Discurso durante a 15ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Despropósito da criação de uma CPI para os casos Waldomiro e Celso Daniel. (como Líder)

Autor
Renan Calheiros (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AL)
Nome completo: José Renan Vasconcelos Calheiros
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SENADO.:
  • Despropósito da criação de uma CPI para os casos Waldomiro e Celso Daniel. (como Líder)
Publicação
Publicação no DSF de 13/03/2004 - Página 6901
Assunto
Outros > SENADO.
Indexação
  • REITERAÇÃO, ANALISE, CRITICA, BANCADA, OPOSIÇÃO, NATUREZA POLITICA, TENTATIVA, CRIAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI).
  • ESCLARECIMENTOS, AUSENCIA, OBSTACULO, INVESTIGAÇÃO, POLICIA FEDERAL, MINISTERIO PUBLICO, DENUNCIA, CORRUPÇÃO, BINGO, EX SERVIDOR, PRESIDENCIA DA REPUBLICA.

O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB - AL. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nesta Casa todo mundo sabe que respeito profundamente o Senador Arthur Virgílio e que compreendo muito bem o papel da Oposição. Esse debate - o Senador Aloizio Mercadante já o disse aqui muito bem - é fundamental. É necessário que ele exista. O debate deve ser travado abertamente, para que o País compreenda nossas razões e nossos argumentos e possa eventualmente confrontá-los.

Quando digo que essa nova tentativa de CPI é política, eu o faço porque sabemos que esse requerimento já estava pronto há muito tempo, provavelmente aguardando o melhor momento para ser apresentado, o que acontece exatamente agora. E por que acontece só agora? Porque duas outras tentativas - dois outros requerimentos - não se viabilizaram, não se constituíram em Comissão Parlamentar de Inquérito porque foram politicamente esvaziadas: uma pela ausência de assinaturas mínimas; outra, Sr. Presidente, porque a Maioria entendeu e entende que não é momento de armarmos um palanque para fazermos uma investigação política, a não ser que essa investigação estivesse enfrentando obstáculos na Polícia Federal, no Ministério Público ou mesmo no Poder Judiciário, o que não é o caso. As investigações estão acontecendo - repito -, estão sendo aprofundadas, serão aprofundadas.

Já disse e repito também: a greve da Polícia Federal não paralisou a investigação. Durante toda a semana, houve vários depoimentos, foram colhidas provas. O País quer que isso se esclareça rapidamente. Os culpados precisam ser punidos. Não há aqui uma separação entre as pessoas que querem investigar e punir exemplarmente e as pessoas que não querem fazê-lo. Entendemos que isso deve ser feito no lugar certo. Não vamos criminalizar o dia-a-dia do Senado Federal. Este País não pode paralisar, e a nossa instituição também não.

Não existe restrição no Regimento do Senado Federal para a criação de Comissão Parlamentar de Inquérito. No Regimento da Câmara, sim. Na Câmara dos Deputados, somente cinco comissões de inquérito podem se instalar simultaneamente. Quantas não deixaram de ser criadas porque cinco já estavam em funcionamento! Aqui não, pode haver várias. Toda vez em que for necessária uma investigação política, precisaremos - a Maioria e a Minoria também - estar prontos para fazê-la.

O que a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania decidiu ontem, ao confirmar a resposta que o Presidente José Sarney deu a uma, duas, três questões de ordem, foi exatamente isto: que só a Maioria instala o Parlamento, que só a Maioria decide por ele. É o princípio da Maioria. Não é a ditadura da Maioria, mas a democracia da Maioria. Da mesma forma que não pode haver a ditadura da Maioria, não pode também haver a ditadura da Minoria.

O direito de criar uma Comissão Parlamentar de Inquérito é um direito constitucionalmente assegurado à Minoria, mas o direito de instalar a Comissão Parlamentar de Inquérito é um direito só assegurado à Maioria. Uma Comissão Parlamentar de Inquérito é fundamental à própria democracia, pois aprimora as instituições, corrige comportamentos. A CPI é fundamental, mas não é insubstituível quando os fatos estão sendo investigados pelos canais convencionais, como acontece agora.

É claro que amanhã vamos poder fazer Comissão Parlamentar de Inquérito, reunir a Maioria e a Minoria, apurar e investigar politicamente, dar resposta política, julgar politicamente, fazer o que já fizemos no passado, mas agora não, porque está parecendo algo obsessivo, uma música de uma nota só. A Oposição quer, de qualquer forma, fazer uma investigação política, criar uma CPI. Não importa qual a denúncia, pois qualquer uma serve, qualquer prazer diverte, e isso não pode acontecer porque paralisa o País. É esse o debate que temos que travar. Ontem, aguardamos o tempo todo para fazê-lo na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania e não pudemos fazê-lo.

A Oposição leu alguns poucos votos em separado e, toda vez em que usou a palavra, o fez para repetir o que entende do mérito da investigação. Não temos diferença com relação ao julgamento de como deve ser as investigações. É claro que elas precisam correr rapidamente. Inclusive, fiz um apelo para que essa greve da Polícia Federal acabasse logo.

A Polícia Federal brasileira - e fui Ministro da Justiça - é uma das polícias mais competentes do mundo, é uma das polícias menos violentas do mundo, é uma instituição respeitada no País, respeitabilíssima, para usar uma expressão mais forte. É claro que essa greve precisa acabar, é claro que o Governo tem que reabrir a negociação e dar para os grevistas o que pode dar, o que pode assumir e cumprir, o que pode fazer, mas não pode deixar essa greve continuar, porque ela não pode ser sinônimo de que a investigação não será aprofundada pela Polícia Federal. Temos que dar também essa resposta - que deve ser a primeira a ser dada -, assim como a resposta do esclarecimento e a da punição exemplar dos envolvidos. Não podemos ficar aqui cada dia discutindo uma CPI diferente.

A Maioria, democraticamente, decidiu que, neste momento, não haverá investigação política, porque entendemos que agora ela é desnecessária e temerária. O País não precisa dela. Ela só deverá ocorrer, se a Polícia Federal não cumprir o seu papel. Essa é uma posição pública, assumida por todos os Líderes dos Partidos que compõem a Maioria congressual. É esse o debate que deve ser travado. É disputa política? Sim, mas ela é inevitável.

Precisamos caminhar no rumo da construção de uma agenda positiva: votar a Lei de Falências, avançar na reforma do Judiciário, votar 17 medidas provisórias provenientes da Câmara dos Deputados que vão obstruir os trabalhos do Senado Federal. Dessa forma, amanhã, quando abrir o jornal, o leitor não entenderá que o País e o Senado estão paralisados, porque a Oposição quer ter o direito - é claro que ela o tem - de manter na pauta, na Ordem do Dia, essa discussão.

Vamos assumir a discussão, fazer um debate público, aberto, respeitoso como este, diferente daquele de ontem. Já nos acostumamos na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania a ver algumas coisas. Toda vez em que se usa um argumento que a Oposição não se sente muito à vontade para responder, as pessoas desequilibram-se, perdem o controle emocional e partem para a agressão. Ontem, ouvi um Senador - não me recordo quem - dizer que, a partir daquele momento, todos ali seriam inimigos. Isso não pode voltar a acontecer. Isso não engrandece o Senado Federal, nenhuma de suas Comissões, muito menos a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, talvez a mais importante do Senado.

Temos que fazer o debate claro, aberto, cada um assumindo uma posição e pagando o preço por isso. É claro que sabemos que cada posição que se assume nesta tribuna tem um preço, que deve ser pago, pois temos que cumprir o nosso papel. Isso é válido tanto para o Governo quanto para a Oposição. Mas o debate tem que ser profundo, consistente, equilibrado, tomado pelo bom senso, pela racionalidade. É preciso que se coloque em primeiro lugar o interesse do País e não o circunstancial interesse político e eleitoreiro.

Tenho a melhor convivência, o melhor relacionamento e o mais profundo respeito pelo Senador Arthur Virgílio e, aproveitando os últimos momentos da minha passagem pela tribuna, deixo isso absolutamente claro para o Brasil. Mas entendo, tal qual o Senador, que o debate é inevitável. Vamos ter que fazê-lo. Espero que não travemos apenas um único debate, que construamos rapidamente uma agenda positiva e possamos discutir esse e outras temas.

O Senador tem argumentos, a Oposição tem argumentos, a Maioria tem argumentos, o Líder Aloizio Mercadante expôs argumentos, e estou expondo argumentos. É natural. Esse confronto, no melhor sentido, continuará a ocorrer. Isso é muito bom para o País.

Ontem, enquanto não falávamos, muitas pessoas não sabiam o que estávamos discutindo na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, porque se passava para o Brasil a idéia de que estávamos querendo enterrar uma investigação política e acabar com a Comissão Parlamentar de Inquérito, de que o direito da Minoria de criar uma Comissão estava sendo sufocado, massacrado, de que estávamos relegando a Constituição Federal para um patamar inferior, de que o Regimento era omisso e de que, por causa dessa lacuna, tínhamos que obrigar o Presidente do Senado Federal a indicar os membros da Comissão. Como é que S. Exª pode obrigar alguém a participar de uma Comissão? O Regimento é claro, não há lacuna, não há omissão, não há nada; é isso que precisa ser esclarecido, e é por isso que esse debate tem que ocorrer.

Com relação à investigação do Waldomiro, esta deve ser feita na Polícia. O Waldomiro é culpado? Se for culpado, ele tem que pagar pelo crime que cometeu e ser exemplarmente punido.

Deve ser realizada a investigação sobre os bingos. Já houve uma CPI na Câmara dos Deputados. Repeti-la agora é repeti-la politicamente, mas essa investigação deve ser feita na Polícia. Se houver envolvimento de alguém com o narcotráfico, com o crime organizado, com a lavagem de dinheiro, ele terá que pagar por isso. O País quer que isso aconteça. A população não tem dúvida: quando diz que quer a criação da CPI é porque quer ver tudo absolutamente esclarecido.

No entanto, parar tudo, colocar o Governo contra as cordas, fazer uma investigação política para que alguns Partidos tirem dividendos sobre outros, é inadmissível, não vou concordar. O PMDB sempre defendeu essa posição e vai defendê-la sempre. Se o Partido que está no Governo fez isso no passado, não é problema do PMDB; é problema do Partido, que é hegemônico no Governo. A nossa posição é de coerência e, coerentemente, será defendida em todos os momentos em que houver necessidade de defendê-la.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/03/2004 - Página 6901