Discurso durante a Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Decepção e desesperança com o governo Lula. Críticas ao fechamento de bingos por medida provisória.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Decepção e desesperança com o governo Lula. Críticas ao fechamento de bingos por medida provisória.
Aparteantes
Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 02/03/2004 - Página 5235
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, FRUSTRAÇÃO, OPINIÃO PUBLICA, GOVERNO FEDERAL, DESCUMPRIMENTO, PROMESSA, CAMPANHA ELEITORAL, INCOMPETENCIA, NATUREZA ADMINISTRATIVA, CRESCIMENTO, DESEMPREGO, REDUÇÃO, PRODUTO INTERNO BRUTO (PIB), COMPARAÇÃO, SITUAÇÃO, SIMILARIDADE, PERIODO, GESTÃO, FERNANDO COLLOR DE MELLO, PRESIDENCIA DA REPUBLICA.
  • REPUDIO, MANIPULAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, IMPEDIMENTO, REALIZAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), SENADO, INVESTIGAÇÃO, CRIME CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PUBLICA, PARTICIPAÇÃO, ASSESSOR, CASA CIVIL, PRESIDENCIA DA REPUBLICA.
  • ANALISE, FUNCIONAMENTO, SISTEMA, CORRUPÇÃO, GOVERNO FEDERAL, DENUNCIA, IRREGULARIDADE, MINISTERIOS, EXIGENCIA, PROPINA, LIBERAÇÃO, REPASSE, RECURSOS FINANCEIROS.
  • DEFESA, NECESSIDADE, IDONEIDADE, CONDUTA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA, AUSENCIA, CRIAÇÃO, OBSTACULO, INVESTIGAÇÃO, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, “a esperança venceu o medo”. Sem dúvida, o inteligente mote publicitário da campanha eleitoral, que provocou admiração e produziu inegável efeito, convenceu a opinião pública brasileira e foi o caminho da vitória para o Partido dos Trabalhadores.

            Hoje, uma outra frase impõe-se e deve ser pronunciada - certamente, menos feliz, sob o enfoque de quem quer ver o bem da Nação: a decepção derrotou a esperança.

Vejo, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que se instala a desesperança, diante de um cenário de corrupção que desponta aos nossos olhos, a partir do Palácio do Planalto. Num primeiro plano, a incompetência visível, que leva o Governo Lula a bater recorde negativo do Governo Collor durante o ano do seu impeachment. O PIB do Governo Collor no ano do impeachment é irmão do PIB do Governo Lula no ano da incompetência administrativa sem precedentes na história da administração brasileira.

Mas não é essa a única semelhança entre o Presidente megalomaníaco que nos governou e foi levado ao impeachment e o Presidente também megalomaníaco que afirma que vamos realizar o maior programa social já visto na face da Terra, enquanto a economia encolhe, o desemprego cresce avassaladoramente e, lamentavelmente, a renda do trabalhador sofre perdas irrecuperáveis.

Há semelhanças incríveis, e a semelhança mais deplorável é a existência de um núcleo de corrupção que se instala agora no seio do Palácio do Planalto, em Brasília.

Se Collor tinha PC Farias, que operava nos bastidores da vida pública nacional, que incursionava no seio do setor privado brasileiro, Lula tem uma equipe de PCs, que se instalou no Palácio do Planalto, em situação privilegiada, para operar de dentro para fora, em detrimento dos postulados de natureza ética, sustentados pelo PT ao longo de muito tempo.

Quem seria o PC de Lula? Ou quais seriam os PCs de Lula: Waldomiro Diniz, Delúbio Soares, Marcelo Sereno, Gilberto Carvalho, Sílvio Pereira, Mirian Belchior, José Antonio Dias Tofolli - este subchefe de assuntos jurídicos da Presidência da República, que advoga em favor do PT nos tribunais de Brasília?

A ética, onde está a ética? Rasgou-se, fez-se frangalhos da bandeira empalmada com tanta galhardia por tantos militantes do PT, ao longo de sua brilhante história. É preciso investigar sim, porque a imagem que hoje transcende do Palácio do Planalto é a de que o Presidente Lula é um Collor de barba.

Como admitir que se procure agora impedir que o Congresso Nacional exercite uma das suas funções primaciais, qual seja de investigar denúncias de corrupção? Por que abafar a CPI do Waldomiro Diniz ou a CPI dos bingos, propostas em curso nesta Casa? Por que o PT, que tanto aplaudia, amava, se empolgava, idolatrava CPIs, agora detesta, não quer, foge da CPI como o demônio foge da cruz? Por que o PT tem medo de CPI agora? Por que quer manter debaixo do tapete do Palácio do Planalto a sórdida corrupção agora denunciada pela imprensa do País?

Não, Sr. Presidente, nós não podemos admitir uma postura de dois pesos e duas medidas em um Partido que despertou tanta esperança no povo brasileiro.

Nos últimos dias são tantos os desdobramentos! Waldomiros existem em sucursais instaladas em vários Estados do País: no Estado da Benedita da Silva, então Governadora do PT; no Estado do Rio Grande do Sul, do governo petista no passado recente; no meu Estado do Paraná, do governo atual do Waldomiro Requião. São vários os Waldomiros que estão instalados nas sucursais da corrupção, que tem como sede o Palácio do Planalto em Brasília.

Estamos pedindo apenas para investigar. Não estamos pedindo que se crucifique o Waldomiro, o Delúbio, o Marcelo Sereno ou quem quer que seja. Em nome do direito à transparência, estamos pedindo ao Governo que nos permita investigar mediante o instrumento de apuração que é a Comissão Parlamentar de Inquérito.

Evidentemente, o grupo Waldomiro, Delúbio, Marcelo, Gilberto, Sílvio, Mirian, José Antônio, que opera ao lado do Presidente da República, do Ministro José Dirceu, em posição privilegiada no Palácio do Planalto, governa mais que o Ministério do Presidente Lula, exerce mais influência do que qualquer Ministro da República. É este grupo que decide sobre a liberação de recursos a Governadores, a Prefeitos, a liberação de recursos para obras. E, por isso, o Sr. Delúbio, com desfaçatez, recebe no Palácio do Planalto, ao lado do Ministro dos Transportes, empreiteiros para tratar de obras e quem sabe tratar do repasse de propinas como contrapartida à liberação de recursos para execução de obras.

Há poucos dias, o Senador José Jorge denunciou, desta tribuna, que no Ministério dos Transportes o pedágio chegava a 22%. E essa denuncia não provocou a queda do Ministro dos Transportes, porque S. Exª se adiantou e anunciou a sua retirada para disputar as eleições em Uberaba. Esse é um ponto.

Esse grupo é que discutia, por exemplo, a liberação das emendas dos parlamentares. Eu sinceramente não sei se alguma emenda foi liberada, porque o Governo demonstrou tal incompetência que sequer teve eficiência para aplicar os recursos provisionados no Orçamento da União para investimentos. E nem mesmo as emendas parlamentares foram liberadas.

Parlamentares denunciaram que essas figuras instaladas no Palácio do Planalto e que fazem parte da bagaceira moral que se instalou nesse Governo eram os responsáveis pela liberação das emendas parlamentares. Há um vínculo estreito dessas figuras com fatos denunciados pela Imprensa, como “Serviço federal que processa dados contrata sem licitação - diz o sindicato”. E quem opera é Élvio Gaspar que, como Waldomiro, integrou a gestão da petista Benedita da Silva no Governo do Rio de Janeiro, em 2002.

É triste destacar, mas a Governadora Benedita da Silva, em tão pouco tempo no Governo do Rio de Janeiro, possibilitou uma seleção de escândalos que nos entristece demais, sobretudo se levarmos em consideração a sua origem de humildade.

Aqui está a dura vida do Sr. Waldomiro: articular as relações do Governo também na área da informática. Além da Gtech, já aqui focalizada pela Senadora Heloísa Helena, há relações do Sr. Waldomiro com a TBA, essa poderosa empresa de informática do nosso País. Negócios de Waldomiro incluem parte de faculdade nessa sociedade dele com a TBA. Obviamente há relações suspeitas e promíscuas de integrantes do Governo com o setor privado, em tão pouco tempo, lamentavelmente.

Nesse caso, é preciso apurar as relações de Waldomiro e, por conseqüência, do Palácio do Planalto com a TBA. Isso é motivo para investigação. Mas o Sr. Luiz Eduardo Soares traz ao conhecimento público informações da maior importância como, por exemplo, “Palocci e Benedita foram alertados sobre esquemas de corrupção no PT do Rio de Janeiro.” Alertou aos Ministros Antonio Palocci e José Dirceu que estava em curso, no Rio de Janeiro, um esquema de corrupção que era considerado, por setores do Partido, ainda incompetente, que poderia ser mais competente, que poderia render mais.

Vejam, Srªs e Srs. Senadores, a que ponto chegamos! A informação é a de que o Sr. Waldomiro Diniz arrecadava R$300 mil por mês dos bingos e que poderia chegar a R$500 mil; que esse era um esquema incompetente e que era preciso organizar um esquema competente para se arrecadar mais. E a proposta foi feita a Luiz Eduardo Soares por um “corruptólogo” - provavelmente muito próximo desse “propinoduto” que se instalou no Palácio do Planalto em Brasília. Esse “corruptólogo” disse que seria possível levantar, nos nove meses de Governo Benedita, algo em torno de R$80 a R$100 milhões. E que, nesse caso, Luiz Eduardo ficaria com R$5 milhões; a Benedita, com R$10 milhões e ele, com R$1 milhão. E que só precisava de duas ou três secretarias, algumas diretorias e outros cargos subordinados.

Essa é a estratégia da corrupção nos Governos. Os “corruptólogos” indicam secretários, indicam diretores, ocupam cargos nos quais se trabalha com recursos públicos e, a partir desses cargos, arrecadam em benefício próprio a pretexto de se arrecadar, muitas vezes, em benefício das campanhas eleitorais.

Esse esquema de corrupção existente no nosso País é conhecido, e, para fazer justiça ao atual Governo, devo dizer que não é um esquema novo.

O atual Governo chegou com muita sede ao poder; e, com tanta sede, vedou os seus olhos, ignorando que esses fatos transcendem os bastidores e chegam à opinião pública do País, desmoralizando, comprometendo, infelicitando a imagem de um Governo que veio para mudar a Nação.

Senador Mão Santa, Senador Gilberto Mestrinho, constata-se que a lua-de-mel acabou. Neste País, quem não desejava o sucesso do atual Governo? A imprensa nacional colaborou. Jamais um Governo teve tanto apoio da mídia brasileira como o Governo do PT. O entusiasmo da sociedade com a hipótese de mudança real levou as pessoas não apenas a acreditarem e a oferecerem o seu voto de confiança, mas até a serem condescendentes diante de determinados fatos que ocorriam já no início do atual Governo, como, por exemplo, a prática condenável do fisiologismo de empanturrar os quadros da administração de militantes do PT com ou sem competência, com ou sem qualificação técnica para o exercício de cargos considerados de natureza política ou de natureza técnica. Isso não importou ao Governo. O que importou ao Governo foi atender à militância, aos quadros do PT, para engordar a conta bancária do Partido dos Trabalhadores, transformando-o no Partido mais rico deste País.

A sociedade brasileira chegou a fechar os olhos para esses fatos, no seu desejo incrível, no seu desejo acalentado há tantos anos de ver este País mudando para valer. Mas a lua-de-mel acabou. Não há como exigir da sociedade mais paciência, liberalidade e condescendência em relação à postura do Governo, que joga na lata do lixo da sua história a bandeira da moralidade pública.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, creio que a paralisia da economia tem muito a ver com a incompetência do Governo, mas, sem dúvida, o descrédito da sociedade em relação ao Governo o paralisará ainda mais.

Não há alternativa para o Presidente Lula a não ser a da coragem. O Presidente Lula tem agora que pagar para ver; o Presidente Lula tem que permitir transparência total, absoluta, com ousadia, para que possa continuar governando o País, sob pena de assistirmos ao fim deste Governo antes do término do seu mandato.

Não há alternativa, o Presidente Lula tem que orientar o seu Partido nesta Casa para que permita a instalação da CPI; o Presidente Lula tem que exigir rigor absoluto dos órgãos governamentais que atuam na área da investigação; tem que colocar o Ministério da Justiça a liderar um mutirão em favor de uma investigação de responsabilidade para apurar os responsáveis, que não podem ficar impunes neste momento crucial da governabilidade brasileira.

Concedo um aparte a V. Exª, Senador Mão Santa.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Alvaro Dias, V. Exª, muito jovem, galgou altas posições políticas e tem uma experiência extraordinária. Para complementar, gostaria de somar às palavras de V. Exª as de outro homem que marcou a democracia: Abraham Lincoln. Ele disse: “Não faça nada contra a opinião pública, porque malogra. Tudo, do lado dela, tem êxito!” Mas eu não iria tão longe, cito outro exemplo, Juscelino, o nosso Juscelino, que construiu esta cidade - médico cirurgião como eu. Ele dizia aos seus assessores José Maria Alckmin e Israel Pinheiro: “Como vai o monstro?” Senador Gilberto Mestrinho, o monstro era o povo! Democracia é o governo do povo, pelo povo, para o povo. Cantei no Piauí, assim como V. Exª no Paraná: “o povo é o poder”. E vimos o povo, na sua festa popular, o Carnaval, cantar modinhas demonstrando a perda da credibilidade naquele no qual ainda acreditamos: o Presidente Lula.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Muito obrigado, Senador Mão Santa.

O meu tempo já se esgotou.

Concluo, Sr. Presidente, dizendo que é da maior importância neste momento a investigação. Não basta o Presidente Lula, de forma insincera, após encaminhar mensagem anunciando a regularização e a legalização dos bingos no Brasil, encaminhar uma medida provisória, numa mudança radical e repentina, para acabar com os bingos. Trata-se de uma confissão da incompetência do Governo.

Denunciam os bingos, mas o Governo não apura nada. Falam em lavagem de dinheiro nos bingos, mas o Governo não prova nada. E o Governo tem medo de CPI, porque essa, provavelmente, não vai alcançar um ou dois bingueiros, como poderia, mas homens do Governo, homens do PT, lideranças políticas de popularidade que estabeleceram uma relação promíscua com alguns empresários do jogo.

O que não é justo é o Senhor Presidente da República condenar todos os empresários que oferecem 320 mil empregos em um momento dramático de desemprego. O País não tem o direito de dispensar nem sequer um dos seus empregos. Que se coloque na cadeia, Sr. Presidente, o empresário de bingo desonesto, criminoso, que pratica ilícito e possibilita a lavagem de dinheiro - e o Governo tem os instrumentos para a investigação -, mas que não se condenem todos, porque há aqueles que atuam com seriedade e com honestidade. Essa prática sempre foi permitida no nosso País e não é justo condená-los exatamente como forma de proteger aqueles que, dentro do Governo, praticaram irregularidades.

Portanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o nosso discurso é um modesto grito de inconformismo com o que vem ocorrendo devido à incompetência e à incapacidade operacional do Governo, e, sobretudo agora, em função desse rasgar da bandeira da moralidade, transformada em frangalhos pelos homens de confiança do Presidente da República instalados exatamente no Palácio do Planalto, em Brasília.

Por isso, Sr. Presidente, CPI já!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/03/2004 - Página 5235