Discurso durante a Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Contestação às alegações da base governista de que seriam necessários fatos novos sobre o caso Waldomiro Diniz para justificar a instalação de uma comissão parlamentar de inquérito no Senado.

Autor
Antero Paes de Barros (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/MT)
Nome completo: Antero Paes de Barros Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Contestação às alegações da base governista de que seriam necessários fatos novos sobre o caso Waldomiro Diniz para justificar a instalação de uma comissão parlamentar de inquérito no Senado.
Aparteantes
José Jorge, Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 02/03/2004 - Página 5246
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • CONTESTAÇÃO, OPINIÃO, GOVERNO FEDERAL, AUSENCIA, JUSTIFICAÇÃO, CRIAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), INVESTIGAÇÃO, PARTICIPAÇÃO, ASSESSOR, CASA CIVIL, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, CRIME CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.
  • CRITICA, GOVERNO FEDERAL, EDIÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), FECHAMENTO, BINGO, SIMULTANEIDADE, RECUSA, APURAÇÃO, DENUNCIA, CORRUPÇÃO.
  • ANALISE, DIVERSIDADE, FATO, JUSTIFICAÇÃO, CRIAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), SENADO, COMENTARIO, ENTREVISTA, EX SERVIDOR, SECRETARIA, SEGURANÇA, AMBITO NACIONAL, INDICIO, CONHECIMENTO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), IRREGULARIDADE, ATUAÇÃO, ASSESSOR, CASA CIVIL, PRESIDENCIA DA REPUBLICA.

O SR. ANTERO PAES DE BARROS (PSDB - MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, retorno do recesso parlamentar muito mais convencido do que estava, há uma semana, sobre a importância da instalação da CPI para investigar as atividades de Waldomiro Diniz.

Ao chegar a Brasília, fiquei surpreendido com o esforço que faz o Governo brasileiro para demonstrar que, se não surgirem fatos novos no depoimento do Sr. Cachoeira e do Sr. Waldomiro, amanhã, já tomou todas as providências com relação ao caso. Não é verdade. O Governo editou uma medida provisória fechando os jogos de bingo e caça-níqueis, mas não tomou providências para a apuração do fato. Se não houver fatos novos no depoimento do Cachoeira e do Waldomiro... Pode não haver fatos novos. Eles podem requerer o direito de só falar em juízo.

Fatos novos existiram aos borbotões nesse período em que estivemos ausentes do Congresso Nacional.

Senão, vejamos, o que tínhamos quando viajamos: a gravíssima divulgação de uma fita provando o envolvimento do Sr. Waldomiro, em 2002, e a afirmação do PT de que Waldomiro não é do PT, um argumento risível. Quer dizer que, se houver problema com os outros Partidos da base que estão no Governo, não é motivo de preocupação porque eles não são do PT? Esse argumento não resiste à menor contradição.

O segundo argumento é que estaria provado que os fatos ocorreram em 2002, portanto, seriam anteriores ao Governo Lula. E agora? Na sexta-feira e no sábado de Carnaval, era capa da revista Época a notícia de que o Sr. Waldomiro operou em 2003. Há a entrevista dele à revista declarando que havia se encontrado com Diretores da GTech. Há a prova pela imprensa brasileira, inclusive com extratos de um hotel de Brasília, mostrando que houve encontros de Waldomiro Diniz com empresários da GTech e com Carlinhos Cachoeira. E há ainda a enorme coincidência de que, uma semana após o último encontro desses senhores, o contrato da GTech foi renovado por 25 meses. Esses fatos foram em 2003, portanto, são novíssimos e, mais do que novíssimos, são gravíssimos.

E eles ainda afirmam que o contrato da GTech existia desde o Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso. Então, digo aqui com a maior tranqüilidade do mundo: investiguem tudo, desde a época do Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso até agora, sobre a influência do Sr. Waldomiro como agente público! Não deixemos de investigar nada! Mas não venham com a chantagem pública de que existe uma quadrilha, mas que, em algum tempo na história brasileira, houve outra quadrilha. In dubio, na investigação, é pro sociedade. Investiguem tudo! Não haverá democracia no Brasil, se houver autoridades brasileiras que não possam ser investigadas. Qualquer autoridade pode ser investigada! Qualquer um! É um direito da sociedade. Não dá para aceitar esse argumento!

Portanto, tenho dito à imprensa brasileira e quero dizer aqui da tribuna do Senado que não aceito o argumento de que é preciso haver fatos novos nos depoimentos do Sr. Cachoeira e do Sr. Waldomiro para se instalar uma CPI.

Um outro argumento utilizado: “Vamos tirar as assinaturas, porque agora precisamos formar uma agenda positiva.” Pelo amor de Deus, não existe agenda positiva para um país que precisa retomar o desenvolvimento que não tenha como ponto nº 1, doa a quem doer, apurar a corrupção! Apurar a corrupção não pode ser colocado nesta Casa como parte de uma agenda negativa. É positivíssimo! Tranqüiliza os investidores, melhora a credibilidade do Brasil, melhora a credibilidade do Governo! Portanto, ponto nº 1: querem a agenda positiva? A Oposição apóia. Querem apoiar o financiamento público de campanha? A Oposição apóia. Querem discutir a Lei de Falência, da qual o Senador Ramez Tebet será o Relator? Podemos discutir um ou outro ponto, mas queremos que seja votada. Mas isso não impede de realizar o ponto mais positivo, que é apurar a corrupção.

O Sr. José Jorge (PFL - PE) - V. Exª me permite um aparte, Senador Antero Paes de Barros?

O SR. ANTERO PAES DE BARROS (PSDB - MT) - Terei o prazer de ouvir V. Exª, Senador José Jorge, mas antes quero utilizar outros argumentos.

Há uma semana, quando deixava Brasília, havia apenas suspeitas de que Waldomiro Diniz utilizava a Casa Civil da Presidência da República para negócios estranhos à sua atividade de Chefe da Subchefia de Assuntos Parlamentares. Entretanto, além dos encontros com a GTech, das negociações de renovação de contrato com a Caixa Econômica Federal, o jornal Folha de S.Paulo trouxe, na última semana, reportagem que revela a sociedade - vejam bem, chamo a atenção do Senado Federal para o fato - de Waldomiro Diniz com a empresária Maria Estela Boner Léo, uma das acionistas da TBA Informática. A TBA, para quem não sabe, é a representante da Microsoft no Brasil. A Microsoft tem interesse direto no trabalho de um grupo técnico criado na Casa Civil da Presidência da República, onde ele atuava como Subchefe da Casa Civil para Assuntos Parlamentares, onde era, até ter pedido demissão, o mais importante assessor do até então mais importante Ministro da República.

Isso não é fato novo? Isso não é fato que mereça investigação? Isso pode se circunscrever a Waldomiro? Pode, mas precisa ser investigado. Isso pode ser mais um fato sem o conhecimento do Ministro José Dirceu? Pode, mas precisa ser investigado.

Outro fato inaceitável: desde 1500, desde Cabral, desde Pero Vaz de Caminha, neste País, quem trata de jogos é o Ministério dos Esportes e a Caixa Econômica Federal. Por que o assunto estava na Casa Civil, numa comissão interministerial?

São perguntas que somente serão respondidas numa investigação que tenha a presença do controle externo, que é o Parlamento brasileiro.

Terceiro fato: o próprio Ministro José Dirceu disse, numa reunião em Brasília, que havia sido traído, que não conhecia os fatos e que foi surpreendido pela divulgação e pelos acontecimentos. Creio que o Senado da República já leu, releu e meditou sobre a entrevista exclusiva que o ex-Secretário Nacional de Segurança, Luiz Eduardo Soares deu a AOL, na Internet, que depois a imprensa brasileira divulgou, relatando fatos que havia alertado à Governadora Benedita da Silva, a importantes autoridades da República e ao Ministro José Dirceu.

Diz ele - algo que precisa ser esclarecido, pois não o foi na entrevista - que se encontrou com uma espécie de “corruptólogo”, um especialista das possibilidades de corrupção na máquina do Estado do Rio de Janeiro, que lhe disse: “Veja, por exemplo, o Waldomiro Diniz. Ele está aqui num esquema levantando R$300 mil por mês dos bingos. Ele está sendo incompetente. É possível chegar a R$500 mil, quem sabe dá para produzir mais”.

Depois, tudo isso foi relatado à Governadora Benedita, que chorou, mas não tomou providências.

E a revelação importantíssima de Luiz Eduardo Soares, na AOL - e estou apresentando apenas a essência da entrevista, porque há outras revelações importantes que não vou detalhar por causa do tempo -, é sobre o encontro que manteve com o então Presidente do PT, José Dirceu, hoje Ministro, em agosto de 2002. Vou reproduzir as palavras do Dr. Luiz Eduardo Soares: “Nós nos conhecíamos superficialmente. Então, nos cumprimentamos formalmente e ele me dirigiu poucas frases”. Uma das frases do Ministro José Dirceu a Soares: “Soube que você anda criando dificuldades para nós, no Rio de Janeiro”. E Luiz Eduardo respondeu: “As coisas estão muito complicadas”. A resposta do, à época, Presidente do PT, hoje Ministro José Dirceu: “Nosso papel é descomplicar”.

E alega que não sabia, que não foi alertado e que apenas uma apuração interna do Poder Executivo é suficiente para esclarecer tudo isso?!

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não venham com essa de tentar descredenciar quem está fazendo a denúncia. Ao trazer a denúncia ao Plenário do Senado na sexta-feira, não o fiz sequer como Senador do PSDB ou como Senador da Oposição.

Tenho, na minha biografia política, o fato de ter passado pelo Partido dos Trabalhadores e tenho certeza absoluta de que os muitos anos de história do PT não foram trilhados nesse caminho. Eu seria o último dos brasileiros a tentar desgastar um governo, ainda mais este que é comandado pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a quem reafirmo, aqui da tribuna, o meu respeito pela sua história e pela sua biografia. Mas essa história e essa biografia podem ficar diminuídas se isso não for apurado.

Não adianta vir com coisas policialescas, do tipo: “O Senador Antero foi visto saindo de madrugada da casa do subprocurador fulano de tal”. Isso não vale. Eu pediria que o Governo tivesse nível, que não transformasse uma instituição importante da República, como a Polícia Federal, numa Gestapo tupiniquim. Mas, se quiserem transformar, criem a Gestapo que quiserem e me investiguem à vontade, porque eu me preparo para a luta ética desde o nascimento. Eu não tenho esse defeito. Tenho outros problemas na minha vida. Não adianta dizerem: “Vamos fazer a CPI, mas vamos investigar também o Arcanjo”. Vamos fazer, sim, a do Arcanjo! Aliás, todos os documentos da vida do Arcanjo estão na CPI do Banestado, cujo Relator é o Deputado José Mentor, do PT. Todas as ligações telefônicas estão lá, todos os cheques estão lá. Não há, na minha vida, qualquer relação com isso.

Não pensem que isso vai me atemorizar. Repito: não há quem não mereça ser investigado. Que investiguem o Arcanjo, o Antero, mas não vamos fazê-lo sob esse pretexto e esse argumento de que há uma quadrilha aqui e uma ali. Comigo não tem quadrilha! Quero que apurem essa quadrilha do Sr. Waldomiro! Sou a favor de se apurar tudo desde 1500, de Cabral para cá.

Antes de concluir o meu pronunciamento, quero conceder um aparte ao Senador José Jorge.

O Sr. José Jorge (PFL - PE) - Meu caro Senador Antero Paes de Barros, em primeiro lugar, expresso a minha completa solidariedade a V. Exª nessa luta que vem travando, com a qual sou solidário, e já apus a minha assinatura para que possamos fazer a CPI. Não repetirei os argumentos de V. Exª, mas não existe só um fato. Acredito que só aquele filme, Senador Antero Paes de Barros, do Waldomiro fazendo aquele acordo, já justificaria uma CPI. Aquilo deve gerar muitos ‘filhotes’ e, se instalada a CPI, muita coisa ainda deve aparecer. Mas gostaria de abordar outro aspecto: a permanência do Ministro José Dirceu na Casa Civil. Afinal há vários indícios e o fato de que o Ministro da Casa Civil nunca esteve sob suspeição. Na realidade é como o Senador Mão Santa diz: “A mulher de César não tem só que ser honesta, deve parecer honesta”. Infelizmente, o Ministro José Dirceu já não parece mais. Na Casa Civil juntou-se um grupo de pessoas para cuidar de assuntos que não têm nada a ver com o seu papel. É como V. Exª disse, por que o grupo dos bingos está na Casa Civil? Por que o grupo de informática está na Casa Civil? Por que são criados tantos grupos na Casa Civil? Por que o tesoureiro do PT encontrou-se com empreiteiros dentro da Casa Civil? Na realidade, creio que isso deveria ser algo superado. Em um regime democrático presidencialista, não deve mudar o presidente. Nós, da Oposição, iremos às ruas para defender o mandato do Presidente Lula, pois não somos uma republiqueta. Mas não para defender mandato de ministro, porque ministro não tem mandato. Quando se verifica uma situação como essa, nós, que estamos aqui há muitos anos, sabemos qual será o fim. Enquanto isso, o País vai se desgastando. Temos, neste Governo, o exemplo da Ministra Benedita da Silva, que depois de tanto desgaste foi demitida, assim como o Ministro Grazziano e o Ministro Berzoini, que teve que mudar de Ministério e ainda levou uma torta na cara. Tudo isso significa um desgaste desnecessário. Creio que o Presidente Lula, para preservar o seu Governo e o Brasil, deve retirar imediatamente o Ministro José Dirceu. E, talvez, no final da CPI, se houver, o ministro possa voltar e, assim, exercer a sua função. Congratulo-me com V. Exª.

O SR. ANTERO PAES DE BARROS (PSDB - MT) - Agradeço a V. Exª o aparte, que incorporo ao meu pronunciamento e com o qual concordo.

Quando apresentei a denúncia do caso Waldomiro Diniz, fiz essa proposta da tribuna do Senado. Quero deixar claro que a Oposição, nesta Casa, não fez nenhuma afirmação sobre o envolvimento de alguma autoridade brasileira, a não ser do Waldomiro, mas reitera a necessidade de haver uma investigação com a presença do Senado da República para se apurar tudo.

O argumento de que não se deve mexer no capitão do time é um absurdo. O Brasil - e agora falo como jornalista esportivo - foi cinco vezes campeão mundial de futebol: em 1958, com o capitão Bellini; em 1962, o capitão era Mauro; em 1970, o capitão era Carlos Alberto Torres; em 1994, com o capitão Dunga; e, em 2002, com o capitão Cafu. Então, troca-se o capitão e ganha-se o jogo. Até porque o capitão é da recessão. O capitão é dos menos 0,2% de PIB, fato que só aconteceu no Brasil no Governo Collor de Mello. O capitão é do maior índice de desemprego no Brasil desde que se começou a medir. Então, é evidente que o capitão não está coordenando bem.

Por isso e também porque a autoridade do ministro está corroída, há duas alternativas: ou o Presidente afasta o Ministro Dirceu ou ele pede para ser afastado. Só uma não serve ao País: ele continuar no cargo enquanto não fique absolutamente tudo em pratos limpos.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, encerro, relembrando aqui a CPI do Banestado. Naquela e nesta tribuna, os argumentos contra a CPI do Banestado eram os mesmos, de que não poderia haver a CPI porque as reformas não seriam aprovadas. Houve a CPI, ela trabalhou com sobriedade absoluta, e as reformas foram aprovadas.

Esta é a mais alta Casa do Parlamento brasileiro. Somos, sim - já demos prova disso -, capazes de instalar a CPI do Waldomiro Diniz e, ao mesmo tempo, desenvolver a agenda positiva. Aliás, o ponto número um de qualquer agenda positiva é o combate à corrupção.

Concedo o aparte ao Senador Mão Santa.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Caro Senador Antero Paes de Barros, apresento aqui os aplausos do povo que represento, do Piauí, pela coragem de V. Exª. Fomos um dos que assinaram o pedido de CPI, traduzindo a coragem e a liberdade do povo piauiense. Mas eu queria levar ao Presidente da República a minha experiência de Prefeito. Lembro-me de que, quando eu era Prefeito, havia um militar suspeito de cometer crimes, e eu fui ao Capitão dos Portos, ao Juiz, com o argumento de que autoridade não pode ser suspeita. No Peru, o Presidente Fujimori caiu porque havia denúncias contra o núcleo duro do seu governo. E ele teve que ir embora e hoje está morando no Japão. Posteriormente, com a permissão de Deus, tornei-me Governador do Estado e prendi o Coronel Correia Lima, do sindicato. Autoridade não pode ser suspeita. Este Governo não tem de oferecer o núcleo duro. Queremos o “núcleo puro” para o País.

O SR. ANTERO PAES DE BARROS (PSDB - MT) - Senador Mão Santa, agradeço-lhe o aparte.

Agradeço a Presidência pela tolerância.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/03/2004 - Página 5246