Pronunciamento de Arthur Virgílio em 16/12/2003
Discurso durante a 1ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Análise da recém anunciada política do Governo para o setor elétrico nacional. (como Líder)
- Autor
- Arthur Virgílio (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
- Nome completo: Arthur Virgílio do Carmo Ribeiro Neto
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
POLITICA ENERGETICA.:
- Análise da recém anunciada política do Governo para o setor elétrico nacional. (como Líder)
- Publicação
- Publicação no DSF de 17/12/2003 - Página 41675
- Assunto
- Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. POLITICA ENERGETICA.
- Indexação
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- CRITICA, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, EDIÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), DEFINIÇÃO, POLITICA ENERGETICA, DESRESPEITO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, USURPAÇÃO, PRERROGATIVA, CONGRESSO NACIONAL, AUSENCIA, DIRETRIZ, GARANTIA, ESTABILIDADE, RECURSOS, SETOR, CONCENTRAÇÃO, FUNÇÃO, MINISTERIO DE MINAS E ENERGIA (MME), PROVOCAÇÃO, FALTA, SEGURANÇA, INVESTIMENTO.
O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM. Como Líder. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a recente emissão de medidas provisórias para o setor elétrico confirma o que vem sendo dito sobre o Governo de Lula. As propostas trazem um conjunto de coisas boas e coisas novas. As boas não são coisas novas e as novas não são coisas boas. Juntamente com mecanismos já recomendados e com a implantação iniciada no Governo de Fernando Henrique, como o reforço no planejamento setorial, a obrigatoriedade de compra de energia por licitação para as distribuidoras e a desverticalização, pretende-se estabelecer a mais profunda concentração de poderes na mão do Governo Federal.
Está-se consolidando o retorno ao cenário que já vivemos e que foi marcado pelo estímulo à ineficiência, pelo desinvestimento e pela geração de grandes passivos para o Tesouro Nacional. Os resultados vão contrariar frontalmente objetivos apresentados de assegurar modicidade tarifária, garantir a oferta e atrair investimentos privados.
O caminho pretendido pelo Executivo, a edição de MPs às vésperas do recesso parlamentar, demonstra esperteza do pior tipo e desrespeito ao Congresso Nacional, que, ao retornar para novo período legislativo, pode encontrar fatos consumados e mudanças estruturais consolidadas com base no texto original.
Adicionalmente, a incerteza regulatória cresce, até porque as MPs são, flagrantemente, inconstitucionais. Contrariam o art. 246 da Carta Magna, que veda o uso de medidas provisórias para alterar a legislação relacionada a artigos da Constituição que receberam emendas, caso do art. 176, relativo ao setor elétrico. Contrariam, também, os art. 22 e 48, ao usurpar a prerrogativa da União e do Congresso Nacional em fixar, em leis, a política energética nacional.
Trata-se de cheque em branco para que o Executivo assuma prerrogativas do Congresso e passe a definir isoladamente os rumos da política energética. O texto vago das medidas provisórias atribui poderes sem definir diretrizes, portanto, contraria a necessidade do País de consolidar em leis um cenário estável e previsível, protegido de mudanças momentâneas de visão. Vai muito além da implantação de um pool comprador de energia. Altera a essência do que vinha sendo implantado no País, a despeito de forte resistência.
O modelo que vinha sendo construído para o setor elétrico buscava o aporte de novos capitais e partia do reconhecimento de que os recursos de fundos públicos nacionais e os que poderiam ser alavancados por agentes, construtores e fabricantes instalados no País seriam insuficientes para atender às necessidades de expansão. Procurava construir ambiente estável, com regras claras, processos transparentes e instituições fortes, visando à atração de investimentos e à promoção da eficiência por meio da competição e da distribuição dos riscos de acordo com capacidade dos agentes em gerenciá-los. Agora, aparentemente, busca-se tal eficiência via controle cartorial de todos os aspectos do setor elétrico, inclusive a responsabilidade de viabilizar os recursos necessários.
Haverá enorme concentração de papéis no Ministério de Minas e Energia, que definiria regras e indicaria o comando para o operador do sistema e para o gestor do ambiente comercial; concederia novas concessões e autorizações; planejaria a expansão com o poder de definir obras estruturantes; atuaria como agente em todos os segmentos e controlaria fundos setoriais.
Os conflitos de interesse decorrentes dessa multiplicidade de papéis e as assimetrias e desequilíbrios que ela poderia promover entre agentes de diferentes naturezas representam insegurança e incerteza aos investidores. Como competir com empresas que têm o Ministro de Minas e Energia como presidente de seus conselhos e que fazem parte do órgão planejador setorial? O mesmo Ministério que faz as regras e define o comando dos principais órgãos setoriais? O mesmo Ministério que, na gestão atual, comenta-se, não deixou de atender ao interesse de suas empresas em episódios recentes como a transferência de uma térmica emergencial para Manaus, o aditamento dos contratos iniciais - não disponível para geradores privados - e a venda de energia subsidiada para grandes consumidores eletrointensivos.
Aumentam os riscos regulatório e político, com repercussões no custo de capital para novos investimentos. Podem ser afastados, em especial, investidores internacionais que não tenham apetite ou conhecimentos para avaliar e precificar esses tipos de risco e promovida a fuga dos capitais privados já investidos, portanto.
Caso se confirmem e prevaleçam as visões que parecem nortear as mudanças, o decorrente enfraquecimento do regulador independente coloca o Brasil na contramão de uma tendência mundial de consolidação de agências reguladoras e ambientes competitivos em setores de infra-estrutura. Essa tendência está refletida em diretiva da diretiva da Comunidade Econômica Européia, que determina a criação de agência nos países membros que ainda não as possuem e a liberação de 450 milhões de consumidores para escolherem seus fornecedores de energia.
A proposta não toca o grande problema do setor elétrico: ele se transformou em importante e não transparente mecanismo de transferência de renda, arrecadação fiscal e condução de políticas públicas. Hoje, a competição das diversas esferas de governo pelos recursos dos consumidores compromete a modicidade tarifária. Cada movimento destinado a priorizar e proteger a determinado segmento, empreendimento ou agente, por meio de subsídios e tratamentos especiais, afeta a sustentabilidade sistêmica do setor elétrico.
Resta ao País esperar pelo bom-senso do próprio Governo, em particular do Ministério da Fazenda, que teria sido derrotado no processo de elaboração das medidas provisórias e pelo bom senso, do qual eu jamais duvidaria, do Supremo Tribunal Federal e do Congresso Nacional para corrigir os desvios que vêm sendo propostos e evitar que novas distorções se acumulem no setor elétrico, que precisa atrair R$20 bilhões por ano, comprometendo o desenvolvimento do País.
Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.
Muito obrigado.