Discurso durante a 10ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Relatório do grupo interministerial destinado a analisar a aplicação do biodiesel no Brasil.

Autor
Sibá Machado (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Sebastião Machado Oliveira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ENERGETICA.:
  • Relatório do grupo interministerial destinado a analisar a aplicação do biodiesel no Brasil.
Publicação
Publicação no DSF de 31/01/2004 - Página 2077
Assunto
Outros > POLITICA ENERGETICA.
Indexação
  • COMENTARIO, RELATORIO, GRUPO DE TRABALHO INTERMINISTERIAL, APLICAÇÃO, Biodiesel, BRASIL, FONTE ALTERNATIVA DE ENERGIA, ORIGEM, OLEO VEGETAL, REGISTRO, DADOS, PRODUÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, DETALHAMENTO, PESQUISA CIENTIFICA E TECNOLOGICA, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO (USP), UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO (UFRJ), UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARA (UFC), UNIVERSIDADE DE BRASILIA (UNB), CENTRO DE PESQUISA, ESTADO DO PARANA (PR).
  • DEFESA, APOIO, BIOTECNOLOGIA, OLEO DIESEL, PROMOÇÃO, EMPREGO, RENDA, DESENVOLVIMENTO REGIONAL, REDUÇÃO, IMPORTAÇÃO, PETROLEO, MELHORIA, POLUIÇÃO, ATMOSFERA, CONTROLE, ALTERAÇÃO, CLIMA, POSSIBILIDADE, CULTIVO, PLANTAS OLEAGINOSAS, ASSENTAMENTO RURAL, REFORMA AGRARIA, REGIÃO SEMI ARIDA, REGIÃO, DESMATAMENTO, IMPORTANCIA, APROVEITAMENTO, RESIDUO, OLEO COMESTIVEL, ESGOTO.
  • IMPORTANCIA, DADOS, CORRELAÇÃO, INVESTIMENTO, CRIAÇÃO, EMPREGO.
  • DETALHAMENTO, SUGESTÃO, ESTUDO, IMPLEMENTAÇÃO, PROCESSO, Biodiesel, ATENÇÃO, DESENVOLVIMENTO REGIONAL, ECONOMIA FAMILIAR, AUTORIZAÇÃO, UTILIZAÇÃO, MODELO, TRIBUTAÇÃO, REGULAMENTAÇÃO, QUALIDADE, ACOMPANHAMENTO.

O SR. SIBÁ MACHADO (Bloco/PT - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Nobre Senador Valdir Raupp, Presidente desta sessão, Senador do Estado de Rondônia, ouvi atentamente o pronunciamento de V. Exª a respeito das preocupações geradas pela crise da Parmalat e, principalmente, pela situação que passa a agricultura do Estado de Rondônia e do Brasil.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, li o relatório final do Grupo de Trabalho Interministerial do Governo Federal, que recomendou uma pesquisa, um estudo sobre a aplicação do biodiesel no Brasil, e gostaria de me pronunciar sobre alguns de seus trechos. Esse grupo interministerial foi integrado por 12 Ministérios, Agricultura, Pecuária e Abastecimento; Minas e Energia; Fazenda; Ciência e Tecnologia; Meio Ambiente; Desenvolvimento Agrário e outros.

No cenário mundial, vale ressaltar que apesar de ser recente, no Brasil, o forte interesse pelo domínio dessa tecnologia, muitos já a incorporaram como política pública estratégica de seus países. Por exemplo, a Comunidade Européia implementa, atualmente, a maior experiência internacional na produção e uso de combustíveis renováveis. Na União Européia, o biodiesel recebe incentivo à produção e ao consumo por meio de desgravação tributária e regulamentações e metas importantes na área de meio ambiente. Em 2005, 2% dos combustíveis consumidos terão de ser renováveis e, em 2010, 5,75%.

Na Alemanha, responsável por 56% da produção européia de biocombustíveis, há cerca de 1.400 postos (dados de 2002) de abastecimentos de veículos fornecendo biodiesel puro (B100). O total produzido na Europa ultrapassa, atualmente, um bilhão de litros por ano, tendo crescido à taxa anual de 30% entre 1998 e 2002.

Além dos principais países produtores - Alemanha, França e Itália, nessa ordem -, outros países da União Européia, inclusive por orientação do parlamento europeu, já desenvolvem ações visando estimular o uso do biodiesel.

Nos Estados Unidos, não há desgravação tributária e a produção ainda é incipiente (cerca de cem mil toneladas de biodiesel por ano; se a equivalência for de um quilo para um litro, são mais ou menos cem mil litros). Mas há planos e iniciativas para a diversificação da sua matriz energética, como o uso do biodiesel em larga escala. Atualmente, o biodiesel está sendo usado em frotas de ônibus urbanos, serviços postais e órgãos do governo, e é considerado diesel premium - o nome dado nos Estados Unidos -, para motores utilizados na mineração subterrânea e embarcações. Em Minnesota, está tramitando projeto de lei que estabelece a mistura imediata de 2%, que passará para 5% nos próximos cinco anos.

Na Malásia, está sendo implementado programa para a produção de biodiesel. A primeira fábrica deve entrar em operação em 2004, com capacidade de produção de 500 mil toneladas anuais. A extração possível de vitaminas A e E permitirá reduzir os custos.

Na Argentina, o biodiesel é estimulado desde 2001, quando foi criado o Plano de Competitividade para o Combustível Biodiesel, propiciando a desoneração tributária por dez anos.

Estudos realizados indicam que as motivações principais desses países ocorreram a partir dos anos 90, com a consolidação do conceito de desenvolvimento sustentável e a preocupação com o efeito estufa, com as guerras no Oriente Médio, que afetam diretamente alguns dos principais países produtores de petróleo, e com as questões estratégicas ligadas ao longo período de formação dos combustíveis de origem fóssil e sua característica finita, exigindo desses países o desenvolvimento de estratégias e rotas diferentes para o seu desenvolvimento.

O Brasil também detém considerável experiência acumulada na área do biodiesel, mas, ao contrário de países considerados desenvolvidos, ela ainda se encontra em franco descompasso com nossa capacidade produtiva de biomassa, pois dispomos de condições de solo e clima privilegiados para a produção de diversas matérias-primas suscetíveis de aproveitamento para a fabricação desse combustível.

A experiência nacional envolve diversas matérias-primas, como a soja, a mamona, o amendoim, o dendê, o babaçu, além de outros, e várias rotas tecnológicas, como a transesterificação metílica e etílica e o craqueamento térmico, entre outras. São experiências já vividas pela Embrapa e a Universidade de São Paulo, a USP.

Quanto à diversificação das rotas tecnológicas, devemos fazer uma primeira observação sobre o que entendemos do biodiesel, aproveitando a experiência mundial.

Na Europa, o biodiesel faz parte de um programa maior de biocombustível, podendo ser todo o combustível produzido a partir da biomassa. Lá, consideram especificamente como biodiesel apenas o éster metílico produzido a partir de óleos vegetais ou animais, com qualidade de combustível para motores diesel, para utilização como biocombustível.

Na viagem à Alemanha, visitei a fábrica da Caterpillar, cuja gerência-geral afirmou que o uso do biodiesel para ela não é mais problema. Todos os motores Caterpillar estão autorizados e disponíveis para o uso desse combustível.

No Brasil, a Agência Nacional do Petróleo, ANP, define o biodiesel como sendo um combustível composto de monoalquilésteres de ácidos graxos de cadeia longa derivados de óleos vegetais ou de gorduras animais e designado como B100. No relatório do GTI, foi considerado biodiesel todo combustível obtido de biomassa que possa substituir parcial ou totalmente o óleo diesel de origem fóssil em motores ciclodiesel, automotivos e estacionários. Essa definição é relevante para evitar a discriminação de qualquer rota tecnológica para a obtenção desse combustível de fonte vegetal ou animal, o que permite incluir, além do próprio óleo in natura, o obtido por transesterificação etílica ou metílica, por craqueamento ou ainda por transformação em líquido de gases obtidos de biomassa.

O caminho adotado pelo Governo brasileiro de não limitar as rotas tecnológicas para o desenvolvimento de combustíveis à base de biomassa evitará que esse importante programa seja dominado por setores exclusivos da produção, perdendo, assim, o papel inovador, como o forte componente de inclusão social que a produção do biodiesel poderá representar para o Brasil.

Quanto às principais experiências e pesquisas no Brasil, o caminho está baseado nas diversas experiências e pesquisas já em curso em todo o País.

A Coordenação dos Programas de Pós-Graduação de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro, COPPE/UFRJ, em parceria com o Instituto Virtual Internacional de Mudanças Globais, IVIG, desenvolve um projeto de extração de biodiesel de óleo usado de frituras que vem sendo testado desde 2001 num caminhão furgão, com o biodiesel B100 (100% biodiesel), com ótimo resultado, embora ainda não homologado. O caminhão já percorreu 300 mil quilômetros sem apresentar nenhum tipo de defeito.

Em outro projeto da mesma entidade, três caminhões de coleta de lixo estão sendo monitorados com o uso do B5 (5% de biodiesel), visando homologar e certificar os testes. Um terceiro projeto visa extrair biodiesel de resíduos gordurosos de esgoto para a realização de testes de desempenho, consumo e emissões, havendo ainda o Projeto Riobiodiesel, que consiste na implantação do ciclo completo de produção, industrialização e consumo do biodiesel para emprego de B5 em ônibus, barcas, geradores, frotas experimentais públicas e privadas, usando como matéria-prima refugo industrial de óleos vegetais, girassol e nabo forrageiro.

No Laboratório de Desenvolvimento de Tecnologias Limpas (Ladetel) da Universidade de São Paulo, campus de Ribeirão Preto, também são realizados testes, pesquisas, na área do biodiesel, tendo sido dominada tecnologia própria de produção de ésteres etílicos com sensível redução do tempo de produção relativamente às tecnologias existentes.

A Universidade Federal do Ceará vem desenvolvendo, há anos, linha de pesquisa científica e tecnológica para produção e utilização de biodiesel a partir da mamona, tendo obtido, no ano passado, proteção para a propriedade intelectual oriunda do projeto. Outra iniciativa mais recente vem sendo utilizada pela Universidade Federal do Maranhão, cujo escopo é viabilizar a utilização do óleo de babaçu para a produção de biodiesel a partir da estruturação de arranjos produtivos locais - o nosso coco.

O Instituto de Tecnologia do Paraná (Tecpar) é sede do Centro de Referência de Biocombustível (Cerbio). Destaca-se, entre seus resultados, teste de campo com vinte ônibus e com um veículo de passeio com aproximadamente 80.000 quilômetros rodados com a mistura B20 - 20% de biodiesel. Testes realizados nos Estados do Paraná e de Mato Grosso também resultam dessa iniciativa.

Na área de produção comercial, destaca-se a experiência de mais de oito anos do Grupo Soyminas, do Grupo Biobrás, que já possui unidades em operação em Cássia, Minas Gerais, Campinas, São Paulo, e Chapadão do Céu, Goiás, devendo inaugurar, nos próximos meses, outra fábrica em Rolândia, Paraná. A capacidade diária de produção dessas unidades é da ordem de 10 mil litros. O produto é comercializado como éster-etílico, tendo em vista que o biodiesel ainda não é um combustível homologado. A tecnologia desenvolvida pela Soyminas poderá ser utilizada na implantação de unidades industriais em Portugal, África do Sul e Uberlândia, Minas Gerais.

Na Embrapa/UnB, em Brasília, também em fase experimental, há produção de biodiesel por outra rota tecnológica, o processo de craqueamento.

No meu Estado, já fundamos o núcleo de Produção de Biomassa, que terá como um dos primeiros trabalhos o desenvolvimento de biodiesel a partir da capacidade de produção de óleos do sistema produtivo agroflorestal. Lá, queremos fazer uma mistura de óleos: a floresta nativa com a agricultura.

Grande parte da potencialidade do biodiesel reside no fato de as plantas industriais terem ampla flexibilidade em termos de tamanho e de matérias-primas empregadas, com pequena ou nenhuma necessidade de modificação, possibilitando, desse modo, que a produção desse combustível renovável se adapte às peculiaridades regionais do País e que se implante um programa não excludente.

Sob os pontos de vista social e regional, a produção de biodiesel promove a inclusão social pela geração de emprego e renda, tendo em vista que, embora com rendimentos variáveis, o biodiesel pode ser obtido a partir de diversas matérias-primas de origem vegetal e animal, disponíveis ou passíveis de produção nas diferentes regiões do Brasil.

Isso também contribui para a inclusão social ao permitir o suprimento de energia elétrica para comunidades isoladas ainda não atendidas, mediante o uso do biodiesel em motores estacionários, o que também pode ser feito com o emprego do óleo vegetal in natura em motores devidamente adaptados a essa finalidade.

No aspecto econômico, inclui-se, como potencialidades do biodiesel, a redução das importações de petróleo e óleo diesel - um ponto extremamente importante, pois é um plano geopolítico para o Brasil tornar-se cem por cento independente das exportações de combustíveis -, que, em 2002, representaram 25% do consumo de diesel, sendo 17% de óleo diesel acabado e 8% de diesel produzido a partir do petróleo importado. Isso reflete positivamente na diversificação da matriz energética brasileira, na redução do dispêndio de divisas, na auto-suficiência, na questão geopolítica (interesses e conflitos relacionados ao petróleo), bem como no adensamento de várias cadeias de agronegócio, com possibilidades de participação de segmentos produtivos de portes diferenciados, incluindo agricultores familiares como produtores de matérias-primas, de óleos vegetais e de biodiesel.

Dentre as questões ambientais, cabe destacar a significativa diminuição das emissões de diversos poluentes, especificamente os monóxidos de carbono, hidrocarbonetos totais, material particulado e enxofre. Além disso, o uso do biodiesel reduz sensivelmente a emissão de gases causadores do efeito estufa. Embora haja ligeiro aumento na emissão de óxido de nitrogênio - cujas conseqüências sobre a qualidade do ar nas grandes metrópoles podem ser contornadas com a adoção de medidas específicas -, os efeitos líquidos sobre a redução global da pressão sobre o meio ambiente são altamente favoráveis ao biodiesel, especialmente quando se considera todo o ciclo de vida do produto, abrangendo desde a produção das sementes, cultivo, colheita, transporte, armazenamento, processamento e consumo.

Outro impacto positivo sobre o meio ambiente advém da possibilidade de se cultivarem algumas espécies oleaginosas, especialmente o dendê, em áreas degradadas da Região Norte do País, onde existem condições de solo e clima favoráveis a essa cultura. No Arco do Desmatamento, pode ser feito um programa de reforma agrária, baseado no projeto de assentamento florestal, para esses cultivos. A mamona e outras matérias-primas podem desempenhar idêntico papel em outras regiões, especialmente no semi-árido nordestino. Cabe registrar também que a possibilidade de produzir biodiesel com resíduos gordurosos de frituras e esgoto tende a diminuir o despejo de material graxo no meio ambiente.

Sobre os desafios, se considerarmos que o País já tem suficiente domínio sobre o processo de produção de biodiesel por meio de rotas tecnológicas alternativas, abrangendo principalmente a transesterificação etílica, mas com avanços importantes também em outras rotas, como a transesterificação metílica e o craqueamento térmico, envolvendo diversas matérias-primas de origem vegetal, animal e mesmo resíduos, portanto, mais que um desafio tecnológico, o que de fato se apresenta como objetivo a ser alcançado em curto prazo é fortalecer e disseminar essas experiências, levando em conta a variada gama de alternativas existentes no País.

De qualquer forma, devem-se continuar aprimorando os testes de produção e uso desse combustível renovável e estabelecer padrões de qualidades adequados aos seus vários usos. Sob esse enfoque, enfatiza-se a necessidade de realizar testes com o biodiesel puro (B100), de forma a solucionar todas as eventuais dúvidas que se possam ter quanto a seu uso.

Em relação à inclusão social, os estudos conjuntos desenvolvidos pelos Ministérios do Desenvolvimento Agrário, da Agricultura, da Integração Nacional e das Cidades permitem simular que, a cada 1% de participação da agricultura familiar no mercado de biodiesel no País, na hipótese de utilização de um percentual de mistura de 5% de biodiesel no óleo diesel em todo o território nacional, seria possível gerar cerca de 45 mil empregos no campo, a um custo médio de aproximadamente R$4,9 mil por emprego. Esse, Sr. Presidente, é “o pulo do gato” do estudo.

Tomando-se como média a possibilidade de se criarem três empregos na cidade para cada emprego no campo, a mencionada participação de um ponto percentual da agricultura familiar no mercado de B5 permitiria geração de aproximadamente 180 mil empregos diretos e indiretos na cidade.

Fazendo-se uma estimativa preliminar, com base nos indicadores acima citados, a participação de apenas 6% da agricultura familiar no mercado do biodiesel (B5) possibilitaria a geração de aproximadamente um milhão de empregos, dos quais 270 mil no campo e 810 mil na indústria, no comércio e na distribuição, a um custo de R$4,9 mil por emprego.

Lembro que, quando a Ford brigou com o então Governador do Rio Grande do Sul Olívio Dutra, hoje Ministro, o custo era de R$300 mil para cada emprego que a Ford gerava. Assim também quero ficar rico. Adoraria se me pagassem isso para eu montar uma empresa.

Portanto, nesse caso, o Governo investiria R$4,9 mil e geraria um emprego no campo e três na cidade.

Apenas para efeito comparativo, se essa participação fosse integralmente apropriada exclusivamente pelo agronegócio da soja, seriam gerados, segundo os mesmos estudos, apenas cerca de 46 mil postos de trabalho, a um custo médio de R$80 mil por emprego. É a mecanização. V. Exª dizia ainda há pouco que, se colocarmos tecnologia pesada na produção de cana, tiraremos 112 oportunidades de trabalho por causa da máquina empregada. No entanto, ao colocar mão-de-obra humana no campo em contato com os efeitos de um trabalho degradante, temos de escolher entre tirar o trabalhador dessas condições e não ter onde colocá-lo.

Sr. Presidente, como já extrapolei bastante o meu tempo, vou ser mais sucinto.

Em relação à renda na agricultura familiar, verifica-se que, a cada 1% de participação desse segmento agrícola no mercado de biodiesel, seriam necessários recursos da ordem de R$220 milhões por ano (média de custeio e investimento), os quais proporcionariam um acréscimo de renda bruta anual, ou seja uma devolução para os cofres, ao redor de R$470 milhões, mostrando, portanto, que a cada R$1,00 aplicado na agricultura familiar seriam gerados R$2,13 adicionais na renda bruta anual, permitindo que a renda média por família no mínimo dobrasse de valor com a medida.

Em relação aos aspectos econômicos, estudos indicam que o biodiesel puro (B100), isento de tributos federais (Cide e PIS/Cofins) e estadual (ICMS), apresenta os seguintes custos por litro: R$0,902 (soja); R$0,645 (girassol), R$0,761 (mamona) e R$0,494 (dendê). Portanto, o dendê supera a soja em todos os níveis, seja na captação de CO², seja na produtividade diária - 400 Kg por hectare de soja e seis toneladas de dendê. A árvore do dendê tem uma grande capacidade de cobertura, de sombra permanente, e chega a 15 anos, 20 anos.

Na Amazônia, teremos, então, algo assim. No Nordeste, o uso da mamona, que é um vegetal de conhecimento do agricultor, precisa de pequenas inovações e tem alta resistência às condições climáticas daquela região.

Então, Sr. Presidente, seguirei adiante, mas eu gostaria de considerar como lido todo o conteúdo, porque está muito longo, e falar das pequenas recomendações feitas no estudo.

Uma delas é que se adote a inclusão social para o desenvolvimento regional nesses processos.

A segunda, que se autorize oficialmente o uso de biodiesel no Brasil, inicialmente com o B5, que já daria para se ir aprimorando como seria sonhar com a possibilidade de 1 milhão de hectares de mamona no Nordeste; em seguida, podemos pensar em um blend entre as oleaginosas nativas da Amazônia com a nossa agricultura e as produzidas no Centro-Oeste, Sudeste e Sul do País, porque a soja, é claro, está com marca registrada nessas regiões.

A terceira é inserir de forma sustentável a agricultura familiar como membro desse processo econômico. Estamos chamando de K= P1+P2+C, onde K é o capital; P1, o Poder Público; P2, o privado; e C, o capital comunitário.

Uma outra é definir o modelo tributário a ser aplicado na comercialização do biodiesel.

Também estabelecer normas, regulamentos e padrões de qualidade desse biodiesel.

E, por último, criar uma comissão interministerial permanente, encarregada de acompanhar a implementação das diretrizes e políticas públicas que viessem a ser definidas pelo Governo Federal.

Para encerrar, Sr. Presidente, quero dizer que sou um entusiasta dessa medida, ao mesmo tempo em que me irmano a esse movimento.

Ontem, eu fazia um estudo dos mapas do desenvolvimento de energia elétrica na região e observei que os gasodutos de Urucum a Porto Velho, de Urucum a Manaus, o linhão Belo Monte/Tucuruí a Manaus e o linhão de Porto Velho a Mato Grosso interligariam o País. Entretanto, Acre, Roraima e Amapá estão completamente fora da produção. Por isso, perderemos o nosso ICMS, uma vez que as chamadas isoladas deixam de produzir, levando-nos a abdicar desse benefício. E, da mesma forma, o Estado de Roraima. Nesse quadro, passaremos a ser meros compradores de energia.

Defendo que essa matéria seja uma espécie de trabalho muito importante do Governo para que o Estado do Acre também seja gerador de energia, a partir de sua capacidade encontrada na biomassa, servindo para qualquer Estado que não disponha de força hidráulica, de minério fóssil, como é o caso do petróleo, e de outras fontes, como é o caso de Rondônia e outros Estados.

Quero dizer a V. Exª que desejo fazer parte do debate sobre o setor energético brasileiro, pedindo mais atenção a esse tipo de programa.

Fazendo justiça a um dos baluartes desse debate no Senado, menciono o Senador Alberto Silva, do Piauí. S. Exª está fazendo um esforço tremendo para que seja inaugurada no Piauí uma planta de produção de biodiesel.

Obrigado, Sr. Presidente.

 

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SEGUE, NA ÍNTEGRA, DISCURSO DO SR. SENADOR SIBÁ MACHADO.

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O SR. SIBÁ MACHADO (Bloco/PT - AC. Sem apanhamento taquigráfico.) -

DISCURSO SOBRE RECOMENDAÇÕES DO GTI SOBRE BIODIESEL.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, no ano passado o Presidente Lula instituiu o Grupo de Trabalho Interministerial com o objetivo de apresentar estudos sobre a viabilidade de utilização de óleo vegetal - biodiesel como fonte alternativa de energia .

O Grupo de trabalho foi composto por 12 Ministérios entre eles:

·     Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA);

·     Ministério de Minas e Energia (MME);

·     Ministério da Fazenda (MF);

·     Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT);

·     Ministério do Meio Ambiente (MMA);

·     Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA)

            O Cenário Mundial

Vale ressaltar que apesar de ser recente no Brasil o forte interesse pelo domínio desta tecnologia, muitos já incorporaram como política pública estratégica de seus paises.

Por exemplo, a Comunidade Européia, implementa atualmente, a maior experiência internacional na produção e uso de combustíveis renováveis. Na União Européia o biodiesel recebe incentivo à produção e ao consumo através de desgravação tributária e regulamentações e metas importantes na área de meio ambiente. Em 2005, 2% dos combustíveis consumidos terão de ser renováveis e, em 2010, 5,75%.

Na Alemanha, responsável por 56% da produção européia de biocombustíveis, há cerca de 1.400 postos (dados de 2002) de abastecimento de biodiesel puro (B100). O total produzido na Europa ultrapassa, atualmente, 1 bilhão de litros por ano, tendo crescido à taxa anual de 30% entre 1998 e 2002.

Além dos principais países produtores - Alemanha, França e Itália, nessa ordem -, outros países da União Européia, inclusive por orientação do Parlamento Europeu, já desenvolvem ações visando estimular o uso do biodiesel.

Nos EUA, não há desgravação tributária e a produção ainda é incipiente (cerca de 100 mil toneladas de biodiesel por ano), mas há planos e iniciativas para diversificação de sua matriz energética com o biodiesel. Atualmente, o biodiesel está sendo usado em frotas de ônibus urbanos, serviços postais e órgãos do governo e é considerado diesel premium para motores utilizados na mineração subterrânea e embarcações. Em Minnesota está tramitando projeto de lei que estabelece a mistura imediata de 2%, a qual passará para 5% nos próximos cinco anos.

Na Malásia está sendo implementado programa para a produção de biodiesel. A primeira fábrica deve entrar em operação em 2004, com capacidade de produção de 500 mil toneladas anuais. A extração possível de vitaminas A e E permitirá reduzir os custos.

Na Argentina, o biodiesel é estimulado desde 2001, que cria o “Plano de Competitividade para o Combustível Biodiesel”, propiciando a desoneração tributária por 10 anos.

Estudos realizados indicam que as motivações principais destes países ocorreram a partir dos anos de 1990 com a consolidação do conceito de desenvolvimento sustentável e a preocupação com o efeito estufa, as guerras no Oriente Médio, afetando diretamente alguns dos principais países produtores de petróleo, e as questões estratégicas ligadas ao longo período de formação dos combustíveis de origem fóssil e da sua característica finita, exigindo destes países o desenvolvimento de estratégicas e rotas diferentes para seu o desenvolvimento.

O Brasil também detém considerável experiência acumulada na área do biodiesel, mas, ao contrário de países considerados desenvolvidos, ela ainda se encontra em franco descompasso com nossa capacidade produtiva de biomassa, pois dispomos de condições de solo e clima privilegiados para a produção de diversas matérias-primas suscetíveis de aproveitamento para fabricação de biodiesel.

Diante disso, a experiência nacional envolve diversas matérias-primas (soja, mamona, amendoim, dendê, babaçu, etc) e várias rotas tecnológicas (transesterificação metílica e etílica e craqueamento térmico , dentre outras).

            Diversificar as Rotas Tecnológicas

Aqui devemos fazer uma primeira observação em relação ao que entendemos sobre biodiesel e aproveitando a experiência mundial.

Por exemplo, na Europa o biodiesel faz parte de um programa maior de biocombustível. Podendo ser todo o combustível produzido a partir da biomassa. Consideram especificamente, como biodiesel ainda apenas, o éster metílico produzido a partir de óleos vegetais ou animais, com qualidade de combustível para motores diesel, para utilização como biocombustível.

No Brasil, a Agência Nacional do Petróleo (ANP), define biodiesel como sendo um combustível composto de mono-alquilésteres de ácidos graxos de cadeia longa, derivados de óleos vegetais ou de gorduras animais e designado B100. No relatório do GTI foi considerado biodiesel todo combustível obtido de biomassa que possa substituir parcial ou totalmente o óleo diesel de origem fóssil em motores ciclodiesel, automotivos e estacionários. Esta definição é relevante para evitar a discriminação de qualquer rota tecnológica para a obtenção desse combustível de fonte vegetal ou animal, o que permite incluir, além do próprio óleo in natura, o obtido por transesterificação etílica ou metílica, por craqueamento, ou ainda por transformação, em líquido, de gases obtidos de biomassa.

Este importante caminho adotado pelo governo brasileiro de não limitar as rotas tecnológicas para o desenvolvimento de combustíveis a base de biomassa como citado acima evitará que este importante programa não seja dominado por setores exclusivos da produção e assim perdendo o papel inovador com o forte componente de inclusão social que a produção do biodiesel poderá representar para o Brasil.

            As principais experiências e pesquisas do País

Este caminho também esta baseado nas diversas experiências e pesquisas já em curso no país.

A Coordenação dos Programas de Pós-graduação de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro - COPPE/UFRJ, em parceria com o Instituto Virtual Internacional de Mudanças Globais - IVIG, desenvolve um projeto de extração de biodiesel de óleo usado de frituras, que vem sendo testado desde 2001 em um furgão, com B100 (100% biodiesel), com ótimo resultado (300 mil km rodados sem defeitos), embora ainda não homologado.

Em outro projeto da mesma entidade, três caminhões de coleta de lixo estão sendo monitorados com o uso de B5 (5% de biodiesel), visando homologar e certificar os testes. Um terceiro projeto visa extrair biodiesel de resíduos gordurosos de esgoto para a realização de testes de desempenho, consumo e emissões, havendo ainda o Projeto Riobiodiesel, que consiste na implantação de ciclo completo de produção, industrialização e consumo do biodiesel para emprego de B5 em ônibus, barcas, geradores, frotas experimentais públicas e privadas, usando como matérias-primas refugo industrial de óleos vegetais, girassol e nabo forrageiro.

No Laboratório de Desenvolvimento de Tecnologias Limpas (LADETEL) da Universidade de São Paulo, Campus de Ribeirão Preto, também são realizados testes, pesquisas, na área do biodiesel, tendo sido dominada tecnologia própria de produção de ésteres etílicos com sensível redução do tempo de produção, relativamente às tecnologias existentes.

A Universidade Federal do Ceará vem desenvolvendo, há anos, linha de pesquisa científica e tecnológica para produção e utilização de biodiesel a partir da mamona, tendo obtido, no passado, proteção sobre a propriedade intelectual oriunda do projeto. Outra iniciativa mais recente vem sendo realizada pela Universidade Federal do Maranhão, cujo escopo é viabilizar a utilização do óleo de babaçu para produção de biodiesel a partir da estruturação de arranjos produtivos locais.

O Instituto de Tecnologia do Paraná (Tecpar), é sede do Centro de Referência em Biocombustíveis (Cerbio). Destacam-se, entre seus resultados, teste de campo com 20 ônibus e um veículo de passeio, com aproximadamente 80.000 quilômetros rodados com a mistura B20. Testes realizados nos Estados do Paraná e Mato Grosso também resultam dessa iniciativa.

Na área de produção comercial, destaca-se a experiência de mais de oito anos do Grupo Soyminas, do Grupo Biobrás, que já possui unidades em operação em Cássia (MG), Campinas (SP) e Chapadão do Céu (GO), devendo inaugurar, nos próximos meses, outra fábrica em Rolândia (PR). A capacidade diária de produção dessas unidades é da ordem de 10 mil litros. O produto é comercializado como éster-etilíco tendo em vista que o biodiesel ainda não é um combustível homologado. A tecnologia desenvolvida pela Soyminas poderá ser utilizada na implantação de unidades industriais em Portugal, África do Sul e Uberlândia (MG).

Na Embrapa/UnB, em Brasília, também em fase experimental a produção de biodiesel por outra rota tecnológica através do processo de craqueamento.

No meu estado já fundamos o Núcleo de Produção de Biomassa onde terá como um dos primeiros trabalhos o desenvolvimento de Biodiesel a partir da capacidade produção de óleos do sistema produtivo agro-florestal.

            Potencialidades

Grande parte das potencialidades do biodiesel reside no fato de as plantas industriais terem ampla flexibilidade em termos de tamanho e de matérias-primas empregadas, com pequena ou nenhuma necessidade de modificação, possibilitando, deste modo, que a produção desse combustível renovável se adapte às peculiaridades regionais do País e que se implante um programa não excludente.

Sob os pontos de vista social e regional, a produção de biodiesel promove a inclusão social pela geração de emprego e renda, tendo em vista que, embora com rendimentos variáveis, o biodiesel pode ser obtido a partir de diversas matérias-primas de origem vegetal e animal, disponíveis ou passíveis de produção nas diferentes regiões do Brasil.

Isso também contribui para a inclusão social ao permitir o suprimento de energia elétrica para comunidades isoladas ainda não atendidas, mediante o uso do biodiesel em motores estacionários - o que também pode ser feito com o emprego do óleo vegetal in natura em motores devidamente adaptados a essa finalidade.

No aspecto econômico, incluem-se, como potencialidades do biodiesel, a redução das importações de petróleo e de óleo diesel - que, em 2002, representaram 25% do consumo de diesel, sendo 17% de óleo diesel acabado e 8% de diesel produzido a partir de petróleo importado -, refletindo-se positivamente na diversificação da matriz energética brasileira, na redução do dispêndio de divisas, na auto-suficiência, na questão geopolítica (interesses e conflitos relacionados ao petróleo), bem como no adensamento de várias cadeias de agronegócio, com possibilidades de participação de segmentos produtivos de portes diferenciados, incluindo agricultores familiares como produtores de matérias-primas, de óleos vegetais e de biodiesel.

Dentre as questões ambientais, cabe destacar a significativa diminuição das emissões de diversos poluentes, especialmente os monóxidos de carbono, hidrocarbonetos totais, material particulado e enxofre. Além disso, o uso do biodiesel reduz sensivelmente a emissão de gases causadores do efeito estufa. Embora haja ligeiro aumento na emissão de óxido de nitrogênio - cujas conseqüências sobre a qualidade do ar nas grandes metrópoles pode ser contornada com a adoção de medidas específicas -, os efeitos líquidos sobre a redução global da pressão sobre o meio ambiente são altamente favoráveis ao biodiesel, especialmente quando se considera todo o ciclo de vida do produto, abrangendo desde a produção das sementes, cultivo, colheita, transporte, armazenamento, processamento e consumo.

Outro impacto positivo sobre o meio ambiente advém da possibilidade de se cultivar algumas espécies oleaginosas, especialmente o dendê, em áreas degradadas da região Norte do País, onde existem condições de solo e clima favoráveis a essa cultura. A mamona e outras matérias-primas podem desempenhar idêntico papel em outras regiões, especialmente no Semi-Árido nordestino. Cabe registrar, também, que a possibilidade de produzir biodiesel com resíduos gordurosos de frituras e esgoto tende a diminuir o despejo de material graxo no meio ambiente.

Deve-se considerar, ainda, que o biodiesel sendo utilizado como aditivo ao diesel de origem fóssil melhora sua lubricidade. Além disso, facilita o atendimento de compromissos firmados no âmbito da Convenção do Clima e pode proporcionar a obtenção de créditos de carbono, sob o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) do Protocolo de Kyoto, desde que seu uso ou mistura ao diesel não seja compulsório.

            Desafios

Se considerarmos que o País já tem suficiente domínio sobre o processo de produção de biodiesel por meio de rotas tecnológicas alternativas, abrangendo principalmente a transesterificação etílica, mas com avanços importantes também em outras rotas, como a transesterificação metílica e o craqueamento térmico, envolvendo diversas matérias-primas de origem vegetal, animal e mesmo resíduos, portanto, mais que um desafio tecnológico, o que de fato se apresenta como objetivo a ser alcançado em curto prazo é fortalecer e disseminar essas experiências, levando em conta a variada gama de alternativas existentes no País.Esta diversidade de alternativas de produção no país, por sinal, as quais não existem em outros países onde o biodiesel já é uma realidade.

De forma qualquer forma deve-se continuar aprimorando os testes de produção e uso desse combustível renovável e estabelecer padrões de qualidade adequados aos seus vários usos. Sob esse enfoque, enfatiza-se a necessidade de realizar testes com o biodiesel puro (B100), de forma a solucionar todas as eventuais dúvidas que se possa ter quanto ao seu uso.  

Outro ponto necessário ,relativamente simples, mas sobre o qual ainda não foram feitos estudos sistemáticos e conclusivos, refere-se ao período de armazenamento do biodiesel e à necessidade de uso de aditivos (antioxidantes) de modo a prolongar sua durabilidade.

No âmbito econômico, um dos principais desafios é a possível competição entre a destinação das matérias-primas empregadas (soja, mamona, dendê e outros) para a produção de óleo vegetal combustível ou óleos refinados para consumo alimentar, a saturação do mercado para a glicerina e os custos do biodiesel em relação ao diesel.

A saturação do mercado de subprodutos (ou co-produtos) associados ao processo de extração do óleo vegetal é outro entrave que pode ser superado desde que se analise e implemente a produção do biodiesel considerando toda a cadeia produtiva, da qual devem fazer parte novos usos para a glicerina e a expansão da produção, consumo e exportação de proteínas animais mediante a utilização da torta como ração.

            Em Relação à Inclusão Social

Os estudos conjuntos desenvolvidos pelos Ministérios do Desenvolvimento Agrário, da Agricultura, da Integração Nacional e das Cidades permitem simular que a cada 1% de participação da agricultura familiar no mercado de biodiesel no País, na hipótese de utilização de um percentual de mistura de 5% de biodiesel no óleo diesel em todo o território nacional, seria possível gerar cerca de 45 mil empregos no campo, a um custo médio de aproximadamente R$ 4.900,00 por emprego.

Tomando-se como média a possibilidade de se criar três empregos na cidade para cada emprego no campo, a mencionada participação de um ponto percentual da agricultura familiar no mercado de B5 permitiria a geração de aproximadamente 180 mil empregos diretos e indiretos. Num cenário realista em que se destaca a importância regional da agricultura familiar, considera-se inteiramente viável a participação dos agricultores familiares no atendimento de parcela expressiva da demanda de biodiesel.

Fazendo-se uma estimativa preliminar, com base nos indicadores acima citados, a participação de apenas 6% da agricultura familiar no mercado do biodiesel (B5) possibilitaria a geração de aproximadamente 1 milhão de empregos, dos quais 270 mil no campo e 810 mil na indústria, comércio e distribuição.

Apenas para efeito comparativo, se essa participação fosse integralmente apropriada exclusivamente pelo agronegócio da soja, seriam gerados, segundo os mesmos estudos, apenas cerca de 46 mil postos de trabalho, a um custo médio da ordem de R$ 80 mil por emprego.Portanto não podemos deixar acontecer o mesmo erro cometido pelo Proálcool onde a exclusão social predominou.

Em relação a renda na agricultura familiar, verifica-se que a cada 1% de participação desse segmento agrícola no mercado de biodiesel, seriam necessários recursos da ordem de R$ 220 milhões por ano (média de custeio e investimento), os quais proporcionariam acréscimo de renda bruta anual ao redor de R$ 470 milhões, mostrando, portanto, que a cada R$ 1,00 aplicado na agricultura familiar, seriam gerados R$ 2,13 adicionais na renda bruta anual, permitindo que a renda média por família no mínimo dobrasse de valor com a medida.

Dessa forma, para que se disponha de números indicativos preliminares sobre os valores envolvidos, pode-se estimar que a participação de 6% dos agricultores familiares no mercado de biodiesel (B5) demandaria recursos anuais de aproximadamente R$ 1,32 bilhão, permitindo que a renda bruta adicional alcançasse cifra da ordem de R$ 2,82 bilhões por ano.

Comparando-se de forma global as possibilidades de criação de novos postos de trabalho na agricultura empresarial e na familiar, tem-se que, enquanto na primeira são necessários, dependendo da cultura e da tecnologia utilizada, cerca de 100 hectares para empregar um trabalhador, na agricultura familiar é preciso apenas 10 hectares, aproximadamente. Não obstante, a participação da agricultura empresarial, bem como de matérias-primas diversas na produção de biodiesel, deve ocorrer em regiões cujas realidades socioeconômica e climática assim o recomendarem.

Adicionalmente, não se deve ignorar outros desdobramentos favoráveis do biodiesel como forma de inclusão social, a exemplo de seu uso para geração de energia elétrica para comunidades ainda não atendidas, em diversas regiões do País, colocando-o, desse modo, como instrumento adicional para o alcance dos objetivos do Programa “Luz para Todos”.

            Em Relação aos Aspectos Econômicos

Em relação aos aspectos econômicos estudos indicam que o biodiesel puro (B100), isento de tributos federais (CIDE e PIS/COFINS) e estadual (ICMS), apresenta os seguintes custos por litro: R$ 0,902 (soja); R$ 0,645 (girassol); R$ 0,761 (mamona) e R$ 0,494 (dendê).

Tomando-se por base o preço ao consumidor de um litro de diesel mineral de R$ 1,397, a adição de 5% de biodiesel (B5) poderia levar a duas situações distintas: com e sem isenção tributária.

Se a tributação fosse cobrada integralmente na venda do B5, haveria um aumento nos preços de venda de 0,72%, se a matéria-prima utilizada fosse a soja, e de 0,21% se a oleaginosa fosse a mamona.

Usando-se girassol e dendê, haveria redução de 0,21% e 0,72%, respectivamente. Na situação inversa, se houvesse isenção tributária, os preços de venda poderiam diminuir em 2,29% (dendê); 1,79% (girassol); 1,36% (mamona) e em 0,86% se a oleaginosa empregada fosse a soja.

Em relação aos Aspectos Ambientais

Analisando-se apenas as emissões de gases de efeito estufa geradas pelo ciclo de vida do insumo, segundo estudos técnicos do Ministério do Meio Ambiente o uso do biodiesel metílico reduz a emissão de gases causadores do citado efeito em 95%. Quanto ao biodiesel etílico, os mesmos estudos indicam que a redução é de 96,2%, havendo, portanto, diferença pouco significativa (1,2%) entre os dois ésteres.

Embora seja um poluente local controlado, os hidrocarbonetos totais (HC) apresentam uma diversidade de compostos tóxicos que não são controlados individualmente. Dos 21 hidrocarbônicos tóxicos que provocam câncer e outros sérios efeitos à saúde, sete são metais e, portanto, não estão presentes no biodiesel.

Dos 14 compostos restantes, onze deles não controlados, foram avaliados pela Agência Americana de Meio Ambiente. O estudo conclui que a correlação entre as emissões totais de gases tóxicos do biodiesel em relação ao diesel convencional é estatisticamente mais significativa, podendo-se afirmar que o uso do biodiesel reduz em cerca de 16% a emissão total desses gases tóxicos, em relação ao diesel de petróleo.

Por outro lado, em relação ao diesel de origem fóssil, o uso do biodiesel aumenta em aproximadamente 10% as emissões de óxido de nitrogênio (NOx), o que não deve constituir obstáculo para seu uso devido às grandes vantagens em relação aos outros poluentes.

Ademais, há estudos em andamento visando reduzir a formação do NOx mediante o emprego de catalisadores adequados, a identificação da fonte ou propriedade que pode ser modificada para minimizar as emissões e a mudança do tempo de ignição do combustível, com a finalidade de alterar as condições de pressão e temperatura de modo a proporcionar menor formação de óxido de nitrogênio.

Cabe destacar, todavia, que o ajuste na regulagem dos motores e a instalação de catalisadores são operações simples durante o processo de produção de veículos novos, mas se revestem de considerável complexidade e de difícil mensuração de resultados quando se trata da frota de veículos em circulação, com número variado de modelos e anos de uso.

Ao reduzir a poluição, o uso do biodiesel permitiria que se evitassem custos de variada ordem, relacionados principalmente à saúde. As estimativas resumidas na tabela a seguir indicam que a substituição do diesel de origem fóssil pelo biodiesel puro (B100) proporcionaria redução desses custos da ordem de R$ 192 milhões anuais, nas dez principais cidades brasileiras, e em aproximadamente R$ 873 milhões, em nível nacional.

            Conclusões

Bem diante do exposto podemos ter uma primeira conclusão. O biodiesel pode contribuir favoravelmente para o equacionamento de questões fundamentais para o País, como a geração de emprego e renda, inclusão social, redução das emissões de poluentes, das disparidades regionais e da dependência de importações de petróleo, envolvendo, portanto, aspectos de natureza social, estratégica, econômica e ambiental.

A produção de biodiesel já é uma realidade em nosso País.Embora de forma insuficientemente articulada, o Brasil já detém considerável informação de pesquisa e desenvolvimento a ser utilizada como base para estabelecer contornos mais nítidos visando consolidar a produção e o uso do biodiesel no País, como substituto parcial ou total do óleo diesel, uma vez que as experiências realizadas em diversas regiões, por entidades públicas e privadas, impulsionadas a partir do primeiro choque do petróleo, passaram por sucessivos avanços.

Os desafios tecnológicos e a inexistência, até o momento, de testes conclusivos e certificados relativos ao uso de biodiesel não devem representar empecilhos ao desenvolvimento imediato de ações que estimulem sua produção e o uso. As experiências internacionais e existentes no Brasil mostram que os avanços tecnológicos e a realização de testes certificados poderão ser feitos concomitantemente com a intensificação e difusão da produção e uso desse combustível alternativo e renovável.

Outra conclusão de caráter geral, mas importante para orientar as decisões a respeito da matéria, é a de que o Brasil, de modo diverso do que ocorre em outros países, especialmente na Comunidade Européia, não deve privilegiar rotas tecnológicas, matérias-primas e escalas de produção agrícola e agroindustrial, diante do amplo leque de alternativas que se pode explorar com vistas a tornar a produção e consumo de biodiesel um vetor de desenvolvimento, podendo atender, com as adaptações devidas, necessidades, objetivos e metas os mais variados, consentâneos com nossas diferentes realidades.

            Recomendações

No trabalho realizado pelo GTI diversas recomendações foram apresentadas . Entre diversas poderíamos destacar:

2. Adotar a inclusão social e o desenvolvimento regional, especialmente via geração de emprego e renda, como princípios orientadores básicos das ações do Governo direcionadas ao biodiesel, o que implica dizer que sua produção e consumo devem ser promovidos de forma descentralizada e não excludente em termos de rotas tecnológicas, matérias-primas utilizadas, categorias de produtores, portes de indústria ou regiões. O Norte e o Nordeste devem receber tratamento diferenciado por serem regiões mais carentes e com amplas possibilidades de inserção no mercado de biodiesel;

3. Autorizar oficialmente o uso do biodiesel em nível nacional, inicialmente B5, reservando-se a obrigatoriedade de sua utilização como instrumento de última instância para viabilizá-lo em situações regionais específicas. A esse respeito, cabe observar que a obrigatoriedade do uso do biodiesel, qualquer que seja a proporção de mistura ao diesel de origem fóssil, criaria, de imediato, uma reserva de mercado que pode ser danosa aos interesses dos consumidores, além do fato de o uso facultativo do biodiesel aumentar as possibilidades de o País valer-se do mercado de carbono, sob o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) previsto no Protocolo de Kyoto;

6. Inserir, de forma sustentável, a agricultura familiar nas cadeias produtivas do biodiesel como vetor para seu fortalecimento, apoiando-a com financiamentos, assistência técnica e organização produtiva, visando a oferta de matérias-primas de qualidade e em escala econômica, assim como a participação dos agricultores familiares e suas associações como partícipes de empreendimentos industriais, de modo a ampliar os benefícios socioeconômicos auferidos;

Analisar a viabilidade do emprego de óleo vegetal in natura em motores estacionários, visando a oferta de energia para comunidades isoladas, onde o custo da eletricidade gerada pelo uso de óleo diesel é elevado;

Definir modelo tributário a ser aplicado na comercialização do biodiesel, bem como o seu enquadramento na classificação oficial de produtos com vistas a incidência da tributação.

8. Estabelecer normas, regulamentos e padrões de qualidade do biodiesel, inclusive quanto às emissões, de acordo com os diferentes usos a que se destina, independentemente das matérias-primas ou rotas tecnológicas que lhe deram origem, com a finalidade de não se discriminar, a priori, alternativas de oferta que podem ser viabilizadas regionalmente mediante desenvolvimento tecnológico e investimentos privados;

11. Criar uma Comissão Interministerial Permanente, encarregada de acompanhar a implementação das diretrizes e políticas públicas que vierem a ser definidas pelo Governo Federal, bem como os demais aspectos relevantes relacionados ao biodiesel no País, com a participação dos Ministérios de Minas e Energia, Ciência e Tecnologia, Desenvolvimento Agrário, Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, do Meio Ambiente, do Trabalho e Emprego e de outros órgãos governamentais que vierem a ser indicados pela Câmara de Políticas de Infra-Estrutura do Conselho de Governo.

No Relatório Final do Grupo de Trabalho Interministerial recomenda privilegiar parcerias público-privadas, (empresarial e comunitária) envolvendo entidades representativas dos produtores de matérias-primas, indústrias de processamento, centros de pesquisa e desenvolvimento, universidades, fabricantes de veículos e componentes automotivos, agências reguladoras e representações dos usuários finais do biodiesel.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 31/01/2004 - Página 2077