Discurso durante a 37ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

A questão da baixa qualidade nutricional do brasileiro.

Autor
Valmir Amaral (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/DF)
Nome completo: Valmir Antônio Amaral
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE. POLITICA SOCIAL.:
  • A questão da baixa qualidade nutricional do brasileiro.
Publicação
Publicação no DSF de 16/04/2004 - Página 10352
Assunto
Outros > SAUDE. POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • COMENTARIO, GRAVIDADE, PROBLEMA, SAUDE PUBLICA, PAIS, RESULTADO, DEFICIENCIA, NUTRIÇÃO.
  • REGISTRO, DADOS, PESQUISA, DEMONSTRAÇÃO, SITUAÇÃO, BRASIL, PERCENTAGEM, CRIANÇA, VITIMA, DOENÇA, EFEITO, DEFICIENCIA, FERRO, VITAMINA, IODO, RISCOS, SAUDE PUBLICA.
  • IMPORTANCIA, POLITICA NACIONAL DE SAUDE, BRASIL, INCLUSÃO, POLITICA NACIONAL, ALIMENTAÇÃO, NUTRIÇÃO, ASSISTENCIA, GESTANTE, MÃE, PERIODO, ALEITAMENTO MATERNO, VITIMA, DESNUTRIÇÃO, ESPECIFICAÇÃO, PROGRAMA, ALIMENTOS, FAMILIA, MERENDA ESCOLAR, COMBATE, FOME, MISERIA.

O SR. VALMIR AMARAL (PMDB - DF. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs, Senadores, “a gente é o que a gente come”, dizia, no século dezenove, o filósofo alemão Ludwig Feuerbach. O contexto em que disse essa frase pode até ser equivocado, assim como sua posição filosófica em geral, mas o fato é que a frase encerra, em certa medida, uma verdade inegável. Nossa saúde varia em função de muitos fatores, mas boa parte dela depende da qualidade de nossa alimentação. Pelo menos no que diz respeito à saúde, o filósofo alemão estava certo: somos o que comemos, saudáveis quando seguimos uma alimentação correta, doentes à medida que se degrada a qualidade de nossa alimentação.

De fato, a má nutrição está direta ou indiretamente associada à maioria das doenças. A deficiência nutricional, por um lado, é um fator que favorece ou agrava os quadros de doenças infecto-contagiosas. Pessoas mal nutridas ou desnutridas, geralmente com a imunidade enfraquecida, estão muito mais expostas a esse tipo de doenças. Além disso, por outro lado, a má nutrição está também relacionada a inúmeras doenças não-transmissíveis, como a hipertensão arterial, doenças cardiovasculares, diabetes e até mesmo alguns tipos de câncer. E essas doenças, em conjunto, vale lembrar, já são a maior causa de mortes no mundo.

No Brasil, alguns graves problemas de saúde pública são causados por problemas nutricionais. Bem recentemente, o Unicef divulgou os resultados de uma ampla pesquisa sobre a deficiência de vitaminas e minerais nas crianças, na qual o Brasil, infelizmente, não faz boa figura. Segundo a pesquisa, 45% das nossas crianças sofrem de anemia causada por deficiência de ferro, ou anemia ferropriva, como dizem os especialistas. Nesse quesito, estamos em pior situação do que alguns outros países da América Latina, como a República Dominicana, El Salvador, Honduras e Guatemala.

Esse tipo de deficiência é especialmente grave porque, muitas vezes, não é tão evidente quanto a desnutrição energético-protéica, outro problema nutricional que tem, no Brasil, a dimensão de um problema de saúde pública. Enquanto os efeitos da desnutrição são evidentes e facilmente constatáveis, como o baixo peso e a baixa estatura, as conseqüências da anemia ferropriva são menos perceptíveis, mas não menos graves. A deficiência de ferro pode prejudicar fortemente o desenvolvimento intelectual das crianças, diminuindo os quocientes de inteligência.

Outras deficiências, como a de vitamina A e a de iodo, também constituem problemas de saúde pública no Brasil. Mas, ao lado dessas deficiências, o sobrepeso e a obesidade já começam, também aqui no nosso País, a representar um risco de saúde pública. Estudos internacionais mostram estatisticamente que a obesidade já é quase tão letal quanto o tabagismo. No Brasil, só no período entre 1975 e 1989, houve um aumento de 100% na ocorrência de obesidade entre os homens e 70% entre as mulheres.

Por tudo isso, uma política consistente de saúde não pode negligenciar a dimensão nutricional. Nossa Política Nacional de Saúde atende a isso, já que inclui, como sua parte integrante, uma Política Nacional de Alimentação e Nutrição. Recentemente, aliás, foi realizada, em Olinda, a II Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, com o objetivo de propor diretrizes para essa política e avaliar seu andamento.

Particularmente importante, Sr. Presidente, é o foco que essa política põe na assistência às gestantes, às mães amamentando seus filhos e às crianças menores de 7 anos em risco nutricional. São esses os beneficiários do programa Bolsa-Alimentação, agora integrado no programa Bolsa-Família, sobre o qual já tive ocasião de me pronunciar antes. Uma das boas notícias da situação da saúde no Brasil é que as taxas de mortalidade infantil vêm decrescendo consistentemente ao longo dos anos. Creio que poderíamos dizer, sem medo de errar, que parte do sucesso na luta contra esse tipo de mortalidade deve-se ao êxito de programas na área de alimentação e nutrição. O Brasil, por exemplo, já tem a maior rede de bancos de leite do mundo, que atende a milhares de recém-nascidos por ano.

Esse foco nas gestantes e no desenvolvimento e crescimento das crianças é confirmado e reforçado pelas prioridades do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional, o Sisvan, que, em suas atividades de monitoramento, deverá concentrar sua atenção exatamente nesses grupos. De resto, a sistematização do processo de monitoramento da situação alimentar e nutricional é um componente essencial da política nacional de alimentação e nutrição e é peça fundamental para o bom funcionamento de toda essa política. Esse sistema, ampliado de modo a estender sua cobertura a todo o País e aperfeiçoado, servirá de eixo para a condução dessa política, dando-lhe consistência e aumentando sua eficiência e eficácia.

Uma das marcas distintivas da política de alimentação e nutrição é sua intersetorialidade. São muitos os setores do governo envolvidos, nos vários âmbitos federativos, além da sociedade civil e do setor produtivo. Há aspectos econômicos, culturais, educacionais, além dos epidemiológicos, a serem levados em conta. Justamente por isso, parece-me que a integração de esforços e programas é a maneira mais sábia de conduzir, nessa área, as ações.

Nesse espírito, eu não poderia deixar de lembrar aqui de um programa que, embora ligado à área de educação, tem uma relevância toda especial para a questão da alimentação e da nutrição. Refiro-me, Sr. Presidente, ao Programa Nacional de Alimentação Escolar, o PNAE, mais conhecido como programa da merenda escolar. Trata-se do programa social mais antigo do Brasil nas áreas de educação e alimentação, e também um dos mais bem sucedidos. É ainda um dos maiores projetos do mundo na área de nutrição, atendendo a 35 milhões de crianças.

Por fim, Srªs e Srs. Senadores, ainda nessa perspectiva da integração dos programas, eu não poderia deixar de mencionar os esforços que compõem o programa Fome Zero. Esse programa, embora focado na questão da segurança alimentar, tem, por sua amplitude, implicações que ultrapassam largamente a questão nutricional. Voltado para o combate à fome, sua mirada vai mais longe, em direção à erradicação da miséria e à eliminação de suas causas estruturais.

Menciono apenas de passagem esse programa porque, em sua amplitude, lembra-nos de como é fundamental a questão da alimentação. Partindo-se dela, um amplo leque de efeitos pode ser considerado. De fato, alimentar-se é a função vital básica. Assegurar uma alimentação correta é, no final das contas, garantir a base, o fundamento de uma vida plena e boa.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, no que diz respeito à saúde e à nutrição, há ainda muito a fazer no Brasil, como, de resto, em todas as áreas sociais, mas é preciso reconhecer que há avanços significativos. O número de crianças desnutridas, por exemplo, vem diminuindo. Há ainda outras deficiências a serem combatidas e vencidas, como a deficiência de ferro, a que me referi antes. Há também o desafio crescente da obesidade, no extremo oposto das disfunções que têm origem nutricional. No entanto, a prioridade conferida a um programa com a ambição e o alcance do Fome Zero, bem como sua visão integrada e intersetorial, permite-nos acreditar que a situação continue melhorando nos próximos anos. Torçamos e trabalhemos para que essa crença e essa esperança não sejam frustradas.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/04/2004 - Página 10352