Discurso durante a Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Avaliação positiva da Medida Provisória 163, de 2004, que trata da reforma ministerial. Artigo do Professor francês Philippe Van Parijs, parabenizando o Governo Brasileiro pela adoção do programa de Renda Mínima.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL. ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.:
  • Avaliação positiva da Medida Provisória 163, de 2004, que trata da reforma ministerial. Artigo do Professor francês Philippe Van Parijs, parabenizando o Governo Brasileiro pela adoção do programa de Renda Mínima.
Publicação
Publicação no DSF de 29/01/2004 - Página 1652
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL. ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.
Indexação
  • REGISTRO, SANÇÃO, LEI FEDERAL, CRIAÇÃO, RENDA MINIMA, CIDADANIA, LEITURA, SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, ECONOMISTA, DISCURSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, CERIMONIA.
  • SAUDAÇÃO, POSSE, PATRUS ANANIAS, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DO DESENVOLVIMENTO SOCIAL E COMBATE A FOME, REGISTRO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), DEFINIÇÃO, COMPETENCIA, SEGURANÇA, NATUREZA ALIMENTAR, ASSISTENCIA SOCIAL, POLITICA NACIONAL, RENDA MINIMA.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Romeu Tuma, quero dizer à Senadora Maria do Carmo que me esforçarei para que S. Exª possa também usar da palavra.

Quero, nesta tarde, registrar acontecimento significativo realizado no último dia 8 de janeiro, quando o Presidente Lula sancionou a Lei que institui a Renda Básica de Cidadania.

Também gostaria de registrar a posse do Ministro do Desenvolvimento Social e Segurança Alimentar, Deputado Patrus Ananias, substituindo os Ministros José Graziano da Silva e Benedita da Silva, respectivamente, Ministros da Segurança Alimentar e do Combate à Fome e o do Desenvolvimento Social, que tão bem honraram as gestões e as missões para as quais haviam sido designados. Agora, esta responsabilidade é transferida ao Ministro Patrus Ananias, que tem granjeado um extraordinário respeito, e que deu exemplos, ao longo de sua vida pública, especialmente como Prefeito de Belo Horizonte, de pessoa com a compreensão profunda dos problemas de erradicação da pobreza, do combate à fome e forma de gerar as possibilidades de inclusão de todos os brasileiros.

Quero registrar que a Medida Provisória nº 163, de 23 de janeiro de 2004, assinada pelo Presidente da República e pelos Ministros Guido Mantega e José Dirceu de Oliveira e Silva, dá a definição desse novo Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome, que terá as seguintes atribuições: a política nacional de desenvolvimento social; a política nacional de segurança alimentar e nutricional; a política nacional de assistência social; a política nacional de renda de cidadania e outros itens, portanto, incorporando, entre as suas missões, a instituição da renda básica de cidadania, que, conforme a lei, deverá ser instituída gradualmente a partir de 2005.

Sr. Presidente, o Prof. Philippe Van Parijs, presente à cerimônia, escreveu um artigo a respeito, e até mesmo usou da palavra, e tão relevante é o conteúdo do que disse naquele momento, bem como nesse artigo, que o jornal Valor Econômico publicou, assim como o jornal Business Day, o principal jornal financeiro da África do Sul, que eu gostaria de registrá-lo.

Diz Philippe Van Parijs, professor de Economia e Ética Social da Universidade Católica de Louvain, fundador e secretário-geral da Rede Européia da Renda Básica:

O mundo está vendo o Brasil. Com grande interesse. Com grandes esperanças. Com alguma apreensão.

Será que o governo e o povo brasileiros conseguirão realizar a sua promessa de erradicar a fome, de drasticamente reduzir a desigualdade em uma das mais desiguais sociedades do mundo? E será que administrará isso de maneira a não prejudicar o dinamismo econômico? Conseguirão fazer isso mesmo de forma a estabelecer a fundação de um desenvolvimento econômico sustentável, colocando as pessoas numa posição de ajudar a si próprias, e assim a ajudar melhorar o seu país?

Os desafios são grandes. Mas a vontade aí está e, assim parece, a sabedoria para fazer as coisas funcionarem. O ambicioso, embora razoável, projeto de uma Renda de Cidadania para todos os brasileiros, proposto pelo Senador Eduardo Suplicy, aprovado no Senado em dezembro de 2002 e pela Câmara dos Deputados em dezembro de 2003 e que foi sancionado em 8 de janeiro de 2004 pelo presidente Lula, evidencia de forma espetacular e sem precedentes tanto essa sabedoria quanto essa vontade.

Diferente dos programas de bem-estar exclusivamente voltados para os pobres, a Renda Básica de Cidadania contém o compromisso, quando inteiramente implantada, de atacar a pobreza sem criar dependência, de garantir a todos a subsistência diária sem estigmatizar o pobre, sem criar uma armadilha que os exclui do mercado de trabalho. E contém ainda o compromisso de atingir maior justiça social promovendo maior liberdade real para todos.

No Brasil, mais do em qualquer outro país, isso não é apenas um sonho nas mentes de um punhado de ativistas e visionários. Está construído nos inúmeros esquemas de manutenção de renda integrados em outubro último no Programa Bolsa-Família, nas lutas sociais que os tornaram possíveis e na experiência administrativa que eles geraram.

A Renda de Cidadania procurará atingir diversos objetivos ao mesmo tempo, como diversos outros programas já o fizeram. Ela não é apenas um modo de atacar da forma mais direta a pobreza e a desigualdade. Elevará o capital humano ao estimular a freqüência à escola, ao expandir os cuidados com a saúde pública e ao encorajar a alfabetização dos adultos. Contribuirá para a distribuição mais equilibrada da população do Brasil em seu território, diminuindo o êxodo rural para as cidades superpopulosas.

Efetiva e mais visivelmente do que todos os esquemas anteriores, a Renda de Cidadania será também um símbolo de solidariedade da nação brasileira inserida na economia global. Devido aos seus recursos e à sua posição no mundo, o Brasil tem um imenso potencial para se beneficiar de uma globalização justa, por meio de um aumento massivo daquilo que pode vender no mercado mundial, atraindo investimentos diretos estrangeiros e também através de muitos outros efeitos multiplicadores. Mas nenhum mecanismo de mercado espontâneo irá garantir que esses benefícios atingirão todos os setores e todas as regiões do país. Alguns estão mesmo fadados a sofrer. Neste contexto, uma renda de cidadania pode ser vista como um dividendo federal. É uma maneira de distribuir para todos os brasileiros, como uma retribuição por um esforço aceito por todos, os ganhos de participação em uma economia globalizada que, de outra forma, tenderia a ser monopolizada por alguns setores e por algumas regiões.

Uma renda de cidadania completa não pode ser instituída em um dia. A sábia forma de implementá-la por etapas a partir de 2005 terá de ser desenhada de forma inteligente. Condições relacionadas à renda ainda serão necessárias, mas terão de tomar a forma de regras simples e de procedimentos transparentes, fáceis de explicar e de implementar, de maneira a alcançar efetivamente a maior parte dos beneficiários e firmemente desencorajar as práticas clientelistas que desacreditariam o esquema.

Desde o começo deverá ser dada atenção especial à harmoniosa articulação com os sistemas de seguridade relacionados ao emprego formal e com os sistemas de isenção incorporados ao mecanismo de imposto de renda. Quanto mais cedo, mais aprofundado e de maneira inteligente os vários esquemas forem integrados, menor será o risco de a Renda de Cidadania ficar para sempre presa a um vasto programa direcionado aos pobres, com todos os riscos de dependência e, finalmente, de reações políticas que isso implica.

Para muitos países haverá tanto que aprender com o caminho que o Brasil segue agora, gradualmente, de forma ousada, mas responsável, em direção a um esquema completo da Renda Básica de Cidadania. O que será tentado e alcançado aqui, pode ser uma fonte de inspiração e encorajamento para muitas pessoas e organizações que lutam por mudanças corajosas desse padrão em torno do mundo, mais destacadamente hoje na República Federal da África do Sul. Como o renomado economista Celso Furtado colocou em mensagem que enviou ao Presidente Lula nesta ocasião, embora o Brasil tenha sido - vergonhosamente - um dos últimos países a abolir a escravatura, pode esperar agora ser lembrado - orgulhosamente - como o primeiro país a introduzir um amplo sistema de solidariedade.

Hoje está sendo dado um passo importante. Mas não é, de forma alguma, o fim da estrada. Pensar de forma criativa a longo prazo, refletir a curto prazo com as instituições do lugar, realizar avaliações objetivas dos esquemas existentes e de novas experiências, a liderança firme que combina a prudência com a responsabilidade, e pela ambição que é necessária para haver esperança, tudo isso permanecerá necessário no futuro, como tem sido crucial no passado, para nos levar tão longe quanto nós agora estamos.

O objetivo final é fazer a vida menos dura para as pessoas para quem ela tem sido inaceitavelmente difícil. É prover opções às pessoas que não têm opção. É assegurar que a riqueza seja distribuída de maneira menos injusta em toda a sociedade. Mas isso não é criar uma sociedade de pessoas passivas, aguardando ser alimentadas pelo governo. Uma renda de cidadania, enfaticamente, não é uma alternativa de acesso ao emprego. Ao contrário, é um meio de permitir às pessoas realizar as coisas para si próprias e para a sociedade, já que presentemente elas não estão podendo realizar por causa da pobreza e da exclusão. É um meio de fortalecer os recursos humanos que presentemente são desperdiçados, como resultado da injustiça e da miséria. É um novo movimento maior para servir tanto a uma economia mais próspera quanto a uma sociedade mais justa.

Em nome de todos que em torno do mundo acreditam na justiça social, meus cordiais agradecimentos ao Presidente Lula, ao Senador Eduardo Suplicy, a todos que contribuíram para que isso se torne alcançável, meus sinceros agradecimentos pela imaginação, pela esperança, pela vontade e sabedoria que transformarão a esperança em realidade.

Requeiro, Sr. Presidente, que sejam também colocados como parte de meu pronunciamento o próprio discurso do Presidente Lula na oportunidade, bem como o outro pronunciamento do Professor Philippe Van Parijs, que será publicado na BIEN News Flash, o Boletim da Rede Européia de Renda Básica, e assim cumpro o meu compromisso.

Muito obrigado, Sr. Presidente.

 

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DOCUMENTOS A QUE SE REFERE O SR. SENADOR EDUARDO SUPLICY EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inseridos nos termos do art. 210, inciso I e o § 2º, do Regimento Interno.)

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/01/2004 - Página 1652