Discurso durante a Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Contestação ao argumento invocado pela bancada governista de que a instalação da CPI do caso Waldomiro Diniz levaria à desestabilização econômica do país. (como Líder)

Autor
Efraim Morais (PFL - Partido da Frente Liberal/PB)
Nome completo: Efraim de Araújo Morais
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Contestação ao argumento invocado pela bancada governista de que a instalação da CPI do caso Waldomiro Diniz levaria à desestabilização econômica do país. (como Líder)
Aparteantes
Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 04/03/2004 - Página 5624
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • CONTESTAÇÃO, ALEGAÇÕES, GOVERNO, INSTALAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), APURAÇÃO, DENUNCIA, CORRUPÇÃO, EX SERVIDOR, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, PREJUIZO, ESTABILIDADE, ECONOMIA NACIONAL.
  • DEFESA, IMPORTANCIA, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), INVESTIGAÇÃO, DENUNCIA, CORRUPÇÃO, GARANTIA, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA, ETICA, MORAL, GOVERNO.

O SR. EFRAIM MORAIS (PFL - PB. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, uma das grandes conquistas institucionais advindas da redemocratização do País, a partir de 1985, foi exatamente o fim da chantagem como instrumento de ação política. Diante de qualquer crise, falava-se em retrocesso político, em golpe militar, o que levava a Oposição e a própria sociedade civil a um comportamento de medo e submissão diante do poder constituído.

Com isso, absorviam-se situações inadmissíveis, a pretexto de se evitar o pior. Um exemplo clássico disso foi o caso Riocentro, em 1980, cujo relatório final inocentava os culpados e consagrava a impunidade. A Oposição tentou reagir, mas, advertida de que as coisas poderiam piorar, instalando-se um retrocesso político no País, acabou tendo que se conformar. O julgamento daquele atentado ficou para a História, que, implacável, condenou os culpados - incluindo entre eles os que se omitiram de julgá-los.

Ultrapassada aquela etapa histórica de paranóias, em que se temia pela sobrevivência da democracia ainda embrionária, mudou o objeto da chantagem. Passou-se a usar a economia. Se há um escândalo a ser investigado, argumenta-se que é preciso cuidado, senão a bolsa cai, o risco-país sobe e o dólar dispara. É preferível, segundo esse raciocínio, a omissão, o agravo moral, a arcar com perdas contábeis e financeiras.

CPI - o instrumento de investigação parlamentar por excelência - torna-se, subitamente, o inimigo da governabilidade. O exercício da fiscalização dos Poderes, função precípua do Poder Legislativo, torna-se fator de desestabilização econômica e, portanto, gesto impatriótico a ser evitado a todo o custo. Líderes de Governo ocupam as tribunas do Parlamento para denunciar colegas da Oposição, acusando-os de conspirar contra a estabilidade da economia. É este o espetáculo a que, constrangidos, assistimos neste momento, nesta Casa.

É preciso dar um basta nisso, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores. É preciso acabar com essa balela de que CPI conspira contra a economia. Se isso fosse verdade, a economia brasileira já se teria arruinado há muito tempo.

Este País já decretou o impeachment de um Presidente da República, a partir de uma CPI, sem que a economia do País fosse comprometida. Já cassou cabeças coroadas do Parlamento, a partir de uma CPI, sem que as instituições políticas, econômicas ou financeiras sofressem danos.

O País, ao contrário - e aqui estou incorporando um conceito que o PT sustentou ao longo de sua história -, só tem a ganhar com o processo de investigação de suas mazelas.

CPI é uma ferramenta da rotina parlamentar - e precisa ser encarada como tal. Quantas CPI’s temos, neste momento, em funcionamento na Câmara e no Senado? E que tem isso a ver com a cotação do dólar ou com o risco-país?

Bem pior que o ruído de uma CPI, bem pior que a exploração política indevida que alguns dela fazem, é a manutenção de um ambiente de suspeita, é o culto à impunidade, que provocam colossal desgaste das instituições políticas do Estado junto à sociedade e aos investidores, internos e externos. País que cultiva a impunidade despreza a segurança jurídica - e isso, sim, assusta, e com razão, investidores e cidadãos.

Mil vezes a turbulência de uma CPI, ainda que nos seus primeiros momentos provoque algum efeito colateral tópico sobre o mercado financeiro, que as conseqüências políticas e morais de se evitá-la. O efeito tópico sobre o mercado financeiro é como a febre: passa logo, sem maiores seqüelas. Mas a impunidade, não: é como um tumor maligno, que lança metástases sobre o tecido moral da Nação, contaminando-o e cobrindo-o de vergonha.

O Governo Lula está fazendo a aposta inversa: joga todas as suas fichas contra a investigação parlamentar das ações de Waldomiro Diniz, sobre quem já não pairam dúvidas. As dúvidas estão exatamente na extensão das ações daquele personagem, que privava da intimidade do principal Ministro do Governo, o Sr. José Dirceu.

O que a Nação suspeita é que Waldomiro Diniz agia como operador de uma engrenagem política subterrânea, respaldado por seu superior hierárquico.

As dúvidas aumentaram quando se soube que outros personagens do Gabinete Civil, também auxiliares diretos do Ministro José Dirceu, estariam igualmente envolvidos em ações estranhas às suas funções. Nomes já foram citados desta tribuna e poupo-me de repeti-los. Interessa-me mostrar mais uma vez ao Governo que esse ambiente é o mais nefasto possível à governabilidade.

Mais que ninguém, o próprio Presidente da República e seu Ministro-Chefe da Casa Civil deveriam estar interessados em ocupar as tribunas disponíveis para esclarecer todas as dúvidas, liquidar com todas as suspeitas.

A sociedade, que em sua maioria votou em Lula, quer saber se pode confiar nos homens que estão à sua volta, na intimidade palaciana. A partir do episódio Waldomiro Diniz, há razões concretas para se afirmar que o ambiente palaciano está contaminado. Há joio e trigo no Palácio. E é preciso mostrar quem é joio e quem é trigo, num ambiente que precisa estar purificado para o cumprimento de sua missão.

Se Waldomiro Diniz, principal assessor do mais importante Ministro do Governo, seu braço operacional no Congresso Nacional, onde pilotou votações fundamentais ao longo de um ano de reformas constitucionais, não era percebido pelo seu próprio chefe, por que então supor que os demais assessores são íntegros e puros?

Os jornais informam que o tesoureiro do PT, Sr. Delúbio Soares, despachava com empreiteiros, na Casa Civil, em pleno Palácio do Planalto. Como se explica uma situação dessas? O Ministro José Dirceu sabia disso? Ou, mais uma vez, foi traído por uma circunstância?

Precisamos saber disso, Srªs e Srs. Senadores. O País não concebe ter no comando de sua estrutura administrativa e política um ingênuo, um enganado, um Ministro-Chefe cujos assessores são simultaneamente o médico e o monstro, da famosa estória do Dr. Jekyll e Mr. Hyde.

É claro que o País se sente inseguro em um ambiente desses. Não é casual que um instituto de pesquisas com a credibilidade do Datafolha tenha tido a iniciativa de perguntar ao povo se quer ou não uma CPI para o caso. E é natural que o povo, posto a par do que se tratava, tenha se manifestado maciçamente pela CPI.

Nada menos, Sr. Presidente, do que 81% - quase unanimidade - querem uma CPI para o caso Waldomiro Diniz. E nada menos do que 61% querem que o Ministro José Dirceu esteja fora do cargo durante essa investigação.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, muitos aqui já o disseram, principalmente o eminente Senador Mão Santa, mas permito-me repetir o chavão, por julgá-lo a mais bem acabada expressão da verdade e o mais adequado à situação: “À mulher de César não basta ser honesta - é preciso que pareça honesta também”.

Sinto dizer que o Ministro José Dirceu não cumpre, neste momento, o segundo requisito desse enunciado clássico. Mais: resistindo à CPI, afasta-se cada vez mais dele. E isso é perigoso. Isso, sim, ameaça à governabilidade.

Para concluir, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, insisto em apelar ao bom-senso das Lideranças do Governo e ao Ministro José Dirceu: em vez de evitar, apóiem a instalação de uma CPI nesta Casa e se dêem a chance de recuperar a confiança nacional, a confiança do Governo da esperança, da ética e da transparência na vida pública.

É este um apelo de quem torce pelo País, que quer ver a governabilidade garantida e o Presidente Lula em paz e em sintonia com os seus compromissos eleitorais e históricos.

Pense nisso, Ministro José Dirceu. Pensem nisso Srs. Líderes da base do Governo.

Antes de encerrar, Sr. Presidente, gostaria de pedir permissão a V. Exª para conceder um aparte ao Senador Mão Santa, já que o citei, com muita honra, no meu pronunciamento. E peço desculpa ao Senador Mão Santa por não ter observado o seu pedido de aparte.

O SR. PRESIDENTE (Romeu Tuma) - V. Exª está dentro do seu tempo, Senador Efraim Morais.

O SR. EFRAIM MORAIS (PFL - PB) - Sr. Presidente, agradeço a V. Exª a tolerância. Tenho o maior prazer em ouvir essa grande liderança, esse grande Senador do Piauí.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Efraim Morais, atentamente estou acompanhando o pronunciamento de V. Exª, assim como todo o País. V. Exª falou em 81% a favor da instalação de uma CPI, pesquisa feita pelo Datafolha. A pesquisa, V. Exª, que é engenheiro, sabe disso, é o casamento da Matemática, a verdadeira ciência, com a Estatística. Aprendi, de Abrahm Lincoln: “Não faça nada contra a opinião pública, porque malogra. Tudo com ela tem êxito!” A opinião pública quer a pesquisa. Então, é um risco. E mais: aprendi com o povo do Piauí que a voz do povo é a voz de Deus. O povo e Deus querem a instalação da CPI. Iria mais adiante, recordando Shakespeare que, em Rei Lear, diz: “Há algo de podre no Reino da Dinamarca”. E fico ainda com a Bíblia, que diz: “Diga-me com quem andas e te direi quem és”.

O SR. EFRAIM MORAIS (PFL - PB) - Muito obrigado, Senador Mão Santa. As citações de V. Exª enriquecem meu pronunciamento.

Reiterando, em nome de 81% de brasileiros e brasileiras, digo que desejamos a CPI, Sr. Presidente, Senador Romeu Tuma, a fim de que possamos passar o País a limpo, devolver a paz ao Presidente Luiz Inácio Lula da Silva e devolver a ética ao PT, hoje carimbado como o Partido contra a ética.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/03/2004 - Página 5624