Discurso durante a 35ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

As ONGs internacionais e a questão indígena no Estado de Roraima.

Autor
Augusto Botelho (PDT - Partido Democrático Trabalhista/RR)
Nome completo: Augusto Affonso Botelho Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INDIGENISTA.:
  • As ONGs internacionais e a questão indígena no Estado de Roraima.
Publicação
Publicação no DSF de 14/04/2004 - Página 10167
Assunto
Outros > POLITICA INDIGENISTA.
Indexação
  • SOLICITAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, FISCALIZAÇÃO, ATUAÇÃO, ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG), AMBITO INTERNACIONAL, TERRITORIO NACIONAL, ESPECIFICAÇÃO, INFLUENCIA, DEMARCAÇÃO, TERRAS INDIGENAS, ESTADO DE RORAIMA (RR), SUSPEIÇÃO, INTERESSE, RECURSOS MINERAIS, REGIÃO.
  • QUESTIONAMENTO, AUSENCIA, RACIONALIZAÇÃO, PROCEDIMENTO, DEMARCAÇÃO, TERRAS INDIGENAS, ESTADO DE RORAIMA (RR), PREJUIZO, MUNICIPIOS, POPULAÇÃO, PRODUTOR RURAL, REGIÃO, ECONOMIA, AMBITO ESTADUAL.

O SR. AUGUSTO BOTELHO (PDT - PR. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ocupo esta tribuna, no dia de hoje para tratar de tema de altíssima relevância, não só para a população de Roraima, mas também para todo o País. Trata-se da questão da atuação ou, melhor dizendo, da ingerência das ONGs Internacionais nos assuntos relativos à demarcação de terras indígenas.

O meu querido Estado de Roraima, nos últimos meses, tem freqüentado a mídia como nunca antes visto. Todos os telejornais têm abordado, de forma emocionada ou não, os problemas advindos da anunciada homologação da área indígena denominada Raposa/Serra do Sol.

As manifestações contrárias que se seguiram à declaração do Ministro Márcio Thomaz Bastos de que a homologação se daria nos moldes de uma área contínua não partiram somente dos índios e não-índios que ocupam a região pretendida, mas também de cidadãos que habitam os diversos rincões do Estado.

Rodovias foram interditadas, um clima de tensão tomou conta do Estado. No meio do tumulto que se estabeleceu em Roraima, alguns jornalistas, numa leitura distorcida do evento, chegaram a falar em morte e até de espancamento de missionários.

No frigir dos ovos, restou e ainda resta, não adequadamente respondida uma pergunta: “se a maioria dos índios, ocupantes da área Raposa/Serra do Sol e a quase totalidade dos não-índios ocupantes da mesma área são contra uma demarcação contínua, por que então realizá-la dessa forma?”.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não sou contra a demarcação de terras indígenas e, nesse sentido, já me pronunciei em várias oportunidades. Todavia, o procedimento demarcatório deve ser pautado pelo mínimo de razoabilidade. Aliás, este princípio tem no Senador Mozarildo Cavalcanti o seu mais ardoroso defensor aqui no Senado.

Demarcar de forma contínua a área Raposa/Serra do Sol significará um desastroso evento para os habitantes do meu Estado, sobretudo sobre a economia e para a sociedade em geral. Certamente, a estabilidade das relações sociais ficarão seriamente comprometidas, com de fato ficou, com o mero anúncio da homologação.

Com a demarcação de forma contínua da Raposa/Serra do Sol, dois municípios - Normandia e Uiramutã - simplesmente desaparecerão do mapa. Estas duas municipalidades contam, hoje, com uma vigorosa infra-estrutura urbana, um comércio significativo e, principalmente, são palco de uma amistosa relação entre índios e não-índios que perdura a mais de 200 anos.

Em Pacaraima, Uiramutã e Normandia, pode-se constatar a maciça presença dos índios na estrutura de poder, na posição de prefeitos e vereadores. Os índios participam, democraticamente, dos mecanismos de formação da vontade dessas importantes municipalidades e vasta parte deles já está totalmente integrados às formas de vida dos não-índios, não sendo raro os que se ocupam do comércio, e há até os que já galgaram as cadeiras das faculdades.

Além disso, a demarcação de forma contínua representará a expulsão de produtores de arroz, milho, feijão etc., que há muito lá se estabeleceram, mesmo antes de as áreas por eles hoje ocupadas serem declaradas como áreas indígenas. A homologação de demarcações anteriores, procedidas sem qualquer indenização e adequado reassentamento, tem gerado verdadeiros bolsões de pobreza na Capital, formado por antigos proprietários ou posseiros advindos de terras indígenas.

Por fim, a demarcação, da forma que pretende o Ministério da Justiça, unirá cinco tribos indígenas numa mesma área geográfica. Isto irá representar, futuramente, um choque entre etnias que, ao certo, não se coaduna com o desejo do Governo Federal de conservar os índios em sua integridade física e sua cultura.

Vale aqui abrir parêntese para dizer que a demarcação contínua da Raposa/Serra do Sol representará a afetação de uma área de um milhão e setecentos mil hectares. Com o atendimento da nossa reivindicação, consistente em realizar uma demarcação que preserve vilas, estradas e terras produtivas, será excluída somente 6% da referida área.

Sr. Presidente, estas são, grosso modo, as principais conseqüências que advirão da homologação, de forma contínua, da área Raposa/Serra do Sol.

Cabe, neste quadrante, realizar a seguinte indagação: “por que demarcar desta forma a reserva indígena Raposa/Serra do Sol, se os problemas que daí advirão são incalculáveis e de conseqüências imprevisíveis?” E mais. A que interesses serve esta demarcação?

Sr. Presidente, a resposta é tão evidente que salta aos olhos de qualquer pessoa que se interesse, realmente, pelo bem-estar do Brasil. Por trás da demarcação contínua da Raposa/Serra do Sol estão os interesses dos Países ricos do planeta que se fazem representar por ONGs. Estas, na sua grande maioria travestidas de entidades protetoras dos índios, atuam sob o olhar complacente do Governo Federal, de maneira desenfreada.

Dotadas de um incalculável poder financeiro, haja vista o poderio dos Países patrocinadores, as ONGs conseguem o que querem e a qualquer preço.

Se demarcar uma terra indígena for sinônimo de morte, desemprego e sofrimento, não pensarão duas vezes estas ONGs antes de lançarem mão de seus poderosos lobbies para que se proceda à demarcação.

O próprio Presidente da República, em visita ao Estado do Acre no ano passado, afirmou, sem titubeio, que as ONGs internacionais possuem mais poder de pressão do que os próprios partidos políticos do Brasil.

O mais interessante, nisso tudo, é que as áreas indígenas demarcadas no meu Estado, estão situadas, coincidentemente ou não, sobre incalculáveis riquezas minerais. Aliás, de a muito é do conhecimento dos Países ricos do mundo, o fato de Roraima ser uma das maiores províncias minerais do Planeta.

            A área Raposa/Serra do Sol possui, em seu subsolo, uma enorme jazida diamantífera, além de outros minerais nobres como ouro e urânio. Da mesma forma, a já homologada e registrada reserva indígena Yanomami, cuja extensão avança por vasta área do meu Estado (uma área correspondente ao território de Portugal), possui inesgotáveis reservas de minerais nobres, como ouro, diamante, vanádio, nióbio, dentre outros.

Diante dessa coincidência entre as áreas demarcadas e o rico subsolo, temos o dever de fazer uma nova indagação: as ONGs Internacionais estão realmente querendo preservar o índio, sua cultura e tradição, ou estão interessados, de fato, no rico subsolo sobre os quais as reservas se assentam? Lembrando que, quando se demarca uma terra indígena, torna-se de todo impossível a exploração dos recursos naturais situados na reserva.

Acredito não só que o interesse é pelo subsolo, como acredito que as ONGs estão querendo, também, nossa biodiversidade. Aliás, o tema “Biopirataria” está na ordem do dia, e seria estultice minha acreditar que as ONGs não estão se aproveitando das reservas indígenas para praticar este odioso crime. Estão, inclusive, se aproveitando, ou melhor, se locupletando, às custas dos conhecimentos tradicionais de nossos índios.

É um absurdo perceber que os estrangeiros, membros de ONGs, tem mais facilidades de transitar e permanecer numa área demarcada do que o próprio exército ou polícia federal.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, termino este pronunciamento fazendo um apelo ao Governo Federal para que realmente fiscalize e monitore a atividade dessas ONGs internacionais em nosso território.

Estas ONGs não podem contar mais com os olhares complacentes do Governo e atuarem ao seu bel-prazer, sob pena de a tão propalada internacionalização da Amazônia ganhar dimensões irreversíveis.

É o que tinha a dizer.

Muito obrigado!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/04/2004 - Página 10167