18 anos e cometer crime hediondo... E o que é crime hediondo, meu Senador?

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO) - Senador Magno Malta, concordo com V. Exª. No entanto, não tenho mais essa confiança inabalável que V. Exª tem no Governo Lula. Foram tantos os acordos que fizemos com o Governo, e tantas vezes ele quebrou. No caso do RDD Max, por exemplo, o Ministro da Justiça nos deu a palavra de que, se aprovado no Senado, não haveria modificação na Câmara, mas fez justamente o contrário. Isso é realmente algo extremamente desgastante. Já não tenho mais o poder de confiança no Governo do Presidente Lula, mas acredito que homens como V. Exª, que fazem parte da base governamental, que têm um discurso duro e uma prática mais dura, podem ainda dar essa credibilidade ao Governo pelo menos nas áreas de segurança pública e da Justiça.

Onde estão os cinco presídios que eram para ser construídos em seis meses, como V. Exª bem lembrou, Senador Magno Malta? V. Exª tem inteira razão. Concordo com V. Exª e vou lutar muito para que o Brasil possa “ter o pé na realidade”. Muitas pessoas dizem que a cadeia não recupera o cidadão. Pergunto: e as ruas o recuperam? É melhor ter um monstro não recuperado na cadeia ou nas ruas?as

Creio que temos que partir para esse tipo de discussão. É claro que temos que melhorar as questões de segurança e da cadeia.

Agradeço o aparte de V. Exª.

O Sr. Magno Malta (Bloco/PL - ES) - Aliás, estão dizendo que estão querendo agir na base da emoção. Quem está agindo na base da emoção é quem não quer entender que o mundo mudou e se globalizou, que o crime organizado cresceu, que a violência cresceu. Ninguém está querendo punir ninguém. Deixam-se os meninos do jeito que estão, mas, se cometerem crime hediondo, pagarão as penas da lei e perderão a sua menoridade. Então, deve-se orientar o Governo, dizendo que é possível a iniciativa privada fazer essas construções. É possível que a iniciativa privada implante indústrias dentro dos presídios e coloque essa gente para trabalhar. Sabe por quê? Porque eles dormem o dia inteiro; recebem, durante a semana inteira, garotas de programa, que são pagas pela facções; o Estado gasta com eles. Eles fazem o que nós mortais não conseguimos: têm relação sexual a semana inteira. Não conseguimos fazer isso, porque trabalhamos. E o Estado ainda paga isso para eles. É preciso cuidar da sociedade. É preciso entender que deve haver o endurecimento na cadeia, que se deve dar qualidade de vida a essa gente, fazendo com que essa gente trabalhe, para que, assim, a família da vítima venha a ser indenizada.

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO) - Agradeço o aparte de V. Exª, Senador Magno Malta.

Sr. Presidente, no Senado houve um grande esforço para modificar a matéria, mas as iniciativas não prosperaram por conta da indisposição do Governo Federal. Mais uma vez, perdemos uma grande oportunidade de dar uma resposta do Estado a bandidos irrecuperáveis, altamente periculosos e de impressionante cinismo. Mas o Ministério de Justiça, atendendo a razões de um estranho psicologismo carcerário, considerou que segregar indivíduos como o bandido Marcos Herbas Camacho, o Marcola, chefe do Primeiro Comando da Capital, é um desrespeito aos direitos humanos, pois traz traumas psiquiátricos a quem eles consideram “reeducandos”. Ora, a intenção do Regime Disciplinar de Segurança Máxima, aprovado na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania desta Casa e rejeitado na Câmara dos Deputados, não era mesmo de reformar a personalidade criminosa de uma escória repugnante, mas de mantê-la distante do meio social que tanto infernizou com a sedição perversa do crime.

A proposta era criar um Regime Disciplinar de Segurança Máxima, de até 720 dias, prorrogáveis, para quem cometesse crime grave no meio prisional ou tivesse notória ligação com organizações criminosas. A idéia era promover o isolamento e cortar os liames de comando dos bandidos intramuros com o ambiente externo do crime organizado, como fez a Itália há dez anos e com muito êxito.

Ao contrário do que afirmam os partidários do queridismo, este tipo de regime de cumprimento de pena foi recomendado pela Organização das Nações Unidas na Convenção de Palermo contra o crime organizado, mas não serviu para o Brasil, sob o pretexto de que é preciso conservar os direitos humanos dos presos. Países com tradição democrática e que defendem com vigor os direitos humanos têm regimes prisionais muito mais rigorosos e jamais foram acusados de violar qualquer norma humanitária.

Aqui, a opção foi suavizar a lei e criar um sistema que não faz medo a ninguém. O RDD aprovado estabelece prazo fixo de 360 dias de isolamento, limita a medida a um sexto da pena e traz regras permissivas de disciplina, como a possibilidade de contato semanal do preso com até duas pessoas, sem contar as crianças. A renovação da medida só se aplica quando houver a prática de outra falta de igual espécie, mesmo que persistam os motivos que ensejaram a inclusão do preso no regime disciplinar, além do que iguala o tratamento do criminoso comum ao do crime organizado.

A progressão do regime de pena, que antes era precedida de exame criminológico, feito por equipe multidisciplinar de peritos, agora será atestada por uma declaração do diretor do presídio. Isso é uma temeridade e vai instituir espécie de recibo para a corrupção na administração penitenciária. O substitutivo aprovado no Senado trazia inovações importantes como a realização de interrogatório por meio de videoconferência com a finalidade de acabar com o turismo penitenciário aos fóruns. Prevaleceu a filosofia esposada por Márcio Thomaz Bastos, a “Maria Bethânia”, segundo a qual o preso tem o direito ao “olhos nos olhos” com o juiz. Outra proposta rejeitada foi a instituição de um serviço de inteligência carcerária para que presos e agentes pudessem ser monitorados. A lei que deveria corrigir os defeitos das instituições prisionais, por inspiração do queridismo, foi preparada para produzir efeitos reversos.

Srªs e Srs. Senadores, o Instituto Latino-Americano das Nações Unidas para a Prevenção do Crime e Tratamento do Delinqüente (ILANUD) realizou uma pesquisa no Brasil sobre vitimização, cujos resultados mostram que a sociedade brasileira tem a nítida sensação de que está à mercê da criminalidade e com escassa percepção da presença do Estado.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO) - Sr. Presidente, vou concluir, mas pediria o mesmo tratamento dado ao nobre Senador Paulo Paim.

Metade da população de São Paulo, Rio de Janeiro, Recife e Vitória diz ter sido vítima de algum tipo de crime nos últimos cinco anos. Tendo ou não sido vítimas de crimes, dois terços dos habitantes das regiões metropolitanas julgam-se prováveis vítimas de algum furto ou roubo até o próximo ano, 57% afirmam ter mudado de comportamento por razões de segurança, e um terço dos entrevistados sente-se inseguro na própria vizinhança.

Sr. Presidente, na mesma semana em que o Presidente Lula sancionava a Lei nº 10.792, o Ministro-Chefe da Casa Civil, José Dirceu, teve um ataque de imponderável bravata e declarou que o Governo “vai enfrentar o crime organizado e o narcotráfico, doa a quem doer”. Certamente, o Ministro, assoberbado que está no comando dos delírios do Brasil, não tomou conhecimento da sanção da Lei Fernando Beira Mar; do contrário, não teria recomendado a mão pesada do Estado contra as organizações criminosas. Mas o Doutor José Dirceu, como é próprio do estilo petista de governar, não deixou de apresentar escusas para a nulidade do primeiro ano do Governo Lula em matéria de política de segurança pública nem deixou de atribuir culpas à administração anterior, além de ter renovado que só a ditadura do proletariado pode nos salvar. De acordo com o Ministro, o Governo Federal não assumia suas responsabilidades de promover segurança pública, porque “o crime organizado e o narcotráfico se infiltraram nas instituições políticas do País”. O Doutor Dirceu garantiu que o Governo Lula vai enfrentar as organizações criminosas, mas adiantou que o problema da criminalidade só será resolvido quando “o País, a Nação e a sociedade tomarem consciência de que é preciso fazer uma revolução social”.

Enquanto a redentora não vem, o ano de 2003 começou e se encerra como o mais violento de nossa vidas. Bandidos juvenis fecharam o comércio de Ipanema. Traficantes ameaçaram acabar com o carnaval do povo. Magistrados foram assassinados. Não faltaram crimes estarrecedores, como o assassinato do casal de adolescentes em São Paulo. Nas duas maiores cidades do País, o Comando Vermelho e o Primeiro Comando da Capital lançaram ataques coordenados contra as instituições policiais em um ato de solução final para a desmoralização do Estado Brasileiro. O ano de 2004 vem aí e, infelizmente, em matéria de falta de segurança, promete ser muito pior. Que País é esse?

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/12/2003 - Página 40430