Pronunciamento de Valdir Raupp em 15/04/2004
Discurso durante a 37ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Registro de documento encaminhado pelos congressistas peruanos ao Congresso dos Estados Unidos para que reoriente sua política de venda de armas aos países latino-americanos.
- Autor
- Valdir Raupp (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RO)
- Nome completo: Valdir Raupp de Matos
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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POLITICA INTERNACIONAL.:
- Registro de documento encaminhado pelos congressistas peruanos ao Congresso dos Estados Unidos para que reoriente sua política de venda de armas aos países latino-americanos.
- Publicação
- Publicação no DSF de 16/04/2004 - Página 10353
- Assunto
- Outros > POLITICA INTERNACIONAL.
- Indexação
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- REGISTRO, APOIO, DOCUMENTO, AUTORIA, PARLAMENTAR ESTRANGEIRO, ENCAMINHAMENTO, PARLAMENTO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), SOLICITAÇÃO, RENOVAÇÃO, ORIENTAÇÃO, PROIBIÇÃO, VENDA, ARMA NUCLEAR, PAIS, AMERICA LATINA.
O SR. VALDIR RAUPP (PMDB - RO. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em meio a uma conjuntura mundial tão preocupante, em que as mais sofisticadas armas, com extraordinário poder de destruição, deixam de ser monopólio de Estados e passam a ser utilizadas com desenvoltura por grupos terroristas radicais, ganha atualidade o documento elaborado por 71 colegas congressistas peruanos, que acabo de receber e que, apoiando integralmente seus termos, faço questão de registrar nesta Casa. Trata-se de Declaração encaminhada ao Congresso dos Estados Unidos da América, acompanhada de solicitação expressa no sentido de que seja reproduzida e endereçada aos demais Parlamentos do Continente.
Em síntese, pedem nossos colegas do Peru que a grande potência continental reoriente sua política de vendas de armas aos países latino-americanos, listando algumas das conseqüências funestas que esse tipo de comércio acarreta para a região. Partindo do pressuposto - incontestável, aliás - de que a aquisição de armas com elevado grau de sofisticação somente se explicaria em situação de guerra extremada, o que, felizmente, não é o nosso caso, o documento solicita que o Governo de Washington retome a sensata iniciativa do Presidente Jimmy Carter, anunciada em 1977, de coibir esse caríssimo comércio.
Desgraçadamente, como resultado de provável pressão exercida pelos grupos empresariais que lucram com tal atividade, o Presidente Bill Clinton revogou a anterior decisão da Casa Branca. Portanto, o que se pede neste momento nem mesmo é inédito: trata-se tão-somente de se proceder ao retorno do quadro vigente em fins da década de 70.
Argumentos é que não faltam para justificar a iniciativa dos parlamentares do vizinho Peru. Em primeiro lugar, a manutenção do comércio dessas armas, sob o ponto de vista moral, político, econômico e social, é indecoroso e deplorável. Seu resultado imediato é drenar os já parcos recursos existentes em nossos países, desviando-os dos indispensáveis programas de desenvolvimento. Na prática, portanto, o que deveria ser investimento social da mais alta relevância - a exemplo de projetos voltados para a universalização do sistema educacional público e para a criação e manutenção de um adequado serviço de saúde - transforma-se em gasto perdulário e desprovido de qualquer sentido moral e material.
Levando-se na devida conta que essas compras normalmente se efetivam com recursos oriundos de empréstimos internacionais, temos, em conseqüência, o significativo aumento da dívida externa, sem que esse endividamento se justifique pela utilização do montante captado em projetos econômica e socialmente necessários.
Há outro aspecto da questão, Sr. Presidente, ainda mais tenebroso: a compra desenfreada de armas de tal porte pela América Latina poderá desencadear, em nossa região, uma corrida armamentista em tudo e por tudo anacrônica e deletéria. Em certo sentido, isso poderia também levar à desastrosa derrota da decisão tomada, ainda na década de 60, reiterada posteriormente, de fazer do Atlântico Sul zona livre de armas nucleares.
Poderíamos lembrar, ainda nessa linha de argumentação, que a constituição de arsenais dessa natureza poderá reavivar antigas rivalidades, as quais, decididamente, nossas nações vêm superando. É como se, na contramão de iniciativas de integração tão positivas quanto difíceis, como a constituição do Mercado Comum do Sul - Mercosul, e da Comunidade Andina, assim como das tratativas em torno de uma futura Área de Livre Comércio das Américas - Alca, quiséssemos criar tensões artificiais e reaprofundar as grandes distâncias que, no passado recente, tanto nos apartavam.
Não há dúvida, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, de que o nefasto gigantismo desse comércio de armas especiais também viola os acordos voltados para a paz e o desarmamento em nossa região, celebrados pelos chefes de Estado dos países integrantes do Grupo do Rio. Ademais, quando se desviam recursos de nossos países para a compra desses armamentos, agride-se o espírito e a letra da Carta da Organização dos Estados Americanos, a OEA, haja vista sua determinação - formalmente acatada por todos os países que compõem o sistema interamericano - relativa à obrigatoriedade coletiva de luta “para suprimir a pobreza extrema, que constitui um obstáculo para o pleno desenvolvimento democrático dos povos do Hemisfério”.
Cumpro um dever indeclinável de trazer ao Senado da República tema dessa magnitude, que diz respeito diretamente ao Brasil e aos demais países latino-americanos. Ao parabenizar os colegas peruanos pela nobre iniciativa, hipoteco-lhes minha incondicional solidariedade e registro minha integral concordância com os termos utilizados no documento dirigido aos Parlamentares norte-americanos.
Não posso admitir que um Continente historicamente marcado por absurdos desníveis sociais e que tanta dificuldade encontra para trilhar o caminho do desenvolvimento possa, acintosa e inescrupulosamente, desviar recursos vitais à luta para a superação da miséria, do atraso e das iniqüidades sociais para saciar a sede de ganho imoral por parte de uns poucos.
Que tenhamos a coragem de enfrentar esses inimigos da paz e do desenvolvimento com justiça social!
Era o que eu tinha a dizer.