Discurso durante a 186ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Importância das viagens internacionais do Presidente da República, destacando a recente ida de Luiz Inácio Lula da Silva aos países árabes.

Autor
Ney Suassuna (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Ney Robinson Suassuna
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA.:
  • Importância das viagens internacionais do Presidente da República, destacando a recente ida de Luiz Inácio Lula da Silva aos países árabes.
Aparteantes
Ideli Salvatti.
Publicação
Publicação no DSF de 16/12/2003 - Página 41262
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • IMPORTANCIA, POLITICA EXTERNA, GARANTIA, ACESSO, PAIS, MERCADO INTERNACIONAL, POLITICA INTERNACIONAL, ELOGIO, ATUAÇÃO, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, PRESIDENTE DA REPUBLICA.
  • REGISTRO, PARTICIPAÇÃO, ORADOR, VISITA OFICIAL, ORIENTE MEDIO, COMENTARIO, ASSINATURA, CONTRATO, BENEFICIO, COMERCIO EXTERIOR, BRASIL, AMERICA DO SUL, PARCERIA, PAISES ARABES.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, muito se escreveu, ou muito tem-se escrito acerca das viagens do Presidente Lula. Um País como o nosso, com um parque industrial como o nosso, precisa exportar e precisa também ter uma representação à altura nos organismos internacionais. Quem tem um vizinho poderoso sabe o quanto isso custa. Perguntem ao México o que pensa da vizinhança com os Estados Unidos? Ao México, custou dois terços do seu território essa vizinhança. E são muitos os exemplos no mundo do que é ter um vizinho poderoso.

Temos um vizinho de continente poderoso. Se não buscarmos o nosso espaço, jamais os Estados Unidos ou, no outro continente, a União Européia vão permitir que estendamos os nossos músculos. É preciso que, com engenho e arte, nós o façamos. E é isso que o Presidente Lula tem buscado fazer, indo de Meca a Seca, buscando espaço, buscando vender produtos brasileiros, arranjar oportunidades e, ao mesmo tempo, encontrar apoio político.

Pleiteamos um lugar no Conselho de Segurança da ONU, e cada viagem dessa é uma viagem de aproximação. Ninguém ama quem não conhece. É preciso que haja interação. É preciso que se encontrem os pontos de atrito ou de amizade.

Tive o privilégio de ir com o Presidente Lula a essa última viagem, aos países árabes. Temos, no Brasil, 10 milhões de pessoas que têm o sangue árabe, majoritariamente sírio-libanês. Um país que tem uma herança dessa, com toda certeza, tem uma chave de muita importância para abrir portas. Vi elogios e vi críticas a essa viagem. O último comandante deste País a ir àquela região foi D. Pedro II, que foi ao Líbano e ao Egito, não por razões comerciais, mas por razões culturais.

O primeiro país que o Presidente visitou foi a Síria. Muitos podem dizer, como ouvi da imprensa, que a Síria é um país ditatorial. Não há, naquela região, país que não o seja, exceto o Líbano. É um costume da região. Os faraós imprimiram uma sistemática - e ainda hoje os governantes herdam parcela dela -, de que quem entra no governo normalmente se sucede em mandatos e realiza um simulacro de democracia, não uma democracia típica ou igual à nossa. Tampouco deveria ser. Cada povo tem o direito de escolher seu governo à sua maneira. Não é à toa que o grande filósofo Goethe citava uma frase latina: Non ridere, non ludere, neque detestari, sed intelligere. Ou seja: procure entender a situação dos outros; não escarneça, não ridicularize. Assim, aquele é o costume na região.

O primeiro país foi a Síria, onde fechamos um contrato de US$270 milhões a fim de construir uma refinaria de açúcar. Pode parecer pouco. Alguém pode dizer que US$270 milhões não é muito. Não é muito em termos. Com a refinaria, vamos dominar a exportação de açúcar para toda a região, o que significará muitos milhões. O açúcar parte daqui bruto, lá será refinado e seguirá para todos os países árabes. Com toda certeza, venderemos muitos e muitos milhões de açúcar. E muitos outros negócios ficaram entabulados.

Em seguida, fomos ao Líbano. Com o Líbano, embora seja um país pequeno, de população pequena, temos muitas ligações. O sistema bancário do Líbano é excepcionalmente forte. Lá estão ancorados, hoje, US$300 bilhões nos bancos, que fazem muitas operações e podem ser uma alavanca importante em toda negociação, em toda comercialização e até no aval do comércio brasileiro para aquela região. Foi muito importante, abriram-se muitas portas. É o Líbano, como eu disse, um entreposto comercial por natureza, e não é à toa, porque isso já vem desde o tempo dos fenícios, que eram excepcionais comerciantes, e os libaneses continuam sendo.

Do Líbano, saímos para os Emirados. E é surpreendente que a nossa presença nos Emirados seja quase nenhuma, em sete emirados que compram tudo e que estão se tornando - não pelo petróleo mais, mas pelo próprio país - um ponto de atração mundial. Hoje, os Emirados recebem mais turistas que o Brasil. E quando olhamos as oportunidades comerciais, ficamos perplexos. Claro que temos que nos adaptar a um mercado com que não temos uma experiência maior. Por exemplo, vi empresas brasileiras levando sapatos para vender. Lá se compram sapatos também, mas a grande maioria da população usa alpercatas, que são até mais caras do que os sapatos normais. Vamos ter que nos adaptar se queremos fornecer calçados a eles.

Há necessidade de fazer prospecção de mercados e há possibilidade de vendermos muito para os Emirados, que são surpreendentes. Eles estão dessalinizando a água do mar e fazendo irrigação, a um custo imenso. E o País é um jardim, lembrando um pouco os canteiros de Brasília, com flores por todos os cantos. A água do mar irriga uma faixa, que é a da estrada, e de um lado e do outro, deserto.

Os prédios são futuristas. Há até hotel submerso. A pessoa vai para o restaurante por baixo d’água, pelo fundo do mar. E é por isso que está recebendo tanto turista e que a região vai se firmar como um ponto turístico impressionante no mundo.

Dos Emirados, saímos para o Egito. O Egito é uma nação de 70 milhões de pessoas, que compra muito. Para nossa surpresa, a nossa presença lá também é inócua. Mas foi lá que ocorreu o fato mais sério e mais promissor de toda essa viagem: a Liga Árabe. São 22 países, aos quais o Presidente Lula teve oportunidade de falar, fazendo-lhes um convite, que foi aceito, e criando uma expectativa muito boa nas duas vertentes: a política - porque significa que teremos 22 votos na ONU - e a comercial.

E aí vem a minha grande surpresa. Eu já conhecia a capacidade de articulação, de percepção, de liderança do Presidente Lula. Mas a minha surpresa é que essa percepção está cada vez mais aguçada. Lá, ele conseguiu, com o diálogo, sensibilizar os representantes dos 22 países de uma forma tal, que foi um sucesso esse encontro dos países árabes com os países da América do Sul.

A Srª Ideli Salvatti (Bloco/PT - SC) - Senador Ney Suassuna, V. Exª me permite um aparte?

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Concedo um aparte à nobre Senadora Ideli Salvatti, com muita satisfação.

A Srª Ideli Salvatti (Bloco/PT - SC) - Senador, fico muito satisfeita com o relato que V. Exª faz da viagem em que teve oportunidade de acompanhar a caravana do Presidente Lula e empresários para vários países do Oriente Médio. Esse relato que V. Exª faz nos dá a exata dimensão da importância dessa viagem, da abertura de canais importantes, no aspecto econômico, político, cultural, turístico, para o nosso país e também para esse pedaço do nosso planeta. Fiquei bastante aborrecida, neste final de semana, lendo as matérias das revistas semanais. Um delas, de forma especial, tem um texto muito negativo, dizendo que o Presidente da República fez uma turnê pelas ditaduras, descaracterizando toda e qualquer importância, retirando toda e qualquer perspectiva e validade de uma viagem desse porte. Tenho, em Santa Catarina, uma relação não muito antiga, mas bastante profunda com a comunidade árabe, principalmente a comunidade palestina, que é bastante numerosa em meu Estado. Desde antes da eleição do Presidente Lula, havia a grande expectativa da comunidade árabe de Santa Catarina, como penso que havia em todo o Brasil, de que a eleição do Lula traria um canal que sempre esteve obstruído, apesar de a comunidade árabe ser imensa em nosso País. Nunca houve prioridade de relações diplomáticas e comerciais com esses países. Já àquela época, quando ainda estava muito efervescente a situação pós-atentados de 11 de setembro, todos os representantes da comunidade árabe em Santa Catarina sinalizavam que o Brasil deveria capitanear a busca de relações, a aproximação, já que os investidores árabes estão retirando seus investimentos dos Estados Unidos e não ficarão submetidos a uma política que faz represália aos árabes de forma indiscriminada, ao caracterizar todos como terroristas. Não correrão esse risco. Os investidores árabes estão retirando seus investimentos dos Estados Unidos e precisam ter onde aplicar seus recursos. Portanto, considero que a viagem do Presidente Lula, a qual V. Exª teve a oportunidade de acompanhar e cujo relato agora nos faz, vem exatamente nessa linha. Quando o Presidente Lula convoca para uma reunião de cúpula todos os Presidentes dos países árabes e todos os Presidentes da América do Sul, Sua Excelência está exatamente estabelecendo essa ponte importantíssima para que possamos canalizar esses investimentos, que são de fundamental importância para a interligação dos países da América do Sul. Há inúmeras obras que permitirão a saída para o Pacífico, para o Caribe, a fim de que tenhamos todas as obras com perspectivas de financiamentos internacionais. Penso que os investimentos dos países árabes estão aí para serem disputados, e ainda bem que o Presidente Lula teve tal grandeza e principalmente visão dessa oportunidade que não poderíamos perder. Parabenizo V. Exª pelo discurso e pelo relato tão importante que nos traz nesta tarde.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Muito obrigado, nobre Senadora. Surpreendem-me, como surpreenderam V. Exª, os relatos da imprensa.

Trata-se um pouco da psicologia do colonizado. Quando o assunto incomoda um pouco os Estados Unidos, uma parte da nossa imprensa imediatamente se põe como se estivéssemos fazendo um mal. Isso é incrível, porque lá é ditadura, mas está cheio de americano, de italiano, de alemão, de francês, todos com presença enorme, vendendo, e vendendo muito, mas não querem que estejamos juntos, não querem que tomemos espaço.

Surpreende-me esta psicologia do colonizado: “Não, não podemos fazer, mas deixemos que os Estados Unidos façam”. Não sou contra americano em absoluto, mas sou a favor dos Estados Unidos, os quais acredito deram muito à nossa civilização. Entretanto, o espaço do Brasil temos de achar e não pediremos favor. Daí eu concordar em gênero, número e grau quando buscamos espaços.

Essa reunião de cúpula da América do Sul com os países árabes será algo muito útil a todos nós. Os investimentos poderão vir, e são US$600 bilhões, que estão ancorados, parados, e podem vir ao Brasil, transformando o País e transportando-o para uma outra realidade.

No Egito, Sr. Presidente, houve oportunidades comerciais. Éramos dez Parlamentares - o Senador Ramez Tebet, mais oito Deputados e eu. Fomos ao Parlamento Egípcio e ouvimos o mesmo que na Líbia: “Nós queremos maior interação com o Brasil, um país irmão que nunca nos causou dor, morte ou tristeza. Aqui vieram os ingleses e nos mataram; vieram os alemães e nos fuzilaram; vieram várias nacionalidades e nós sabemos o quanto do nosso sangue foi derramado por esses povos. Vocês nunca nos causaram nada, a não ser os braços abertos para receber os nossos migrantes, que hoje somam dez milhões de habitantes em seu País”.

Foi o que ouvimos. Dava-nos orgulho ver a amizade latente, a visão querida que o Brasil tem em toda região.

De lá, saímos para a Líbia. Em relação à Líbia, ouvi mais criticas, Senadora Ideli Salvatti, do que nos outros lugares. Mas, na Líbia, já tivemos um mercado de US$2 bilhões anuais. Somente agora a China atinge algo próximo a esse número.

Novamente, o Presidente Muamar Kadafi, que lá tem um status diferente. É líder, está acima de tudo. Como eu disse, isso é uma característica da região. Também está havendo pressão dos americanos para fazer... O bloqueio está acabando, mas, antes de acabar, já estão lá as empresas inglesas, que, na verdade, são testas-de-ferro das empresas americanas, querendo expandir a prospecção de petróleo, fazer 25 mil casas em Tripoli, construir quatro mil quilômetros de estradas de ferro e fazer o Rodoanel de Trípoli, de US$150 milhões. Se não chegarmos já, acontecerá como em Dubai e nos Emirados, onde perdemos a vez. Os americanos construíram; as potências do G-7 conseguiram fazê-lo. É a hora de estarmos lá. Com certeza, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, foi muito profícua a viagem.

Ao voltar, lamentei encontrar essas colocações que nos deixam surpresos. Demonstram falta de visão e de sensibilidade ao desprezar uma região que apresenta tamanha potencialidade, que está sendo maltratada pelos senhores do mundo e que pode trazer para cá todo esse capital, sendo parceiros muito fortes nossos. Acho que foi um sucesso. O Presidente Lula marcou uma posição que dará muitos dividendos. As sementes plantadas foram muito boas. Inclusive, no retorno, fiz questão de pedir a todos no avião para que déssemos as mãos, agradecêssemos o que foi plantado e pedíssemos a Deus que essas sementes germinassem no próximo ano, criando uma enorme parceria entre os países árabes e o nosso País. Tenho certeza de que isso acontecerá, porque vi o entusiasmo de lá.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, tenho certeza de que o Presidente não irá, de maneira alguma, inibir-se por críticas sem fundamento e, como eu disse, oriundas de um pensamento colonialista, ou melhor, colonizado. É preciso que o Brasil estenda sua musculatura e ocupe lugares no mundo. Devemos buscar o nosso lugar ao sol, porque não vão nos dar. Em política, o poder não admite espaço vazio. Se deixarmos, os outros ocuparão. O Brasil está mostrando o seu destino de potência, buscando, pela primeira vez, mundo afora, colocar-se, indicando que está em condições de ajudar, de formar parcerias e de construir um mundo melhor, sem essa unicidade de hoje, em que um manda e todos obedecem. Não. Queremos um mundo mais parceiro, em que seremos amigos dessa potência, mas que buscaremos também ter o nosso espaço e lugar ao sol.

Congratulo-me com o Presidente Lula. Creio que apenas os que têm miopia política podem pensar de modo diferente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/12/2003 - Página 41262