Discurso durante a 17ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas à afirmação do presidente da República de que o governo federal irá financiar a construção de casas destruídas pelas enchentes com recursos do FGTS. (como Líder)

Autor
Almeida Lima (PDT - Partido Democrático Trabalhista/SE)
Nome completo: José Almeida Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. CALAMIDADE PUBLICA.:
  • Críticas à afirmação do presidente da República de que o governo federal irá financiar a construção de casas destruídas pelas enchentes com recursos do FGTS. (como Líder)
Aparteantes
Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 11/02/2004 - Página 3761
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. CALAMIDADE PUBLICA.
Indexação
  • CRITICA, INCOERENCIA, DECLARAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, DECISÃO, GOVERNO, UTILIZAÇÃO, RECURSOS, FUNDO DE GARANTIA POR TEMPO DE SERVIÇO (FGTS), FINANCIAMENTO, RECONSTRUÇÃO, HABITAÇÃO, VITIMA, INUNDAÇÃO.
  • DEFESA, NECESSIDADE, GOVERNO, RESPEITO, POPULAÇÃO, BRASIL, ADOÇÃO, PROVIDENCIA, EFICACIA, SOLUÇÃO, PROBLEMA, REGIÃO NORDESTE, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DE SERGIPE (SE).

O SR. ALMEIDA LIMA (PDT - SE. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador José Sarney, dispensável o pedido de desculpas de V. Exª, mas agradeço a gentileza e a deferência não apenas a mim, mas a todos os Parlamentares, a todos os Senadores desta Casa.

Srªs e Srs. Senadores, o que me traz à tribuna, na tarde de hoje, é um fato que, desde o início do seu acontecimento, está sendo malconduzido, mal explicado e, portanto, mal resolvido. Nesta Casa, durante toda a convocação extraordinária, diversos Senadores estão tratando da questão que envolve a calamidade pública, sobretudo no Nordeste brasileiro, no meu querido Estado de Sergipe, diante das fortes chuvas que se vêm precipitando.

Trago um fato acontecido no dia de ontem, quando o Presidente Lula, participando do seu programa “Café com o Presidente”, prestou uma declaração com o tom de quem estava encaminhando a resolução de um grave problema decorrente do fato a que me referi.

Caso não fosse uma declaração pensada, decorrente de uma decisão de Governo, eu não estaria aqui a criticar, pois as gafes que Sua Excelência tem cometido já são do conhecimento de todos os brasileiros e permitiriam, se assim posso dizer, mais uma ou mais algumas. Mas, Sr. Presidente, foi uma declaração pensada, uma decisão de Governo, creio que passível, se pudéssemos retroagir no tempo, de ser incluída no “Febeapa”, de Stanislaw Ponte Preta, que era, na verdade, o Festival de Besteiras que Assola o País.

O Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ontem, disse categoricamente que trabalhará para a construção, não para a reforma das casas danificadas, destruídas pelas chuvas. Afirmou que não as reconstruirá no mesmo local passível anualmente de enchentes e que precisará conversar com os Prefeitos e Governadores. Segundo o Presidente, os Prefeitos terão que doar o terreno para a construção das casas, e os Governadores precisarão fazer a urbanização, a terraplenagem, a pavimentação, as obras de água, esgoto e energia. E o Governo Federal, entrará com o quê? Sua Excelência esclareceu: o Governo financiará a construção. Piada! Piada de mau gosto, que dá a demonstração exata de que este Governo é um padrasto ruim. Sim, porque há padrasto bom, mas este é um padrasto ruim.

Senador Mão Santa, a parte do Governo Federal é, em outra hipótese, a liberação do Fundo de Garantia daquele trabalhador que perdeu a sua casa. Ou seja, o Governo Federal não entrará com absolutamente nada.

O SR. ALMEIDA LIMA (PDT - SE) - Permitirei, Senador, concluindo apenas o raciocínio. O cidadão - que ele chama de trabalhador - do semi-árido sergipano, nordestino, não tem emprego, não mantém relação de trabalho com carteira assinada, nem recolhe FGTS. Mesmo que mantivesse essa relação, o Fundo de Garantia seria para atender às necessidades do trabalhador quando alcançasse a aposentadoria. Pois bem, é uma piada de mau gosto.

Ouço V. Exª, Senador Mão Santa.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Almeida Lima, V. Exª foi o primeiro Senador a clamar sobre o drama das enchentes no Nordeste. Ainda não se viu ação alguma do Governo Federal. Estive recentemente no Piauí e o que vi foi a generosidade da iniciativa cristã para com o povo do Piauí: campanhas de rádio, campanha de religiosos, da Igreja Católica, dos evangélicos, dos maçons, do Rotary e do Lions. Por outro lado, a ida do Presidente da República ao Piauí foi muito negativa. Olha que todo mundo disputa! E vi recentemente amigos suspenderem suas viagens de lua-de-mel ao delta do Parnaíba porque não têm mais coragem de beber água do Piauí, que o Presidente recusou.

O SR. ALMEIDA LIMA (PDT - SE) - Um absurdo, Senador Mão Santa! Agradeço a V. Exª pelo aparte, porque vem exatamente colocar o meu pronunciamento em outro trilho que eu pretendia alcançar.

Ora, Sua Excelência, o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, depois da viagem que fez à Índia, tendo passado também por Genebra, na Suíça, retornou ao Brasil e chamou a atenção do Governo, reclamou dos Ministros, daqueles mesmos Ministros - a exemplo do da Integração Nacional, Ciro Gomes - sobre os quais todos nós aqui estabelecemos críticas, referindo-nos à omissão do Governo. E ele chamou a atenção como se ele, Presidente, não fosse o responsável direto pelo que aconteceu no País na sua ausência. E, usando linguajar próprio do advogado no foro, digo: é preciso chamar o feito à ordem, colocar os pontos nos is e nos jotas e dizer tudo ao povo brasileiro.

Não temos a memória curta. O Senador Mão Santa, há poucos instantes, lembrou que fui o primeiro Senador a trazer a questão a esta Casa, exatamente no segundo dia de convocação extraordinária, no dia 20 de janeiro, terça-feira. E, lá no meu Estado, as chuvas torrenciais aconteceram nos dias 16, 17 e 18, da sexta-feira para o domingo e para a segunda-feira, dia em que a sessão extraordinária do Congresso Nacional teve início. O Presidente Lula estava no Brasil e aqui ficou na segunda-feira, dia 19, na terça-feira, dia 20, na quarta-feira, dia 21, na quinta-feira, dia 22, até a sexta-feira, dia 23, quando viajou para Nova Délhi, na Índia.

Ora, não apenas eu, mas também outros Senadores solicitamos a visita do Presidente e dos Ministros. Diante desse nosso pedido, é preciso que se pergunte: na sexta-feira, o Presidente deixa Brasília para ir a Nova Délhi, na Índia? Não, ele sai de Brasília e vai para São Paulo, onde, às 20h15min da sexta-feira, ao lado da prefeita do Partido dos Trabalhadores, Marta Suplicy, inaugura uma fonte com iluminação multimídia no Parque do Ibirapuera. Ou seja, ele alonga a rota de viagem, já que, saindo de Brasília, seria mais próximo chegar à Índia por Salvador ou Recife. Entretanto, vai a São Paulo inaugurar uma fonte com iluminação multimídia, quando poderia ter visitado o Nordeste brasileiro antes da viagem, uma semana depois do início da calamidade. Ele poderia ter chegado a Salvador ou a Recife, sobrevoando, durante um dia, a região calamitosa. Foi o que fez depois que retornou ao Brasil, chamando a atenção do Ministério como se o problema não tivesse sido iniciado por ele mesmo, que foi omisso e continua sendo.

Afora isso, houve a piada de mau gosto que contou na manhã de ontem, afirmando que a participação do Governo Federal para a construção das casas será a abertura de financiamento. É o pobre sertanejo de Sergipe que vai receber financiamento do Governo Federal para a reconstrução de sua casa, depois de exigir do prefeito uma área a salvo de futuras enchentes? Depois vai exigir dos Governos estaduais a urbanização, a infra-estrutura? Aí ele propõe uma linha de financiamento ou a liberação do Fundo de Garantia dos que não têm relação de emprego registrada, dos que sequer recolhem FGTS? Que brincadeira!

É preciso que o Governo brasileiro respeite o povo! É preciso que Lula, que não é mais nordestino - e assim ele se considera e assim demonstra à sociedade brasileira -, respeite os nordestinos! É preciso ouvirmos a palavra do Presidente da forma mais responsável possível. O cargo, o mandato de Presidente exige essa solenidade e essa responsabilidade. É o que os jornais do dia de hoje estão a publicar, são essas as declarações.

Presidente Paulo Paim, de forma efetiva, nada chegou ao Estado de Sergipe. Os recursos prometidos, além de extremamente insuficientes, lá não chegaram. O Governo de Sergipe encaminhou ao Ministério da Integração Nacional relatório circunstanciado e pleito nesse sentido. Mas nada! Apenas o Ministro Ciro Gomes fez o que disse que não faria: uma visita publicitária. Ele terminou fazendo essa visita, embora tivéssemos solicitado uma visita humanitária e não publicitária.

            Portanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, já ouvimos alguns Senadores tratarem dessa matéria hoje. Espero que outros me sucedam nesta tarde e no dia de amanhã e também depois de amanhã. É preciso que o Congresso Nacional tenha o vigor necessário para não deixar que esse assunto seja esquecido pela Presidência da República, seja posto, uma semana depois, ao esquecimento de todos, enquanto os sertanejos passam dificuldades lá. É preciso que outros, assumindo a tribuna, voltem a reclamar atitudes sérias e não piadas de mau gosto como a que ouvimos, sem nenhum prazer ou satisfação, da boca do próprio Presidente da República no dia de ontem.

            Os prefeitos fazem doação de terrenos, os governadores fazem a infra-estrutura, e o Governo Federal concede financiamento ao pobre que perdeu sua casa, seus móveis, seus bens e a esperança. E aí o Presidente da esperança diz que vai financiar ou, numa outra opção, liberar o Fundo de Garantia que ele não tem, por não manter uma relação de emprego devidamente regulamentada com o recolhimento de FGTS. Como disse, repito: e que tivesse essa relação! O FGTS é para o sustento dele e da família, a título de aposentadoria, de indenização, lá no final, para poder tocar a sua vida.

            Portanto, Srªs e Srs. Senadores, esse era o pronunciamento que desejava fazer na tarde de hoje, esperando que o Governo Federal não continue omisso e que as Lideranças do Governo nesta Casa tenham sensibilidade de dizer ao Presidente e ao corpo de Ministros que precisam sair da omissão e tomar atitudes efetivas e eficazes para a resolução dos problemas dos sertanejos do semi-árido, do meu Estado, Sergipe, e do Nordeste brasileiro.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/02/2004 - Página 3761