Discurso durante a Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Alerta para a crise nas empresas de comunicações.

Autor
Edison Lobão (PFL - Partido da Frente Liberal/MA)
Nome completo: Edison Lobão
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TELECOMUNICAÇÃO.:
  • Alerta para a crise nas empresas de comunicações.
Aparteantes
César Borges.
Publicação
Publicação no DSF de 05/03/2004 - Página 5678
Assunto
Outros > TELECOMUNICAÇÃO.
Indexação
  • ANALISE, CRISE, SITUAÇÃO FINANCEIRA, EMPRESA DE TELECOMUNICAÇÕES, REIVINDICAÇÃO, IGUALDADE, APOIO, PODER PUBLICO, CONCESSÃO, CREDITOS, GARANTIA, LIBERDADE, PLURALIDADE, OPINIÃO, CONCILIAÇÃO, INTERESSE, CIDADÃO, EMPRESA, ESTADO, DEMOCRACIA.
  • COMENTARIO, CRITERIOS, PAIS ESTRANGEIRO, FRANÇA, GRÃ-BRETANHA, AUXILIO FINANCEIRO, EMPRESA, INFORMAÇÃO, PRESERVAÇÃO, UTILIDADE PUBLICA, IMPRENSA, RADIO, TELEVISÃO.

O SR. EDISON LOBÃO (PFL - MA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a mídia brasileira enfrenta a maior crise de sua história, com uma dívida calculada em cerca de US$10 bilhões, segundo estudos divulgados recentemente.

Diante de tal situação, as empresas de comunicação reclamam do Poder Público tratamento idêntico ao que é oferecido aos demais setores da economia em matéria de concessão de créditos. Essas empresas se sentem discriminadas pelas políticas operacionais de financiamento em vigor.

O pleito da mídia nacional, em favor de um tratamento igualitário, me parece mais do que razoável.

Mas a ótica pela qual abordamos a questão se situa, de preferência, no quadro dos grandes princípios que regem o funcionamento dos regimes democráticos.

Nas grandes democracias européias, a regra é consagrada. Ou seja, entre as prerrogativas legais do poder público, figura aquela relativa às garantias que devem ser asseguradas à liberdade de imprensa e ao pluralismo de opinião.

O direito à informação, informação ampla e diversa, refletindo as diferentes correntes de pensamento, impôs-se mais do que nunca na sociedade moderna de comunicação; é uma exigência incontornável do mundo da globalização, da interdependência das civilizações.

É dentro dessa perspectiva que gostaria de manifestar minha inquietação com uma eventual estagnação da democracia brasileira na sua capacidade informativa com seus atributos essenciais - a liberdade e o pluralismo. Isso por causa da crise econômica que afeta seriamente o conjunto da mídia nacional, sobretudo nas suas três principais expressões - imprensa, rádio e televisão.

Urge a busca de uma solução, capaz de conciliar os interesses do cidadão, que tem na mídia em geral um serviço de utilidade pública, nas suas vertentes informativa e educativa, os interesses empresariais do setor e os interesses do Estado de velar pelo desenvolvimento dos valores fundamentais da democracia.

Na busca dessa solução, teríamos que examinar, entre outras referências, os critérios de ajuda à mídia praticados pelas democracias européias toda vez que a liberdade e o pluralismo tendem a ser ameaçados pelos maus resultados econômicos e financeiros dos grupos de comunicação. Esforços substanciais são feitos então pelo Poder Público para que não desapareçam aqueles veículos em crise, mas que representam um efetivo, real interesse público.

Assim, na França e na Grã-Bretanha, em nome do primado da democracia, o Estado oferece ajudas diretas e indiretas às empresas de informação em dificuldade, seja por meio de empréstimo a juros baixíssimos, seja pela redução parcial dos seus débitos acumulados nos órgãos governamentais, inclusive bancos, sem falar de outros incentivos. Tarifas preferenciais nos transportes ferroviário e aéreo são concedidas à imprensa.

Só na França, na virada do século, essa ajuda à mídia foi superior a um bilhão de dólares.

Vale, contudo, insistir na observação de que, entre as condições primordiais para a obtenção dessa assistência oficial, destaca-se a utilidade pública, o interesse coletivo atendido pelo veículo beneficiado.

No conjunto das democracias ocidentais, é cada vez maior o consenso de que a mídia e, em particular, a imprensa, constitui um dos setores mais vulneráveis da economia. Por cumprir uma função de utilidade pública, os jornais não podem onerar seus preços de venda. Ficando sujeitos às incertezas das conjunturas econômicas, quase sempre desfavoráveis nos últimos anos, os jornais - e o raciocínio é válido também para o rádio e tv - assistem, impotentes, à retração crescente do mercado publicitário. Com isso, os prejuízos e o conseqüente endividamento tornaram-se uma constante na grande maioria das empresas jornalísticas, sobretudo nesses tempos de transição tecnológica, exigindo, pois, investimentos vultosos.

Daí a necessidade de uma intervenção, na melhor acepção liberal e democrática do termo, do poder público no caso da mídia nacional.

O Sr. César Borges (PFL - BA) - Permite V. Exª um aparte, nobre Senador Edison Lobão?

O SR. EDISON LOBÃO (PFL - MA) - Ouço, com prazer, o aparte do nobre Senador César Borges.

O Sr. César Borges (PFL - BA) - Nobre Senador Edison Lobão, V.Exª, como aliás é do seu feitio, sempre trazendo assuntos da maior importância para esta Casa, coloca mais uma questão que preocupa a Nação brasileira. Se vivemos, hoje, uma crise em termos de desenvolvimento econômico, falta de crescimento, é claro que essa crise se reflete também no mercado editorial, no mercado publicitário, na mídia, enfim, que tem um papel importantíssimo na manutenção da democracia. E não podemos deixar que um setor tão importante, como esse, possa sofrer dificuldades, descontinuidade no seu trabalho de servir à população, porque os jornais, a mídia, seja ela impressa, ou televisiva, é fundamental para a formação da opinião pública nacional, para que a democracia se faça efetiva em nosso País. O que assistimos, infelizmente, é essa crise. V. Exª faz um grande alerta ao propor que, efetivamente, haja uma preocupação, inclusive em termos de Governo, com relação a essa crise. O que nós esperamos, Senador Edison Lobão, é que seja feito da forma mais democrática possível, que possa atender a todos que estejam passando por essa motivação de uma crise que existe, sem, no entanto, haver pressão por parte do Governo Federal, na hora de contemplar com um programa, um setor da mídia brasileira. Portanto, quero parabenizá-lo por esse alerta que está fazendo à Nação brasileira, esperando que as autoridades tenham essa preocupação democrática de manter toda a imprensa brasileira atuando para servir à população do nosso País. Muito obrigado, Sr. Senador. Parabenizo V. Exª por esse pronunciamento.

O SR. EDISON LOBÃO (PFL - MA) - Senador César Borges, V. Exª foi ao âmago do problema, quando manifesta preocupação com a democracia, na medida em que a imprensa entra em crise em nosso País. Já são decorridos tantos e tantos anos, e ainda nos lembramos daquela frase de Thomas Jefferson, segundo a qual, a imprensa é o único sinal de alarme de uma nação. Se nós temos uma democracia em processo de consolidação, necessitamos fundamentalmente de uma imprensa livre e forte para manter esse processo que está em consolidação.

Assim, se nós negligenciamos a nossa imprensa, estamos por igual negligenciando a democracia que temos.

Sr. Presidente, no exame dessa necessidade de uma ação do Estado, com base em amplo consenso das partes interessadas, é preciso considerarmos detidamente os ensinamentos oferecidos pelas grandes democracias européias. Estas, com seus índices elevados de desenvolvimento cultural, não se descuidam, todavia, da salubridade econômica de seus sistemas midiáticos, já que estes viabilizam o exercício do direito à informação e suplementam, por variadas iniciativas, os programas educativos, a formação profissionalizante dos jovens e cumprem outras funções sociais relevantes. E por aí se concretiza aquilo que tanto preocupa os pensadores,os humanistas da era da comunicação eletrônica. Ou seja a ampla democratização dos bens culturais, num mundo em que a valorização da cidadania se tornou um dos objetivos prioritários das políticas públicas.

Sr. Presidente, se as democracias desenvolvidas tomam todos esses cuidados para preservar seus empreendimentos no setor da informação e da difusão de bens culturais, temos de convir que os deveres do Brasil no capítulo são infinitamente superiores e com manifesto sentido de urgência. Basta ver os nossos déficits em matéria educacional, o que explica em parte a tiragem reduzida dos nossos jornais.

A isso se somam outras deficiências na produção e circulação de bens culturais, deficiências explicadas em larga medida pela fragilidade econômica do sistema de comunicação. Em suma, apresentamos um passivo nesse domínio que não pode ser comparado ao das grandes democracias européias.

É claro que a crise da mídia deve ser tratada como uma questão da sociedade, da cidadania. Mas temos que nos precaver em relação aos que, trabalhando com a noção um tanto sectária de cidadania, procuram desqualificar os grupos empresariais que garantiram e garantem ainda a modernização e atendem à exigência do pluralismo em nossa imprensa, rádio e televisão.

Sr. Presidente, vou concluir evocando a sábia reflexão do ex-primeiro-ministro francês Michel Rocard, hoje dirigente da Comissão de Mídia do Parlamento Europeu. No entender dele, não pode haver democracia estável, criativa, inovadora, capaz de traduzir os anseios de desenvolvimento humano em todos os domínios, sem o respaldo de um sistema de mídia pluralista. Para tanto, a segurança econômica e financeira das empresas de informação é tão importante quanto a liberdade de opinião garantida pela Constituição.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/03/2004 - Página 5678