Discurso durante a 27ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

"A farsa dos medicamentos", no Amapá. (como Líder)

Autor
João Capiberibe (PSB - Partido Socialista Brasileiro/AP)
Nome completo: João Alberto Rodrigues Capiberibe
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SENADO. ESTADO DO AMAPA (AP), GOVERNO ESTADUAL.:
  • "A farsa dos medicamentos", no Amapá. (como Líder)
Publicação
Publicação no DSF de 31/03/2004 - Página 8810
Assunto
Outros > SENADO. ESTADO DO AMAPA (AP), GOVERNO ESTADUAL.
Indexação
  • SAUDAÇÃO, VISITA, SENADO, PARLAMENTAR ESTRANGEIRO, PAIS ESTRANGEIRO, ITALIA.
  • ESCLARECIMENTOS, ATUAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), ASSEMBLEIA LEGISLATIVA, ESTADO DO AMAPA (AP), INVESTIGAÇÃO, DENUNCIA, EXCESSO, AQUISIÇÃO, MEDICAMENTOS, PERDA, PRAZO, VALIDADE, EPOCA, GOVERNO, ORADOR, CONCLUSÃO, INDICIAMENTO, EX GOVERNADOR, AUTORIDADE, GOVERNO ESTADUAL, ENCAMINHAMENTO, RELATORIO, MINISTERIO PUBLICO.
  • REGISTRO, PROVIDENCIA, PROCURADOR GERAL DE JUSTIÇA, REALIZAÇÃO, PERICIA, POLICIA TECNICA E CIENTIFICA, CONCLUSÃO, FRAUDE, INJUSTIÇA, ACUSAÇÃO, PERDA, VALIDADE, MEDICAMENTOS.
  • INFORMAÇÃO, APRESENTAÇÃO, DENUNCIA, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL, MINISTERIO DA SAUDE (MS), TENTATIVA, ACUSAÇÃO, ORADOR, EX GOVERNADOR, ESTADO DO AMAPA (AP).
  • DENUNCIA, IRREGULARIDADE, GOVERNO ESTADUAL, ESTADO DO AMAPA (AP), AQUISIÇÃO, MEDICAMENTOS, AUSENCIA, LICITAÇÃO.
  • JUSTIFICAÇÃO, PROJETO DE LEI, OBRIGATORIEDADE, DIVULGAÇÃO, INTERNET, NOTA FISCAL, EMPENHO, AQUISIÇÃO, SETOR PUBLICO.

O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco/PSB - AP. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, aproveito para cumprimentar as autoridades italianas que nos honram com sua visita a este plenário.

Sr. Presidente, quero fazer um esclarecimento sobre uma situação vivida no nosso Estado do Amapá, a qual a população denominou de “a farsa dos medicamentos”.

No dia 11 de janeiro de 2003, poucos dias após a posse do novo Governador, o Sr. Secretário de Saúde denunciou ter encontrado cinco toneladas de medicamentos com o prazo vencido. Essa notícia foi veiculada no Jornal Nacional, da Rede Globo, no dia 11, e teve imensa repercussão no nosso Estado. Logo em seguida, a Assembléia Legislativa instalou uma CPI para apurar as responsabilidades pelas cinco toneladas de medicamentos vencidos. A conclusão da Comissão Parlamentar de Inquérito foi de que a responsabilidade seria nossa, como Governador do Estado, e foi pedido o nosso indiciamento perante o Ministério Público, como também o do ex-Secretário de Saúde, Jardel Nunes, e o de mais dois outros funcionários da Secretaria Estadual de Saúde.

Meu indiciamento foi pedido sem que eu tivesse oportunidade de ser ouvido na Comissão Parlamentar de Inquérito da Assembléia Legislativa.

A partir da denúncia de toneladas de medicamentos vencidos, a Secretaria Estadual de Saúde passou a fazer compras de medicamentos sem licitação. Descobrimos, pela Internet, que, de um total de R$22,189 milhões, R$21,011 milhões de medicamentos foram comprados sem licitação - todas as contas do Governo do Amapá estão expostas na Internet; tenho todos os empenhos de compras de medicamentos realizadas em 2001, quando eu era Governador, e em 2003. A partir da denúncia de que haviam sido encontradas cinco toneladas de medicamentos, 94,69% de todas as compras foram feitas sem licitação.

A CPI instalada na Assembléia Legislativa concluiu o seu trabalho em outubro, responsabilizando-me. O Secretário de Saúde do Estado e os Deputados da CPI foram ao Ministério Público apresentar o relatório da CPI e também duas carretas de medicamentos vencidos - como está aqui na foto, as duas carretas tinham registrado, na lateral: “Medicamentos vencidos no Governo anterior”. Ou seja, responsabilizavam-nos por termos deixado os medicamentos vencerem.

O Procurador-Geral de Justiça, quando recebeu o relatório, foi comunicado de que essas duas carretas com cinco toneladas de medicamentos deveriam viajar, naquele mesmo dia, para a vizinha cidade de Belém, onde seriam incinerados. O Procurador então reteve esses medicamentos, enviou-os para o quartel da Polícia Militar e determinou que a Polícia Técnica realizasse uma perícia.

A Polícia Técnica nomeou cinco peritos, que, finalmente, no dia 15 de março, apresentaram o seu laudo ao Ministério Público. Os peritos analisaram item por item, unidade por unidade, de um total de mais ou menos 1,2 milhão de unidades.

Srªs e Srs. Senadores, fizemos um estudo sobre o resultado do laudo para saber o que dizia sobre tanto medicamento desperdiçado e perdido. Tenho aqui o resultado final.

O laudo indica que, do total de medicamentos encontrados nas duas carretas, 11,84% teriam vencido entre os anos de 1988 e 2002 - ou seja, no período do meu Governo; 36% teriam vencido entre abril de 2002 e 31 de dezembro de 2002; 43,31% venceram no ano de 2003. E, dentro da carreta - pasmem Srªs e Srs. Senadores! -, 8,7% dos medicamentos ainda estavam em condições de uso, ou seja, dentro do prazo de validade.

A partir do conhecimento do relatório da CPI, dei entrada no Ministério Público Federal em uma denúncia dizendo que naquelas carretas existiam medicamentos comprados com recurso federal, pedindo que fosse instalado o inquérito, que foi feito. A Polícia Federal foi acionada e, hoje, também está realizando perícia, porque considera essa situação muito grave.

Essa farsa foi pensada e desenvolvida por agentes públicos pagos com recursos do cidadão e que, portanto, não poderiam agir dessa forma.

Fiz um relatório e encaminhei denúncia ao Ministro da Saúde, mas, até hoje, não obtive resposta.

Das acusações elencadas pela CPI instalada na Assembléia Legislativa do meu Estado, estamos provando exatamente o contrário: todas as compras realizadas em 2001, meu último ano de mandato, foram feitas de acordo com a lei. As compras de 2003, sem licitação.

Já tive a oportunidade, durante a discussão do PLS nº 130, que torna obrigatória a exposição em tempo real das notas de empenho e das compras públicas, de demonstrar indícios fortes de superfaturamento nas compras de medicamentos. No entanto, o Ministério Público estava conduzindo o inquérito numa outra direção. Agora, com o laudo da Polícia técnica, o Ministério Público Estadual tem a obrigação de esclarecer quem colocou medicamentos ainda não vencidos dentro daquela carreta, por que estas continham a inscrição de medicamentos vencidos na administração anterior, se esses medicamentos venceram em 2003 e se os medicamentos, durante o ano todo, foram comprados sem licitação - e ali há vários indícios de superfaturamento na compra desses medicamentos.

É isso que desejamos esclarecer, mas queremos mais: que o Ministério Público Federal, tendo em vista o uso de recursos públicos na compra desses medicamentos, rastreie a sua distribuição nos postos de saúde e nas unidades hospitalares, porque isso é simples de ser feito. Precisamos esclarecer esse fato, porque uma das acusações feitas pela CPI dos Medicamentos é que, no meu Governo, havíamos comprado remédio em excesso e, por isso, ele havia sido desperdiçado. Na verdade, compramos o absolutamente necessário para atender à população.

Em 2003, houve problemas graves no sistema de saúde do nosso Estado, com a ocorrência de uma epidemia de dengue, aqui denunciada, que atingiu milhares de famílias. Não houve controle para se saber quantas pessoas contraíram a doença no Amapá. Inclusive, o Senador Papaléo e a sua família contraíram dengue, bem como vários de meus familiares. E não temos como nos defender, porque não há iniciativa nesse sentido. O que fazem a Secretaria Estadual de Saúde e o Governo do Amapá? Conspiram, produzem provas falsas para acusar os seus adversários.

Portanto, Sr. Presidente, tenho um relatório completo que voltarei a encaminhar ao Ministério da Saúde, porque precisamos que este tome providências. Sabemos que a corrupção, neste País, mata milhares de pessoas. Não há criminoso pior do que o ladrão de dinheiro público, porque quando ele o desvia condena milhares de pessoas ao sofrimento e à morte. Aqui está: medicamentos de controle da Aids que não existiam nos hospitais públicos estavam nessa carreta, ainda dentro do prazo de validade. Nós precisamos investigar isso.

É por isso, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que esse trabalho de rastreamento dos desempenhos, que pode comprovar tudo o que falo da tribuna do Senado, só foi possível graças à transparência e à exposição dos empenhos na Internet. Sem isso não haveria como se conhecer o custo das compras desses medicamentos. Foi por meio da internet que descobrimos a monstruosa farsa dos medicamentos no Amapá.

Quando todos os entes públicos deste País, todos aqueles que trabalham com o dinheiro do cidadão, se virem obrigados a expor na Internet as suas notas de compras, tenho convicção de que estaremos começando um caminho de mudança, de republicanização do Estado brasileiro e de respeito à contribuição de todos os brasileiros.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 31/03/2004 - Página 8810