Discurso durante a 19ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Risco da decadência do setor de fumo.

Autor
Demóstenes Torres (PFL - Partido da Frente Liberal/GO)
Nome completo: Demóstenes Lazaro Xavier Torres
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
COMERCIO EXTERIOR. POLITICA INDUSTRIAL.:
  • Risco da decadência do setor de fumo.
Publicação
Publicação no DSF de 19/03/2004 - Página 7732
Assunto
Outros > COMERCIO EXTERIOR. POLITICA INDUSTRIAL.
Indexação
  • ANALISE, RISCOS, DECADENCIA, SETOR, PRODUÇÃO, FUMO, BRASIL, EFEITO, DESEMPREGO, AUMENTO, POBREZA, MOTIVO, NEGLIGENCIA, OMISSÃO, GOVERNO FEDERAL.
  • IMPORTANCIA, NATUREZA ECONOMICA, NATUREZA SOCIAL, SETOR, FUMO, MUNDO.
  • COMENTARIO, DADOS, ESTATISTICA, EVOLUÇÃO, PRODUÇÃO, FUMO, BRASIL, AMPLIAÇÃO, AREA, PLANTIO, IMPORTANCIA, VOLUME, EXPORTAÇÃO, SETOR, BALANÇA COMERCIAL, PAIS, EFEITO, MELHORIA, INDICE, EMPREGO.
  • NECESSIDADE, PROVIDENCIA, GOVERNO BRASILEIRO, SITUAÇÃO, DISCRIMINAÇÃO, CHARUTO, PROCEDENCIA, BRASIL, MERCADO EXTERNO, UNIÃO EUROPEIA.
  • APREENSÃO, REDUÇÃO, VENDA, CHARUTO, MERCADO INTERNO, MOTIVO, GOVERNO FEDERAL, CONCESSÃO, BENEFICIO FISCAL, PRODUTO IMPORTADO.

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, “se o governo comprar um circo, o anão começa a crescer”. Palavras de Antônio Delfim Netto.

Hoje, estou ocupando a tribuna desta Casa para retratar a realidade de um setor produtivo brasileiro que vem sofrendo descaso, abandono, discriminação e até mesmo injusta repressão por parte do Governo Federal, embora tenha a mais alta relevância do ponto de vista econômico e social. Trata-se do setor de fumo, manufaturado ou não.

O segmento empresarial responde no mundo pelo terceiro lugar em todas as transações de comércio internacional de agronegócios, tendo atingido a expressiva cifra de US$26 bilhões em exportações no ano de 2000, superada somente pelos negócios de frutas, incluindo seus sucos, e das carnes de boi, porco e frango, quando agregadas.

O Brasil é o segundo maior produtor de fumo em folha do mundo, depois da China, tendo superado os Estados Unidos da América a partir de 1997 e a Índia a partir de 2002. São 295 mil hectares plantados, 245 mil dos quais somente nos Estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. Vale lembrar que tal volume de produção permite, por um lado, renda estável e relativamente alta para os agricultores e, por outro, um produto que prima pela alta qualidade, mundialmente cobiçado. São 150 mil famílias de produtores somente na região Sul, com área média de 17,5 hectares, dos quais 2,6 destinados ao fumo, com a mais alta tecnologia do mundo.

Como um todo, o setor emprega mais de um milhão de pessoas. Veja bem, Sr. Presidente: mais de um milhão de pessoas empregadas neste momento de crise, direta e indiretamente, segundo dados da Associação dos Fumicultores do Brasil, Afubra. As exportações do setor lograram, no ano de 1998, o valor de US$1,6 bilhão, sendo US$1 bilhão em folhas, abaixo somente do complexo soja, café, couros e calçados e carnes, dentro do agronegócio. Atualmente, gera divisas de pouco mais de US$1 bilhão por ano para o nosso balanço de pagamentos.

Todavia, alguns números e fatos recentes mostram que o perigo da decadência é iminente, e, caso as ameaças se confirmem, vem aí mais desemprego e o agravamento da pobreza, por culpa exclusiva do Governo Federal, que tem se mostrado omisso ou que, quando age, opera sempre no sentido de prejudicar o segmento produtivo.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, estou falando de produtos principalmente para exportação, e a responsabilidade de regulamentação do consumo desses produtos cabe aos governos dos países para onde exportamos e que representam sociedades que não necessariamente têm os mesmos valores e posturas do Brasil perante o uso do tabaco. Aliás, 80% da produção física de fumo no Brasil é atualmente exportada para matrizes de gigantes multinacionais que não se interessam em agregar valor aos produtos dentro do Brasil e têm nessa política um forte aliado: o Governo Federal.

Srªs e Srs. Senadores, observem a situação da indústria do charuto no País. O Brasil já foi importante fornecedor do produto manufaturado para o mercado internacional até a década de 60, quando decaiu. Voltou ao mercado nos meados de 1980 e chegou a exportar US$1 milhão em 1997. A partir de então, foi virtualmente barrado na União Européia, devido a seus regulamentos do Sistema Geral de Preferências (SGP), que “graduaram” o Brasil, tornando-o o único país do mundo a pagar tarifa máxima erga omnes de 26%, enquanto outros países nossos concorrentes, classificados no SGP, pagam 9,1%, e os demais, tarifa zero. O resultado foi queda imediata de 90% em nossas exportações, enquanto o resto dos produtores mundiais auferiam ganhos decorrentes de aumentos brutais nas importações da União Européia, de US$46 milhões para US$100 milhões nos últimos dez anos.

Nossa “graduação” do SGP europeu deveu-se ao fato de o Brasil ter se tornado o maior exportador de fumo em folha do mundo. E, como a União Européia contempla em seus regulamentos o desempenho de todo o Capítulo 24 - produtos de tabaco em geral -, nosso crescimento na produção e exportação de matéria-prima nos legou o prêmio de banimento do mercado europeu de produtos acabados, onde detemos hoje um market share de menos de 1%. É uma maneira velada do mais legítimo colonialismo: às colônias, a produção de matérias-primas; às metrópoles, os produtos manufaturados. Não houve nenhuma manifestação, por parte do Governo Federal, contra tamanha discriminação comercial até meados do ano passado, quando, instadas pelo setor, as autoridades procuraram se informar e pedir explicações. Foram dadas as supostas explicações pela União Européia, e ficou por isso mesmo.

Em 22 de dezembro de 1999, o Governo brasileiro firmou com a República de Cuba o Acordo de Complementação Econômica nº 43, por meio do qual reduziu em 100% as tarifas incidentes sobre as importações brasileiras de charutos daquele país, com validade de três anos. Foi mais uma dentre as várias estocadas que o setor brasileiro de charutos tem recebido. Em 10 de junho de 2003, o Sindicato da Indústria do Fumo da Bahia solicitou à Camex que revogasse o benefício ao produto cubano, com o apoio ao produto brasileiro e pela extinção do prazo inicialmente aplicado. Não foi atendido, e o privilégio continua.

Como resultado, vimos perdendo mercado interno - pela entrada de charutos cubanos sem tarifas - e mercado externo, pela discriminação que a União Européia impôs sobre as importações de charutos brasileiros. Fica claro que se torna impossível sobreviver nessas condições de mercado.

Ressalte-se que a produção de charutos no Brasil é totalmente concentrada no Estado da Bahia, dada a qualidade de sua matéria-prima e a habilidade de sua mão-de-obra, especialmente a feminina. É uma indústria centenária, que emprega atualmente mais de três mil trabalhadores na agricultura familiar e no processamento industrial. Detemos hoje tecnologia, recursos maturais e empreendedores suficientes para nos tornarmos líderes mundiais no setor, mas é impossível “remar contra tamanha maré”, impulsionada por quem deveria cuidar dos interesses nacionais.

Some-se a tudo isso, ainda, uma carga tributária interna incidente sobre cigarros e charutos de 65,5%, estimada pela Abifumo. É óbvio que esse nível de carga tributária constitui uma tentação muito grande para a sonegação, pois mesmo baixos níveis de sucesso resultam em altos retornos financeiros. Por exemplo, 10% de vendas ilegais resultam em mais de 5% de retorno líquido, o que pode significar todo o lucro de uma empresa. Contra isso, há que se montar uma máquina administrativa e judiciária grande e de alta eficácia, o que não é o caso do Brasil. E ainda falam em aumentar essa carga tributária para inibir o consumo interno.

Sr. Presidente, não posso ficar insensível diante dessa situação, embora meu Estado, Goiás, nada produza de fumos, cigarros ou charutos. Antes de tudo, porém, sou brasileiro e tenho o dever moral de denunciar esse estado de descaso e injustiça. Temos que exigir das autoridades brasileiras negociadoras de comércio internacional imediata correção dessa situação, sob pena de aceitarmos passivamente a infame condição de colônia européia, da qual pensamos que somos libertos desde 1822. Essa correção pode ser feita por intermédio das negociações em curso entre o Mercosul e a União Européia para o acordo de livre comércio ou por um entendimento específico, tal como se realizou com o café solúvel, onde bastaria a gestão decisiva do Governo brasileiro para a consecução de um ajuste unilateral.

Conclamo todos os senhores para que se juntem a nós nessa cruzada, para que façamos chegar a todos os Governos e a todos os brasileiros nossa indignação contra um quadro que mais representa a ação destruidora da máquina governamental sobre um importante segmento da sociedade brasileira.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, particularmente não sou fumante, e não estamos falando no consumo interno do Brasil. Estamos falando na exportação, que hoje gera mais de R$1 bilhão para o Brasil, e há um milhão de empregados nesse setor.

Mas que setor é esse que consegue sobreviver com uma taxação, na Europa, de 26,5%, e no Brasil, de 65,5%? Enquanto isso, na Europa e no Brasil, o charuto cubano tem uma taxação zero. Parece brincadeira do Governo Federal.

Faço este alerta, para verificarmos se o Governo se sensibiliza nessas negociações e consegue viabilizar um setor que, no Brasil, pode ser o maior do mundo nessa área, em termos de exportações. Com isso, o País poderá expandir o seu nível de empregos e de exportações, aumentar a nossa balança comercial - naturalmente a nosso favor - e fazer com que terminem esses privilégios absurdos. Ninguém entende por que um charuto cubano tem de merecer um privilégio em relação ao charuto brasileiro.

Faço este pronunciamento, para que as autoridades brasileiras encarregadas, neste momento, de fazer essa negociação consigam na Comunidade Européia que o tratamento do charuto e do fumo brasileiros seja igualitário ao do charuto cubano e ao do fumo de outros países.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/03/2004 - Página 7732