Discurso durante a 36ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Necessidade da recuperação da rodovia BR-364 no Estado de Rondônia.

Autor
Paulo Elifas (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RO)
Nome completo: Elifas Paulo da Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESENVOLVIMENTO REGIONAL. POLITICA DE TRANSPORTES.:
  • Necessidade da recuperação da rodovia BR-364 no Estado de Rondônia.
Publicação
Publicação no DSF de 15/04/2004 - Página 10255
Assunto
Outros > DESENVOLVIMENTO REGIONAL. POLITICA DE TRANSPORTES.
Indexação
  • COMENTARIO, PROCESSO, COLONIZAÇÃO, ESTADO DE RONDONIA (RO), IMPORTANCIA, REGIÃO, POTENCIA, DESENVOLVIMENTO, SIMULTANEIDADE, CRESCIMENTO, PROBLEMA, DESEMPREGO, DESEQUILIBRIO, DISTRIBUIÇÃO DE RENDA, VIOLENCIA, ESPECIFICAÇÃO, CONFLITO, INDIO, GARIMPEIRO, MUNICIPIO, ESPIGÃO D'OESTE (RO).
  • DEFESA, NECESSIDADE, RECUPERAÇÃO, RODOVIA, ESTADO DE RONDONIA (RO), MELHORIA, SEGURANÇA, USUARIO, FACILITAÇÃO, ESCOAMENTO, PRODUÇÃO, IMPEDIMENTO, ISOLAMENTO, REGIÃO.

O SR. PAULO ELIFAS (PMDB - RO. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, venho, hoje, a esta tribuna para falar sobre o povo brasileiro. De todas as cores, de todos os credos, de todos os sotaques. Brasileiros de mãos calejadas pelos guatambus da vida, brasileiros das filas dos hospitais públicos e das promessas de emprego, brasileiros da luta por um país mais justo e democrático na repartição de suas imensas riquezas, brasileiros que fazem do suor o combustível da esperança. Falo, portanto, em especial, dos brasileiros de Rondônia.

São muitos os Estados que avocam para si a condição de síntese do País, tanto no que há de mais belo, como nas suas maiores mazelas. Mas, nenhum deles tem, como Rondônia, a sua história moldada pelos contornos da realidade brasileira, principalmente nas últimas décadas. Rondônia é o ponto de encontro de todos os cantos e recantos do Brasil, uma terra nordestina de Severinos, uma terra nortista de Raimundos Nonatos, uma terra sulista de Silvas, Schmidt, Dalla Vecchia e Michaltzuk, uma terra de cosmopolitas, de sertanejos e de nativos de todos os nomes e sobrenomes, que se irmanam na gente rondoniense, retrato mais que perfeito da Nação brasileira.

Eu mesmo, um Silva do Paraná, ousei o desafio de deixar a minha vida no norte do Paraná e dedicar-me, como médico, a uma população, que chegava a um território longínquo, mas que já se apresentava, em meados da década de setenta, como um “Novo Eldorado”. Éramos poucos profissionais médicos em Rondônia, naquela época, menos de vinte. Os núcleos populacionais mais se pareciam um amontoado de clareiras com quiosques e casinhas de madeira, ao longo de uma estrada quase intransitável, a mesma que Juscelino ousou chamar, um dia, de “lado esquerdo da cruz”, por se tratar da via de integração do País, via oeste.

Luz de lampião, candeeiro, vela, lamparina; água do poço, da cacimba, da cisterna, do rio, do regato, do córrego, do igarapé ou quaisquer que sejam os nomes ou os costumes dos lugares de origem daquela gente de semblante corado pelo sol-a-sol. Entrei portas adentro daquelas moradas singelas, vi nascer e morrer, o choro de alegria da chegada e as lágrimas de tristeza da despedida.

Quem conhece, portanto, como eu, Rondônia na sua história e na sua geografia, sabe da importância do processo migratório na ocupação do espaço rondoniense, que se estendeu, principalmente, ao longo da BR-364. E essa migração, e o conseqüente desenho da ocupação produtiva, deu-se através de políticas públicas, isto é, Rondônia cumpriu uma missão das mais estratégicas no contexto da política nacional de desenvolvimento econômico e social. Rondônia respondeu, de pronto, na solução dos grandes problemas nacionais, ao longo dos últimos trinta anos, período de maior afluxo populacional para o Estado.

Rondônia possuía, principalmente no final da década de setenta, todos os ingredientes necessários para atenuar os focos de tensão social que se alastravam no campo e nas cidades brasileiras, particularmente motivados pela luta pela terra produtiva.

A BR-364 constituiu-se, portanto, ao longo destes anos de ocupação territorial de Rondônia, em leito de vida. Uma verdadeira passagem para o progresso. Um elo de ligação entre cidades que emergiram e que se desenvolveram às suas margens, uma entrada para todos os povos, uma saída para o mundo.

A colonização do estado de Rondônia, na sua grande maioria se fez por pequenos produtores rurais com características familiares, dão o perfil das cidades que se alastraram, principalmente ao longo da BR-364. O grande arquiteto e, quem sabe, o paisagista da rede de cidades de Rondônia foi o Incra. Foram os seus projetos de colonização e de assentamento dirigido os moldes para o desenvolvimento urbano e rural do Estado. Muitos deles emprestaram, inclusive, seus nomes para os municípios que se sucederam. São os casos de Ouro Preto D’Oeste, Cacaulândia, Theobroma, Corumbiara, Colorado D’Oeste, entre outros. Trata-se de um processo diferente do se desenvolveu na chamada Amazônia Oriental. Lá, as terras foram ocupadas pelos grandes empreendimentos empresariais, que se estenderam em imensas extensões de terra, normalmente para a criação extensiva de gado. Rondônia, ao contrário, foi ocupada, produtivamente, pela policultura, de menor porte, o que propiciou, também, uma melhor distribuição fundiária. Em Rondônia, ainda hoje, quase 90% dos estabelecimentos rurais ainda se enquadram na categoria da pequena produção familiar de até cem hectares. Uma agricultura com essas características, que se sustenta na policultura, é menos sensível às crises, gera mais empregos a custos menores, produz alimentos e propicia o excedente necessário à exportação geradora de divisas. É assim Rondônia. 

Senhor Presidente,

Senhoras Senadoras e Senhores Senadores:

Por isso, Rondônia está pronta, mais uma vez, para responder às necessidades da Nação e de um povo que quer mudanças. Não há como conviver com tantos conterrâneos que ainda amargam a dor da fome. Nem com tantos desempregados à procura das placas de “precisa-se” e que só encontram as de “não há vagas”. Nem, tampouco, com tamanhas disparidades de distribuição de renda, que é responsável por esse verdadeiro apartheid social de um país rico, de pobres. Os focos de tensão social, também hoje, se alastram pelas periferias, no campo e nas cidades, principalmente nos maiores centros urbanos. E, cada um destes lugares, por mais distante e, muitas vezes, esquecido, encontra em Rondônia os seus representantes, uma espécie de amostra humana, verdadeiros símbolos da riqueza das diferenças brasileiras de rostos e de sotaques.

Mas, Rondônia também vive essa mesma contradição: um Estado que ostenta potenciais de desenvolvimento dos mais significativos do planeta, com problemas sociais que se avolumam e que atingem o limite da violência. Recentemente, conforme amplamente divulgado pela imprensa, novo conflito, envolvendo garimpeiros e índios, ocorreu na reserva dos denominados índios Cinta Larga, na localidade de Espigão do Oeste, vizinho ao Município de Cacoal, onde atuo profissionalmente como médico. Esse conflito deixou um saldo de 23 vítimas, contabilizados até ontem à noite. Extra-oficialmente asseguram que há 62 corpos, muitos carbonizados. Por conhecer a região e conviver com a população local, temo que esse não seja o último conflito a ocorrer, apesar das providências já tomadas pela Funai e pelo Senhor Ministro da Justiça, através da Policia Federal.

Pela história de Rondônia, pode-se demonstrar, por exemplo, que é possível realizar uma reforma agrária sem os ranços ideológicos que politizam a discussão da distribuição fundiária, nos limites de inviabilizá-la. Que é factível desenvolver uma economia baseada na pequena unidade de produção, que é possível também fortalecer uma sociedade com forte origem no ruralismo, desenvolvendo o núcleo urbano baseado na produção e trabalho agrícola. Que é possível fazer justiça social e por conseqüência desenvolver o País. Só por isto Rondônia é um Estado referencial para um planejamento em escala nacional, principalmente dos Estados da Amazônia Legal, contribuindo para amenizar e solucionar os problemas do Brasil de hoje, que são desemprego, fome e violência e a disparidade social sem precedentes.

Porém, é necessário que Rondônia tenha na BR-364, marco inicial da sua ocupação, sua espinha dorsal, não um “cordão sem ponta”, “cheio de nós”, esburacada e destruída. É necessário que seja recuperada, seja refeita nos trechos destruídos pelo transporte pesado de madeira, soja, café e boiadas. Que seja novamente via que transporta o progresso dos brasileiros de Rondônia, pois estando como está, destruída e abandonada, se transforma, também, em leito de morte.

Os agricultores de Rondônia, além do escoamento de sua produção, convivem com a má conservação das estradas vicinais e das estradas que ligam os municípios fora da BR, quase todos sem cobertura asfáltica, e que, por isto, são penosamente punidos por um clima de intensa chuva que arrasta pontes de madeira, bueiros e solapam os leitos das estradas cascalhadas, porém sem terraplanagem.

Nos meses de janeiro a maio, as estradas vicinais, isolam os agricultores, que passam necessidade e morrem sem socorro médico, pois chegam tarde aos hospitais. Quantas de suas esposas tiveram que dar a luz em casa, à luz de vela, convivendo com a impossibilidade de transporte!

Neste momento, queremos dar uma sugestão ao Governo Federal, para que se debruce sobre a história do povo de Rondônia, setenta mil pessoas na década de 60 e um milhão e quinhentas mil nos dias de hoje. Se debruce e veja a história deste povo que, lutando com esperança, sem medo, transformaram uma floresta desabitada, inóspita, num exemplo de colonização, ocupação e fator de desenvolvimento social.

Rondônia precisa de muito mais, pois o povo que lá está, não cruza os braços, porém precisa de que o governo faça sua parte, que faça também parte da história os brasileiros de todos os Estados, gente de Rondônia, síntese do Brasil.

Obrigado Senhoras Senadoras e Senhores Senadores.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/04/2004 - Página 10255