Discurso durante a 27ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Justificativas ao projeto de lei do Senado, de autoria de S.Exa., apresentado nesta Sessão, que altera a Lei 8.080, de 19 de setembro de 1990, para vedar a fixação de teto financeiro para pagamento de hospitais públicos ou de ensino.

Autor
Heloísa Helena (S/PARTIDO - Sem Partido/AL)
Nome completo: Heloísa Helena Lima de Moraes Carvalho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • Justificativas ao projeto de lei do Senado, de autoria de S.Exa., apresentado nesta Sessão, que altera a Lei 8.080, de 19 de setembro de 1990, para vedar a fixação de teto financeiro para pagamento de hospitais públicos ou de ensino.
Publicação
Publicação no DSF de 31/03/2004 - Página 8769
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • SOLIDARIEDADE, DISCURSO, SENADOR, OPOSIÇÃO, EDIÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV).
  • GRAVIDADE, PRECARIEDADE, CONDIÇÕES DE TRABALHO, HOSPITAL, SETOR PUBLICO, HOSPITAL ESCOLA, FALTA, REMUNERAÇÃO, PROCEDIMENTO.
  • JUSTIFICAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUDITORIA, ORADOR, IMPEDIMENTO, FIXAÇÃO, LIMITAÇÃO, PAGAMENTO, HOSPITAL, SETOR PUBLICO, PROCEDIMENTO, SISTEMA UNICO DE SAUDE (SUS).

A SRª HELOISA HELENA (Sem Partido - AL. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, estou apresentando hoje um projeto de lei, e sei, como bem disseram o Senador Jefferson Péres e vários outros Senadores nesta Casa, que a nossa capacidade legiferante, a nossa obrigação de legislar, o nosso direito de legislar está comprometido, porque o Governo edita tantas medidas provisórias - evidentemente sem cumprir os requisitos constitucionais que exigem a simultaneidade de urgência e relevância -, que apresentamos simplesmente para nos sentir cumprindo com a nossa obrigação.

Mas, apesar de sabermos que, no mundo da política, geralmente sentimentos nobres, como companheirismo, afeto, solidariedade e amizade, não cabem; que, no mundo da política, o bom, o proveitoso é o oportunismo do mundo dos negócios - portanto, a mentira é que lá cabe muito bem -, estamos, mais uma vez, apresentando um projeto para vedar a fixação do teto financeiro para os pagamentos aos hospitais da rede pública e aos hospitais de ensino por atendimentos ou procedimentos efetuados no âmbito do Sistema Único de Saúde.

É evidente que em todos os lugares do País - Alagoas, Goiás, São Paulo - existe um problema gravíssimo, uma grave crise financeira nos hospitais públicos e, de uma forma especial, nos chamados hospitais de ensino. É claro que essa grave crise financeira por que passam os hospitais públicos e os hospitais de ensino nada tem a ver com gestão temerária, incompetência ou improbidade na gestão de recursos públicos. Pelo contrário, os hospitais públicos e os hospitais universitários têm tido uma inimaginável competência para continuar com as portas abertas, mesmo administrando as migalhas que caem do banquete farto proporcionado pelo Governo Lula aos banqueiros e ao capital financeiro.

Sabemos que essa situação deficitária se arrasta há muitos anos, pelo menos desde que a remuneração desses hospitais passou a ser calculada com base nos registros de atividades (prontuários, fichas de atendimento, exames etc.) e, posteriormente, transformada nas chamadas contas hospitalares para o reembolso das despesas.

Sabemos, Sr. Presidente, que a principal razão do problema é que, além de o reembolso às atividades prestadas ser calculado a partir de tabelas muito defasadas em relação ao verdadeiro custo dos procedimentos hospitalares, apenas uma parte desses atendimentos feitos é devidamente remunerada. Como todos sabemos, os hospitais conveniados, os privados, filantrópicos ou “pilantrópicos”, muitas vezes se sentem no direito de fechar as suas portas aos pobres - como falamos no jargão da área de saúde pública, “reprimir demanda” -, quando os valores pagos pelos procedimentos feitos estão aquém do procedimento realmente feito ou quando existe atraso no repasse desses recursos.

Senador Papaléo Paes, V. Exª e todos nós que somos da área de saúde pública sabemos o que acontece com o hospital público e com o hospital universitário. Esses hospitais não fecham as portas, não reprimem demanda. Atendem todos, especialmente os filhos da pobreza, aqueles que não têm recurso de seguro saúde ou um amigo médico ou enfermeira, alguém que de alguma forma possa intermediar o seu interesse imediato para o atendimento.

E o que acontece? Como os hospitais universitários e os hospitais públicos não fecham suas portas, não reprimem a demanda e, portanto, são obrigados a prestar todos os atendimentos, seja um atendimento mais simples, seja um atendimento de alta complexidade, ele não é remunerado pelo procedimento feito, em função do chamado teto do atendimento. É por isso que estamos apresentando um projeto para impedir a fixação do teto financeiro para os pagamentos aos hospitais de rede pública, aos hospitais de ensino, por atendimentos ou procedimentos efetuados no âmbito do SUS.

Todos conhecem os dados da Associação Brasileira de Hospitais Universitários e de Ensino (Abrahue), e sabem que, no caso dos hospitais universitários, eles não se predispõem apenas ao atendimento à população, à formação de pessoal não só capaz de indicar e aplicar técnicas de saúde adequadas, mas também de exercer crítica sobre a relação custo/benefício das mesmas; a contribuição para a formulação e execução de programas de prevenção de doenças; integração às unidades acadêmicas; e aprimoramento da qualidade assistencial, para levar à população os benefícios tecnológicos disponíveis.

Sabemos que os hospitais universitários são extremamente importantes. Embora eles não representem sequer 2% de todas as unidades hospitalares integradas à rede SUS - são mais de seis mil unidades; e os hospitais universitários, 150, sendo 45 ligados ao MEC -, mesmo assim são responsáveis por mais de 12% das internações.

Na área de alta complexidade, sua participação é bem maior, respondendo por aproximadamente metade das cirurgias cardíacas e neurológicas, 65% dos atendimentos para malformações craniofaciais e 70% dos transplantes.

No caso específico de Alagoas, são justamente as crianças com câncer, com doenças crônico-degenerativas, as mais atingidas, em função da não-remuneração dos procedimentos feitos pelos hospitais universitários.

Sabemos que existe uma crise financeira generalizada. Só nos 45 hospitais universitários vinculados ao MEC, a dívida já está superando mais de R$380 milhões. Por quê? Porque infelizmente é assim. Os hospitais públicos, os hospitais universitários atendem todos os filhos da pobreza e não têm o direito de fechar a porta, em função do preço da tabela para o procedimento, em função da ausência do repasse nos recursos. Enquanto a rede conveniada - que, ao longo da história, inclusive, investiu com recurso público no aumento da prestação de serviços de alta complexidade - recebe a maior remuneração, o hospital público e o hospital universitário não recebem.

Sr. Presidente, é evidente que eu queria que esse projeto fosse matéria de medida provisória. Caberia medida provisória, pois tem o caráter de urgência e relevância. Isso significa o atendimento de milhões de filhos da pobreza, de pessoas pobres que não conhecem o médico nem a enfermeira para atravessar a fila, pessoas que passam noites e mais noites nas filas, buscando um atendimento ou um papel para autorização de internação hospitalar. Por quê? Porque os hospitais universitários e os hospitais públicos atendem a todos, mas, muitas vezes, apenas 30 ou 40% desses procedimentos são remunerados. O Poder Público - o Ministério da Saúde, o Governo Federal - remunera a rede conveniada, a filantropia, a “pilantropia”, os hospitais privados, que ganham muito com o procedimento de alta complexidade, enquanto que o hospital público, capacitado e treinado, em condições de atender o procedimento de alta complexidade, atende mas não é remunerado em função da questão do teto.

Assim, Sr. Presidente, esperamos que esse projeto seja aprovado o mais rápido possível. Se o Governo tivesse um pouquinho de sensibilidade, faria uma medida provisória - já que faz medida provisória para qualquer porcaria! Pelo menos seria uma medida provisória para uma matéria que é simultaneamente urgente e relevante, pois abre a possibilidade de atendimento aos pobres. Sei que eles não são a prioridade número um do Governo, porque a prioridade número um é encher a pança dos banqueiros internacionais, agradar ao capital financeiro, ao tempo em que esvazia toda a área de políticas sociais para os filhos da pobreza neste País.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 31/03/2004 - Página 8769