Discurso durante a 37ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas à atuação do governo federal na condução da política agrária no País.

Autor
Osmar Dias (PDT - Partido Democrático Trabalhista/PR)
Nome completo: Osmar Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA AGRARIA. SEGURANÇA PUBLICA.:
  • Críticas à atuação do governo federal na condução da política agrária no País.
Aparteantes
Mão Santa, Ramez Tebet.
Publicação
Publicação no DSF de 16/04/2004 - Página 10316
Assunto
Outros > REFORMA AGRARIA. SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • QUESTIONAMENTO, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, DESRESPEITO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, REVOGAÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), GOVERNO, ANTERIORIDADE, DETERMINAÇÃO, AREA, OCORRENCIA, INVASÃO, AUSENCIA, OBJETO, PROCESSO, DESAPROPRIAÇÃO.
  • COMENTARIO, APREENSÃO, PROPRIETARIO, PROPRIEDADE RURAL, PAIS, AGRAVAÇÃO, PROBLEMA, VIOLENCIA, INVASÃO, PROPRIEDADE PRODUTIVA, OMISSÃO, GOVERNO, COMBATE, FALTA, SEGURANÇA, ESTADOS, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ).

O SR. OSMAR DIAS (PDT - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, pena que não seja possível ampliar esta foto para que o Brasil possa vê-la. Trata-se de foto publicada no jornal O Estado de S.Paulo, e não foi tirada nem na Rocinha nem no Iraque, mas na sede de uma fazenda, onde o proprietário construiu um verdadeiro bunker, uma trincheira, a fim de poder continuar morando em sua residência, que, segundo o jornal, teve suas janelas estilhaçadas por balas. O proprietário vive amedrontado dentro da sua propriedade, considerada produtiva pelo Incra.

O pior, Sr. Presidente, é que esta foto é o retrato do desrespeito - não do MST, porque ele está fazendo aquilo que compete ao movimento, e estimulado pelo Governo -, desrespeito para com o setor produtivo, para com os produtores. O desrespeito à Constituição não parte em primeiro lugar do MST, mas do Governo, quando praticamente revoga a medida provisória, editada no Governo Fernando Henrique Cardoso, que determinava que áreas invadidas não seriam objeto de processo desapropriatório.

O Presidente do Incra, de forma irresponsável - porque é uma autoridade pública -, afirma que a medida provisória não vale, apesar de ter sido considerada constitucional pelo Supremo Tribunal Federal. Tem ele mais poder de julgar constitucional ou não a medida provisória do que aquele Tribunal? Ele se julga acima da lei para dizer que a medida provisória não vale? É um desrespeito à Constituição, ao Estado de Direito.

As pessoas não podem mais viver tranqüilas nas suas propriedades, nas suas casas, pois estão amedrontadas pelo MST, que está, sim, sendo estimulado pelo Governo. Não adianta negar. O Governo faz cara de paisagem, enquanto o campo está em polvorosa. Um caos de insegurança toma conta hoje dos produtores rurais.

E não adianta fazer discurso de homenagem aos produtores rurais, dizendo que eles foram responsáveis pelo superávit da balança comercial, que o agronegócio brasileiro segurou os índices de desemprego. Não adianta fazer discurso de homenagem e ter atitudes irresponsáveis como a do Presidente do Incra, endossada pelo Ministro do Desenvolvimento Agrário, Miguel Rosseto. Aliás, uma atitude irresponsável e criminosa, que estimula o MST a fazer invasões a todo vapor - foram 102 invasões nesse período de governo. É um desrespeito aos produtores e à sociedade, porque quem não respeita o Estado de Direito está desrespeitando a Constituição e a sociedade.

Sr. Presidente, esta foto é o retrato da destruição da autoridade do Governo. O Governo está permitindo que a sua autoridade seja destruída todos os dias. Quando V. Exª vai à tribuna e cobra o cumprimento do acordo para que se vote a PEC nº 77, em outras palavras, V. Exª está avisando o Governo: ou cumpre a palavra, ou perde a autoridade. O Governo está perdendo sua autoridade com cada atitude irresponsável que pratica. Quando não cumpre o acordo para votar a PEC nº 77, está destruindo a autoridade. Quando permite as invasões e não garante a reintegração de posse, está destruindo sua autoridade.

Chegamos ao cúmulo de ver fazendas produtivas serem invadidas no Rio Grande do Sul, Estado do Senador Sérgio Zambiasi, do Senador Pedro Simon e de V. Exª, Senador Paulo Paim. Agradeço-lhe, aliás, a oportunidade de estar falando neste momento, já que V. Exª concedeu-me a sua vez.

Diz o jornal que foi invadida uma fazenda produtiva de 360 hectares, com 345 cabeças de gado e uma plantação de soja, a Fazenda Bom Sossego. “O Coordenador do MST Nilton Lima, responsável pela invasão, informou que pouco importa o fato de a área ser produtiva”.

Vejam a que ponto está chegando o País! É uma verdadeira bagunça, que o Governo do Presidente Lula está patrocinando.

Disse o Coordenador do MST: “Se a terra é produtiva, que o governo a compre para assentamento”.

Aonde vamos chegar, Senador Ramez Tebet? Para onde estamos caminhando? Era essa a mudança que prometeram para o País? Queriam mudar o País para subverter a ordem, para desrespeitar a Constituição, desrespeitar acordos, desrespeitar o cidadão, desonrar palavras e compromissos?

Senador Ramez Tebet, concedo um aparte a V. Exª, até para que eu possa tomar um copo d’água.

O Sr. Ramez Tebet (PMDB - MS) - V. Exª pode saber que meu aparte vale muito mais do que isso, dado o apreço que dispenso a V. Exª.

O SR. OSMAR DIAS (PDT - PR) - Não quis dizer isso; quis dizer da minha indignação, Senador Ramez Tebet.

O Sr. Ramez Tebet (PMDB - MS) - Tudo é brincadeira, Senador. Somos muito amigos, mas a minha interferência não é pela amizade, é pelo respeito que tenho não só pelo pronunciamento de V. Exª, como também pelos posicionamentos sempre firmes que tem no Senado. Essa é uma matéria que V. Exª conhece muito bem, pois vem de um Estado que está sendo agredido violentamente por essas invasões, assim como eu tenho minha origens no Estado de Mato Grosso do Sul, que sofre tremendamente com o mesmo problema. E, agora, o que estamos observando, e V. Exª salienta, é que o princípio da autoridade está arrasado. Quer dizer, há um desafio, um desplante, por parte do Movimento, desafiando as autoridades constituídas, desafiando o setor produtivo do País, desrespeitando a legislação. Como V. Exª disse, não interessa mais saber se é terra produtiva ou improdutiva. Senador Osmar Dias, V. Exª está refletindo não só o seu pensamento como representante do Estado do Paraná. V. Exª falou olhando para o Rio Grande do Sul, um grande Estado produtor, a exemplo do seu. E Mato Grosso do Sul tem sofrido também, e a nossa luta tem sido intensa. Porém, o que está chocante é que esse problema chegou a um determinado ponto que colocou em risco a ordem constituída no País. Temos que ser francos. Está na hora de colocarmos um basta nessa situação, e que esse basta seja feito dentro da ordem, que se faça cumprir a lei. O que não pode é que duas ou três pessoas façam pronunciamentos desafiando as autoridades constituídas do País, desafiando os Poderes Executivo, Judiciário e Legislativo. Senador Osmar Dias, cada vez cresce mais a minha admiração por V. Exª.

O SR. OSMAR DIAS (PDT - PR) - Obrigado, Senador Ramez Tebet. V. Exª talvez não avalie o quanto foi importante o seu aparte, porque se encaixou na minha indignação. Quando eu disse que precisava tomar um pouco de água, era de tanta indignação, que me secou a garganta, em função do que vem ocorrendo no meu Estado. Lá parece que não há lei, e as coisas que eu e as pessoas que conversam comigo enxergam são diferentes daquelas que constam em matérias pagas nos jornais.

O nosso porto é o mais eficiente do Brasil e, no entanto, há uma fila de 120 caminhões. Os caminhoneiros reclamam que estão abandonados à própria sorte.

V. Exª, Senador Ramez Tebet, tem sido aqui sempre uma voz de prudência, alertando o Governo. O Partido de V. Exª apóia o Governo, mas V. Exª faz aquilo que deve fazer quem quer apoiar e ajudar de verdade: alertar. Quando V. Exª fala o faz com muita prudência e alertando o Governo. Por isso, agradeço a V. Exª pela interferência no meu pronunciamento.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Osmar Dias, V. Exª já tomou água, e eu gostaria de tomar um pouco do seu tempo, fazendo um aparte de um minuto.

O SR. OSMAR DIAS (PDT - PR) - Por favor, Senador Mão Santa.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - V. Exª não representa apenas os melhores Senadores da 52ª Legislatura. Nos 180 anos de Senado, poucos tiveram a sua competência. Ninguém o excede em conhecimentos de agronomia e pela maneira como preside a mais importante Comissão do Senado, a Comissão de Educação. Resumindo tudo o que penso, eu, como brasileiro, tinha medo do PT, tinha medo de que ele transformasse a nossa bandeira brasileira, com suas bonitas cores - o verde, o amarelo, o azul e o branco -, em vermelha. Mas não fez isso, Senador Osmar Dias. Ele só mexeu na faixa branca, no lema positivista “ordem e progresso”, que agora parece “desordem e regresso”.

O SR. OSMAR DIAS (PDT - PR) - Senador Mão Santa, agradeço a V. Exª pelas palavras e pelo aparte, sempre de muita inteligência.

Vou colaborar com o Sr. Presidente, que me pediu para ser breve em meu pronunciamento. Gostaria de continuar este discurso por muito tempo, porque tenho muitas coisas para falar, mostrar o que está errado e fazer uma proposta para o Governo - e vou fazê-lo. Antes, porém, quero apenas dizer ao Presidente Lula que, em vez de estar preocupado em aumentar a Cofins para arrecadar mais; em aumentar tributos, cada vez mais pesados para o setor produtivo; em ficar pensando na próxima medida provisória que vai editar; Sua Excelência deveria atentar para as manchetes dos jornais que estão alertando para o estado de caos em que o País vive no que se refere à insegurança, não apenas no Rio de Janeiro, mas a que começa a tomar conta da pacata zona rural deste País, onde as pessoas, que lá podiam viver em paz, com serenidade e tranqüilidade, hoje estão ameaçadas, vivendo dentro de trincheiras, como a casa do Sr. Luiz Antonio Coelho Júnior.

Não é possível que uma fotografia como esta não chame a atenção de um Governo que foi eleito fazendo muitas promessas, entre elas a da mudança. Deus me livre, mas não quero nem pensar que esta seria a mudança prometida.

Espero que o Governo Lula corrija o rumo da sua atuação, os seus caminhos, porque senão a insegurança vai tomar conta de todos os cantos deste País. Os conflitos serão inevitáveis e, como disse a Senadora Ana Júlia Carepa, a impunidade é que leva aos conflitos. E o que vemos é impunidade aos invasores. Em vez de punir o invasor, o Governo o premia, aumentando as benesses que são distribuídas a quem invade, e, assim, é claro que ele está estimulando as invasões, sim.

É preciso que o Sr. Ministro do Desenvolvimento Agrário e o Presidente do Incra tomem mais cuidado com o que falam e com as suas atitudes, porque a posição deles, hoje, não é de sindicalistas, mas de autoridades públicas que refletem o pensamento do Governo. E se o pensamento do Governo é esse refletido pelo Ministro Miguel Rossetto, eu estou muito preocupado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/04/2004 - Página 10316