Discurso durante a Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Homenagem de pesar pelo falecimento do ex-Senador José Richa.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagem de pesar pelo falecimento do ex-Senador José Richa.
Publicação
Publicação no DSF de 18/12/2003 - Página 41796
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, JOSE RICHA, EX SENADOR, EX GOVERNADOR, ESTADO DO PARANA (PR), FUNDADOR, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA (PSDB), ELOGIO, VIDA PUBLICA, DEFESA, DEMOCRACIA.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS. Para encaminhar a votação. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Parlamentares, não há dúvida nenhuma de que hoje é um dia de profunda mágoa e tristeza para a política brasileira.

José Richa era um desses políticos que na história da vida brasileira marcam passagem por uma série de qualidades e princípios que defendem e pelos quais lutam a vida inteira. José Richa sempre foi um homem de princípios. Jovem, estudante universitário, acreditou nos princípios do PDC, partido que Montoro liderava e que tinha idéias realmente magníficas de justiça social e que parecia vir para ser o grande partido da sociedade brasileira. Por essas idéias e justiça social, Richa filiou-se ao PDC e iniciou sua carreira jovem, trabalhando no gabinete de Ney Braga, governador do Paraná. Veio a ditadura, veio o regime militar e entre ser Governo e ser Oposição, ficar ao lado dos militares e ficar ao lado da democracia, Richa não teve opção, fundou o MDB, à revelia do seu amigo quase padrinho Ney Braga, que foi para a Arena. Trilhou o caminho difícil da Oposição, numa hora como aquela em que imprevisíveis eram os caminhos que haveria de ter pela frente.

No MDB, Richa transformou-se num grande nome do Paraná e transformou-se num grande nome nacional. Lembro-me de que, nas horas dramáticas, nas horas difíceis, nas horas das decisões que tínhamos que tomar, tendo em vista AI-1, AI-2, AI-5, cassações - aquela cassação do Alencar Furtado, quando do pronunciamento magnífico que ele, que era nosso Líder, fez em um programa de televisão -, Richa sempre estava aqui em Brasília. Era convocado pelo Dr. Ulysses Guimarães porque ele se constituía em um dos nomes que dava linha e orientação ao nosso partido.

Richa foi Governador; sim, foi Governador. Richa foi Senador da República, eleito no mesmo dia que eu. E aqui chegamos. Richa foi Governador em 82, na primeira eleição depois da ditadura. Eleito, Richa teve um papel importante, eu diria, um papel fundamental para os destinos deste País. O meu candidato, o candidato amplamente majoritário no MDB para as eleições à presidência da República era Ulysses Guimarães. Richa participou das eleições das Diretas Já. O comício que nós fizemos em Curitiba foi dos maiores do Brasil. Foi ali em Curitiba que, nas Diretas Já, os comícios começaram a se encher de montanhas de gente. E a Rede Globo e a sociedade passaram a entender que algo de novo estava acontecendo. Derrotada a emenda das Diretas Já, quando todos nós estávamos na interrogação do que fazer, Richa, Governador do Paraná, foi a Montoro e, tendo o apoio de Montoro, Governador de São Paulo, reuniu os Governadores do MDB e lançou a candidatura de Tancredo Neves no Colégio Eleitoral.

Dois atos de arrojo de Richa: no MDB, que era apaixonado pelas Diretas e dizia que o Colégio Eleitoral era um escândalo, Richa defendeu ir ao Colégio; e, no MDB, que era todo apaixonado pela candidatura do Dr. Ulysses, Richa defendeu Tancredo, e nisso teve o apoio de Montoro, outro normal candidato à Presidência. Richa saiu vitorioso. Conseguiu explicar, numa convenção monumental, tumultuada do MDB, que o partido deveria ir ao Colégio. Deveria ir ao Colégio para derrotá-lo, derrubá-lo porque, ganhando, diretamente nós estaríamos terminando com o Colégio Eleitoral. E nos justificou que o candidato deveria ser o Dr. Tancredo porque tinha condições de entrar numa linha divisória dentro da Arena, e o Dr. Tancredo teria apoio mais fácil dos militares e do Governo do que o Dr. Ulysses, um tradicional, radical adversário, autor de discursos e frases duríssimas aos militares. José Richa foi vitorioso. Tancredo Neves foi escolhido pelo PMDB e eleito Presidente.

José Richa participou conosco da organização da Frente Democrática, da organização do Governo de Tancredo Neves. Richa sofreu conosco a morte de Tancredo. Richa fez um governo extraordinário no Paraná, um grande governo. E com tranqüilidade e muita facilidade o seu sucessor, indicado pelo MDB com o seu apoio, o Deputado Álvaro Dias, foi eleito. Passou o tempo. Com a morte de Tancredo e a posse do Dr. José Sarney, muitas confusões se criaram dentro do PMDB. Várias divisões se deram dolorosamente dentro do partido e uma delas resultou na criação do PSDB. José Richa, que era como irmão político de Mário Covas, seguiu-o. Lembro-me da insistência dele - eu Governador - e do Covas no Palácio Piratini para que eu fosse para o PSDB. José Richa dizia que era importante eu ir para o PSDB, para que o PSDB não fosse um partido tão paulista e fosse um partido mais eclético, distribuído pelo resto do Brasil. Richa foi para o PSDB e foi um grande nome, várias vezes apontado como a saída para o PSDB. A sua pureza e o seu desprendimento fizeram com que isso não acontecesse. Na Constituinte, Richa teve um papel da maior importância: criou o Grupo dos Trinta. E quando a Constituinte rachou, uns com o Covas, Líder de um lado, e o Centrão do outro, muitas das emendas aprovadas, muitas das horas negras que apareceram, quando não se sabia qual era a saída, o grupo do Richa era chamado e esses trinta parlamentares que constituíam o grupo dele decidiram muitos projetos da maior importância na Assembléia Nacional Constituinte.

Eleito Presidente Fernando Henrique, sempre estranhei Richa não atender os convites insistentes do Fernando Henrique para participar do Governo. Desde o início, todo o PSDB e todos os amigos do Governo achavam que Richa era o homem certo para ser o Chefe da Casa Civil, pela sua grandeza, pela sua seriedade, por conhecer o Partido, pela facilidade com que penetrava em todos os lados, no Partido e fora dele. Eu fui inclusive interlocutor de convites que o Fernando Henrique, Presidente, fez ao Richa.

Não sei, sinceramente, não sei mas nos oito anos em que Fernando Henrique foi Presidente, eu não me lembro de um ano ou de um problema que o Governo tinha em que José Richa não era convidado para ser Ministro e não aceitou. Uma das últimas coisas que fez - e eu me lembro - ele insistiu para que o Scalco, seu irmão, político, aceitasse trabalhar e fosse Ministro de Fernando Henrique, mas ele não aceitou.

José Richa foi o Presidente do nosso Movimento, na hora do plebiscito, para criarmos o parlamentarismo. Lutou e andamos pelo Brasil, mas lamentavelmente não tivemos competência. Até hoje, eu desconfio de alguns que diziam que apoiavam o parlamentarismo, nos quais Richa confiou e eu não confiava. Na verdade, a campanha que fizemos para o parlamentarismo, na televisão, na minha opinião foi péssima - até a da monarquia foi muito melhor do que a nossa - mas Richa lutou e lutou permanente e constantemente.

Richa era um homem de família. É emocionante ver o Richa e Dª Arlete, o amor, o carinho, o afeto, a amizade e a simpatia que os nutria. Eles viviam permanente e constantemente uma vida que eu não digo que tivesse inveja, mas que eu admirava com profundidade. O seu filho Beto, seu sucessor político, hoje, é vice-Prefeito da Capital. Mas eu me lembro muito do Adriano. Jovem, diabético, para onde fosse levava a injeção e aplicava em si, entrava em coma e ia para o hospital. Lembro-me, a primeira vez que soube fui correndo ao hospital, porque não sabia que para ele coma era algo normal. Entrava em coma, davam o remédio e voltava ao normal. Esse Adriano teve uma atividade importante, do maior significado. Foi o Presidente da Associação dos Diabéticos.

Eu era Ministro Agricultura quando ele me procurou para determinarmos que fossem criados produtos dietéticos, como a Coca-Cola. Ele argumentava e eu dizia para ele que o suco de laranja era muito melhor que a Coca-cola, que o guaraná. Perguntei por que estava querendo guaraná e Coca-cola sem açúcar. Ele dizia: o senhor na sabe como é doloroso ir ao colégio e ver todo mundo tomando guaraná e a gente ter de tomar suco de laranja, porque no guaraná tem açúcar. E ele conseguiu, fruto do seu trabalho, os produtos dietéticos.

Encerro, Sr. Presidente, mas quero dizer que tenho no Richa, sempre tive, um irmão e um amigo. Éramos de partidos diferentes, mas mensalmente nos reuníamos todas as vezes que vinha a Brasília, na casa do amigo José Lírio Ponte Aguiar, por quem tinha tanta admiração e carinho. Ele, eu, o Scalco, sempre nos reuníamos para debater, para analisar, para estudar o nosso País.

Olha, Sr. Presidente, morreu José Richa. Morreu um homem de bem, morreu uma referência neste País. Morreu uma daquelas pessoas que, posso dizer, quando falava dizia o que sentia e quando falava ensinava ao Brasil. Morreu José Richa, e nós aqui prestamos-lhe a nossa homenagem triste, dolorida, sofrida, mas a homenagem a um homem que honrou o Paraná, que honrou o Parlamento, que honrou o Brasil, que honrou a política brasileira. Meu irmão, meu amigo, José Richa, que nesta hora com Deus está prestando contas da enormidade de coisas que fez por este país. Que Deus o tenha e que lá olhes um pouco por este teu País e por esta tua pátria. Adeus, meu irmão, José Richa, que Deus esteja contigo.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/12/2003 - Página 41796