Pronunciamento de João Capiberibe em 16/03/2004
Discurso durante a 17ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Inclusão das despesas governamentais na Internet como forma de transparência e combate à corrupção.
- Autor
- João Capiberibe (PSB - Partido Socialista Brasileiro/AP)
- Nome completo: João Alberto Rodrigues Capiberibe
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.:
- Inclusão das despesas governamentais na Internet como forma de transparência e combate à corrupção.
- Aparteantes
- Eduardo Suplicy.
- Publicação
- Publicação no DSF de 17/03/2004 - Página 7243
- Assunto
- Outros > ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.
- Indexação
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- COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, PERIODICO, VEJA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), AUTORIA, STEPHEN KANITZ, JORNALISTA, ANALISE, PROBLEMA, CORRUPÇÃO, NECESSIDADE, QUALIFICAÇÃO, RECURSOS HUMANOS, AUXILIO, COMBATE, SITUAÇÃO.
- COMENTARIO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, APROVAÇÃO, COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO JUSTIÇA E CIDADANIA, FIXAÇÃO, OBRIGATORIEDADE, EXPOSIÇÃO, RECEITA, GASTOS PUBLICOS, INTERNET, FACILITAÇÃO, ACESSO, POPULAÇÃO, GARANTIA, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA, COMBATE, CORRUPÇÃO, PAIS.
- IMPORTANCIA, EXPERIENCIA, ESTADO DO AMAPA (AP), APERFEIÇOAMENTO, INFORMAÇÕES, EFICACIA, INSTRUMENTO, CONTROLE, FINANÇAS PUBLICAS.
O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco/PSB - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Sras e Srs. Senadores, além do diálogo que vou travar com este Plenário, gostaria, particularmente, de me dirigir aos telespectadores da TV Senado e da Rádio Senado, porque, nesta oportunidade, darei resposta ao Sr. Roberto Bencz, que me enviou um correio eletrônico do qual constava um artigo do colunista Stephen Kanitz, publicado na revista Veja em junho de 1999. Já faz um certo tempo da publicação desse artigo, quase cinco anos. O articulista fala da questão da corrupção e dos recursos humanos necessários ao seu combate, no caso, os auditores.
Esses temas estão diretamente ligados à questão da transparência nos gastos públicos. Quero agradecer ao Sr. Roberto Bencz pela iniciativa, tanto mais que o artigo continua atual, muito embora já com quase cinco anos de idade.
O debate político nacional, no último mês, passou a girar em torno da corrupção, em conseqüência do envolvimento de um alto funcionário da Presidência da República, hoje afastado das suas funções e respondendo aos devidos inquéritos. E não me consta que haja qualquer obstrução nas investigações realizadas pela Polícia Federal e pelo Ministério Público.
A corrupção é um problema grave que historicamente se entranha na maior parte das sociedades. Não se trata de um fenômeno brasileiro. É também internacional. A corrupção afeta países ricos e pobres. O combate à corrupção depende dos instrumentos e recursos importantes, inclusive humanos, para assegurar correta aplicação do dinheiro público. O Banco Mundial estima que a corrupção custa em torno de US$1,5 trilhões ao conjunto dos países. Esse valor corresponderia a 5% de toda riqueza mundial, 5% do PIB mundial. A corrupção é hoje objeto de preocupação de instituições como a ONU e a OCDE. Em dezembro último, 94 países assinaram um Tratado das Nações Unidas contra a corrupção, em Mérida, no México. Trata-se de um pequeno passo, ainda que tímido, mas importante.
Mas voltemos ao artigo de Stephen Kanitz. Segundo esse brilhante analista, a taxa de corrupção é inversamente proporcional ao número de auditores. Em outras palavras, quanto maior o número de auditores, menor a corrupção e quanto menor o número de auditores, maior a corrupção.
A Dinamarca e a Holanda, por exemplo, países com baixo índice de corrupção, possuem cem auditores para cada cem mil habitantes. O Brasil, que, infelizmente, não é considerado como modelo de honestidade no tratamento da coisa pública, tem apenas oito auditores para cada cem mil habitantes, doze mil e oitocentos auditores no total. Para alcançar o padrão da Dinamarca e da Holanda, teríamos que dispor de cento e sessenta mil auditores. Temos treze vezes menos auditores do que o que seria necessário.
Ainda segundo o artigo de 1999, uma das maiores universidades do Brasil possuía sessenta e dois professores de Economia, tendo apenas um professor dedicado à Auditoria. Como, portanto, formar milhares de fiscais, auditores internos, auditores externos, conselheiros de Tribunais de Contas, fiscais de bancos e da Comissão de Valores Imobiliários? Como vamos formar o pessoal necessário para prevenir e reduzir a corrupção?
Vejam este dado importantíssimo: há doze economistas no Brasil para cada auditor, enquanto que nos Estados Unidos a relação é inversa.
Estamos diante de um impasse. Necessitamos de recursos humanos qualificados para nos ajudar a combater a corrupção. Para isso, necessitamos de formar pessoal, o que leva muito tempo. Não nos cabe outra alternativa a não ser transformar a sociedade brasileira em auditores e controladores do Estado brasileiro. Nesse aspecto, citarei alguns exemplos que mostram a facilidade que a tecnologia da informática, da informação, pode nos proporcionar no controle do Estado.
Nesta Casa, tramita um projeto de lei, já aprovado, por unanimidade, na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, que torna obrigatória a exposição das receitas e das despesas pela Internet. Exatamente para favorecer a compreensão daqueles que nos acompanham, vou citar alguns exemplos que demonstram, com clareza, a facilidade com que qualquer cidadão pode acompanhar os gastos onde já estão disponíveis as informações. São duas instituições.
No site oficial do Estado do Amapá, qualquer cidadão pode acessar os gastos do Estado, porque ali estão todos os empenhos, que podem ser acessados na tela do seu computador pessoal. Nesses empenhos, constam o tipo do gasto realizado, o beneficiário, o valor e a descrição do material adquirido.
Começo dando o exemplo do Amapá por ser o mais antigo. Desde 2001, todas as despesas estão disponíveis. Avaliei na Internet os investimentos em pesquisa no Amapá nos últimos três anos. Levantei apenas três itens de despesa: gastos com diárias de pessoal, gastos com equipamento e material permanente e gastos com material de consumo. Esses três itens compõem o grosso das despesas, até porque toda a pesquisa depende do deslocamento de pessoal para campo, de material de consumo para o desenvolvimento de suas pesquisas e de compra de equipamentos.
Levantei todos os gastos em quinze minutos na Internet. Em 2001, nos três itens citados acima, o Amapá gastou R$2.965.581,72. Estou mencionando os centavos porque é uma informação oficial, uma informação contida em todos os empenhos de compras daquele Estado. Em 2002, as despesas com esses mesmos três itens caíram para R$2.414.089,57, e, em 2003, o valor foi para R$935.550,86, o que demonstra, com clareza, que a pesquisa no Amapá está relegada ao mais completo abandono.
O outro exemplo é o do Ministério da Ciência e Tecnologia, que também já dispõe dos dados referentes aos seus gastos na Internet. É um Ministério que está aprimorando as informações, que é o que quero demonstrar.
Para se verificarem os gastos, basta acessar o site geral do Ministério, entrar em “Projeto Transparência” e, então, em “Empenhos”. Pelo site do MCT, por exemplo, é possível detectar que o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, sediado em São José dos Campos, comprou uma unidade de cartucho de tinta para impressora, referência 51.645-A, por R$59,09 a unidade. O mesmo Instituto, sediado em Natal, no Rio Grande do Norte, pagou por um cartucho igual o valor de R$115,09. Portanto, como todos podemos ver, trata-se de um instrumento eficaz no controle da aplicação do dinheiro público.
É evidente que o auditor levanta informações. Se essas informações sobre as quais estou falando neste momento não estivessem na Internet e não fossem de fácil acesso, bastando digitar algumas teclas, levaríamos meses para consegui-las e talvez tivéssemos até que mover um processo judicial para poder recebê-las.
Há quinze minutos, foram tiradas da Internet as despesas do MCT de 2003, mas já estão na Internet as despesas de 2004. Acessei o campo “Diárias de Pessoal” e tive uma surpresa muito agradável. Eu soube que o Presidente do CNPq recebeu R$13.411,08 para uma viagem cujo roteiro era São Paulo, Johanesburgo, Cape Town, Johanesburgo, Maputo, Johanesburgo, Dubai, Delhi, Paris e São Paulo. Para que serviu a viajem? A informação que tenho é a de que ele viajou para participar de um encontro com o Ministro da Ciência e Tecnologia e com cientistas locais, visando à implantação do Pró-África e à assinatura de convênio entre o CNPq e o Conselho de Pesquisas Científicas e Industrial da Índia. Essa informação foi colhida há alguns minutos.
Vou dar uma outra informação, que precisa de complementação. Tenho aqui a primeira compra do ano de 2004 da Finep, a financiadora de projetos ligada administrativamente ao Ministério da Ciência e Tecnologia. Esse empenho, o de nº 2004NE000006, foi feito para a compra de água mineral. A descrição é a seguinte: “Valor que se empenha para cobrir despesas com fornecimento de água mineral para o escritório da Finep Brasília”. Foi pago por esse Empenho R$500,00. No entanto, não se diz a quantidade, se foi um copo, um litro, vinte litros ou cem litros. Evidentemente, esse tipo de informação, imprecisa, não nos ajuda de imediato, mas ajudaremos o Ministro, solicitando-lhe que determine à Finep (Financiadora de Estudos e Projetos) detalhar a informação e quantificá-la, além de especificá-la, para que cada cidadão possa acompanhar os gastos pela Internet.
Tenho aqui mais uma diária. Trata-se de todas as diárias, disponíveis pela Internet, de um técnico que viajou para Porto Alegre para uma reunião com a Petrobras e a Eletrobrás sobre projetos da planta-piloto para fabricação de módulos fotovoltaicos, ou seja, energia solar. É fundamental para o povo brasileiro que tenhamos uma planta produzindo as placas de energia solar. O valor é de R$470,85.
Enfim, há uma série de outros exemplos que essas duas instituições e o MCT (Ministério da Ciência e Tecnologia) estão-nos proporcionando.
O Ministro Eduardo Campos comprometeu-se conosco a ir além da emissão do empenho. S. Exª também vai colocar na Internet a ordem bancária, ou seja, a liquidação da despesa. Eis a importância dessa transparência para o cidadão contribuinte, porque ao consumidor é negada a autoria do pagamento do imposto neste País. Na verdade, o consumidor, que é quem paga Imposto sobre Circulação de Mercadoria e o Imposto Sobre Produtos Industrializados, não aparece como contribuinte. Quem aparece é o fiel depositário. É o comerciante que aparece como contribuinte. As listas dos contribuintes publicadas pelos governos estaduais, na verdade, são listas dos maiores arrecadadores da contribuição do cidadão.
Se um País nega a autoria da contribuição ao consumidor, imaginem, então, o que acontece com o resultado da sua contribuição! Imaginem o que acontece com o imposto pago pelo cidadão se a ele lhe é negada a autoria do imposto e da sua contribuição!
Portanto, nós teremos que mudar o tratamento dado à contribuição do cidadão e, mais do que isso, o tratamento dado aos gastos dos recursos do contribuinte. A Internet nos proporciona essa facilidade. Há várias instituições encarregadas de fiscalizar o Poder Público, como os Tribunais de Contas, que vão desde os Municípios - agora já não são todos os Municípios que dispõem - aos Estados e à União, as auditorias e as controladorias. Mas, como podemos observar, não dispomos de auditores, de pessoal qualificado para exercer o controle e a fiscalização. Portanto, nós temos a instituição, mas não temos o pessoal. Só nos resta ampliarmos a fiscalização para cada cidadão. Evidentemente, se tivermos a informação, não vamos nos deixar roubar. Poderemos acompanhar todas as emendas parlamentares, que já criaram graves problemas de desconfiança.
Quero até relatar que, há três anos, estive num distrito e vi - Senador Suplicy, em seguida passo a palavra a V. Exª - a constituição de uma agroindústria com recursos de um Ministério, resultado de uma emenda parlamentar. A obra estava parada há um ano, ficou pela metade, com o custo de R$ 180,00. Neste final de semana, voltarei ao meu Estado e visitarei essa obra para ver se foi concluída. Vou rastrear, por meio do Siafi.
A diferença entre o modelo que estamos propondo, de transparência absoluta e de acesso fácil ao cidadão, e o Siafi é muito grande. Vou acessar o Siafi porque, como Senador da República, tenho direito ao código e à senha para ter as informações que desejo. Queremos que as informações sejam abertas a todos, que cada cidadão tenha direito de saber os gastos de cada autarquia, de cada instituição pública do País.
Ouço o Senador Suplicy.
O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Senador João Capiberibe, quero cumprimentá-lo pela batalha que tem travado no Senado Federal em favor de um projeto de lei que visa a possibilitar a todo e qualquer cidadão a informação completa sobre como está se executando o Orçamento. A iniciativa empreendida por V. Exª como Governador do Amapá foi tomada como exemplo pelo Ministro da Ciência e Tecnologia, no Governo do Presidente Lula, e está frutificando. V. Exª tem interagido com outros parlamentares no Brasil, como, por exemplo, o Vereador Odilon Guedes, de São Paulo, que apresentou um projeto com o objetivo também de dar transparência ao acompanhamento dos gastos da Prefeitura Municipal.
(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)
O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Vou concluir, Sr. Presidente, com uma indagação ao Senador João Capiberibe. Pergunto a V. Exª quais são os eventuais gastos incorridos na proposta de V. Exª ao Executivo e, se eles existem, de que montante são. Por que essa pergunta? Porque, quando a Prefeita Marta Suplicy vetou o projeto - até dialoguei com o Secretário de Governo, Rui Falcão -, havia uma preocupação com respeito aos possíveis gastos que estariam sendo colocados, porque haveria uma exigência de imprimir e distribuir aquilo a uma série de organizações. Mas gostaria de bem compreender: no projeto de V. Exª, existe apenas a disponibilização em terminais aos quais teria acesso a população em geral? Teriam esses cidadãos a necessidade de ir a alguns lugares específicos para ter acesso àqueles terminais ou poderia qualquer pessoa que tenha acesso à Internet obter essa informação? Portanto, gostaria de saber se porventura há no seu projeto algum gasto que eventualmente seja de monta para que o Executivo proveja a transparência que nós, parlamentares, temos. Enfim, avalio que se trata de uma informação relevante. Até gostaria de propor que V. Exª continuasse a interagir com o Vereador Odilon Guedes, que tem interesse de conhecer esse aspecto que acabou resultando naquele veto. Mas não ocorreu por vontade da Prefeita ou do Secretário de Governo, que até teve o seu nome homologado recentemente para ser o Vice-Prefeito, se for reeleita a Prefeita Marta Suplicy. O encontro pode ajudar no diálogo entre a Prefeitura Municipal e a Câmara Municipal de São Paulo, que têm propósitos semelhantes ao de V. Exª.
O SR. JOÃO CABIPERIBE (Bloco/PSB - AP) - Senador Eduardo Suplicy, na verdade, não há gasto.
O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - É o que estava pressupondo. Daí a relevância. Eu quero enviar, depois, mais uma vez, a cópia do seu projeto com essa informação à Prefeita e ao Vereador Odilon Guedes.
O SR. JOÃO CABIPERIBE (Bloco/PSB - AP) - Pela simples razão de que a Prefeitura de São Paulo, como a maioria das Prefeituras, já está com o seu sistema orçamentário e financeiro informatizados. Assim como o Ministério da Ciência e Tecnologia também. Ele pegou apenas a base de dados correspondente aos empenhos - e mais tarde vai pegar a base de dados correspondente às ordens bancárias - e colocou na Internet, na própria página. O pessoal é o mesmo, a página está exposta na Internet, então, os custos são horas-trabalho de funcionários que já são pagos.
Para completar a informação, quem quiser poderá acessar a página www.mct.gov.br, no Projeto Transparência, e pesquisar todos os gastos das diversas instituições ligadas ao Ministério da Ciência e Tecnologia.
Para finalizar, gostaria de informar que encaminhei carta ao Presidente Lula solicitando audiência para apresentar o projeto a Sua Excelência. Se decidir politicamente, o Presidente poderá implantá-lo em menos de 72 horas em todos os entes federados de todo o Brasil.
Muito obrigado, Sr. Presidente.
O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Em que situação se encontra o projeto de V. Exª?
O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco/PSB - AP) - O projeto já foi aprovado na CCJ por unanimidade. Está na CAE.
O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Obrigado.