Discurso durante a Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Polêmica em torno da concessão da patente de general-de-brigada a Apolonio de Carvalho.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
FORÇAS ARMADAS.:
  • Polêmica em torno da concessão da patente de general-de-brigada a Apolonio de Carvalho.
Publicação
Publicação no DSF de 19/12/2003 - Página 42227
Assunto
Outros > FORÇAS ARMADAS.
Indexação
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, JORNAL DO BRASIL, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), DIFICULDADE, DECISÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATENDIMENTO, RECOMENDAÇÃO, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), CONCESSÃO, PATENTE MILITAR, GENERAL DE BRIGADA, OFICIAL DO EXERCITO, VITIMA, CASSAÇÃO, PERIODO, ESTADO NOVO, REGIME MILITAR, MOTIVO, DIVERGENCIA, OPINIÃO, FORÇAS ARMADAS.
  • JUSTIFICAÇÃO, HOMENAGEM, PERSONAGEM ILUSTRE, PARTICIPAÇÃO, LUTA, DEMOCRACIA, DEFESA, JUSTIÇA SOCIAL, CRISE.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Jornal do Brasil, na sua edição do dia 15 de dezembro, traz uma longa reportagem sobre a polêmica que vem sendo travada em torno da concessão ou não - a título de homenagem - da patente de general-de-brigada a Apolonio Carvalho, 92, antigo militante comunista que foi cassado em duas oportunidades, durante o governo Vargas e durante o regime militar.

Diz o Jornal do Brasil que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem “uma difícil decisão para tomar nos próximos dias”: acatar ou não um pedido do Ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, para que Apolonio seja promovido a general.

Ocorre, porém, que na trincheira oposta está o Ministro da Defesa, José Viegas, que não aceita a promoção de Apolonio Carvalho, que foi tenente do Exército Brasileiro nos anos 30.

Pelo que os jornais publicaram, o Alto Comando do Exército já manifestou - em nota - sua contrariedade, justificando que o ato do Ministro da Justiça desobedece a Lei nº 5.821, de 1972. De acordo com esse dispositivo legal, o Presidente da República só pode promover oficiais generais a partir de lista tríplice, fornecida pelas Forças Armadas. Da lista podem tomar parte somente oficiais com aptidão física e com um tempo mínimo de serviço, requisitos que Apolonio - que passou somente seis anos e seis dias no Exército - não preenche.

Por isso, caso se decida pela promoção de Apolonio, avaliam os militares para o Jornal do Brasil, o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva estaria “fundando as bases de uma crise institucional”.

É nesse ponto que desejo me concentrar. Não creio que o assunto seja para tanto. Temos que analisar a questão com muita tranqüilidade, porque já temos muitas crises reais com que nos preocupar.

O advogado de Apolonio Carvalho, Paulo Henrique Fagundes, diz que nem ele, nem seu cliente, pleitearam qualquer tipo de homenagem. O que houve foi uma recomendação do Ministro da Justiça, feita espontaneamente e aprovada por unanimidade pelos integrantes da Comissão de Anistia.

Segundo o advogado, trata-se de uma homenagem simbólica, porque Apolonio Carvalho não vai vestir a farda nem voltar à ativa. Assim, ele lamenta que o Exército tenha recorrido a uma lei para oficiais de carreira para negar a homenagem a Apolonio.

O surgimento do problema: a recomendação do Ministro da Justiça, feita espontaneamente, sem, é claro, uma conversa prévia com o titular da Pasta da Defesa. A intenção, parece-nos, era a melhor possível.

Vejamos um pouco da história de Apolonio Carvalho, que teve cassada sua patente de oficial do Exército Brasileiro em abril de 1937. Apolonio pertence a uma família de oficiais do Exército. Seu pai tomou parte na proclamação da República, na condição de cadete da Escola Militar da Praia Vermelha, um dos principais focos republicanos do País.

Nos anos 30, Apolonio filou-se à Ação Integralista Nacional e recebeu a missão de organizar os núcleos da instituição em Bagé (RS), onde servia, e nas cidades vizinhas. Esse trabalho foi desenvolvido na legalidade até novembro de 1935, quando ocorreram as rebeliões isoladas de Natal, do Recife e do Rio de Janeiro.

Preso, foi levado para o Rio. “Em abril de 36, sem processo, sem julgamento, sem ser ouvido, tenho minha patente cassada”, disse Apolonio ao Jornal do Brasil. No cárcere, filiou-se ao Partido Comunista Brasileiro.

Ao sair da prisão, em julho de 1937, juntamente com outros militares comunistas, alistou-se nas forças republicanas espanholas para lutar contra tropas do general Franco. Participou da guerra civil daquele país até a derrota dos republicanos em abril de 1939, quando escapou pela fronteira catalã para a França.

Por algum tempo ficou em campos de refugiados. Após a rendição da França, em julho de 1940, foi para Marselha, onde se encontra a francesa Renée, a mulher que ainda hoje é sua esposa.

Os dois aliam-se à resistência francesa e, ao fim da guerra, o brasileiro Apolonio foi nomeado coronel, e Renée, tenente do Novo Exército Francês. Por atos de bravura, Apolonio recebeu ainda a Legião de Honra do governo da França, a maior condecoração daquele país.

Depois de viver alguns anos em Paris, voltou ao Brasil com a redemocratização ao fim da Era Vargas. Mas sua anistia só seria concedida em 1961, pelo Ato nº 18. Porém, antes da formalização do indulto, sobreveio o golpe militar de 64. Em 1970, Apolonio foi preso pelo Exército, mas conseguiu deixar o País rumo à Argélia, como um dos 39 brasileiros trocados pelo embaixador alemão seqüestrado pelos militantes de esquerda.

Apolonio só voltaria ao Brasil quase 20 anos depois, para mais uma vez tentar obter sua anistia, como lhe possibilitava a nova Constituição, de 1988. Segundo seu advogado, ele foi o primeiro a dar entrada no processo, mas um dos últimos a ser atendido, sem ser incluído no preceito de que cada ano passado na clandestinidade corresponde a 12 meses de serviço prestados. Os militares deram a Apolonio a patente de coronel da reserva, mas apenas reconheceram os seis anos e seis dias de serviço.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Sr. Apolonio Carvalho é um brasileiro ilustre. Dedicou sua vida à luta política, à defesa dos seus ideais de justiça social. Atuou no Brasil, na Espanha e na França. Neste último país foi homenageado com a Legião de Honra. Tudo isso deve ser levado em conta agora no momento em que a Nação, por meio da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, lhe concedeu anistia. Não creio que este seja um assunto para o surgimento de uma crise artificial, a partir de uma decisão do Presidente Lula.

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/12/2003 - Página 42227