Discurso durante a Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre o primeiro ano do Governo Lula.

Autor
José Agripino (PFL - Partido da Frente Liberal/RN)
Nome completo: José Agripino Maia
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Considerações sobre o primeiro ano do Governo Lula.
Publicação
Publicação no DSF de 19/12/2003 - Página 42204
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • CRITICA, INEFICACIA, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, GOVERNO FEDERAL, OBEDIENCIA, FUNDO MONETARIO INTERNACIONAL (FMI), AUMENTO, DESEMPREGO, CARGA, TRIBUTAÇÃO, AUSENCIA, MELHORIA, SAUDE, EDUCAÇÃO, SEGURANÇA PUBLICA, REDUÇÃO, CONFIANÇA, BRASIL, MERCADO INTERNACIONAL, DIFICULDADE, INVESTIMENTO, CAPITAL ESTRANGEIRO, QUESTIONAMENTO, EFICACIA, POLITICA EXTERNA.

O SR. JOSÉ AGRIPINO (PFL - RN. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, estamos realizando, talvez, uma das últimas sessões do ano de 2003. Impera na Casa o espírito de festa, de Natal, de concórdia.

Eu preferiria não proferir o discurso ou a fala com que me vejo na contingência de proferir. Por dever de consciência.

Senador Reginaldo, muito embora o espírito natalino esteja presente nesta Casa, eu creio que é preciso que façamos as reflexões. Dificilmente, a história registrará um ano em que tantos brasileiros perderam tanto em tão pouco tempo. O ano de 2003 foi um ano de perdas. Que perdas? O Presidente da República fez um discurso ufanista, referindo-se à participação dele na aprovação das reformas. Desculpe-me Sua Excelência, mas as reformas aqui produzidas e votadas foram produtos da maturidade da classe política e do entendimento entre Governo e Oposição. Enquanto aqui se discutia, Sua Excelência voava.

Para sermos verdadeiros, no ano de 2003, ano de perdas, foram perdidos 650 mil empregos. O nível de emprego do Brasil, de outubro a outubro, caiu 13%; nas cidades grandes, como São Paulo e Rio de Janeiro, caiu 20%. Perderam seus postos de trabalho 650 mil trabalhadores. São pais de família e muitos deles, talvez, tenham até votado no Presidente Lula, imaginando que a perspectiva da geração de 10 milhões de emprego fosse para valer. Eles perderam o emprego, evidentemente em função de uma política econômica levada a efeito: a política econômica de submissão ao FMI, em contraponto ao que o Presidente, como candidato, havia dito e estava comprometido. O PT preconizava “Fora FMI”, mas, em vez disso, o Governo do PT se submeteu a uma regra de superávit primário de 4,25%. Os juros começaram em 26,5% e, por pressão da sociedade e dos Partidos de Oposição, vêm decrescendo, fora de tempo, até chegar ao patamar hoje de 16%, ainda com juro real na faixa de 9%. A carga tributária pela imposição da contribuição social sobre o lucro líquido das empresas; do PIS, que evoluiu de 0,65 para 1,65; da Cofins, que está em discussão e que vai merecer reparos por parte dos partidos de oposição; da tabela do imposto de renda, que lutamos e ainda vamos lutar para que seja reajustada, tudo isso produziu uma situação tal na economia brasileira, que terminou levando à recessão sem precedentes.

No ano de 2003 houve uma perda de 650 mil postos de trabalho, pelo desestímulo à economia. Prejuízo para os aposentados, que perderam 11% dos seus rendimentos porque a partir da aprovação, contra o nosso voto, da PEC 67 vão ter que contribuir com 11% dos seus rendimentos para a Previdência Social; perda para as viúvas, para as pensionistas, que perderam 30% daquilo que vierem a receber pelo confisco imposto pela perversa PEC 67; perda para os servidores públicos, que votaram maciçamente no Governo do PT e que tiveram, diferentemente da promessa que lhes foi feita, o reajuste de 1% nos seus salários.

A Oposição, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, tem a obrigação de convocar a sociedade à vigilância, de fazer o trabalho de fiscalização do campo ético, administrativo e da cobrança de compromissos. O que o meu Partido, o PFL, fez este tempo todo foi, inicialmente, cobrar coerência do Governo: entre o que o Presidente Lula prometia como candidato e o que fez como Presidente eleito. O PFL fiscalizou a administração e a ética o tempo todo. O fez e o fará.

Preciso fazer esta constatação, porque vamos ter um novo ano. O brasileiro deseja, na verdade, que o Governo governe; que aquilo que o Governo prometeu seja na prática a verdade. Precisamos fazer, neste final de ano, uma espécie de recall sobre como foi o Governo, de quais ações do Governo que o povo se lembra no ano de 2003. No campo da saúde - um sério problema de Governo nos Municípios, nos Estados e na União -, qual é o ícone, qual é a lembrança do povo brasileiro, Senador Garibaldi Alves Filho?

Recordo-me muito bem de que nenhum plano novo foi anunciado, à exceção de um vigoroso programa de saneamento básico, anunciado pessoalmente pelo Presidente e que até hoje não vimos. Os recursos prometidos são uma justificativa de cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal e até agora não apareceram. Presidente não pode prometer para não cumprir; Presidente não pode ter a veleidade de chegar nos lugares e dizer coisas inconseqüentes. Porque credibilidade tem fim, e sinto que a credibilidade do Presidente está se queimando e indo à exaustão. O único fato emblemático na questão da saúde é o lamentável episódio do Instituto Nacional do Câncer, que era muito bem administrado e muito bem gerido no Governo passado. Era considerado referência nacional no Rio de Janeiro e, por nomeações políticas, entrou em crise, prejudicando aqueles que dependem da prestação de uma assistência médica pública no campo da saúde voltada para a cura do câncer. Até o remédio para a quimioterapia faltou.

No campo da educação, ouvimos os choramingos do Ministro Cristovam Buarque por verbas, e o Presidente passando-lhe um pito, dando ao País um recado claro de que a educação, neste Governo, não é prioridade. De tanto esperar por verbas novas, o Ministro apareceu com uma novidade no fim do ano, que é a perspectiva de uma taxa nova cobrada sobre o pretérito: alunos de escola pública formados estariam agora ameaçados de ser taxados com um recurso que o Governo utilizaria para aplicar na universidade pública.

No campo da segurança: ouve-se falar de quê? Lembra-se de quê? Lembro-me muito bem do narcoturismo de Fernandinho Beira-Mar, passeando em avião da União em busca de um pouso para ser preso; ou do triste episódio ocorrido com o Secretário de Segurança Nacional, Sr. Luiz Soares, do nepotismo com a ex-esposa, gerando um escândalo que o levou à demissão.

Senador Reginaldo Duarte, a segurança, que é um problema seriíssimo, ao lado do desemprego, neste País, é o que mais inquieta a sociedade brasileira. Gastou-se menos em segurança, por aportes de verbas federais, do que propôs o Prefeito César Maia no início do ano. Na proposta de convênio no Rio de janeiro, ele aportaria R$100 milhões de recursos da Prefeitura e o Estado e a União aportariam R$100 milhões cada um. Decorridos doze meses, os recursos aplicados na segurança pela União foram inferiores aos R$100 milhões que o Prefeito César Maia ofereceu, sem nenhuma obrigação de fazê-lo, para o combate à violência e à criminalidade no Rio de Janeiro. Esse fato permite avaliar com muita precisão o nível de prioridade que este Governo dá e deu à questão da segurança.

Quanto às relações exteriores, o Presidente ocupou-se de viajar. É bom que viaje, mas que faça viagens conseqüentes. Viagem a Havana, Caracas, Namíbia e Líbia podem até ser interessantes, mas será que as prioridades do Brasil estão aí? Será que o confronto estabelecido gratuitamente pelo Presidente com os Estados Unidos da América, maior parceiro comercial do Brasil, poderá produzir bons resultados? Será que esse périplo pelas Havanas e por Caracas produzirá bons resultados para o nosso problema do desemprego?

É muito bom ser altivo. Aplaudo a auto-suficiência, o gesto de altivez, mas não a altivez gratuita, colocando em risco aquilo de que precisamos: taxação menor sobre o suco de laranja, sobre o aço e sobre os calçados brasileiros e preferência à compra de aeronaves brasileiras. Para que o confronto? Para que gastar o tempo com países governados por pessoas notoriamente entendidas como tiranos universais? Onde o Brasil ganha com essa política de relações exteriores?

Gostaria muito de não estar dizendo nada disso, mas é preciso que se faça esta confrontação, esta constatação: no campo da Educação, da Saúde da Segurança, das Relações Exteriores e dos Transportes, qual é a obra nova, qual foi o grande porto melhorado ou construído? Qual é a estrada que está sendo bem recuperada? Onde é que está o dinheiro do contribuinte brasileiro? Onde está o Governo do Presidente Lula?

Desejo fazer essas constatações ao lado da preocupação maior, porque após 2003, o ano das perdas, virá 2004. E o Presidente está prenunciando um grande ano. Espero que seja um grande ano, mas não será seguramente um grande ano, se não forem corrigidas premissas fundamentais.

Sente-se claramente que o mundo está se preparando para entrar numa nova onda de crescimento. É visível: a intervalos de tempo, a economia mundial cai ou cresce. Sinto que a Economia mundial está pronta para voltar a crescer e o Brasil pode perfeitamente surfar nessa onda, desde que três premissas básicas sejam observadas.

Inicialmente, os marcos regulatórios têm que ser suficientemente definidos. Não é com a edição de uma medida provisória, definindo o setor elétrico, com o retrocesso de transformar a Aneel em um órgão sem função e sem credibilidade. Não é estabelecendo marcos regulatórios, novamente na contramão da história, centralizadores, retrógrados, não é com marcos regulatórios atrasados que se vai finalizar para a credibilidade internacional e para os investimentos externos e internos.

Urge que o Governo se modernize no campo da definição dos marcos regulatórios, porque o mundo inteiro, que tem vontade de investir no Brasil, só virá com segurança. É preciso que o Brasil entenda que, com a carga tributária que é aplicada hoje sobre o cidadão e sobre as empresas do Brasil, beirando os 40%, ninguém vem para cá.

Ninguém vem para um País com carga tributária de 40%. Qual é o negócio, empresa ou empreendimento que tem lucro capaz de desovar 40% e ainda sobrar lucro para fazer investimento? Com a carga tributária como está posta e com o Governo insistindo em aumentá-la a cada dia - e a Cofins está para chegar, para enfrentarmos e para derrotarmos essa proposta perversa -, chegaremos a lugar nenhum e não vamos surfar nessa onda nova.

Por último, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o confronto com os Estados Unidos não é boa prática. Não está aqui nenhum americanista, nem devoto ou simpatizante especial dos Estados Unidos da América. Aqui está um Senador pragmático, que entende que os Estados Unidos têm que ser tratados como tratam as nações expertas do mundo, tratadas com habilidade, cortesia, firmeza, mas sem confronto, porque o estabelecimento de confronto com os Estados Unidos faz com que as preferências que podem ser dadas ao Brasil vão para o Canadá, vão para a Índia, vão para a França ou Inglaterra, que são parceiros mais confiáveis. E, nisso, vão-se embora os investimentos e os empregos de que o Brasil não pode abrir mão.

Essas, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, eram as considerações que eu me via na obrigação de fazer, por preocupações que tenho e que me são reveladas, no momento em que ouço as manifestações do Presidente Lula, que tem um papel fundamental em seu Governo: vender esperança. Sua Excelência é um vendedor de esperança. Gostaria muito de que o País fosse aquele dos discursos e das promessas do Presidente Lula. Mas, do jeito que vai, com a ineficiência dos quadros que o Governo tem, com as premissas que o Governo acolheu, não chegaremos a lugar algum. E, antes que seja tarde, aqui vai o alerta: que 2004 não seja de novo um ano de perdas como foi 2003.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/12/2003 - Página 42204