Discurso durante a 32ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Defende a aprovação da Medida Provisória 157, de 2003, que permite o porte de armas de fogo às guardas municipais.

Autor
Romeu Tuma (PFL - Partido da Frente Liberal/SP)
Nome completo: Romeu Tuma
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA.:
  • Defende a aprovação da Medida Provisória 157, de 2003, que permite o porte de armas de fogo às guardas municipais.
Publicação
Publicação no DSF de 07/04/2004 - Página 9606
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • NECESSIDADE, APROVAÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), AUTORIZAÇÃO, PORTE DE ARMA, ARMA DE FOGO, GUARDA MUNICIPAL, OBEDIENCIA, CRITERIOS, QUANTIDADE, HABITANTE, MUNICIPIOS.
  • ANALISE, VANTAGENS, FORMAÇÃO PROFISSIONAL, GUARDA MUNICIPAL, ACESSO, EQUIPAMENTOS, ARMA DE FOGO, MELHORIA, ATUAÇÃO, COMBATE, CRIME, CONTRIBUIÇÃO, EFICACIA, SEGURANÇA PUBLICA, COMPLEMENTAÇÃO, TRABALHO, POLICIA MILITAR, POLICIA CIVIL.

O SR. ROMEU TUMA (PFL - SP. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores: desde abril de 2002 - há dois anos, portanto -, uma Proposta de Emenda à Constituição cochila em “regime de urgência” na Câmara dos Deputados, após ter sido aprovada por unanimidade neste Plenário.

Tivesse sido ali examinada sem delongas, não estaríamos a nos defrontar com esta embaraçosa discussão sobre um dos problemas que mais afligem e preocupam o País, isto é, o combate à criminalidade violenta com o emprego de todos os recursos legais à disposição do poder público.

Não digo isso apenas por ser o autor daquela PEC, que recebeu no Senado Federal o n.º 87/1999 e, na Câmara, o n.º 534/2002, mas também porque há cinco anos vejo o nosso Poder Legislativo discutir o problema sem resultados concretos, enquanto o crime campeia à solta nos centros urbanos, numa escalada de violência sem precedentes em nossa História.

Ao votar agora a Medida Provisória 157/03, estaremos deliberando sobre uma variante daquele PEC. Isto é, decidiremos se os municípios com população entre 50 mil e 500 mil habitantes poderão fornecer armas de fogo aos seus guardas, medida aliás já adotada na prática, antes da promulgação do Estatuto do Desarmamento, por força das circunstâncias e sob a fiscalização do Exército.

Na verdade, estaremos decidindo se as prefeituras podem dispor de meios para cooperar efetivamente com as organizações incumbidas da segurança pública. Trata-se, a meu ver, de algo muito mais consistente do que debater, por exemplo, o emprego das Forças Armadas no policiamento ou o agravamento das sanções criminais até o nível da pena de morte.

Nossa deliberação não alcançará, porém, a dimensão que adquiriu durante o exame daquela PEC. Ou seja: acontecerá à margem daquela proposta, que objetiva conferir, através de convênios entre municípios e Estados, poder de polícia às guardas municipais criadas de acordo com o disposto no Artigo 144 da Constituição Federal. Dariam elas assim apoio às polícias militares e civis, após receber equipamentos e formação técnico-profissional adequados, às custas do erário municipal.

Todavia, a decisão deste Plenário, hoje, também será das mais importantes. Implica a escolha entre dar meios ao agente da lei para que possa garantir a segurança dos cidadãos e de seu patrimônio ou deixá-lo à mercê da sanha dos bandidos, impotente para defender a si próprio e as pessoas que deverá proteger.

Em última análise, debatemos o dever de o poder público municipal contribuir para a segurança da população, complementando a ação do Estado, e, por conseqüência, o direito de dispor dos instrumentos necessários a esse mister. Este precisa ser o nosso enfoque principal, notadamente por se assestar para municípios pequenos, aqueles que mais necessitam da ação das guardas porque contam com os menores contingentes policiais. Neles, os efetivos de guardas municipais que patrulham as vias públicas são maiores que os de policiais civis e militares.

Lembro-me de que, há dias, o prefeito de um município do Interior de São Paulo, abrangido pela faixa de população determinada na Medida Provisória 157/03, liderou manifestação popular de grande repercussão na mídia porque a única delegacia de polícia local, além de possuir apenas meia dúzia de funcionários, encerra as atividades às 17 horas, diariamente, exceto aos sábados, domingos e feriados, quando não funciona.

Creio, porém, que o governo editou essa Medida Provisória não por haver cedido a pressões de prefeitos, mas sim por se curvar a uma realidade que se encontra em flagrante contradição com o preconizado no Estatuto do Desarmamento na parte relativa às guardas municipais.

Ouvi aqui o temor de que essas corporações poderiam transformar-se em guardas pretorianas de prefeitos interioranos. Poderiam eles adquirir poder capaz de inibir adversários. É a exceção tomada por regra e, mesmo assim, com base em hipóteses. Se acolhêssemos esse raciocínio, chegaríamos ao absurdo de concluir que, para garantir lisura na política, há necessidade de desarmar todas as organizações destinadas à execução da segurança pública.

Ouvi também existir possibilidade de desvirtuamento das guardas pelos prefeitos devido aos usos e costumes díspares, que pontilham nossas dimensões continentais. Daí - presumo - haver necessidade de adequar a Medida Provisória às características regionais ou derrogá-la simplesmente. Entretanto, se aceitássemos essa argumentação, estaríamos abdicando do dever imposto ao Poder Legislativo central pela Constituição. Deixaríamos a cada Estado e a cada município a atribuição de legislar, de acordo com conveniências e cultura regionais, sobre matéria de competência exclusiva da União. Estaríamos implodindo a Nação.

Ora, Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, vivemos num Estado democrático de direito, sob o império da lei e não do arbítrio de quem quer que seja, ainda mais quando prefeito de um diminuto município interiorano. Mantenhamo-nos firmes na linha de maior interesse que deve ser, indiscutivelmente, o aprimoramento do sistema de segurança pública para implementar o axioma que diz: a presença policial inibe o crime. Incrementemos o policiamento dentro das normas estritamente legais para que cumpra, com a melhor técnica de prevenção dos delitos, os preceitos democráticos que garantem o direito à vida, à integridade física e à propriedade. É isso que o povo brasileiro almeja, sem entender como poderemos exigir atuação eficaz de um poder público vedando-lhe os recursos necessários enquanto, ao mesmo tempo, incentivamos que se arme um exército particular de mais de meio milhão de homens para proporcionar segurança privada a quem tenha condições de lhe custear os gastos.

O texto original da MP merece aprovação porque quem exerce atividade policial o faz durante as 24 horas do dia, mesmo não estando “em serviço”. Tanto é verdade que, em todo o País, se exige dedicação exclusiva aos cargos compreendidos nessa função pública. Além disso, há o aspecto da segurança do próprio policial, alvo permanente dos meliantes que combate. Chegam a ser corriqueiras as ocorrências nas quais policiais fora de serviço são friamente executados no momento em que bandidos desconfiam de sua condição profissional. Como privá-los, então, da arma necessária a sua segurança pessoal?

Alguém dirá que o guarda não é um policial. Entretanto, não é dessa forma que a população pensa. Até no noticiário de imprensa, com relação às ocorrências atendidas por guardas municipais, observa-se a repetição de frases como “os policiais” e “ação da polícia”.

O trabalho do guarda, na prática, em termos de vigilância ostensiva preventiva, em quase nada difere do policial. Em muitas cidades, inclusive do meu Estado, que se aponta como possuidor de uma das melhores estruturas de segurança pública no País, a população precisa contar com sua guarda municipal para desfrutar de alguma tranqüilidade. Daí o meu entendimento de que os municípios devem cooperar com os respectivos Estados nos trabalhos de segurança pública, pois as cidades, mesmo as de maior massa populacional, carecem de policiais em número suficiente para garanti-la, principalmente nas áreas periféricas.

Rotineiramente, os guardas municipais já agem em apoio, tanto à Polícia Militar, como à Civil. E, a exemplo destas, são alvo do ódio dos marginais, como se viu há pouco tempo durante atentados praticados por organizações criminosas existentes em meu Estado.

O fato é que, caso aquela PEC houvesse recebido, na Câmara dos Deputados, a mesma atenção dedicada pelo Senado da República, este assunto de há muito já estaria resolvido. As guardas existem. São marcantes no apoio às autoridades policiais, como demonstraram em inúmeros acontecimentos, a exemplo dos seqüestros da filha do empresário Sílvio Santos e do publicitário Washington Olivetto. Constituem uma força organizada ponderável, que o poder público deve empregar na segurança pública neste momento de aflição causado pela escalada de criminalidade violenta.

Contam-se aos milhares os casos em que, quando estavam patrulhando algum próprio municipal, inclusive escolas, os guardas defrontaram-se com a prática de crimes e efetuaram a prisão dos autores, conduzindo-os imediatamente ao distrito policial da área ou apresentando-os a uma guarnição da PM. Aliás, essa atitude é facultada a todos os cidadãos, pois, de acordo com a lei, qualquer pessoa pode - e, se for policial, deve - prender em flagrante quem cometa um crime. O Artigo 144 da Constituição afirma ser a segurança pública “direito e responsabilidade de todos.” Dessa forma, a PEC pretende apenas disciplinar uma situação de fato para evitar má interpretação e desentendimentos.

O exercício desse poder de polícia dependerá também de legislação infraconstitucional, a ser produzida pelo Congresso após a aprovação da PEC. Estas leis deverão considerar ainda a adequada formação profissional dos guardas, através de treinamento pelas atuais academias de Polícia ou por órgãos municipais criados especificamente para isso.

E tudo isso por quê? Simplesmente porque estamos pagando agora pela omissão governamental, durante décadas, num dos campos mais nevrálgicos de suas atribuições fundamentais, qual seja, a segurança pública. Precisamos correr para nos posicionar adiante do crime, precisamos deixar de lhe ficar a reboque. Devemos motivar o poder público municipal a dar sua contribuição nessa corrida, ao contrário de desestimulá-lo com hipotéticas suspeitas ou castrá-lo no momento em que mais precisamos de sua ação . Façamo-lo agir, de maneira a apoiar o esforço nacional contra o banditismo. Estendamos o porte de arma de fogo às guardas de municípios com população entre 50 mil e 500 mil habitantes com a certeza de que estaremos promovendo ampla melhoria da segurança pública. Evidentemente, ainda não é o ideal e precisaremos retomar o assunto, no futuro. Os acontecimentos incumbir-se-ão de demonstrar a incoerência em vincular o porte de arma pelos guardas à quantidade de munícipes que irão servir. Seu trabalho sempre será o mesmo, tenha ou não o município 50 mil habitantes, inclusive a liberdade para a criação das Guardas nas regiões metropolitanas, independente do número de habitantes, tese que, inclusive, deveria valer para todos os municípios.

Obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/04/2004 - Página 9606