Discurso durante a 36ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários a respeito de seminário no Rio de Janeiro sobre avaliação do Governo Lula. Comentários ao artigo "Vendeta na Reforma Agrária", de autoria de Xico Graziano, publicado no jornal O Estado de S.Paulo.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. REFORMA AGRARIA.:
  • Comentários a respeito de seminário no Rio de Janeiro sobre avaliação do Governo Lula. Comentários ao artigo "Vendeta na Reforma Agrária", de autoria de Xico Graziano, publicado no jornal O Estado de S.Paulo.
Publicação
Publicação no DSF de 15/04/2004 - Página 10214
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. REFORMA AGRARIA.
Indexação
  • COMENTARIO, REALIZAÇÃO, SEMINARIO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), PROMOÇÃO, ENTIDADE, ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG), AVALIAÇÃO, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL.
  • CRITICA, INCOMPETENCIA, GOVERNO, MANUTENÇÃO, ORDEM PUBLICA, IMPEDIMENTO, VIOLENCIA, ZONA RURAL, INERCIA, CONTENÇÃO, MOVIMENTO TRABALHISTA, SEM-TERRA, INSUBORDINAÇÃO, LEGISLAÇÃO.
  • DEFESA, URGENCIA, GOVERNO, DISPONIBILIDADE FINANCEIRA, EFETIVAÇÃO, REFORMA AGRARIA, RECUPERAÇÃO, CONFIANÇA, TRABALHADOR RURAL, PROPRIETARIO, PROPRIEDADE RURAL.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O ESTADO DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ANALISE, PROBLEMA, INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRARIA (INCRA), FALTA, PROPRIEDADE IMPRODUTIVA, DESAPROPRIAÇÃO, IMPLEMENTAÇÃO, PROJETO, ASSENTAMENTO RURAL, SUGESTÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, CONTROLE, CONTENÇÃO, MOVIMENTO TRABALHISTA, SEM-TERRA.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, há um seminário no Rio de Janeiro de avaliação do Governo Lula, promovido pela Associação Brasileira de Organizações Não-Governamentais.

No dia de ontem, o economista da Universidade Federal do Rio de Janeiro Fernando Cardim afirmou aquilo que estamos cansados de afirmar: o Governo Lula está sem rumo. Mas foi além e disse que o Presidente Lula pode acabar o seu mandato como o ex-Presidente argentino Fernando de la Rúa.

Relembrando, Fernando de la Rúa, eleito em 1999, foi obrigado a renunciar em dezembro de 2001, após uma grave crise político-econômica, quando também renunciou o Ministro da Economia Domingo Cavallo.

O professor e economista Fernando Cardim afirma que não há projetos de curto nem de longo prazo, que o Governo não tem rumo, nem de curto, nem de longo prazo, que o curto prazo foi entregue ao Ministro da Fazenda e o longo prazo ainda está esperando para saber qual é a estratégia de desenvolvimento imposta pelo atual Governo.

Se há falta de rumo, consagra essa ausência, sobretudo neste momento, a desordem institucionalizada no meio rural.

Sr. Presidente, venho a esta tribuna responsabilizar o Governo. Não há como não responsabilizar o Governo do Presidente Lula pela institucionalização da desordem no meio rural brasileiro. Não há mais lei. O império da lei cede espaço à violência, porque não há autoridade governamental, que não se impõe. Há uma apatia sem precedentes por parte do Governo, talvez constrangido por ter sido, ao longo do tempo, parceiro do MST, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra.

As lideranças do movimento insistem em afirmar que o Governo Lula é aliado. Estabeleceu-se, neste momento, uma aliança promíscua, porque a violência faz degenerar a instituição pública brasileira, oferecendo espaço a uma desordem que certamente será responsável por prejuízos imprevisíveis à nossa economia.

Faço apenas um relato dos últimos dois meses, março e abril, embora abril ainda esteja em curso. Nesse período, houve 102 invasões, das quais 69 foram patrocinadas pelo MST, em 16 Estados da Federação, onde aproximadamente 21 mil famílias estão acampadas. Muitos desses trabalhadores são desempregados urbanos que se reúnem, integram o movimento e invadem as terras, provocando a insegurança de forma fatal para a produção agrícola brasileira.

            O Governo é, sim, responsável. O MST foi instrumentalizado politicamente pelo Partido dos Trabalhadores. O MST apoiou abertamente a candidatura de Lula à Presidência da República, e Lula afirmava ser o único candidato capaz de promover reforma agrária em paz no País. Certamente esse constrangimento leva à inanição, à passividade, diante de toda esta movimentação que afronta a legislação do País.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Senador Alvaro Dias, V. Exª me permite um aparte?

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Infelizmente, Senador Eduardo Suplicy, estou falando pela Liderança e não há como conceder apartes.

Ontem, ao final da reunião da CPI da Terra, a conclusão foi um diagnóstico pessimista que impõe uma missão das mais difíceis ao Governo brasileiro. O bolsão de pobreza cresce assustadoramente no campo; a pressão social é avassaladora; e o Governo necessita disponibilizar recursos e instrumentalizar o Incra para que se promova a reforma agrária no País de forma mais competente, recuperando a credibilidade. A descrença dos trabalhadores sem terra e dos proprietários rurais leva a essa conflagração.

Ontem, houve acusações de parte a parte. Os trabalhadores sem terra acusam os proprietários rurais de constituírem milícias armadas, promovendo a violência. Os proprietários rurais acusam os trabalhadores sema terra, por meio do MST, de promoverem a violência.

Desta tribuna, responsabilizamos o Governo. Das acusações de proprietários às acusações de trabalhadores sem terra, preferimos responsabilizar o Governo. Um governo é eleito para impor autoridade, estabelecer o respeito à ordem e à lei vigente. O Governo Lula está sendo incompetente para fazer com que a ordem se estabeleça no País e incapaz de fazê-lo.

Sr. Presidente, Sras e Srs. Senadores, peço para dar como lido um artigo escrito por Xico Graziano, publicado no jornal O Estado de S. Paulo, intitulado “Vendeta na Reforma Agrária”, que deveria ser lido pelo Presidente Lula - é recomendável -, pois traz sugestões importantes que podem contribuir para que Sua Excelência tente semear a paz no campo. De início, convocando os seus aliados do MST para um diálogo, a fim de impedir a continuidade desse movimento de rebeldia, que leva pessoas humildes, trabalhadores muitas vezes desesperados, à violência. A responsabilidade por essa violência é, acima de tudo, do Governo Federal.

 

     

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR ALVARO DIAS EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210, I e § 2º do Regimento Interno.)

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Vendeta na Reforma Agrária

Xico Graziano

O Incra não está encontrando terras improdutivas para desapropriar. Por isso, mesmo contra sua vontade, não consegue implementar novos projetos de assentamento rural. Perdido, o governo experimenta de seu próprio veneno, destilado pelo MST, seu antigo aliado.

Afora a confusão, esse “abril vermelho” pode trazer uma guinada positiva na questão agrária brasileira. Para tanto, basta o Incra ter a coragem de afirmar aquilo que os economistas rurais não-ideológicos já sabem: terras disponíveis, hoje, somente se encontram na Amazônia ou no sertão. E considerá-las improdutivas significa afrontar a ecologia. Ou a agronomia.

Nas principais regiões agropecuárias do país, as fazendas se modernizaram e incorporaram “fronteiras internas” no processo produtivo. A expansão dos cultivos exigiu, também, a abertura de novas fronteiras, especialmente aquelas verificadas em Mato Grosso, na Bahia, no Tocantins, Piauí e Maranhão. Esse processo de expansão produtiva tem sido notoriamente documentado.

Paradoxalmente, o fim do latifúndio improdutivo virou um problema. Eternamente insatisfeito, o MST coloca a faca no pescoço do governo e exige mais assentamentos. Como escapar do dilema?

O melhor caminho seria brandir a arma da verdade. Ninguém melhor que o PT, agora no poder, para chamar os pseudo-revolucionários do MST e conversar sério. A portas fechadas, quiçá rodeados por algum bispo da Comissão Pastoral da Terra (CPT).

“Olha”, diria o Ministro, “demos aqui uma analisada com calma e descobrimos que aqueles números estão ultrapassados, a realidade mudou, a safra expandiu-se, a pecuária renovou-se, o Lula está gostando, divisas entram no país, os empregos, pelo menos no campo, se expandem, por isso, calma aí companheiro, chega de invasão, vocês estão atrapalhando o país. Entendeu Stédile?!”

Incerto seria o resultado da conversa. Boa vontade não se deve esperar de quem é contumaz em brandir facões e foices. Além do mais, seus líderes sabem que a realidade da agricultura está diferente. Pouco importa. Eles vivem do problema, não da solução.

Quando radicalizam, seu intento real visa a acessar verbas federais, repassadas em convênios com finalidades disfarçadamente altruístas. A tática almeja fortalecer a organização para disputar espaços no poder. Que exercem de forma autoritária. Quem ainda pensa o MST como movimento social padece da santa inocência.

Complicado é o governo cair na armadilha. A movimentação dos sem-terra embute claramente uma farsa. A horda invasora, regra geral, se constitui de desempregados urbanos, facilmente manipuláveis pela fábrica de sem-terra montada na organização.

O perigo se esconde dentro do aparelho de Estado. O acirramento das invasões empurra os pseudo-revolucionários ali infiltrados, provocando um deus-dará na reforma agrária. Desgraçadamente, o governo tem abandonado critérios técnicos e normas processuais, entrando no jogo da confusão. O pior resultado surge: imóveis produtivos estão sendo desapropriados para aplacar a fúria do MST.

A Fazenda Vale dos Bois, em Goiás, é um exemplo dessa insanidade administrativa. Com 1500 hectares, totalmente explorada com pecuária, alta lotação das pastagens, reserva florestal averbada à margem da escritura, coisa rara por lá, empregados com carteira assinada, sem nenhuma história de conflitos, tudo como manda o figurino. Não adiantou nada.

Motivada por uma vendeta, a fazenda entrou na roda do infortúnio. A bronca vem de uma deputada estadual chamada Magda Mofatto, ex-proprietária do imóvel, contra o atual detentor da área, seu companheiro de outrora. Por aquelas razões que nunca se descobrem nas brigas desse gênero, a mulher jurou aniquilar o homem, um advogado de bem.

Há coisa de um ano, a fulana mancomunou com o Incra de Goiás a desapropriação da fazenda que lhe pertencera. Juntou a fome com a vontade de comer. Tudo em nome da reforma agrária. Feito o conluio, daí para frente uma sucessão de vistorias e laudos resultou no desfecho previamente arranjado: a fazenda está declarada improdutiva, apta para desapropriação. O MST bate à sua porta. Um absurdo total.

Somente aos experts é possível descobrir como se processam tais operações. Métodos caquéticos de avaliação, baseados em índices que verificam o estoque, não o fluxo da produção, facilitam a montagem desse processo kafkiano, comandado pelo delírio ideológico. Os artifícios garantem que é ocioso aquilo que esbanja produção, praticando uma avaliação às avessas. Uma triste mágica.

Como, no passado, se flagraram os fazendeiros maquiando a produtividade, emprestando gado para colocar dentro de sua cerca, agora os técnicos do Incra vistoriam a fazenda, mas nem contam o gado existente. A eles interessam tão somente documentos, provando qual o rebanho que o proprietário manteve, no ano anterior. Se inexistirem notas fiscais, ou papéis não forem encontrados, dane-se o coitado do produtor. A fazenda vira improdutiva na hora. Pela caneta.

Quem lê isso, não acredita. Mas é assim que funciona. O grau de improdutividade é calculado numa máquina de somar reses e dividir pastos. A possibilidade de manipulação é enorme. Estando, como se sabe, o Incra aparelhado pelo MST, aqui sim está o verdadeiro bode tomando conta da horta.

A solução para o dilema agrário que se esconde nesse abril será essencialmente política. Poderia, todavia, se iniciar pelo aprimoramento dos normativos técnicos que definem a ociosidade da terra. Representaria um bom começo para banir a vendeta e excluir a falcatrua da reforma agrária.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR ALVARO DIAS EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210, I e § 2º do Regimento Interno.)

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Matéria referida: Comentários conjunturais 14 de abril


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/04/2004 - Página 10214