Discurso durante a Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Ineficiência administrativa do Governo Lula.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Ineficiência administrativa do Governo Lula.
Aparteantes
César Borges, Maguito Vilela, Tião Viana.
Publicação
Publicação no DSF de 19/12/2003 - Página 42103
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • CRITICA, INCOMPETENCIA, GOVERNO FEDERAL, GESTÃO, APLICAÇÃO, RECURSOS FINANCEIROS, INCAPACIDADE, ESTABELECIMENTO, PRIORIDADE, INVESTIMENTO, CRIAÇÃO, EMPREGO, DESCUMPRIMENTO, PROMESSA, CAMPANHA ELEITORAL.
  • CRITICA, MANIPULAÇÃO, DIVULGAÇÃO, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, COMPENSAÇÃO, INEFICACIA, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, POLITICA SOCIAL.
  • COMENTARIO, OCORRENCIA, IRREGULARIDADE, RELACIONAMENTO, GOVERNO FEDERAL, CONGRESSO NACIONAL.
  • COMENTARIO, PREVISÃO, AUSENCIA, CRESCIMENTO ECONOMICO, BRASIL, PERIODO, GOVERNO, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, PRESIDENTE DA REPUBLICA.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o mundo do espetáculo instalou-se hoje no Palácio do Planalto, e pudemos constatar a existência de dois mundos: o mundo virtual - esse mundo fantasioso, do ufanismo, o mundo do espetáculo - e o mundo da realidade, em que nos encontramos no Brasil.

Antes que nascesse o mundo do espetáculo, houvera o mundo do caos. Foi o que disse o Presidente Lula hoje, no início da sua exposição. “Herdou um País no caos: a economia em frangalhos, a inflação ameaçadora, o descrédito generalizado no Brasil e no exterior. Um país desacreditado no concerto internacional: as linhas de crédito interrompidas, o risco país explodindo, enfim, era o caos”.

Senadora Heloísa Helena, esse discurso não é novo. Ou é novo? Seria novo o discurso do Faraó Tutankamon, da 18ª dinastia egípcia, lá por volta do século XIII a.C.? Ele também fez esse discurso. Ao assumir o reino egípcio, o faraó da 18ª dinastia desancava o seu antecessor: “Os templos estavam dizimados, o reino estava destruído”. Depois dele, muitos governantes aprenderam a lição e fizeram o mesmo, muitas vezes para justificar o fracasso de suas administrações. É mais fácil olhar o retrovisor, atirar pedras nos antecessores do que utilizá-las para construir um caminho de esperança para a população.

Nada justifica a paralisia do Governo Lula nesse seu primeiro ano de gestão. Na campanha, o Presidente declarou-se francamente favorável à mudança do modelo econômico adotado por Fernando Henrique Cardoso. O lema da campanha era “Brasil para Todos”, e foi dividido em 3 partes: crescimento econômico, geração de empregos e diminuição das desigualdades. O que se viu, logo de início, é que os dogmas sustentados, durante tanto tempo, pelo Partido dos Trabalhadores foram sendo sepultados a cada passo, a cada ato, a cada medida administrativa, a cada pronunciamento do Presidente da República.

A negação do discurso passou a ser a rotina de todos os dias da prática administrativa do PT no Governo. As esperanças que alavancaram Lula até a grande vitória começaram a ser sepultadas. Aquela prática condenável da composição dos quadros de Governo sem considerar os critérios de competência técnica, qualificação profissional e probidade puxaram para baixo a qualidade do Governo, e a ineficiência tomou conta desses primeiros meses do Governo Lula.

Quem falou muito bem a respeito disso foi o Professor Márcio Buainaim, da Unicamp, quando afirmou: “Militância é uma ótima escola para a formação de cidadãos, mas pouco ensina sobre como gerir recursos públicos”.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a militância petista ocupando cargos fundamentais em áreas cuja exigência de qualificação técnica é insubstituível fez com que o Governo se tornasse ineficaz, incapaz mesmo de aplicar os recursos provisionados no Orçamento para investimentos fundamentais. Como exemplo, quanto ao Programa de Geração de Empregos, apenas 0,06% do que estava previsto para investimentos foi aplicado, o que, na verdade, é o calcanhar-de-aquiles de um Governo que prometeu a geração de 11 milhões de empregos, mas produziu, já no primeiro ano de gestão, ao redor de um milhão de novos desempregados.

É evidente que se admite a utilização da militância partidária em cargos governamentais de confiança. No entanto, é preciso compatibilizar os interesses da eficiência administrativa com a aspiração legítima de prestigiar os que militaram politicamente e contribuíram para a organização e a vitória de um Partido. Mas não se admite um Governo paralisado pela incompetência dos que ocupam esses cargos. O Governo não conseguiu investir mais do que gastou em viagens. A maioria dos Ministérios gastou mais em viagens do que aplicou em investimentos produtivos.

As promessas do candidato Lula significam a frustração daqueles que não se iludem com a propaganda extraordinariamente bem elaborada. Ainda hoje se viu, no visual que se apresentou no Palácio do Planalto, a qualidade da propaganda do Governo. Se há algo de bom no atual Governo é a sua propaganda. É a publicidade que sustenta a imagem do Presidente da República com níveis elevados de popularidade, apesar da ineficácia governamental.

É um Governo sem programa e sem plano, mas que tem um programa de marketing convincente, competente. Isso a Oposição tem que reconhecer.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Governo utiliza o fisiologismo como prática para a composição dos quadros governamentais em prejuízo da eficiência, bem como incha a máquina administrativa com a criação de ministérios - hoje são 35 ministérios, e não conhecemos sequer o nome de todos os ministros, alguns deles em completo anonimato depois do primeiro ano de Governo, porque não se apresentaram como executores de qualquer plano governamental.

Poderíamos dissertar também sobre o modelo de relação política adotado pelo Presidente Lula para a aprovação das reformas no Congresso Nacional e aí teríamos que nos lembrar do saudoso Deputado e Ministro Roberto Cardoso Alves, que cunhou a frase “é dando que se recebe”, porque a imprensa noticiou, ao longo de tantos meses, as negociações do Governo com o PMDB, por exemplo, para obter maioria que consagrasse as suas propostas no Senado Federal e na Câmara dos Deputados.

Os indicadores econômicos e sociais do Governo refletem o fracasso do primeiro ano da administração. O desempenho na área social é pífio, o Programa Fome Zero não deslanchou, a não ser na publicidade. Na verdade, zero é o crescimento econômico. A fome continua a mesma, aliás, a fome cresceu. O que não cresceu foi a economia, que encolheu. O crescimento, sim, é zero, ao contrário do prometido pelo Presidente na campanha eleitoral, que o País cresceria 5% ao ano.

Senador Tião Viana, com prazer concedo um aparte a V. Exª.

O Sr. Tião Viana (Bloco/PT - AC) - Agradeço ao Senador Alvaro Dias a oportunidade do aparte. V. Exª cumpre, com muita dedicação, como parlamentar, a atividade oposicionista ao Governo Lula, procurando dar o melhor de si ao debate, fazendo uma crítica dura ao Governo. Gostaria apenas de fazer uma ponderação contrária aos argumentos de V. Exª. Sei que V. Exª, ex-Governador de Estado, homem de grande experiência na vida pública, sabe exatamente o que é o primeiro ano de governabilidade de uma unidade federada ou de um país. Seguramente, tivemos um choque administrativo, quando sucedemos a um governo que tinha retraído R$19,52 bilhões de recursos extraordinários para o Orçamento de 2002. Em 2003, esses recursos não se manifestaram na atividade de execução do Governo Lula. O risco país Brasil estava em 2.400 e hoje está menos de 500; as dívidas sacrificavam de maneira asfixiante o Governo, em termos de cumprimento de prazos da dívida externa; a máquina administrativa estava basicamente paralisada - há 18 anos, o INSS não admitia um servidor público. O Governo Fernando Henrique Cardoso, nos seus oito anos, deixou mais de nove milhões de desempregados no País. Tivemos de enfrentar o quadro trágico da realidade sócio-econômica brasileira e o risco de credibilidade no cenário internacional macroeconômico. Hoje, estamos concluindo um ano com um superávit comercial de mais de R$24 bilhões; com transações em conta corrente de mais de R$3 bilhões; com a estabilidade das dívidas com os credores internacionais; com uma política externa firmada de maneira conseqüente, correta; com potencialidade de expansão dos negócios exteriores. Esse é o horizonte que temos adiante. Então é hora de otimismo realista. São muitas as dificuldades, como as que expõe, mas, ao contrário de V. Exª, volto-me, por exemplo, para a realidade do meu Estado. O primeiro ano foi absolutamente difícil para o Governo Jorge Viana, que hoje tem mais de 95% de aprovação popular. Atravessada a dificuldade da estruturação da máquina no primeiro ano, vem o resultado. E acredito que o Governo Lula trabalhará com grande resultado no projeto nacional por uma nova realidade para a sociedade brasileira.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Senador Tião Viana, é claro que V. Exª incorpora por inteiro o discurso ufanista do Presidente Lula. E não poderia ser outro o comportamento de V. Exª, já que é Líder do Partido do Presidente da República nesta Casa. Agora, evidentemente, o que frustra mais é o contraste do discurso com a prática. As promessas de campanha, absolutamente ignoradas, fazem-nos lembrar do ensinamento de Churchill, que afirmava: “As promessas do candidato são o sepulcro do estadista”.

Não há dúvida, Senador César Borges, que o Presidente Lula hoje é um líder desacreditado, pelo menos no seio daqueles que são bem informados, daqueles que acompanham o dia-a-dia da sua atividade na Presidência da República.

É óbvio que discordo do que diz o Senador Tião Viana relativamente à política externa adotada pelo Presidente. Não teríamos aqui, obviamente, o tempo necessário para analisar todos os pontos dessa política, todos os atos praticados pelo Presidente nas suas viagens ao exterior, todos os encontros por ele estabelecidos. O Presidente da República tem conquistado simpatia exatamente daqueles setores que antes mais combatia e hoje é o xodó do Fundo Monetário Internacional e do mercado financeiro internacional. O jornal Financial Times afirma que o Presidente Lula é xodó do Fundo Monetário Internacional e do mercado financeiro internacional exatamente por adotar, de forma disciplinada, as políticas por eles impostas, obviamente contrariando o discurso de ontem e certamente desagradando aqueles que acreditaram na mudança do modelo econômico e da qualidade de vida da população assalariada do País, na geração de 10 milhões de empregos, prometidos durante a campanha eleitoral. Não há como admitir que, durante um ano de Governo, esses índices que os indicadores econômicos anunciam pudessem ser suportados, de forma ufanista, pelo Presidente Lula, que proclama a grandiosidade do seu Governo, como fez hoje pela manhã.

Concedo um aparte ao Senador César Borges.

O Sr. César Borges (PFL - BA) - Senador Alvaro Dias, cumprimento V. Exª pelo pronunciamento. V. Exª, como homem público, foi Governador de Estado, tem todo o respaldo intelectual, político e técnico para fazer este discurso desapaixonado, realista, em que expõe suas preocupações com os destinos do nosso País. Efetivamente, 2003 foi um ano perdido para o desenvolvimento brasileiro. O Governo tem se notabilizado por não cumprir os compromissos de campanha e administrar fatos que não são lastreados no dia-a-dia do povo brasileiro. V. Exª traz - tenho certeza -, com angústia, esse tipo de posicionamento. Queríamos o Brasil se desenvolvendo, com uma política minimamente heterodoxa - isso era prometido pelo Governo do Partido dos Trabalhadores -, e não a continuidade de uma política ortodoxa, conservadora do ponto de vista monetário. Todo o País hoje sofre em razão desses índices de estagnação econômica, de desemprego, de diminuição da atividade econômica em todos os segmentos. V. Exª está de parabéns pela sua análise que, apesar de dura, retrata a realidade que estamos vivendo. Seu pronunciamento serve como um alerta para que o Governo Federal possa parar de fazer fantasia, para a qual muitas vezes é levado, com viagens mirabolantes, com planos que não se concretizam, e possa trabalhar no dia-a-dia, para oferecer soluções aos graves problemas da sociedade brasileira. Quero me solidarizar com V. Exª pelo seu discurso e também parabenizá-lo mais uma vez. Muito obrigado.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Muito obrigado, Senador César Borges.

V. Exª foi um grande governador da Bahia. Sabe que um Presidente da República, um governador de Estado, um administrador, enfim, tem que pronunciar o discurso da realidade. Não pode ser um discurso fantasioso, que venda ilusões. Venderam-se ilusões durante a campanha eleitoral, que, finda, dá início a um governo, e o Presidente da República comporta-se como vendedor de ilusões, mantém-se na mesma trajetória, a vender ilusões. Sabemos...

O Sr. Maguito Vilela (PMDB - GO) - Senador, gostaria de lhe pedir um aparte.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Eu o concederei em breve, Senador Maguito Vilela.

Não há, neste momento, nenhum indicador econômico que aponte para o crescimento em 2004, uma vez que as premissas sustentadas e mantidas pelo Governo impedem o crescimento econômico. É a política do arrocho, é a política fiscalista, é a política do investimento público zero, é a política de desestímulo ao investimento privado. Então, não há esperança de crescimento econômico, pelo menos no patamar exigido pela sociedade brasileira.

Gostaria de citar alguns dados ainda, Sr. Presidente. Meu tempo está se esgotando e não sei se posso ceder o aparte ao Senador Maguito Vilela.

O Presidente assinala que não é mais possível.

O SR. MAGUITO VILELA (PMDB - GO) - Mas eu pedi quando ainda havia tempo.

O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim) - Mas o tempo do orador está à disposição dele, e ele não cedeu.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Pediu ao final, Senador Maguito. Teria o maior prazer em ouvi-lo, mas, lamentavelmente, o Regimento me impede.

O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim) - A Mesa será tolerante com o orador, como foi com os outros. Agora, o tempo está à sua disposição.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Muito obrigado, Sr. Presidente.

Quero apenas destacar mais alguns números da realidade nacional, que contrastam com o otimismo, com o ufanismo do discurso do Presidente da República, hoje pela manhã.

Crescimento zero. O Brasil teria que crescer a um ritmo anual, em 2004, 2005 e 2006, de 7,9%, para que o Presidente da República pudesse cumprir as promessas de campanha eleitoral de geração de 10 milhões de empregos no País. E sabemos que é impossível o País atingir tal crescimento. Seriam necessários investimentos anuais de US$20 bilhões para vencer os gargalos que atingem, além do setor de transporte, do setor de energia, setores como gás natural e telecomunicações, impedindo o desenvolvimento nacional. Este ano, investimos aí ao redor de US$8 bilhões apenas.

O investimento estrangeiro no Brasil, também ao contrário do que proclama o Presidente Lula, sofreu uma retenção neste ano. Não chegou a US$10 bilhões.

Na reforma agrária, o desempenho do Governo foi frustrante: apenas 7 mil novas famílias foram assentadas, e tiveram concluído o processo de assentamento mais 14 mil, que já, no Governo passado, tinham iniciado o processo de assentamento. 

Sr. Presidente, em outubro, o rendimento do trabalhador caiu 15,2%, segundo o IBGE.

Poderíamos citar ainda a questão da infância, esse resultado assustador do primeiro ano de Governo, com o crescimento em 50% do número de crianças que tiveram que voltar ao trabalho. São dados que realmente impressionam.

A violência cresceu de forma avassaladora em todo o País, sem que o Governo tivesse competência para conter esse processo, que ganha aí contornos de perversidade.

Portanto, Sr. Presidente, não há razões para essa comemoração. Não há razões para essa festividade, mas razões para preocupação, para reflexão. Espera-se que o Presidente da República, com a sua equipe, mude o rumo do Governo para atender às aspirações da sociedade, em cumprimento dos compromissos assumidos durante a campanha eleitoral.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/12/2003 - Página 42103