Discurso durante a Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

A burocracia no Brasil.

Autor
Ney Suassuna (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Ney Robinson Suassuna
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DE DESENVOLVIMENTO.:
  • A burocracia no Brasil.
Publicação
Publicação no DSF de 24/01/2004 - Página 1293
Assunto
Outros > POLITICA DE DESENVOLVIMENTO.
Indexação
  • ANALISE, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, EXCESSO, BUROCRACIA, PAIS.
  • DEFESA, NECESSIDADE, DESBUROCRATIZAÇÃO, AGILIZAÇÃO, DESENVOLVIMENTO NACIONAL.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


           O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nesta semana ocupei duas vezes a tribuna. Numa delas, fiz um balanço do ano de 2003 - decepções e vitórias - e também avaliei as projeções e as possibilidades de 2004. Neste ano de 2004, todos nós estamos depositando muitas esperanças, mas não devemos esperar demais do ponto de vista orçamentário. O Brasil vai arrecadar R$404 bilhões, mas vai pagar R$164 bilhões só do serviço da dívida. Essa dívida está pesando enormemente nas costas de todos nós e é um peso muito difícil de ser levado pela nossa geração. É claro que isso vem da irresponsabilidade, eu diria, econômica das gerações passadas. Temos muito que agradecer às gerações passadas, inclusive a vida; se não fossem as gerações passadas, não estaríamos aqui. No entanto, o Brasil, nesse tempo todo, não se preocupou com dívidas.

           Quando o Brasil se tornou independente, os portugueses tomaram dinheiro emprestado aos ingleses. Depois, num acordo de pai para filho, D. João VI permitiu que D. Pedro I declarasse a independência, desde que pagasse a conta aos ingleses. Foi a primeira dívida. Daí para diante, a dívida só fez crescer. Em algumas horas, o dinheiro ficou muito caro: pagávamos 20% sobre o dólar. Era terrível! Essa dívida extrapolou e hoje ela é pesadíssima. Pagar R$164 bilhões por ano praticamente neutraliza o Orçamento.

           Então, a nossa solução não deverá ser de Orçamento, mas de exportações e do que pudermos cortar de despesas. E o que podemos cortar de despesas, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores? O que podemos fazer para que a nossa juventude não se sinta desalentada com a falta de empregos, nosso maior problema do momento? É preciso baixar o custo Brasil, é preciso diminuir a burocracia.

Eu falava, na terça-feira, aqui, que, na Austrália, é preciso dois dias para se implantar uma microempresa; no Brasil, levam-se cento e cinqüenta e nove dias. O custo de se instalar uma empresa no Brasil é várias vezes maior que o da Austrália. A burocracia, que é um hábito ibérico, sufoca o Brasil.

Será que há burocracia somente na área administrativa? Não, Sr. Presidente. A burocracia na Justiça é uma vergonha nacional. Os juízes estão sufocados num mar de papel. Transformamos a nossa Justiça em uma Justiça processual. O importante é protelar. Se um indivíduo cometer um homicídio hoje e tiver algum dinheiro, ele será julgado daqui a 30 anos, a não ser que caia no gosto da imprensa, pois, se isso ocorrer, a pressão fará com que seja diminuído o prazo.

E não culpo os juízes. A culpa é da sociedade que permitiu que a Justiça ficasse desta forma: extremamente burocratizada, sufocada, afogada num mar de processos.

Quem quiser um exemplo do que estou falando vá a uma Vara Judicial e observe o mundo de processos que há. São salas cheias de papel, e o juiz fica sufocado por uma agenda terrível. Em se tratando da Justiça Federal, ainda é pior, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores. Só na Receita Federal, no Ministério da Fazenda, há 4,5 milhões de processos aguardando julgamento. E a Justiça do Trabalho? Também está sufocada. Precisam ser reformuladas tanto a Justiça Comum como a Justiça do Trabalho.

Essas duas reformas estão chegando ao Senado. Já começam a tramitar. Vejam os senhores: há dez anos está o processo de reforma do Judiciário no Congresso, pois passou nove anos na Câmara dos Deputados e chegou em setembro passado ao Senado.

A oposição à reforma é grande no meio judicial. E por quê? Porque todo mundo diz que é preciso reformar, mas, quando chega a hora da reforma, pensa: a situação como está é conhecida; a outra poderá ser pior. E começam os anticorpos às reformas.

Trabalhei na reforma administrativa de 1967 com o Ministério Hélio Beltrão. Era assim mesmo. Chegávamos a um Ministério, víamos que a burocracia era genérica e sabíamos que era preciso reformar. Todo mundo dizia que era preciso reformar, mas, quando apresentávamos a reforma, a grita era geral. Ninguém queria mudar a rotina conhecida.

Para V. Exªs terem uma idéia do que é a burocracia neste País, imaginem só: já foi abolido, por decreto, duas vezes, o reconhecimento de firma, mas tente pegar um documento qualquer - mesmo que seja para levar para o Governo - para ver se o cidadão não diz que é preciso reconhecer a firma. É a falta de confiança nas pessoas. E o cidadão se sente - é um atavismo brasileiro - na obrigação de transferir sua responsabilidade para outro. Então, quem atesta não é uma pessoa que tenha fé, e um funcionário público qualquer podia fazê-lo pelo decreto. Não! É preciso ir ao cartório, porque aí a responsabilidade passa a ser do cartório.

Temos a burocracia na cabeça, e essa burocracia está entravando o Brasil e aumentando o custo. Para V. Exªs terem uma idéia, um processo de falência de uma empresa nos Estados Unidos e na maioria dos países da Europa demora um ano; no Brasil, esse mesmo processo leva dez anos para ser concluído. Isso se reflete em quê?

Agora, vejam a malícia e - e eu diria até - a malandragem dos financistas. Como isso demora, como tem esse custo, vai para os juros. Quem vai tomar dinheiro emprestado tem que tomar uma parcela por conta da demora das soluções.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, esta Casa vai ter muita responsabilidade e precisa estar imbuída dessa responsabilidade na reforma do Judiciário, que temos que fazer durante essa convocação. Já estamos ouvindo e estamos prestando muita atenção aos depoimentos das autoridades que estão sendo chamadas. Hoje mesmo, o Ministro Nelson Jobim deverá estar prestando informações a esta Casa sobre a reforma do Judiciário.

E há também a Lei de Falências para ser votada nesta convocação. E, com toda certeza, nos próximos dias, estará aportando ao Congresso a reforma da lei trabalhista. São coisas importantes que temos que fazer. É claro que o corporativismo vai pesar e que haverá protestos, discussões, mas é preciso que se faça. Saltamos de 12% para 12,4% de desemprego. E não pode haver nada mais degenerativo, nada mais deprimente, nada mais ofensivo a um ser humano do que não se sentir útil, do que não ter emprego.

E, quando falamos em emprego, não estamos contando como subemprego os empregos de pessoas que terminam cursos superiores e vão ganhar R$200,00 ou R$300,00. Hoje mesmo, recebi o telefonema de um correligionário da Paraíba que estava desolado, porque a filha, que terminou de fazer graduação e pós-graduação, foi em busca do primeiro emprego, mas lhe ofereceram apenas R$200,00 de salário inicial. São oferecidos R$200,00 para uma pessoa com pós-graduação!

A verdade é que continuamos com um outro complexo: o complexo da graduação e, agora, da pós-graduação. As carreiras técnicas de bombeiro e de eletricista estão dando muito mais resultado, como emprego, do que as carreiras de bacharéis, de doutores e tudo o mais.

Então, é preciso que o Brasil entre nos trilhos do desenvolvimento. E, para entrar nos trilhos do desenvolvimento, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é preciso que desburocratizemos as rotinas e façamos deste um País mais ágil. Isso custa caro ao Brasil, custa caro ao futuro e prejudica, principalmente, os jovens que estão chegando ao mercado de trabalho e que precisam ter mais facilidade nas ações, na sua missão trabalhista.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/01/2004 - Página 1293