Discurso durante a Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas à medida provisória que proíbe os bingos no Brasil. Apelo ao governo de Luiz Inácio Lula da Silva para que assuma uma posição clara em favor da flexibilização das regras do FMI.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
JOGO DE AZAR. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. DIVIDA PUBLICA.:
  • Críticas à medida provisória que proíbe os bingos no Brasil. Apelo ao governo de Luiz Inácio Lula da Silva para que assuma uma posição clara em favor da flexibilização das regras do FMI.
Aparteantes
José Jorge.
Publicação
Publicação no DSF de 05/03/2004 - Página 5690
Assunto
Outros > JOGO DE AZAR. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. DIVIDA PUBLICA.
Indexação
  • PROTESTO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), GOVERNO FEDERAL, EXTINÇÃO, BINGO, ALEGAÇÕES, DENUNCIA, ATO ILICITO, LAVAGEM DE DINHEIRO, JOGO DE AZAR, AUSENCIA, COMPROVAÇÃO, INVESTIGAÇÃO.
  • DEFESA, INSTALAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), INVESTIGAÇÃO, DENUNCIA, CORRUPÇÃO, BINGO, OBJETIVO, COMPROVAÇÃO, IDONEIDADE, EMPRESARIO, SUSPEIÇÃO, IRREGULARIDADE, ATUAÇÃO, POLITICO, RECOLHIMENTO, RECURSOS, CAMPANHA ELEITORAL.
  • CRITICA, ALEGAÇÕES, OBSTACULO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), DESEQUILIBRIO, ECONOMIA, POLITICA NACIONAL.
  • ANALISE, RECESSÃO, ECONOMIA NACIONAL, INCOMPETENCIA, GOVERNO FEDERAL, CONTRADIÇÃO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), OBEDIENCIA, FUNDO MONETARIO INTERNACIONAL (FMI), SOLICITAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, REVISÃO, POLITICA, RENEGOCIAÇÃO, DIVIDA EXTERNA, PRIORIDADE, CRESCIMENTO ECONOMICO.
  • DEFESA, APOIO, PAIS ESTRANGEIRO, ARGENTINA, NEGOCIAÇÃO, DIVIDA, FUNDO MONETARIO INTERNACIONAL (FMI), EXIGENCIA, ALTERAÇÃO, NORMAS, LOBBY, FAVORECIMENTO, BRASIL.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, o Governo, alegando prática de ilícitos em algumas empresas de bingo do País, edita medida provisória para extingui-las. A CPI do Banestado revelou a existência de evasão de divisas, de lavagem de dinheiro e prática de outros ilícitos por meio das instituições financeiras do nosso País. Pergunto: o Governo vai editar uma medida provisória acabando com os bancos no Brasil? Essa é a pergunta que se impõe neste momento.

Relativamente aos bingos, fala-se na hipótese de lavagem de dinheiro. Até hoje, nenhuma autoridade pública apresentou provas para que todos possamos acreditar na veracidade dessa denúncia.

O Coaf, ao contrário, em depoimento da Srª Adrienne Senna na CPI do Futebol afirmou que ao investigar cerca de 25 denúncias de lavagem de dinheiro por meio dos bingos não constatou a veracidade do fato.

Mas é bom dizer, os empresários do bingo no País desejam a instalação da CPI dos Bingos. É claro, é possível que exceções à regra existam. É possível que alguns empresários de bingos estejam praticando ilícitos e devam ser condenados. Mas a maior parte daqueles que operam bingos no País hoje desejam a instalação da CPI dos Bingos. Por quê? Porque estão cansados do achaque. Na verdade, a CPI dos Bingos vai investigar políticos que achacam empresários do bingo na arrecadação de recursos para as suas campanhas eleitorais. Até mesmo políticos bravateiros, aqueles que assumem o poder e fecham bingos, recolheram recursos de empresas de bingo para sua campanha eleitoral.

Quando o Presidente Lula vai enviar ao Congresso Nacional a medida provisória para acabar com os bancos no Brasil? Afinal, a CPI do Banestado já provou: não há apenas uma denúncia; há provas cabais de que há evasão de divisas e lavagem de dinheiro com a utilização de instituições financeiras no nosso País. Dois pesos e duas medidas, o Governo não pode adotar. De outro lado, o Líder Aloizio Mercadante afirma que com a medida provisória extinguindo os bingos encerra-se o assunto, não há mais necessidade de CPI. Eu não sabia, nobre Senadora Lúcia Vânia, que medida provisória se constituía em sentença judicial para a absolvição de quem quer que seja. Medida provisória é sentença judicial? Absolve alguém pela prática de ilícitos praticados? Não, Srs. Senadores. O Governo que mudou radicalmente conceitos, que sepultou postulados defendidos, dogmas acalentados durante muitos anos, altera também o conceito de instrumentos básicos, utilizados por ele para a sua ação administrativa. A medida provisória passa a ter, portanto, outra finalidade, já que o Governo quer que ela seja a absolvição, seja a sentença de absolvição para eventuais ilícitos praticados.

Outra barbaridade que se afirma é que instalação de uma CPI tumultua, perturba, paralisa o Governo e abala o mercado, como se nós estivéssemos ainda vivendo sob a égide de instituições democráticas fragilizadas. Sr. Presidente, eu pensei que não ouviria mais esta história. Está aí a CPI do Banestado, que identificou um escândalo monumental. Não se sabe o volume de recursos açambarcados desonestamente nesse que pode ser o maior escândalo financeiro da história deste País. Não há abalo algum. A CPI opera, investiga, trabalha, denuncia, anuncia providências e não acontece absolutamente nada. Nós estamos vivendo sob a égide de instituições democráticas consolidadas no nosso País. Portanto, são dogmas equivocados, sustentados ainda hoje por aqueles que buscam aplacar a própria consciência para negar à população brasileira o direito à transparência, o direito à informação sobre fatos fundamentais que implicam desperdício do dinheiro público, que tem origem nos impostos pagos com sacrifício pela sociedade brasileira, num País de carga tributária descomunal.

Dito isso, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, volto ao tema de ontem. Essa crise política, esse debate sobre roubalheira, essa discussão sobre moralidade pública, ou imoralidade pública, a revelação de que há uma bagaceira moral instalada no quarto andar do Palácio do Planalto não pode fazer com que nos esqueçamos de que há neste País uma crise econômica de profundidade, há uma recessão perversa que está penalizando milhões de brasileiros, sacrificados a uma subvida em função da insensibilidade e da incompetência do Governo.

Aliás, se pudéssemos legislar sob o ponto de vista da eficiência dos governos, o primeiro artigo deveria ser: o incompetente está proibido de postular cargo de governante do País. Quem não tem competência não deveria postular nada. Postular anunciando milagres, com promessas mirabolantes e depois assumir que não tem competência para resolver problemas e ficar chorando o passado, falando em herança maldita... Em herança maldita já falou Tutancamon, na XVIII dinastia egípcia. Portanto, não é um fato novo. Já na época dos faraós egípcios se justificava a incompetência responsabilizando antecessores. Quem não tem competência não deve postular cargo de importância no País. Que se postule cargo à altura de sua capacidade. Estamos vivendo uma crise econômica sem precedentes. Ou não estamos diante do maior desemprego da nossa história? Ou estou aqui inventando que estamos vivendo uma dramática crise econômica e social imposta pelo Governo do PT, que se dizia governo dos trabalhadores?

O Sr. José Jorge (PFL - PE) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Com prazer, ouço V. Exª

O Sr. José Jorge (PFL - PE) - Senador Alvaro Dias, venho me solidarizar com V. Exª. Tenho assistido aos pronunciamentos de V. Exª nessa mesma linha para mostrar as coisas erradas que o Governo está fazendo. No ano passado, depois de 10 anos, se não me engano, a economia decresceu 0,2%, e o atendimento social foi muito pior. Por exemplo, na área de educação, o Ministro levou um ano para apresentar o seu programa e logo que o fez foi demitido. Veio um novo Ministro, mas até agora nenhum projeto da área de educação foi enviado pelo Governo. Na área da saúde, a mais politizada, os técnicos foram substituídos por militantes principalmente do PT. O Governo não está indo bem na área social, não está indo bem na área econômica e agora não está indo bem na área ética. Como V. Exª disse, um funcionário que trabalhava no 4º andar do Palácio do Planalto, comandado pelo Ministro José Dirceu, foi apanhado em flagrante; há outro, o Sr. Marcelo Sereno, respondendo a uma CPI no Rio, que deu entrevista dizendo que não vai sair. Vejam a falta de autoridade do Governo! Um auxiliar de terceiro escalão que trabalha no Planalto, acusado de corrupção, sendo investigado por uma CPI, diz ao jornal que não vai sair. Quem manda neste Governo? Nobre Senador, sou solidário a V. Exª.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Obrigado, Senador José Jorge. Por acaso, ontem ouvi um jovem Deputado do PT, oriundo do movimento estudantil, dizer que não se provou nada contra o Sr. Waldomiro Diniz e que é a direita que está tentando desestabilizar o Governo Lula. Eu não sabia que a direita está tentando desestabilizar o Governo Lula. Vi aqui líderes da chamada direita - pelo menos, o PT sempre os marcou como direitistas - defenderem as posições do Governo para a não instalação de CPI no Congresso Nacional. Afirmar que não se provou nada contra o Sr. Waldomiro Diniz é demais. É demais! Não é prova uma fita de vídeo que mostra o Sr. Waldomiro Diniz negociando valores, discutindo percentuais de propina? Ora, onde estamos?

Quero pedir hoje ao Governo Lula que assuma uma posição de coragem perante o Fundo Monetário Internacional. Ou não foi o PT que durante tanto tempo desancou o Fundo Monetário Internacional? Agora o PT festeja nas churrascadas da Granja do Torto as imposições malignas do Fundo Monetário contra a economia do nosso País. Que mudança! Que mudança radical, inexplicável e danosa para os interesses do nosso País! Enquanto o mundo discute o desatrelamento às políticas impostas pelo Fundo Monetário Internacional, o Brasil, mais do que nunca, atrela-se e submete-se a elas, sendo aplaudido pelo Fundo porque obedece de forma disciplinada às suas imposições como o melhor de todos os alunos nessa escola da perversidade econômica internacional.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, vamos acabar com eufemismos, sem tentativa de suavizar o discurso, substituindo uma palavra ou uma expressão por outra mais agradável, mais polida. É conveniente que o Presidente Lula se caracterize de forma clara em favor da flexibilização das regras do Fundo Monetário Internacional.

Vamos deixar de meia conversa. Vamos deixar de implorar que se permita investimento de parcelas dos recursos do Fundo em saneamento básico ou em habitação. Vamos para um enfrentamento de natureza política. Isso nós pedimos em nome das tradições ideológicas do Presidente Lula, dos princípios defendidos por ele ao longo de um período de luta oposicionista, do qual compartilhamos em boa parte nos mesmos palanques, especialmente durante a campanha por eleições diretas.

A despeito dessa guinada vertiginosa do PT, estamos ainda admitindo a possibilidade de uma reversão de expectativa. Quem sabe o Presidente, numa noite, de madrugada, acorda desse pesadelo e assume posições anteriormente defendidas e propõe a renegociação da dívida nas condições pleiteadas pela sociedade brasileira, que implique a retomada do nosso crescimento econômico com a necessária geração de emprego para atender a milhões de brasileiros cada vez mais excluídos do processo produtivo nacional! O Brasil deve agora apoiar a Argentina. Que confrontemos com a Argentina no terreno esportivo, mas, politicamente, este é o momento de apoiar a Argentina, que saiu na frente. O Brasil é maior que a Argentina? É. Tem conceito internacional superior? Tem, mas está a reboque. O Presidente Kirchner saiu na frente. Vamos atrás agora.Vamos apoiar a Argentina. Vamos apoiar o Presidente Kirchner nas negociações que estabelece com o Fundo Monetário Internacional, para que sirvam de parâmetro, a fim de que o Brasil possa estabelecer negociações do mesmo nível, em futuro próximo, que possa permitir retirar a economia nacional dessa asfixia que a maltrata tanto.

Haverá o encontro de Lula com o Presidente da Argentina na próxima quarta-feira, em São Paulo. Que nesse encontro se acerte uma abordagem comum para as relações com os organismos financeiros internacionais. Vamos lá, Presidente Lula! Vamos seguir o exemplo do Presidente da Argentina. Vamos assumir uma postura mais corajosa. Vamos ser parceiros dele e vamos exigir novas regras do Fundo Monetário Internacional, porque há ambiente para isso internacionalmente.

As grandes nações estão pressionando o Fundo Monetário Internacional para que mude as regras do jogo em relação aos países em desenvolvimento. O Brasil perdeu a carona do bom momento da economia mundial. Não pode perder agora a carona nessa ação argentina em favor de novas regras com o Fundo Monetário Internacional.

É preciso travar amplo debate nacional. O Brasil não está debatendo essa questão. Estamos partindo do secundário, esquecendo o prioritário. Não há como discutir a crise econômica e social deste País sem discutir o atrelamento do Brasil ao Fundo Monetário Internacional. Não teremos políticas públicas internas capazes de superar a crise se não rompermos com essas regras impiedosas que o Fundo estabelece.

Tem de ser travado um debate em torno da reestruturação da dívida pública brasileira. É preciso pressionar, num primeiro momento, o Governo brasileiro e pressionar, sobretudo, o Fundo Monetário Internacional.

No Brasil, ao contrário da Argentina, o tema não despertou a atenção devida na opinião pública brasileira.

Temos que ser condutores deste debate. O Senado Federal tem que assumir a liderança relativamente a esse debate. Não podemos continuar pagando 9,49% do Produto Interno Bruto de juros da dívida.

            Em 2003, foram utilizados 145 bilhões. No pagamento da amortização da dívida, no ano passado, Lula desembolsou 412,9 bilhões, ou seja, 54,61% de todos os gastos do País, mais da metade, com educação, saúde, agricultura, infra-estrutura, na área social, no Fome Zero. Todos os gastos do País foram suplantados pelo gasto do Governo Lula com o pagamento da dívida. Isso não é possível!

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Sr. Presidente, vou concluir.

O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim) - Senador Alvaro Dias, quero dar oportunidade à Senadora Heloísa Helena. Em seguida, iniciaremos a Ordem do Dia.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Sempre tenho o maior prazer em ouvir a Senadora Heloísa Helena. Contribuirei para que S. Exª possa falar.

A omissão de Lula deixa um saldo de desconfiança em relação à solidez da nossa aliança com a Argentina. Refiro-me à omissão de Lula na crise da Argentina em setembro de 2003, em plena guerra com o Fundo Monetário Internacional. Quando a Argentina estava travando essa guerra com o FMI, Lula sumiu de cena e deixou Kirchner sozinho, abandonado. A Argentina, sozinha, isolada, acabou levando a melhor naquele embate com o Fundo Monetário Internacional.

Agora, o Presidente Lula tem a oportunidade de resgatar esse compromisso moral e de natureza política dos países em desenvolvimento, que diz respeito à solidariedade. É preciso ser solidário à Argentina para que também o Brasil possa se beneficiar dos novos parâmetros que aquele País vem alcançando nas negociações com o Fundo Monetário Internacional.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/03/2004 - Página 5690